Karen Cristina da Silva Pissurno

Tamanho: px
Começar a partir da página:

Download "Karen Cristina da Silva Pissurno"

Transcrição

1 Universidade Federal do Rio de Janeiro A CONCORDÂNCIA VERBAL DE TERCEIRA PESSOA DO PLURAL NA VARIEDADE MOÇAMBICANA DO PORTUGUÊS: UMA ABORDAGEM SOCIOLINGUÍSTICA Karen Cristina da Silva Pissurno 2017

2 A CONCORDÂNCIA VERBAL DE TERCEIRA PESSOA DO PLURAL NA VARIEDADE MOÇAMBICANA DO PORTUGUÊS: UMA ABORDAGEM SOCIOLINGUÍSTICA Karen Cristina da Silva Pissurno Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro como quesito para a obtenção do Título de Mestre em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa). Orientadora: Profa. Doutora Silvia Rodrigues Vieira Rio de Janeiro Agosto de 2017 II

3 A CONCORDÂNCIA VERBAL DE TERCEIRA PESSOA DO PLURAL NA VARIEDADE MOÇAMBICANA DO PORTUGUÊS: UMA ABORDAGEM SOCIOLINGUÍSTICA Karen Cristina da Silva Pissurno Orientadora: Professora Doutora Silvia Rodrigues Vieira Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro como parte dos requisitos necessários para a obtenção do Título de Mestre em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa). Examinada por: Presidente, Profa. Doutora Silvia Rodrigues Vieira Profa. Doutora Christina Abreu Gomes UFRJ Profa. Doutora Beatriz Protti Christino UFRJ Profa. Doutora Silvia Figueiredo Brandão UFRJ, Suplente Profa. Doutora Danielle Kely Gomes UFRJ, Suplente Rio de Janeiro Agosto de 2017

4 PISSURNO, Karen Cristina da Silva. A concordância verbal de terceira pessoa do plural na variedade moçambicana do Português: uma abordagem sociolinguística / Karen Cristina da Silva. Rio de Janeiro: UFRJ / FL, xviii, 222 f.: il.; 31 cm. Orientadora: Silvia Rodrigues Vieira Dissertação (mestrado) UFRJ/Faculdade de Letras/Programa de Pós-graduação em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa), Bibliografia: f Português de Moçambique 2. Concordância Verbal 3. Sociolinguística 4. Multilinguismo I. Vieira, Silvia Rodrigues II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Letras, Programa de Pós-graduação em Letras Vernáculas. III. A concordância verbal de terceira pessoa do plural na variedade moçambicana do Português: uma abordagem sociolinguística. IV

5 A minha mãe, Verônica, A meu pai, Robson, A meu marido, Leonni, A minha orientadora, Silvia, que me apoiaram em todos os momentos, e foram fundamentais para a realização deste sonho. V

6 AGRADECIMENTOS Primeiramente a Deus, por sua infinita bondade e por ter me permitido realizar tão grandioso sonho. Sem Sua presença viva em mim e sua eterna misericórdia, nada disso seria possível. A minha mãe, Verônica, e a meu pai, Robson, por todo o investimento em meus estudos, por toda a paciência nos momentos mais difíceis, pelo apoio incondicional e pelo amor tão puro, que fizeram de mim um ser humano digno e responsável, capaz de enfrentar todos os obstáculos da vida. Vocês são a razão da minha existência e a motivação para que eu seja cada vez melhor. Se eu puder ser para o meu futuro filho metade do que vocês foram para mim, ele será muito feliz e abençoado. A meu esposo, Leonni, por ter sonhado comigo o meu sonho, desde a graduação e a cada passo até o dia de hoje, nas derrotas e nas vitórias. Companheiro leal e imprescindível, que neste momento vivencia comigo a realização de tão incrível conquista. Obrigada pela paciência e compreensão, apesar de todo o estresse que a esposa não sabe disfarçar. A minha orientadora, Silvia Rodrigues Vieira, por ter me apresentado ao mundo da pesquisa científica e pelo apoio desde o convite para o grupo de iniciação até o dia de hoje. Obrigada por ter me incentivado a tentar novamente, pois sem as suas palavras eu teria permanecido na zona de conforto e não teria chegado até aqui. Obrigada por cada palavra de encorajamento durante a pesada tarefa de redigir a dissertação. Obrigada por ter me proporcionado a experiência da pesquisa de campo, que abriu meus horizontes e me permitiu não só muitos momentos de aprendizado, mas de risadas e lembranças que vão ficar guardadas para sempre em minha memória. Você é um exemplo de profissional e de ser humano a ser seguido e eu agradeço a Deus por ter me concedido a honra de ter te conhecido e de poder trabalhar ao seu lado. A FAPERJ, pelo financiamento da pesquisa de campo em Maputo, Moçambique- África, que nos proporcinou a montagem do corpus aqui utilizado e uma infinidade de descobertas e novos conhecimentos sobre a realidade moçambicana. VI

7 A Perpétua Gonçalves e Victor Mércia Justino Cumbana, da Universidade Eduardo Mondlane, que nos ajudaram a planejar e executar a busca pelos perfis de informantes que desejávamos entrevistar e nos cederam atenciosamente os espaços para realização das entrevistas. A Maria João Carrilho Diniz, diretora da Biblioteca Central de Maputo, não somente por ceder o espaço para as entrevistas e por ter nos apresentado a vários de nossos informantes, mas por sua imensa generosidade em compartilhar um pouco de seu conhecimento conosco. Seu testemunho nos permitiu compreender de maneira mais eficaz quão ricas são a cultura e a diversidade da sociedade de Maputo. A Rajabo Alfredo Mugabo Abdula, o diretor da pesquisa, por sua disponibilidade em nos ajudar e por todos os informantes que encontramos graças a sua ajuda. Obrigada por ter nos acompanhado e nos ajudado em tudo que estava em seu alcance. A todos os nossos 35 informantes, que generosamente nos cederam seus relatos. Não poderia deixar de agradecer por cada testemunho, por cada experiência compartilhada, por cada história contada, por cada ensinamento dado. A pesquisa não existiria se não fosse por vocês. Quanta riqueza, quanta alegria, quanta coisa boa vocês me proporcionaram! Nada mais a dizer a não ser: KANIMAMBO! A Karen Alves Pereira, minha xarazinha, que desde a graduação me acompanha e sempre acreditou no meu potencial. Obrigada pela amizade sincera, que já ultrapassou os limites da amizade, e por suas palavras de incentivo. Sei que posso contar contigo para qualquer coisa e sei que hoje você compartilha da mesma felicidade que eu pela minha conquista. A todos os meus amigos que me incentivaram a continuar e foram pacientes em meus momentos de afastamento para me dedicar tanto à viagem quanto à dissertação. Em especial, agradeço a Cristina Márcia Corrêa, pela parceria nos trabalhos das disciplinas, nos congressos e por me socorrer com prontidão toda vez que enviava um áudio no Whatsapp com dúvidas sobre o Goldvarb e sobre formatação. Obrigada pelo companheirismo! VII

8 Feliz do homem que encontrou a sabedoria, daquele que adquiriu a inteligência, porque mais vale esse lucro que o da prata, e o fruto que se obtém é melhor que o fino ouro. Provérbios 3, VIII

9 SINOPSE Estudo variacionista sobre a concordância verbal de 3ª pessoa do plural no Português oral de Maputo Moçambique, África. Controle estatístico de variáveis estruturais e sociais para a determinação dos condicionamentos da regra de marcação de número. Reflexão sobre o multilinguismo e o contato entre as línguas moçambicanas e o Português. Debate sobre o estatuto da variedade moçambicana do Português. IX

10 RESUMO A CONCORDÂNCIA VERBAL DE TERCEIRA PESSOA DO PLURAL NA VARIEDADE MOÇAMBICANA DO PORTUGUÊS: UMA ABORDAGEM SOCIOLINGUÍSTICA Karen Cristina da Silva Pissurno Orientadora: Silvia Rodrigues Vieira Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em Letras Vernáculas (Setor de Língua Portuguesa), da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Língua Portuguesa. Estudo sociolinguístico sobre a concordância verbal de 3ª pessoa do plural no Português oral de Maputo, Moçambique/África. A partir dos pressupostos da Teoria da Variação e Mudança, o objetivo principal da pesquisa foi constatar o estatuto da regra de marcação de plural na variedade moçambicana, se categórica, semicategórica ou variável (LABOV, 2003). Para tanto, observaram-se as restrições linguísticas e extralinguísticas que condicionam a concordância. À luz de estudos sobre o contato linguístico no Brasil (LUCCHESI; BAXTER; SILVA, 2009) e o bilinguismo (ROMAINE, 2013), observou-se como a situação de multilinguismo poderia afetar o Português falado pelos moçambicanos. Os resultados obtidos por meio do tratamento estatístico realizado pelo programa computacional GOLDVARB X revelam o comportamento de uma regra semicategórica, em termos quantitativos (96.8% de aplicação das marcas de número), índice que deve ser compreendido após detalhada análise qualitativa dos contextos variáveis. Os principais fatores que desfavorecem a concordância foram: (i) maior uso de línguas locais, (ii) menor escolaridade, (iii) sujeitos pospostos, (iv) verbos com menor saliência fônica, (v) sujeitos sem marca explícita de plural e (vi) verbos inacusativos/inergativos. De maneira geral, o comportamento dos dados em termos qualitativos revela a existência de contextos diversos efetivamente variáveis, à semelhança do que ocorre na variedade brasileira de forma produtiva, contrariamente aos padrões europeus de concordância (semi)categórica (VIEIRA; BRANDÃO, 2014). No entanto, a particularidade da situação multilíngue de Moçambique estabeleceria uma posição única para a variedade moçambicana, localizando-o em uma disposição entre as variedades europeias e brasileiras dentro de um continuum de padrões de concordância da Língua Portuguesa. Palavras-chave: Português de Moçambique, concordância verbal, sociolinguística, multilinguismo. Rio de Janeiro Agosto de 2017 X

11 ABSTRACT THE VERBAL AGREEMENT OF THIRD PERSON PLURAL IN THE MOZAMBICAN VARIETY OF PORTUGUESE: A SOCIOLINGUISTIC APPROACH Karen Cristina da Silva Pissurno Orientadora: Silvia Rodrigues Vieira Abstract da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em Letras Vernáculas (Setor de Língua Portuguesa), da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Língua Portuguesa. Sociolinguistic study on verbal agreement of 3rd person plural in the oral Portuguese of Maputo, Mozambique/Africa. From the assumptions of the Theory of Variation and Change, the main objective of the research was to verify the status of the agreement rule in the Mozambican variety, whether categorical, semicategorical or variable (LABOV, 2003). To do so, the linguistic and extralinguistic restrictions that constrain the rule were observed. Considering studies on linguistic contact in Brazil (LUCCHESI; BAXTER; SILVA, 2009) and bilingualism (ROMAINE, 2013), it was observed how the multilingual situation could affect the Portuguese spoken by Mozambicans. Through the statistical treatment performed in the computer program GOLDVARB X, the results obtained reveal the behavior of a semicategorical rule (96.8% of application of number marks), which must be understood after detailed qualitative analysis of the variable contexts. The main constraints that restrict the rule were: (i) greater use of local languages, (ii) lower schooling, (iii) subjects that come after the verb, (iv) verbs with lower phonic salience, (v) subjects without explicit plural mark and (vi) intransitive / inergative verbs. In general, the behavior of the data in qualitative terms reveals the existence of diverse contexts that are effectively variable, similar to what occurs in the Brazilian variety in a productive way, contrary to the European (semi)categorical standards (VIEIRA, BRANDÃO, 2014). However, the particularity of Mozambique's multilingual situation would establish a unique position for the Mozambican variety, locating it in an arrangement between European and Brazilian varieties within a continuum of the Portuguese agreement standards. Keywords: Mozambican Portuguese, verbal agreement, sociolinguistics, multilingualism Rio de Janeiro Agosto de 2017 XI

12 SUMÁRIO LISTA DE SIGLAS... xv ÍNDICE DE TABELAS, QUADROS E GRÁFICOS... xvi 1 INTRODUÇÃO A SITUAÇÃO MULTILÍNGUE DE MOÇAMBIQUE FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Teoria da Variação e Mudança Aquisição de Segunda Língua (L2/LE) Conceitos básicos sobre Bilinguismo Estatuto social das línguas em sociedades multilíngues Formação das variedades do Português: das origens ao continuum afro-brasileiro REVISÃO BIBLIOGRÁFICA: A CONCORDÂNCIA VERBAL Abordagem tradicional Descrições sociolinguísticas: tendências gerais No Português Brasileiro No Português Europeu No Português de Moçambique METODOLOGIA Montagem e elaboração do corpus Seleção dos informantes Distribuição do corpus XII

13 5.4 - Etapas do trabalho AS VARIÁVEIS A Variável Dependente As Variáveis Independentes Extralingüísticas Lingüísticas Sobre o Sintagma Nominal (SN) Sobre o Sintagma Verbal (SV) ANÁLISE DE DADOS Descrição das rodadas multivariadas Distribuição geral dos dados O comportamento das variáveis extralinguísticas Língua(s) dominada(s) pelo informante Escolaridade Informante Faixa etária O comportamento das variáveis linguísticas Posição do sujeito Saliência fônica Paralelismo no nível clausal Tipo de verbo XIII

14 8 DEBATE DOS RESULTADOS: O PERFIL DO PM EM RELAÇÃO AO PB E AO PE UMA REGRA VARIÁVEL OU SEMICATEGÓRICA? CONSIDERAÇÕES FINAIS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANEXOS ANEXO I - GUIA DE ENTREVISTA ANEXO II - QUADRO-SÍNTESE DAS RODADAS XIV

15 LISTA DE SIGLAS CV L1 L2 LE LB PB PE PM SV SN Concordância Verbal Língua materna Segunda língua Língua estrangeira Língua Bantu Português Brasileiro Português Europeu Português de Moçambique Sintagma Verbal Sintagma Nominal XV

16 ÍNDICE DE TABELAS, QUADROS E GRÁFICOS TABELAS Tabela 1 Línguas faladas pela população de 5 ou mais anos de idade Tabela 2 Distribuição percentual da população de 5 ou mais anos de idade segundo língua materna em Maputo Tabela 3 Distribuição percentual da população de 5 ou mais anos de idade segundo língua materna em Moçambique, em 1980, 1997 e Tabela 4 Distribuição percentual da população de 5 anos ou mais segundo conhecimento da língua portuguesa e sexo em Moçambique, em 1997 e Tabela 5 Continuum de marcação de pluralidade em verbos de P6 consoante os traços rural / urbano e os graus de escolaridade em variedades brasileiras na proposta de Lucchesi et al. (2009) Tabela 6 Distribuição dos dados com e sem marca verbal de 3ª pessoa plural Português de Moçambique (PM) Tabela 7 Distribuição dos dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo língua(s) dominada(s) pelo informante no Português de Moçambique (PM) Tabela 8 Distribuição dos dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo escolaridade no Português de Moçambique (PM) Tabela 9 Cruzamento de dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo língua(s) dominada(s) pelo informante e escolaridade no Português de Moçambique (PM) Tabela 10 Cruzamento de dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo língua materna e escolaridade no Português de Moçambique (PM) Tabela 11 Cruzamento de dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo informante e escolaridade no Português de Moçambique(PM) Tabela 12 Cruzamento de dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo língua(s) dominada(s) pelo informante e faixa etária no Português de Moçambique (PM) XVI

17 Tabela 13 Distribuição dos dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo posição do sujeito no Português de Moçambique (PM) Tabela 14 Distribuição dos dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo posição do sujeito com sujeito não expresso no Português de Moçambique (PM) Tabela 15 - Distribuição dos dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo saliência fônica no Português de Moçambique (PM) Tabela 16 Distribuição dos dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo paralelismo clausal no Português de Moçambique (PM) Tabela 17 Distribuição dos dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo tipo de verbo no Português de Moçambique (PM) Tabela 18 Cruzamento de dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo posição do sujeito e tipo de verbo no Português de Moçambique (PM) Tabela 19 Cruzamento de dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo saliência fônica e tipo de verbo no Português de Moçambique (PM) QUADROS Quadro 1 Regras gerais de concordância verbal de acordo com gramáticas tradicionais brasileiras Quadro 2 Regras particulares de concordância verbal de acordo com gramáticas tradicionais brasileiras Quadro 3 Variáveis relevantes em estudos de concordância verbal de P6: amostras brasileiras com diferentes níveis de escolaridade Quadro 4 Variáveis relevantes em estudos de concordância verbal de P6 com amostras europeias Quadro 5 Quadro de informantes utilizados na amostra, distribuídos em relação ao nível de instrução, a escolaridade e ao sexo XVII

18 Quadro 6 Variável dependente binária: concordância verbal padrão x concordância não padrão no PM Quadro 7 Quadro de informantes distribuídos em relação ao uso de Português como L1 ou L Quadro 8 Distribuição dos condicionamentos para a não marcação de concordância nas três variedades: PB, PE e PM GRÁFICOS Gráfico 1 Cruzamento de dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo língua(s) dominada(s) pelo informante e escolaridade no Português de Moçambique (PM) Gráfico 2 - Cruzamento de dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo informante e escolaridade no Português de Moçambique (PM) Gráfico 3 Distribuição dos dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo paralelismo clausal no Português de Moçambique (PM) Gráfico 4 Cruzamento de dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo saliência fônica e tipo de verbo no Português de Moçambique (PM) FIGURAS Figuras 1 Mapa das Províncias de Moçambique XVIII

19 1 INTRODUÇÃO A presente pesquisa tem como objeto de estudo a concordância verbal de 3ª pessoa do plural na modalidade oral do Português de Moçambique, África, mais especificamente do Português falado na capital, Maputo. Investiga-se o comportamento da variável, considerando-se a variante declarada padrão, na qual as marcas de número estão presentes na forma verbal em consonância com o sujeito e também a não-padrão, na qual as marcas de plural não se encontram registradas. Por pressuposto teórico, propõe-se que a realização ou não de tais marcas decorre da atuação de fatores internos e externos à língua. Averiguando a frequência de uso da realização ou do cancelamento da concordância padrão e identificando as estruturas mais utilizadas na variedade em questão, pode-se verificar não só quais contextos linguísticos são mais suscetíveis à presença e/ou à ausência das marcas, mas também quais implicações sociais sobre o uso de uma ou outra variante são impostas aos falantes dessa variedade do Português. Ainda que a Língua Portuguesa seja o idioma oficial do país, dados de recenseamentos (cf. CENSO, 2007; INE, 2010) e de estudos já realizados sobre a variedade moçambicana (cf. GONÇALVES, 2010; NGUNGA, 2012; TIMBANE, 2015; CHIMBUTANE, 2015; GONÇALVES; CHIMBUTANE, 2015; CAO PONSO, 2016; dentre outros) demonstram que ela coexiste com uma grande diversidade de idiomas nacionais 1. Essas línguas nacionais, todas da família bantu, são, para muitos habitantes das áreas rurais de Moçambique, especialmente aqueles acima dos 50 anos de idade, suas línguas maternas. Os mais jovens da área rural, por sua vez, assim como os mais velhos, também têm as línguas nacionais como maternas. Dessa maneira, o idioma tido como oficial apresenta um status de língua estrangeira (LE) para esses indivíduos, ou seja, uma língua utilizada em situações bastante artificiais, especialmente instrucionais, como é o ensino de inglês no Brasil, por exemplo, já que a língua alvo só é aprendida em contextos 1 Embora as expressões idiomas/línguas nacionais ou locais possam, de certa forma, remeter a questões político-sociais, relativas à representatividade dessas línguas no contexto nacional, o uso de tais termos na presente pesquisa restringe-se ao fato de serem línguas próprias de Moçambique e diferentes do Português, utilizadas em cada uma das províncias de Maputo. A decisão de usar essa nomenclatura relaciona-se à fidelidade à literatura consultada, no que diz respeito à descrição dessas línguas. Não obstante essa opção, reconhece-se que o termo autóctone se configuraria uma opção mais neutra, afastada de concepções políticas. 19

20 de educação formal, enquanto em casa os indivíduos utilizam suas línguas maternas para comunicação diária. Por outro lado, nas áreas urbanas, a situação é similar à do uso de uma segunda língua (L2), ou seja, a exposição à língua alvo não se faz apenas em contexto escolar, mas é exigida em praticamente todos os ambientes nos quais os indivíduos estabelecem comunicação, como acontece com brasileiros vivendo nos Estados Unidos, por exemplo, já que, mesmo que dentro de casa eles falem sua língua materna, fora dela é necessário comunicar-se exclusivamente em inglês. No caso de Maputo, para além do uso das línguas nacionais, a população tem contato intenso com o Português no seu dia-a-dia e nos ambientes que frequenta e, consequentemente, as crianças já chegam à escola com conhecimento prévio da língua. Da mesma forma, aqueles habitantes que nascem em famílias que afirmam usar somente o Português dentro de casa tendem a adquiri-lo como sua primeira língua (L1) e, igualmente, entram na escola já com conhecimento da modalidade oral do idioma. Assim, nas áreas urbanas, independentemente da idade do indivíduo, o acesso ao Português é mais fácil e constante, permitindo o contato desde muito cedo com essa língua, o que facilita sua aquisição. Em termos gerais, pode-se dizer, então, que o povo de Maputo é, em sua grande maioria, pelo menos, bilíngue. O Censo 2007 corrobora essa afirmação, já que registra o Português como a língua mais utilizada por seus habitantes dentro de casa, especialmente aqueles que vivem nas áreas urbanas. Já os que vivem nas áreas rurais, por outro lado, têm na educação formal a única forma de contato com a Língua Portuguesa, fato diretamente relacionado às altas taxas de analfabetismo dos habitantes mais velhos, que continuam a utilizar seus idiomas nacionais (as línguas bantu faladas no país). Isso nos leva a crer que a educação formal seja uma variável de suma importância para este estudo, já que ela atua diretamente no estatuto do Português utilizado pelos moçambicanos, seja como L2 ou LE. Assim sendo, estabelecem-se duas situações: de um lado, encontram-se os habitantes das zonas mais rurais, que possuem línguas bantu como L1 e que, teoricamente, recebem a transmissão do Português Europeu (PE) considerado padrão, como uma língua estrangeira, em contextos descontinuados, formalizados apenas para os habitantes mais jovens quando em ambiente escolar, podendo, dessa forma, gerar reestruturações do sistema da Língua Portuguesa a partir de uma nova gramática que incorpore tanto sua L1 quanto a L2 tida como referência; de outro lado, temos os habitantes das áreas urbanas, que têm acesso à língua em todos os ambientes de uso da 20

21 mesma (na família, na escola e no trabalho), haja vista o valor concedido à língua oficial do país, que possibilita ascensão social de seus usuários. Nesse caso, diversas crianças adquirem o Português como L1 (em paralelo ou não a uma língua nacional), transmitido por seus pais dentro de casa e, supostamente, aprimorado na escola. A aquisição de língua para esses indivíduos, portanto, poderia atingir níveis de conhecimento parecidos com os dos falantes de PE, por exemplo, que não passam por processos semelhantes de contato com outras línguas. No entanto, é válido ressaltar que os pais dessas crianças, assim como muitos de seus professores, não são, necessariamente, falantes nativos de Português, o que poderia trazer questionamentos sobre a língua que é transmitida por eles, talvez não tão próxima do PE padrão quanto se desejaria. Salienta-se, aqui, o fato de que, em estudos anteriores das variedades africanas do Português, como as de São Tomé e Príncipe (cf. BRANDÃO; VIEIRA, 2012a; 2012b) e de Maputo (cf. GONÇALVES, 1997), se verificou ser salutar a importância social dada à Língua Portuguesa, associada ao prestígio e à ascensão econômica. Deste modo, haveria certo desejo dos habitantes das zonas urbanas pela aquisição do PE tido como padrão, o que, por sua vez, está relacionado a certo preconceito, desses mesmos indivíduos, quanto às línguas nacionais empregadas nas áreas rurais, nas quais seus falantes mantêm seu uso como forma de valorização cultural. Com isso, a parcela de indivíduos que deseja adquirir a Língua Portuguesa vem crescendo ao longo dos anos, mas não de maneira que as línguas nacionais sejam totalmente eliminadas, já que nas áreas rurais elas ainda têm muito significado para seus falantes e a crescente migração para a cidade faz reavivar o uso desses idiomas também dentro da cidade, nos ambientes mais diversos, sobretudo os informais. No entanto, há indivíduos nas zonas urbanas que acreditam que saber (ou dizer que sabem) uma língua local pode atrapalhar suas chances de ascender socialmente. O resultado, portanto, é o uso simultâneo das diversas línguas no meio da sociedade, que tende a selecionar os contextos em que cada uma delas tem maior valor. Em outras palavras, a diversidade linguística presente nas comunidades de fala moçambicanas constitui um aspecto cultural muito relevante e tem relação direta com a questão educacional, a transmissão da Língua Portuguesa e o prestígio dado a ela por esses falantes. Dessa maneira, o estudo dos padrões de concordância no Português de Moçambique (PM) reveste-se de fundamental importância, tendo em vista não só ser reduzido o número de pesquisas que consideram as variedades africanas, mas também ser esse tema emblemático para a compreensão de situações de intenso contato interlinguístico. Ademais, a descrição das variedades do Português, de modo geral, é 21

22 imprescindível para o debate sobre as convivências de normas na Língua Portuguesa constituída por uma vasta diversidade sociolinguística. Desse modo, relacionam-se neste trabalho os resultados obtidos a algumas características que podem ser atribuídas à situação de intenso contato linguístico, como a que ocorre especialmente em colônias exploradas pelos portugueses, caso tanto do Brasil quanto de países africanos, e está fortemente presente na variedade em estudo. Nesse sentido, supõe-se que o aprendizado de Língua Portuguesa por parte dos índios e africanos tenha tomado feições particulares relacionadas aos padrões das línguas nativas desses falantes. Tais mudanças não são relacionadas apenas à inserção de léxico e às diferenças de pronúncia, mas também ao apagamento de algumas marcas morfológicas, como as marcas de concordância nominal e verbal e da flexão de caso de pronomes pessoais, por exemplo. Trata-se de alterações que configuram casos de simplificação morfológica, característica muito comum nas variedades populares das línguas que passaram por processos de contato linguístico intenso durante sua formação (cf. LUCCHESI, 2012, p ). Logo, a descrição dos fenômenos de concordância verbal na comunidade de fala de Maputo não só permite levantar informações relevantes para a compreensão dessa variedade, mas também para a interpretação de traços específicos, como os referentes à simplificação morfológica ora mencionada. Assim, será possível reconhecer, no âmbito do fenômeno estudado, se a variedade moçambicana está mais próxima da variedade brasileira, que também surgiu guardadas as devidas proporções e realidades sóciohistóricas em meio a intenso contato linguístico, ou da variedade europeia, a qual serve de modelo para sua formação. Em outras palavras, procura-se estabelecer se o estatuto da concordância verbal do Português de Moçambique apresenta padrões mais variáveis ou categóricos de marcação de plural, em termos quantitativos e qualitativos. Assim sendo, pretende-se, com esta pesquisa, não somente estabelecer o índice geral de concordância no PM, mas também indicar quais variáveis se mostram influentes no cancelamento da marca, a partir do fornecimento de dados de natureza sociolinguística sobre o Português de Maputo e da expansão de conhecimentos acerca da norma de concordância verbal em uso na modalidade oral das variedades de Português faladas na África. Dessa maneira, o estudo descreve, em dados orais contemporâneos, as variantes com e sem marcação de plural, nos diversos contextos morfossintáticos, cujos usos estabelecem os padrões de concordância verbal no PM, além de averiguar o estatuto da 22

23 concordância nessa variedade, verificando, consoante Labov (2003), se se trata realmente de uma regra variável, semicategórica ou categórica. Em caso de regra variável ou semicategórica, identificam-se as variáveis linguísticas e extralinguísticas que atuam no comportamento do fenômeno, apontando os elementos (des)favorecedores da marca de plural. Por fim, investiga-se a existência de diferenças significativas entre a fala dos indivíduos de acordo com sua escolaridade e com a menor ou maior exposição à Língua Portuguesa em todos os contextos do seu dia-a-dia. De modo geral, o Português de Moçambique, ao que tudo indica, guarda traços do Português falado pela população culta, da classe média e dos proprietários, mas também sofre influência das línguas nacionais. Embora seja língua oficial e de prestígio, é possível reconhecer diferentes registros, determinados por fatores como escolaridade, nível socioeconômico e ambiente de inserção social. Sendo assim, a elite moçambicana busca utilizar o Português Europeu padrão, adquirido muitas vezes nos estudos feitos em escolas portuguesas, enquanto as camadas sociais mais baixas falam a Língua Portuguesa com maior influência de suas línguas locais, que foram e ainda são, em determinados contextos, altamente estigmatizadas. A partir do estudo e da análise dos dados adquiridos para esta pesquisa, pretendese responder fundamentalmente a três perguntas, que constituem os problemas definidos para que se alcancem as metas traçadas: (a) qual o índice geral de concordância no Português de Maputo?; (b) que variáveis linguísticas e extralinguísticas se mostram influentes no cancelamento da marca?; (c) o estatuto do Português como L1 ou L2, relacionado às línguas locais faladas pelo indivíduo, tem alguma influência sobre os resultados? Levando esses questionamentos em consideração, os objetivos gerais da pesquisa são: (i) fornecer dados de natureza sociolinguística sobre o Português de Moçambique, e (ii) expandir conhecimentos acerca da norma de concordância verbal em uso na modalidade oral das variedades do Português falado no continente africano. Com o intuito de, igualmente, contribuir com o debate sobre as variedades da Língua Portuguesa, a grande questão a se discutir é se existe, de fato, uma influência do substrato, ou seja, das línguas faladas na região antes da dominação dos colonizadores, no Português falado pelos moçambicanos. Dentro dos limites do presente trabalho, que 23

24 analisa uma porção limitada de dados apenas do Português em meio à complexidade do multilinguismo moçambicano, pretende-se, apenas, levantar hipóteses sobre a mudança linguística ocorrida nessa variedade, buscando debater como o contato linguístico influenciou e, possivelmente, continua influenciando o PM, principalmente pela existência de traços gramaticais destas que podem interferir na construção da gramática do Português como L2. Ressalta-se, assim, que não será possível realizar comparações aprofundadas entre as línguas locais e o Português de Moçambique em função do material de que se dispõe; entretanto, espera-se viabilizar o levantamento de questões relevantes acerca do assunto, pertinentes ao escopo da pesquisa. Dando prosseguimento à pesquisa, as seções que compõem o presente trabalho estão organizadas conforme descrição a seguir. No Capítulo 2, analisa-se a situação de multilinguismo em Moçambique e o quanto a diversidade de línguas pode (ou não) afetar o Português falado por esses indivíduos, a partir de dados históricos e linguísticos. Com essa exposição, pretende-se apontar as particularidades dessa variedade e os aspectos que determinam a necessidade de estudá-la sob o viés da Sociolinguística, considerando com atenção alguns fundamentos diretamente relacionados às questões de contato interlinguístico. Assim, o panorama geral da situação linguística do país será apresentado, de forma que se compreenda a riqueza de idiomas presente nessa sociedade e as implicações dessa situação para a configuração do Português de Moçambique. No Capítulo 3, observa-se o arcabouço teórico utilizado para a análise dos dados. Com o objetivo de segmentar melhor cada base conceitual, esse capítulo subdivide-se em cinco seções, sendo a primeira sobre a Teoria da Variação e Mudança, que funciona como a alavanca para as questões sociolinguísticas que aqui são abordadas; a segunda considera questões sobre a aquisição de segunda língua, tema salutar para a compreensão da variedade de Português falada em Moçambique; em seguida, a terceira seção apresenta as questões sobre bilinguismo, sobre a mudança de língua e como os falantes nessa situação lidam com o conhecimento das línguas que adquiriram ao longo da vida; a penúltima subseção debruça-se sobre o estatuto social das línguas e o valor associado ao uso de dadas línguas dentro de uma sociedade; por fim, a última seção dedica-se à formação das variedades e ao debate acerca das origens do Português Brasileiro, tema relevante para a compreensão da variedade moçambicana, devido a certas similaridades em termos de constituição. Além disso, fecha-se esta seção com uma breve exposição sobre a pertinência da proposta de um continuum afro-brasileiro (cf. PETTER, 2008) no 24

25 que diz respeito ao panorama geral das variedades de Língua Portuguesa, relacionandose suas convergências e divergências. Já no Capítulo 4, explora-se a concordância verbal, considerando não só a perspectiva das gramáticas normativas de Língua Portuguesa, como também os trabalhos variacionistas que demonstram como ocorre a variação das marcas de número nas variedades brasileira, europeia, são-tomense e moçambicana. Com a exposição dos resultados encontrados nas outras variedades, pretende-se traçar os paralelos entre entre elas e a situação observada no Português de Moçambique. No Capítulo 5, apresentam-se os aspectos metodológicos referentes a montagem e elaboração do corpus utilizado na pesquisa e todas as etapas do trabalho, além de explorar como foi feita a seleção dos informantes, já que, diante de uma sociedade extremamente heterogênea, foi necessário estabelecer critérios que justificassem a escolha de cada perfil. Já no Capítulo 6, explicitam-se as variáveis controladas neste estudo, seguidas de exemplos produzidos pelos próprios informantes da amostra, retirados de suas entrevistas. O Capítulo 7, por sua vez, trata da análise dos dados obtidos na pesquisa, levantando e interpretando os resultados quantitativos observados com base nos fundamentos teóricos estudados. Este capítulo é subdividido em quatro seções: na primeira delas, evidenciam-se todas as rodadas estatísticas executadas para a obtenção dos resultados quantitativos, além de discorrer sobre os procedimentos (os amálgamas das variantes) necessários ao aprimoramento da análise dos dados. Na segunda seção, apresentam-se os resultados gerais alcançados, seguidos da relação dos condicionamentos extralinguísticos relevantes ao cancelamento da marca de número, na terceira seção, e dos fatores linguísticos, na quarta seção. Ao longo da exposição das variáveis selecionadas como relevantes, alguns resultados referentes ao comportamento de variáveis não selecionadas também serão comentados, de maneira que enriqueçam o olhar qualitativo sobre os dados, fatores que revelam dados interessantes no que tange ao estabelecimento do perfil da variedade moçambicana. Na sequência, no Capítulo 8, faz-se um debate, considerando todo o tratamento estatístico e qualitativo realizado no capítulo anterior, sobre o estatuto da regra de concordância no Português de Moçambique, em comparação com as outras variedades do Português (brasileiras e europeias), com o objetivo de constatar a posição do PM dentro de um continuum de uso das regras de marcação, se mais próximo do comportamento das variedades mais reestruturadas, como a brasileira, ou do modelo europeu de uso. 25

26 Por fim, o Capítulo 9 traz as considerações finais que resultam de todo o estudo e as reflexões necessárias à continuidade da pesquisa e ao mais detalhado aprofundamento de questões que possam ter sido exploradas de maneira incipiente devido ao perfil e à abrangência deste trabalho. De modo geral, por ser estabelecida a partir de cunho variacionista, a pesquisa demonstra que, de fato, fatores sociais são extremamente significativos para a configuração da variedade moçambicana do Português e que esta, por usa vez, parece estar traçando suas próprias características, especialmente por causa do forte contato interlinguístico existente na sociedade. Sendo assim, o Português de Moçambique, embora ainda em estágio de formação e em busca de uma identidade sui generis, revela a existência de particularidades que já se manifestam no plano da marcação de plural nos verbos de terceira pessoa e permitem delinear os padrões de concordância ora em evidência. 26

27 2 A SITUAÇÃO MULTILÍNGUE DE MOÇAMBIQUE Considerando o quadro socio-histórico de Moçambique, é preciso destacar a situação linguística presente no país, que possui uma população de mais de 20 milhões de habitantes, cuja língua oficial é o Português. Ao lado da Língua Portuguesa, são faladas mais de 20 línguas bantu (SITOE; NGUNGA, 2000 apud GONÇALVES, 2010, p. 25) e cinco línguas asiáticas, o que já confirma o caráter plurilíngue dessa sociedade. A tabela a seguir apresenta a distribuição de tais línguas, por número de falantes e províncias onde são faladas. Tabela 1 Línguas faladas pela população de 5 ou mais anos de idade Nº Língua 2 Nº de falantes % Províncias 1 Makhuwa Cabo Delgado, Nampula, Niassa, Zambézia, Sofala 2 Português Todas as províncias 3 Changana Gaza, Maputo, Maputo City, Inhambane, Niassa 4 Sena Manica, Sofala, Tete, Zambézia 5 Lomwe Napula, Niassa, Zambézia 6 Chuwabu Sofala, Zambézia 7 Nyanja Niassa, Tete, Zambézia 8 Ndau Manica, Sofala 9 Tshwa Gaza, Inhambane, Maputo, Sofala 10 Nyungwe Manica, Tete 11 Yaawo Cabo Delgado, Niassa 12 Makonde Cabo Delgado 13 Tewe Manica 14 Rhonga Gaza, Maputo, Maputo City, Inhambane 2 A ortografia das línguas que será adotada aqui seguirá essa primeira tabela, independentemente de haver diferentes versões de escrita desses nomes, considerando ora o nome original, ora o nome já adaptado ao português. 27

28 15 Tonga Gaza, Maputo, Maputo City, Inhambane 16 Copi Gaza, Maputo, Maputo City, Inhambane 17 Manyika Manica 18 Cibalke Manica 19 Mwani Cabo Delgado 20 Koti Nampula 21 Swahili Cabo Delgado 22 Outras Todas as províncias 23 Línguas de sinais Todas as províncias Total Fonte: Censo de Em síntese, podem-se destacar as seguintes línguas como concorrentes do Português na cidade de Maputo: Changana, Tshwa, Rhonga, Tonga, Copi. Como pode ser visto na seguinte tabela, extraída do Censo , as línguas que coexistem ao lado do Português em Maputo não são muito expressivas em se tratando de L1, sendo que a mais utilizada é a chamada Changana, falada por 31,5% da população. Vê-se, portanto, que a percentagem de habitantes que afirmam usar preferencialmente o Português é bastante superior (42,9%) e aumentou em comparação com o Censo de 1997, que registrava 39,5% e assinalava o Português como a L1 de apenas 6,5% dos falantes. (cf. GONÇALVES, 2010, p. 26). 3 Tabela disponível em Acesso em 11/02/ Cabe salientar que os métodos de coleta de dados para o Censo de Moçambique são recentes, tendo até o momento apenas 2 registros formais (1997, 2007). Isto nos leva a crer que é preciso cuidado ao observar os dados apresentados nas tabelas, que podem conter alguns números ainda questionáveis. Charles; Sá (2010) e Charles (2012) mencionam a necessidade de atualização das cartas geográficas que auxiliariam o processo de coleta de dados para os censos e os inquéritos feitos em Moçambique, fazendo com que seus resultados sejam mais precisos de acordo com a realidade do país. 28

29 Tabela 2 Distribuição percentual da população de 5 anos ou mais anos de idade segundo a língua materna em Maputo Língua Materna % de falantes Português 42,9 Xichangana 31,5 Xirhonga 9,7 Cicopi/Cichopi 3,3 Xitshwa 3,5 Bitonga 2,8 Outras línguas moçambicanas 4,4 Outras línguas estrangeiras 1,3 Desconhecida 0,5 Fonte: Censo 2007 Essa diferença percentual pode ter uma de suas explicações na questão da faixa etária dos informantes do Censo, uma vez que, como a própria autora afirma, os índices mais elevados de conhecimento dessas línguas verificam-se entre os recenseados com mais de 25 anos (GONÇALVES, 2010, p. 27). Isso quer dizer que, ao longo dos 10 anos que se passaram entre os recenseamentos, a formação de novas crianças, especialmente nas cidades, em que o Português é a língua principal, não somente de instrução escolar, mas de uso na grande maioria dos contextos comunicativos, pode ter ajudado consubstancialmente a aumentar a quantidade de falantes da Língua Portuguesa na zona urbana de Moçambique como um todo, que hoje apresenta 10,7% de falantes de Português como L1, de acordo com o INE 2010, que compara a distribuição de língua materna de 1980 a Como se vê na tabela a seguir, o percentual de indivíduos que se declaram como falantes de línguas bantu como L1 vai reduzindo proporcionalmente ao aumento de declarantes de Português como língua materna em todo o país: 29

30 Ano do Censo Tabela 3 Distribuição percentual da população de 5 anos ou mais anos de idade, segundo língua materna em Moçambique, em 1980, 1997 e Língua Bantu Português Outras Línguas Estrangeiras Mudo Nenhuma Desconhecida Fonte: INE (2010) sobre Censos de 1980, 1997 e 2007 Timbane (2015), seguindo a mesma linha de pensamento, ratifica que o número de falantes de português tende a crescer desde 1980 (5 anos após a proclamação da independência) incentivado pela educação massiva e inclusiva principalmente nas zonas urbanas (TIMBANE, 2015, p. 295), que ocorreu tardiamente em Moçambique. Além disso, segundo Firmino (1988), O maior envolvimento, a todos os níveis, dos moçambicanos na acção pública (instâncias do poder, serviços públicos, comércios, etc.), o aumento das situações de comunicação em que os interlocutores não falam a mesma língua bantu [...] o aumento da população escolar atingindo níveis cada vez mais altos, são alguns dos factores que justificam a subida do número de falantes da língua portuguesa. (FIRMINO, 1988, p. 98) Em outras palavras, a Língua Portuguesa foi, aos poucos, transformando-se na língua de comunicação básica dos moçambicanos, satisfazendo as necessidades de comunicação para obtenção de todos os tipos de serviços, especialmente nas áreas urbanas e na educação escolar, que privilegia o Português como a língua de prestígio, cujo domínio possibilita ascensão social, enquanto não dominá-la significa possibilidades de exclusão social e de preconceitos. Timbane (2015) corrobora essas afirmações, ao atestar que O português é uma língua moçambicana de origem europeia porque ela já satisfaz as necessidades comunicativas dos moçambicanos e já tem falantes nativos. Toda a educação formal é feita em português pelo fato de ser a língua de prestígio, por ser oficial e ser amparada pela Constituição da República de Moçambique (2004), instrumento que não dá relevância às diversas línguas bantu moçambicanas faladas pela maioria da população. (TIMBANE, 2015, p. 295) 30

31 No entanto, a população da zona rural continua tendo o Português praticamente como uma língua estrangeira 5, de acesso restrito ao meio escolar. Fora da escola, não há meios de difusão que permitam aos moçambicanos dessas áreas o domínio da língua de prestígio da sociedade. Menezes (2013, p. 38), mencionando estudos sociolinguísticos e números do INE de 1997, com relação à área de residência em Moçambique, destaca que os que sabem falar português nas zonas urbanas equivalem a uma percentagem de 72.4% e, nas zonas rurais, 25.4% [...], enquanto os que têm português como língua materna equivalem a 17% nas zonas urbanas e 2% nas rurais. Já o Censo de 2007 destaca que apenas 3.5% da população rural declara ter o Português como L1. Em outras palavras, pode-se dizer que, apesar da larga expansão da Língua Portuguesa em todo o país, o número de pessoas que tem o Português como L1 é ínfimo, especialmente por conta do grande número de pessoas que utilizam as línguas bantu nas áreas rurais. Chimbutane (2015) confirma esse cenário, ao informar que tais dados podem [...] ser reflexo de uma extraordinária expansão da língua portuguesa pelos meios urbanos, ao mesmo tempo que pode indicar que, apesar do crescimento da percentagem de habitantes de áreas rurais que sabem falar a língua portuguesa, estes preferem falar as línguas bantu na sua comunicação em casa. (CHIMBUTANE, 2012, p. 26) De acordo com Gonçalves (2010), a complexidade da situação linguística do país pode ser mais bem compreendida a partir do entendimento do processo histórico desde a chegada dos colonos portugueses em Apesar de terem chegado ao país na mesma época em que colonizavam o Brasil e a Índia, Moçambique não era o foco de suas atenções e, consequentemente, a difusão da Língua Portuguesa foi mais lenta. Sendo assim, houve uma considerável demora para a criação de políticas educacionais e, então, apenas em 1930 é estabelecida uma política, na qual o Português se torna a língua de instrução escolar, com o objetivo de educar e permitir a assimilação cultural dos africanos, deixando as línguas nacionais para uso exclusivo em contextos familiares e de instrução religiosa. Assim, nas palavras de Gonçalves: 5 Para o detalhamento da diferença entre segunda língua (L2), usada em contextos do dia a dia, paralela ao uso das línguas locais, e língua estrangeira (LE), aquela que é usada apenas em contexto de instrução formal, conferir Seção 3.2 do presente trabalho. 31

32 Em consequência do atraso no processo de colonização de Moçambique em que sobressai a criação tardia de uma rede escolar a nível nacional na altura da independência, em 1975, a língua portuguesa era parte do repertório linguístico de um grupo minoritário de moçambicanos, residentes principalmente nos centros urbanos. (GONÇALVES, 2010, p. 31) Dessa maneira, entende-se que a transmissão da Língua Portuguesa aos moçambicanos aconteceu de maneira progressiva e tardia, permitindo àqueles que tinham acesso à escola a aquisição do Português como L2 6 em contextos formais, enquanto os mais velhos, que não tiveram acesso à escola e são residentes das zonas rurais, permanecem utilizando suas línguas maternas bantu para comunicação natural e diária. Após a independência do país, o Português é definido como língua oficial, tomando totalmente o lugar das línguas bantu, já que passa a ser apontada como mais eficaz para a comunicação internacional e a transmissão de conhecimentos, além de ser considerada, cada vez mais, como língua de prestígio e que permitiria ascensão social aos seus falantes. Desse modo, o Português ganha novos valores tanto para aqueles que já o dominam quanto para aqueles que desejam dominá-lo. Advindo dessa mudança de valores, a população que frequenta a escola passou por um processo de grande crescimento, tendo, de acordo com o Censo de 2007, mais de 5 milhões de alunos. Tal número reflete a multiplicação do número de falantes da Língua Portuguesa e a importância cada vez maior facultada a ela. Gonçalves ainda assegura que as classes mais favorecidas dos centros urbanos têm tendência a comunicar entre si exclusivamente em português (ainda que este não seja a sua L1), sendo a língua escolhida para transmitir às novas gerações. (GONÇALVES, 2010, p. 34). Cabe ressaltar que, ao longo do período colonial, nas zonas rurais a população continuava a se comunicar e a transmitir para as novas gerações suas línguas bantu, enquanto o Português era adquirido apenas como LE. O contato com o Português era 6 A diferença entre os conceitos segunda língua (L2) e língua estrangeira (LE) será desenvolvida no Capítulo 3 deste trabalho. No entanto, cabe ressaltar que, basicamente, esses dois tipos de aquisição são distinguidos em relação aos contextos nos quais as línguas são aprendidas. De acordo com Stern (1983), segunda língua está relacionada ao aprendizado e o uso de uma língua, diferente da materna, dentro de um território no qual ela exerce uma função social e/ou política. Por outro lado, uma língua estrangeira seria usada em espaços nos quais não haveria um estatuto sociopolítico que exigisse o uso da mesma. Assim, entende-se que a população rural de Moçambique não utiliza a Língua Portuguesa nos contextos que lhes são mais íntimos e familiares, pois não há exigência de uso deste idioma. Sendo assim, seu uso fica restrito às áreas nas quais o Português é a principal língua de comunicação (na cidade, nas escolas, etc.), como uma LE. 32

33 restrito, então, à instrução formal e religiosa, e a textos escritos, de onde vinha o input mais estruturado possível para esses falantes. Portanto, pode-se concluir que grande parte dos falantes de Português hoje o tem como uma L2 (nas zonas urbanas) ou uma LE (nas zonas rurais), o que, consequentemente, gera variabilidade das regras e traços gramaticais específicos da sua gramática (GONÇALVES, 2010, p. 37). Tal contexto parece sempre ter sido motivo de conflitos para os moçambicanos, especialmente durante o período colonial, pois o valor da Língua Portuguesa era tão alto, que muitas famílias proibiam suas crianças de usarem as línguas locais dentro de casa, forçando-as a utilizar apenas o Português, como declara Rosário (2015): No tempo colonial, os pais assimilados castigavam, algumas vezes severamente, os filhos, quando estes aprendiam as línguas africanas com as avós ou com os empregados domésticos. E as razões que apresentavam eram que, ao aprender as línguas africanas, contaminavam o seu Português, e, com isto, envergonhavam os seus pais em momentos de convívio social, por causa da horrível pronúncia cafrealizada, ou então porque esse conhecimento dificultava a aprendizagem e a aquisição do saber na escola, e também o desempenho no trabalho. (ROSÁRIO, 2015, p. 24) Vale salientar que os assimilados são assim denominados por serem negros que tentaram, de muitas formas, se aproximar dos hábitos e dos costumes dos portugueses, incluindo, principalmente, o uso da Língua Portuguesa em detrimento das línguas locais. Esses indivíduos negariam, de certa forma, suas origens culturais, para se aproximarem do status de civilização dos portugueses, pois isso faria deles cidadãos com iguais condições de crescimento na educação e no trabalho. A partir dessas crenças, as línguas nacionais foram se tornando estigmas, consideradas como línguas tribais. Aqueles que desejassem algum tipo de ascensão social e prestígio na sociedade precisavam falar Português. No entanto, devido à presença ainda muito forte dessas línguas em outros contextos, era praticamente impossível não adquirir, ainda que de forma discreta, as línguas nacionais. Assim, criou-se uma geração que, supostamente, só sabia falar Português, mas que, na verdade, nunca deixou de ter algum tipo de contato com as línguas africanas. Assim, os jovens da minha geração, aprendendo embora as línguas maternas africanas, quer através das suas próprias mães, quer através das avós ou, no caso das famílias mais abastadas, através dos empregados domésticos, mantinham essa competência linguística mais 33

34 ou menos adormecida, embora lhes fosse útil em momentos apropriados. Grande parte dos cidadãos desta geração, sobretudo os grupos das cidades mais importantes, criou a ilusão de que seus filhos não dominavam senão a língua portuguesa. (ROSÁRIO, 2015, p. 24) Sobre os dias atuais, Chimbutane (2015) resume as tendências de uso das línguas em nível provincial, afirmando que De modo geral, em todas as províncias, (a) as línguas bantu são as mais frequentemente faladas em casa, (b) o Português tende a ser cada vez mais uma língua falada com frequência no domínio familiar e doméstico. (CHIMBUTANE, 2012, p. 29). Isto posto, pode-se concluir que, de fato, há um plurilinguismo presente na realidade linguística de Moçambique, na qual existe predominância da Língua Portuguesa nas áreas urbanas, mas ainda há resquícios e indícios de uso dos idiomas nacionais, principalmente entre os habitantes mais velhos da população, em ambientes domésticos e nas áreas mais rurais do país. Nas palavras de Stroud (1997), A escolha de uma norma linguística que é externa à nação na qual a língua é falada significa que as instituições oficiais como a escola e outras arenas tais como o mercado de trabalho, acabam por exercer controlo sobre quem terá acesso à língua. Uma consequência deste facto é a criação de certo número de mercados linguísticos, mais ou menos integrados num mercado linguístico oficial na qual os falantes podem aproximar-se da norma (europeia), e a existência simultânea e paralela de alguns mercados linguísticos não oficiais. (STROUD, 1997, p. 28). Enquanto nas áreas mais urbanas o Português é a principal, quando não a única, língua de comunicação cotidiana, nas áreas mais rurais, por outro lado, o Português funciona como a língua de comunicação comercial, restrita a contextos de LE, convivendo com uma ou mais línguas bantu, devido ao caráter misto da população. Logo, é evidente a natureza variável da Língua Portuguesa falada nessas áreas, que se mostrará diferente tanto em quantidade como em qualidade da língua que produzem em meio a tão variado contato linguístico. Tal contexto implica a adaptação dos falantes rurais nas variadas situações de uso do Português, dispondo, enquanto falantes de uma LE, de menos oportunidades de contato com a língua considerada padrão e mais contato com usos não oficiais. Assim, esse cenário pode levar a variação para uma determinada direção, mais ou menos afastada do modelo alvo. Já os falantes urbanos, considerando também os com mais 34

35 escolaridade, teriam mais oportunidades de adquirir o Português padrão, à semelhança do PE. De acordo com Chimbutane (2015), o advento da democratização do país, por volta dos anos 80, reforçou a perspectiva de um Português padrão a ser alcançado, que excluísse totalmente qualquer característica prototípica de uma Língua Portuguesa que pudesse ser considerada propriamente moçambicana e se aproximasse, cada vez mais, da variedade europeia: Com efeito, se bem que ainda se preconizasse o desenvolvimento de um Português moçambicano, surge uma preocupação em normalizar esse Português e até mesmo de se ter o padrão europeu como norma escolar. [...] nessa fase a preocupação central já não era a uniformização do Português falado em Moçambique [...] mas a importação de uma norma exógena, desconhecida pela maioria dos falantes, incluindo pela maior parte dos professores [...] a escola começou a preocupar-se mais com o ensino da gramática, passando a ser menos tolerante em relação a formas desviantes, incluindo aquelas que outrora eram positivamente recebidas como marcas de moçambicanidade. (CHIMBUTANE, 2015, p ) Timbane (2014) critica a existência de um Português padrão similar ao europeu em Moçambique, afirmando que as línguas bantu ainda existem dentro e fora da cidade, sem nenhuma chance de serem totalmente extintas. Para o autor, essa situação de uso simultâneo das línguas reforça a hipótese de que existiria um Português propriamente moçambicano, nativizado, resultante das mudanças influenciadas pelo contato com as línguas nacionais e que geram variações diferentes do Português Europeu padrão que teria sido seu modelo de formação: Adotamos o termo nativização [...] para designar o processo de transformação da norma-padrão europeia em PM, uma variedade que na base das LB adapta, integra na língua seus valores culturais, sua identidade, seus símbolos, seus objetos materiais de tal forma que seja sentida como pertence dos moçambicanos. (TIMBANE, 2014, p. 11) Considerando o uso de um Português padrão, cabe ressaltar a questão social do sexo dos falantes, que parece indicar menor uso da norma de prestígio por parte das mulheres, já que estas teriam a tendência de promover o uso de línguas bantu, devido à sua baixa escolaridade e aos contextos sociais dos quais fazem parte. Ao que tudo indica, mesmo depois da independência do país, as mulheres ainda têm menos acesso à educação 35

36 formal e, consequentemente, à Língua Portuguesa tida como padrão. O mercado de trabalho reforçaria essa postura, haja vista seus deveres fortemente familiares e poucas oportunidades de atividade laboral fora do ambiente familiar, como esclarece Stroud (1997): [...] embora as mulheres e os homens tenham exatamente a mesma variedade e tipo de redes sociais, os indivíduos do sexo masculino falam um Português mais padrão do que as mulheres, e estas falam melhor as línguas bantu locais que os homens. Uma explicação para isto é que as redes recebem o seu sexo de acordo com a língua; as ocupações que as mulheres têm são mais orientadas para o uso de línguas bantu locais contrariamente aos homens. (STROUD, 1997, p. 33) No entanto, a comparação entre os Censos de 1997 e 2007 demonstra estar havendo uma mudança nesse panorama, com claro crescimento no número de mulheres que declaram saber falar Português, como é possível analisar na seguinte tabela: Tabela 4 Distribuição percentual da população de 5 anos ou mais segundo conhecimento da língua portuguesa e sexo em Moçambique, em 1997 e Conhecimento de LP Homens Mulheres Homens Mulheres Sabe falar LP Não sabe falar LP Desconhecida Fonte: INE (2010) sobre Censos de 1997 e 2007 Chimbutane (2012), sobre a mudança no percentual de mulheres e a diminuição da disparidade entre elas e os homens em termos de conhecimento do Português, afirma que Esta situação pode dever-se a uma gradual mudança de atitude em relação ao lugar da mulher na sociedade, o que pode ser consequência de diferentes políticas e acções sociais visando a equidade de gênero no país. Em termos específicos, estes dados podem indicar que a mulher tem estado a ter cada vez mais acesso à educação formal, uma das principais vias de aprendizagem da língua portuguesa em Moçambique, em especial nas áreas rurais. (CHIMBUTANE, 2012, p. 18) Ainda assim, o autor reitera que 36

37 [...] as populações das áreas rurais e as mulheres estão numa clara situação de desvantagem em relação às populações das áreas urbanas e ao homem, respectivamente: as populações das áreas rurais e as mulheres registram índices comparativamente mais baixos de conhecimento da língua portuguesa e de alfabetização. (CHIMBUTANE, 2012, p. 43) Em vista de toda essa disparidade, ainda presente na sociedade, em relação ao acesso à Língua Portuguesa, seja pela localidade (rural x urbano), pela escolaridade (mais ou menos escolarizados), pela idade (indivíduos mais jovens x mais velhos) ou até mesmo o sexo (homem x mulher), a partir dos anos 90, o Ministério da Educação institucionalizou o debate sobre a introdução das línguas locais na educação formal. Assim, deu-se início às discussões sobre uma educação bilíngue, uma vez que, sendo o Português falado por uma minoria da população, o uso desta língua como meio exclusivo de ensino estava a concorrer para a exclusão da vasta maioria das crianças moçambicanas do processo educativo. (CHIMBUTANE, 2015, p. 59). Baseado nessa proposta, o sistema de ensino em Moçambique, portanto, é dividido em dois programas: um monolíngue, no qual o ensino é totalmente alicerçado no uso exclusivo de Português e um bilíngue, no qual se usa uma língua local ao lado do Português, como fonte de ensino. Chimbutane (2015) destaca que, na atualidade, se usam por volta de 16 línguas locais nessas escolas bilíngues e ainda afirma que em 2014 havia uma estimativa de cerca de 490 escolas bilíngues espalhadas pelo país, localizadas nas seguintes províncias: Cabo Delgado, Niassa, Nampula, Zambézia, Tete, Manica, Sofala, Inhambane, Gaza e Maputo. Essa proposta vem sendo apoiada por linguistas (cf. CHIMBUTANE, 2015; MENEZES, 2013; NGUNGA, 2007; LOPES, 1997; TIMBANE, 2015) que defendem a necessidade de um ensino bilíngue para que, em séries mais avançadas, os alunos consigam desenvolver melhor suas habilidades, haja vista o grande fracasso escolar observado naqueles alunos que não aprenderam Português em casa e só compreendem seus idiomas maternos. No entanto, apesar de ser uma política que visa ao enriquecimento do sistema educacional, com o objetivo de auxiliar aqueles alunos vindos das áreas rurais, com pouquíssimo ou nenhum acesso à Língua Portuguesa, especialmente nos primeiros anos da educação básica, ao introduzir os conteúdos também em línguas locais, a sua execução tem encontrado dificuldades, particularmente relacionadas aos seguintes obstáculos: 37

38 [...] (1) a fraca capacidade técnica nacional em matéria de ensino bilíngue, (2) a ainda incipiente descrição das línguas locais, (3) a falta de materiais impressos nestas línguas e (4) os elevados encargos financeiros decorrentes da produção simultânea de materiais de ensino e aprendizagem em 16 línguas bantu, para além do Português. (CHIMBUTANE, 2015, P. 62) Em poucas palavras, mesmo com toda a diversidade linguística e a tentativa de introduzir as línguas locais no ensino escolar, a Língua Portuguesa continua sendo a língua de maior prestígio e, mesmo que haja uma valorização das línguas nacionais, estas parecem estar fadadas a um simples papel integrativo, como conclui Chimbutane (2015): O Português é assumido como um recurso que permite acesso a mercados de trabalho formais e aos dividendos sócio-econômicos daí decorrentes, ao passo que as línguas locais são vistas como meros veículos de comunicação familiar ou entre membros de grupos etnolinguísticos específicos. Ou seja, no geral, as línguas locais não são associadas à geração de capital ou percebidas como recursos a explorar em mercados laborais formais. (CHIMBUTANE, 2015, p.65) Dessa forma, pode-se concluir que o ensino bilíngue não garante melhores oportunidades na vida dos moçambicanos e que os fatores sociais são de fato relevantes no que tange à caracterização da variedade moçambicana do Português, na medida em que as variantes estigmatizadas, possivelmente decorrentes do constante contato com essas variadas línguas locais, não ocorrem de forma aleatória e, portanto, podem ser descritas e regularmente estruturadas, estabelecendo o caráter sociolinguístico que é de interesse desta pesquisa. Verifica-se, então, que por ser considerado um recurso de ascensão social, os fenômenos variáveis são concebidos como algo a ser evitado e combatido. Dessa forma, os erros 7 de Português encontrados na variedade moçambicana, que mereceriam mais atenção dos professores de Língua Portuguesa, são listados por Gonçalves (1997) como sendo os seguintes: i) léxico: neologismos com base em empréstimos do PE, de línguas bantu e do inglês; ii) léxico-sintaxe: casos em que as propriedades da palavra geram uma estrutura sintática não prevista na norma do PE; iii) sintaxe: estruturas encaixadas (orações subordinadas e complementos circunstanciais), colocação pronominal, 7 Nomenclatura utilizada por Gonçalves (1997) para se referir aos componentes da língua que fogem às regras gramaticais da Português Europeu padrão. Para mais informações, cf. Capítulo 2. 38

39 determinação, ausência de artigos, ordem de palavras; iv) morfossintaxe: morfologia flexional de tempo, pessoa, número, modo, gênero e caso, especialmente a concordância nominal e a verbal. Portanto, compreende-se que, como mostram tanto as questões sócio-históricas aqui exploradas quanto a listagem dos fenômenos linguísticos levantados por linguistas, a concordância verbal é, realmente, uma das áreas mais importantes a serem observadas no Português de Moçambique. Sendo este tema de alta relevância no ensino de Língua Portuguesa nas escolas de Moçambique e, igualmente, nas pesquisas que pretendem explorar as variedades africanas, justifica-se a legitimidade da presente investigação. 39

40 3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Nesta seção, observam-se os aportes que servirão de base para a pesquisa. Dividida em cinco subseções, serão apresentados os pontos mais relevantes para a interpretação dos resultados sobre a Teoria da Variação e Mudança, a aquisição de segunda língua, as questões sobre bilinguismo, o estatuto social das línguas, o debate sobre as origens do PB e a formação das variedades e, por último, a proposta de um continuum afro-brasileiro de Petter (2008). Pretende-se, com isso, demonstrar o panorama teórico sobre o qual a presente pesquisa se apoia e o tipo de olhar que se pretende ter acerca da constituição da variedade moçambicana e todas as suas especificidades. 3.1 Teoria da Variação e Mudança O objeto da Sociolinguística Variacionista, ou Teoria da Variação e Mudança, nos termos de Weinreich, Labov e Herzog (1968), compreende essencialmente a língua falada em situações reais de uso, privilegiando os fenômenos de variação e mudança. A partir da observação atenta da fala, é possível descrevê-la e analisá-la de maneira coerente e eficaz. Esse aporte teórico-metodológico dá conta da diversidade linguística, que pode ser percebida (conforme BRIGHT, 1966) sob três diferentes ângulos no que se refere ao condicionamento extralinguístico: (i) a identidade social do emissor, (ii) a identidade do receptor e (iii) as condições da situação comunicativa. A Sociolinguística trata da língua como fenômeno social, passível de sofrer variação no sistema de regras linguísticas impostas pela gramática, por influência do contexto social. A variabilidade é inerente a todas as línguas, uma vez que a língua não é uma entidade homogênea, mas dinâmica e heterogênea, porque os falantes que fazem uso dela também são heterogêneos e não se comportam da mesma maneira em todas as situações sócio-comunicativas. Segundo o aporte teórico laboviano, a variação não pode ser analisada como resultado do uso arbitrário e irregular da língua pelos falantes. O fenômeno variável encontra motivações em circunstâncias linguísticas determinadas. Sendo assim, ele é o resultado sistemático e regular de restrições impostas também pelo próprio sistema linguístico em uso. Dessa maneira, o falante emprega determinada forma de expressão a depender de fatores linguísticos e extralinguísticos que atuam sobre o fenômeno em questão. 40

41 Os fatores linguísticos referem-se à própria estrutura gramatical e suas propriedades morfofonológicas, sintáticas e semânticas. Os fatores extralinguísticos relacionam-se a propriedades inerentes ao falante, como o sexo, a faixa etária e a etnia, sua caracterização social, através de sua escolaridade, sua profissão e sua classe social, e, por fim, às propriedades contextuais, que mostram o grau de formalidade e monitoração do discurso em determinados eventos de fala. A partir da atuação desses fatores, o linguista é capaz de traçar a descrição e a sistematização do uso de uma ou outra variante por parte do falante. Por variantes, entendem-se duas ou mais formas alternativas de se realizar a mesma variável linguística e que se encontram em concorrência em um mesmo contexto. A concordância verbal, por exemplo, é um fenômeno variável com duas realizações possíveis: a variante com marca de plural no verbo e a variante sem a marca. De acordo com Labov, essas variantes são idênticas quanto à referência ou valor de verdade, mas opostas em sua significação social e/ou estilística (LABOV, 1972, p. 110). A variação pode ser condicionada, portanto, por três fatores externos principais: pela região em que o falante vive, o que constitui a variação diatópica; pelo estrato social ao qual o falante pertence, a chamada variação diastrática; e pelo nível de formalidade no qual o falante está inserido, a variação diafásica. Esta última relaciona-se, dentre outros fatores, com o grau de monitoração na produção linguística, seja na fala ou na escrita, com o grau de envolvimento entre os falantes no discurso em questão e até com o tema em discussão entre os falantes. Cada tipo de variação pressupõe a existência de uma lista de regras a serem seguidas por seus falantes, seja para o uso de uma ou de outra variante, de forma que a comunicação não seja comprometida por desentendimentos. No entanto, sabe-se que essas regras apresentam exceções, mas que também podem ser sistematizadas por conta de restrições linguísticas, quando observadas em particular. Sendo assim, Labov (2003) propõe tratar os tipos de regras linguísticas encontradas nas línguas naturais em três categorias: categórica, semicategórica ou variável. Regras categóricas caracterizam uma opção de determinada variedade linguística da ordem de 100% das ocorrências, de modo que, por princípio, elas nunca são violadas. Isso quer dizer que elas fazem parte do repertório dos falantes, que tendem a utilizar determinada construção sempre da mesma maneira. Uma regra semicategórica da ordem de 96 a 99% de concretização de uma das formas alternantes reporta violações raras ao sistema vigente. Essas violações geralmente aparecem no início ou no fim de uma mudança linguística. Por fim, uma regra efetivamente variável (de cerca de 5 a 95% de alternância) significa a ausência de uso categórico de uma forma em detrimento 41

42 de outras, ou seja, no repertório dos falantes há possibilidades naturais de alternância entre diferentes variantes. Considerando os fenômenos linguísticos que demonstram comportamento alternante, afirmam Lemle; Naro (1977, p. 17): Dá-se, nos estudos sociolinguísticos, o nome técnico de regra variável a uma regra linguística facultativa, i.e., que ora se aplica ora não se aplica.. Essas regras variáveis são comuns entre os falantes, que podem ser estigmatizados quando fazem uso de variantes que estão fora do padrão que se tem como modelo. Dentro do aporte da Teoria da Variação e Mudança, ganha relevo, portanto, o julgamento de valor que todas as manifestações linguísticas sofrem por parte dos falantes, ainda que todas sejam legítimas e previsíveis do ponto de vista teórico. Essas avaliações determinam o tipo de inserção dos indivíduos nas comunidades de fala, desencadeando a distribuição na escala social, de modo que se valorizam aqueles que utilizam as variantes corretas, de acordo com os modelos vigentes na comunidade, e se estigmatizam aqueles que fogem a esse padrão. Em outras palavras, interessa ao sociolinguista estabelecer o estatuto social das variantes, o que se correlaciona aos conceitos de estereótipos, marcadores e indicadores. As marcas linguísticas que estão na consciência dos falantes, estigmatizadas, muitas vezes, como incorretas, são consideradas estereótipos, que acabam por identificar e definir determinados grupos; os indicadores, de outro lado, sugerem apenas diferenciação social por idade ou grupo, sem resultar de uma avaliação subjetiva apontada no nível da consciência; por fim, os marcadores estão relacionados a distribuição social e diferenciação estilística trata-se de variantes que, de acordo com a situação sociocomunicativa, podem ser identificadas por determinados falantes. Assim, observa-se que as variáveis revelam forte estratificação social e de estilo determinantes sociais cuja atuação ocorre de forma inconsciente até transformarem as variantes em algo aparente, a ponto de serem consideradas estereótipos linguísticos. Ao reconhecer tanto os fatores linguísticos quanto os sociais que atuam diretamente no uso de uma ou outra forma, pode-se compreender o desenvolvimento de mudanças linguísticas, ou seja, entender como a mudança se dá em sua totalidade onde ela começa e termina. Para chegar a conclusões mais objetivas sobre os condicionamentos de uso das variantes, é preciso dar conta de cinco problemas, consoante Weinreich, Labov e Herzog (1968): 42

43 1. O problema das restrições: determinar, apesar da heterogeneidade fortemente presente em todas as línguas naturais, quais são as possíveis condições para as mudanças ocorrerem em determinados sistemas, sejam elas por fatores sociais ou de ordem linguística; 2. O problema da transição: compreender que a mudança é distribuída em estágios. Assim, haverá estágios de mudança em progresso, nos quais duas variantes estão em competição e a mudança se estabelece quando os falantes, que antes usavam formas alternantes, privilegiam o uso de uma em detrimento da outra; 3. O problema do encaixamento: reconhecer que as mudanças estão encaixadas dentro de outras mudanças do sistema linguístico e extralinguístico; 4. O problema da avaliação: relatar o julgamento subjetivo das variantes por parte dos falantes, que pode acelerar ou retrair o uso de uma determinada variante devido a seu valor social; 5. O problema da implementação: buscar os fatores que explicam a motivação para a implementação da mudança, isto é, compreender por que uma mudança ocorre em uma determinada língua e não em outra de mesmo aspecto ou na mesma língua em outro momento. De modo geral, o sociolinguista parte das propriedades da língua para entender a forma como se caracteriza uma variedade específica. Ele deve averiguar o estatuto social da variedade, identificar o comportamento do fenômeno variável no sistema e determinar se as variantes adversárias se encontram em um processo de avanço ou de recuo da inovação. Dessa maneira, além de identificar e analisar o nível de estabilidade e mutabilidade da variação, a Sociolinguística tem por objetivo diagnosticar quais variáveis possuem um efeito positivo e/ou negativo nos usos linguísticos. Após essa verificação, segue-se à observação das regularidades encontradas, com vistas ao estudo de seu comportamento específico. Logo, a variação e a mudança são contextualizadas formando um grupo de parâmetros a serviço da delimitação investigativa da diversidade da língua. Seguindo, portanto, o arcabouço teórico-metodológico variacionista, esta pesquisa observa os dados linguísticos com base nos seguintes princípios: (i) a inerência da variação nas línguas, o que permite a sistematização das mesmas; (ii) mesmo que a variação não leve necessariamente à mudança, a constatação de uma mudança implica a existência de variação anterior a ela; e (iii) a variação não ocorre de forma aleatória; pelo 43

44 contrário, é condicionada por fatores linguísticos e sociais que atuam diretamente no (des)favorecimento de uma variante em detrimento de outra. No que tange ao fenômeno em estudo, cabe aqui uma breve colocação sobre a validade de tal pesquisa em termos variacionistas: a concordância verbal de número é variável em alta escala e constitui um fenômeno típico de ser estudado, sob uma perspectiva da teoria da variação linguística: suas variantes ocorrem em contextos semelhantes e apresentam o mesmo valor de verdade (SCHERRE, 1996, p. 86) Ademais, em se tratando especificamente do PM, temos a variação colocada da seguinte forma por Gonçalves: Há casos que parecem ter tendência para estabilizar como parte da subvariedade educada do PM, enquanto outros parecem resultar de falta de atenção dos falantes às suas próprias produções linguísticas e não do desconhecimento das regras de concordância verbal do PE padrão. (GONÇALVES, 2010, p. 57) Pretende-se, portanto, destacar as variáveis linguísticas e extralinguísticas que atuam sobre o referido fenômeno da concordância verbal de 3ª pessoa do plural na variedade moçambicana do Português. Para a delimitação dos fatores a serem investigados, o estudo parte das propostas de Vieira (1995) e Vieira; Bazenga (2013), sobretudo para o estabelecimento das variáveis independentes controladoras do fenômeno e, também, Gonçalves (1997, 2010), Gonçalves et al. (1998) e Gonçalves; Chimbutane (2015), para compreender a relevância dos resultados a partir do ponto de vista sociolinguístico e cultural no contexto multilíngue de Moçambique. 3.2 Aquisição de segunda língua (L2/LE) Em vista da complexa situação linguística de Moçambique, na qual a grande maioria dos falantes de Língua Portuguesa aprendeu o Português como segunda língua (L2) ou como língua estrangeira (LE), é de suma importância apresentar, ainda que de maneira resumida, elementos que permitam a compreensão de como os processos de aquisição de uma língua diferente da materna ocorre, já que tal informação pode auxiliar no entendimento da formação da variedade africana em questão. 44

45 Dentre muitos conceitos sobre a aquisição de língua, é necessário, primeiramente, compreender a diferença entre se aprender uma L2 e uma LE. O aprendizado de uma segunda língua é caracterizado pela exposição ao input linguístico não somente em contexto escolar, mas em todos os ambientes dos quais o aprendiz faz parte e compartilha com sua comunidade. Línguas estrangeiras, por outro lado, são aprendidas em ambientes considerados mais artificiais, em contextos tipicamente escolares, nos quais o input é meramente instrucional, enquanto fora da escola o indivíduo volta a utilizar sua língua materna (cf. LEFFA, 1988). O input, conceito crucial neste campo de estudo (cf. KRASHEN, 1982, 1985), nada mais é do que tudo aquilo que o aprendiz lê ou escuta na sua língua-alvo, ou seja, na língua que deseja e/ou precisa aprender. Através do input, o cérebro armazena as informações recebidas, como novos sons e novas palavras, para que elas sejam acessadas posteriormente. Dessa forma, entende-se que não é possível aprender uma nova língua sem que haja, minimamente, contato anterior com esta, seja através de leitura ou de compreensão oral. A quantidade e a qualidade do input recebido são essenciais ao resultado final a que se pretende chegar, uma vez que, sem uma quantidade mínima de elementos que propiciem uma comunicação eficaz e inteligível, o repertório que o falante tem disponível é muito escasso e insuficiente para que o output, isto é, a produção concreta da língua, seja eficiente. Em suma, a exposição a dados linguísticos é primordial para o aprendizado efetivo de uma nova língua. Observando tal questão, a autora Maria Cristina Silva faz uma breve comparação entre a aquisição de língua materna (L1) e a aquisição de uma segunda língua (L2), afirmando que, embora apresentem evidências bastante parecidas, que gerariam os mesmos padrões de aquisição, o processamento e o resultado final desta se faz diferente para cada uma delas, já que envolvem fatores distintos ao longo do processo de aprendizagem: Se as sequências na aquisição de L2, para cuja existência parece haver evidência [...] também se encontrarem no processo de aquisição de L1, isso significa que ambos os tipos de aquisição poderão estar sujeitos aos mesmos padrões. [...] Uma questão subjacente a esta consiste em procurar perceber até que ponto o processo de aquisição de L2 é ou não mais bem sucedido do que o processo envolvido na aquisição de L1, do ponto de vista do nível de domínio linguístico alcançado pelos falantes. [...] há factores acidentais em jogo (os falantes de L1 e L2 geralmente adquirem um idioma em cenários diferenciados e sob distintos níveis de exposição), bem como outros de natureza inevitável (poderá ser 45

46 impossível estabelecer uma comparação entre falantes equivalentes de L1 e de L2). A resposta a esta questão permanece assim um enigma: se é verdade que parece haver muitas semelhanças entre o processo de aquisição de L1 e de L2, a variação encontrada, a par de outros factores, parece ser responsável por muitas diferenças. (SILVA, 2005, p. 103) Esses fatores envolvidos podem ser, dentre muitos, a necessidade de aprender a língua, a pressão política e social sobre o prestígio e o valor de tal língua, além da influência dos parâmetros da própria L1, que já estão internalizados no falante. Ademais, existem ainda as restrições com relação à idade do aprendiz, às oportunidades de exposição à língua, as transferências de L1, o tipo de feedback recebido sobre seu desenvolvimento linguístico e o contexto social em que o falante está inserido (cf. trabalhos sobre Bilinguismo; dentre outros, APPEL; MUYSKEN, 2005; ROMAINE, 1995). Todos esses fatores podem, de fato, interferir positiva ou negativamente no resultado final do processo. Há que se dizer, todavia, que, em termos de aprendizado de língua estrangeira, é praticamente impossível afirmar que haja um estágio verdadeiramente final, no qual nada mais precisa ser aprendido. Contudo, em estudos sobre a aquisição de línguas nomeia-se como estágio final (cf. WHITE, 2000; LIGHTFOOT, 1991) 8 o momento em que as mudanças gramaticais são pouco expressivas, indicando que a reestruturação mental já foi relativamente atingida pelo falante. 9 Ao longo do processo de aprendizagem de uma língua, o aprendiz passa por vários estágios de aquisição da L2, os chamados sistemas provisórios, sendo que, por 8 Apesar de usarem nomenclaturas diferentes, steady state grammar e mature grammar, respectivamente, White (2000) e Lightfoot (1991), ambos os autores referem-se a esse mesmo momento do processo de aprendizagem de língua. 9 É importante ressaltar que esse estágio final não deve ser concebido como se o falante tivesse atingido um nível de proficiência de um nativo, principalmente porque, ao que parece, algumas áreas da gramática são mais facilmente dominadas do que outras por falantes de segunda língua. Essa assimetria tende a estar ligada exatamente à língua nativa do aprendiz, que pode influenciar diretamente na assimilação de algumas propriedades específicas da língua alvo, resultando em uma gramática (de L2) diferente da dos falantes nativos. Em poucas palavras, pode-se dizer que o estágio final de uma segunda língua é muito mais instável do que o da L1, possibilitando a existência de variações e mutabilidades no discurso do falante. Para aprofundamento destas questões, cf. Bialystok; Hakuta (1999); Bialystok; Miller (1999). Além disso, mesmo considerando a aquisição de língua materna, há que se considerar a possibilidade de não haver um estágio final tão delimitado como parece. Paiva; Duarte (2003) ainda destacam que, em meio aos contextos de mudança, há que se observar a mudança de estruturas da gramática do próprio indivíduo, ou seja, tanto o indivíduo quanto a comunidade podem se manter estáveis, não se processando qualquer tipo de mudança, ou podem estar ambos mudando paralelamente (PAIVA; DUARTE, 2003, p. 18), o que poderia representar estágios que parecem mais estáveis do que outros, nos quais a mudança parece mais estabilizada, como se fosse um estágio final. 46

47 muitas vezes, a gramática final atingida por esse falante não necessariamente atingirá a língua-alvo em sua totalidade. Tais sistemas são o que linguistas, como Selinker e Adjemian 10, nomeiam interlínguas, que nada mais são do que línguas naturais possíveis, dado que seguem sistemas de regras internamente consistentes. Em síntese, pode-se afirmar que, ao dar conta do input de L2 a que é exposto, o aprendiz alcança algum nível de representação da língua-alvo, ainda que não seja idêntico ao de falantes nativos. De toda forma, se o estágio a que esse falante chega for uma gramática possível e compreensível, parte do objetivo já pode ser considerada alcançada. Por outro lado, os desvios à gramática da língua-alvo são, quase sempre, mal vistos, avaliados com um olhar preconceituoso. Essa postura desconsidera a variação linguística que é inerente a qualquer língua, principalmente nas interlínguas que são intrinsecamente variáveis, visto que os aprendentes de L2 variam entre o uso de formas correctas e o uso de formas incorrectas em relação ao padrão da língua-alvo, como afirma Gonçalves (2010, p. 68). A esse tipo de desvio da língua padrão nomeia-se fossilização, que, de acordo com Stroud (1997, p. 14), refere-se à cessação da aprendizagem, resultando num sistema de interlíngua mais estável, porém incompleto ou não-nativo. A fossilização ocorre em falantes de todas as idades 11, em diferentes estágios de aquisição, e pode ser explicada por questões neurológicas do próprio processo de aprendizagem da língua e/ou por questões de atitude do falante para com a língua-alvo. Porém, ainda há incertezas sobre a cronicidade da fossilização, tendo em vista que muitos desses desvios ocorrem de maneira inconsciente e, portanto, são de difícil correção automática, dependendo, assim, de instrução formal para tanto. Outro conceito fundamental no que tange à aquisição de línguas é o de transferência linguística, que está relacionado aos pressupostos da Teoria de Princípios e Parâmetros (cf. CHOMSKY, 1986), da Gramática Gerativa. Chomsky, criador de tal teoria, postula que os princípios são invariantes, aqueles que determinam a gramática universal, que é inerente ao ser humano, enquanto os parâmetros, que constituem 10 Para mais informações sobre o tema, vale a pena conferir Selinker (1972) e Adjemian (1976), que foram aqui citados meramente para registro de referência de uso dos termos sistema provisório e interlíngua, já que não cabe no escopo deste trabalho aprofundar tais conhecimentos. 11 Stroud (1997, p. 14) afirma: A aquisição incompleta é normalmente mais saliente entre aprendentes adultos, mas mesmo os aprendentes crianças, que alcançam um nível final de quase-nativos ou semelhante ao nativo, mostram evidências de fossilização. 47

48 propriedades diferentes e únicas para cada língua, seriam fixados ao longo do período de aquisição da linguagem. Assim sendo, ao adquirir a língua materna, o indivíduo organiza em sua gramática internalizada os parâmetros dessa L1, sem possuir pré-conceitos linguísticos que o impeçam de assimilar novas estruturas e novo vocabulário, diferentemente, por outro lado, da aquisição de L2, na qual o indivíduo já possui conhecimentos prévios sobre os parâmetros que atuam e funcionam adequadamente em uma língua. Como consequência disso, o estabelecimento de parâmetros de uma L1 interfere no processamento de novos conceitos advindos de uma segunda língua. Logo, a tendência geral é a de que haja uma transferência de parâmetros gramaticais já internalizados na L1 para a gramática da língua-alvo. Shwartz; Sprouse (1996 apud GONÇALVES, 2010, p. 72) corroboram essa proposta ao defenderem que os valores de parâmetro da L1 são inicialmente retidos pelos aprendentes e generalizados para a L2. Ngunga (2012) define a transferência linguística como fenómeno que consiste na utilização numa língua de traços característicos de uma outra língua devido a incapacidade de o sujeito falante produzir correctamente um som, uma palavra, uma frase da língua não materna (Ln1), ou na atribuição a uma palavra, expressão ou frase, de um sentido que faz lembrar a tradução literal de algo análogo na língua materna. (NGUNGA, 2012, p. 2) Uma vez que os parâmetros são específicos para cada língua, a transferência de tais propriedades pode gerar, e na maioria das vezes gera, transferências inapropriadas, que impossibilitam a reestruturação gramatical da interlíngua de onde resulta a L2 final do indivíduo. Dado elementar já discutido entre especialistas no assunto é que, independentemente de quaisquer questões que impeçam a aprendizagem eficaz de uma L2, mesmo que existam muitas evidências positivas 12, a reestruturação gramatical das interlínguas nem sempre é possível. Considerando especificamente a situação de Moçambique, vale ressaltar a diferença crucial entre aprender uma L2 e uma LE, especialmente em contextos multilíngues como o dessa região. Destacando tal cenário, Menezes (2014) afirma que os 12 Evidência positiva significa a exposição à língua considerada padrão, transmitida por falantes de L1 e, principalmente, em contextos formais, como a escola e a língua escrita. 48

49 falantes das áreas rurais teriam o Português como uma LE, enquanto os indivíduos mais urbanos o teriam como uma L2: Em Moçambique, o português tem o estatuto de L2 e/ou LE para a maioria da população. No meio rural, onde há predominância das línguas locais, da família bantu, e onde é aprendido só em contexto de escola, contexto no qual a maioria da população, muito raramente, entra em contato com esta língua no dia-a-dia, tem que ser considerado como uma língua estrangeira, diferentemente do meio urbano, em que o português pode ser considerado como uma L2 e já faz parte do ambiente linguístico dos alunos que entram para a escola. (MENEZES, 2014, p. 117) Assim, formula-se a noção de que, em uma população que usa o Português como L2 e/ou como uma LE, a aprendizagem de tal língua se dá de maneira distinta a depender da área em que cada indivíduo mora, sendo que aqueles aprendentes que vivem fora do ambiente da cidade têm contato muito restrito com a língua formal que se pretende ensinar na escola. Logo, com uma exposição tão restrita à língua, sua aquisição poderá ser lenta e incompleta. Por outro lado, aqueles que têm acesso à Língua Portuguesa em ambientes naturais e comuns ao seu cotidiano possuem mais oportunidades de desenvolver a língua alvo, podendo chegar a estágios mais completos de aprendizagem e, consequentemente, podendo alcançar resultados mais satisfatórios no ambiente escolar, em que a norma de uso ensinada pretende se aproximar do PE padrão. Sobre a norma padrão do PE, Timbane (2014) declara que: em Moçambique houve uma nativização do português fruto de aprendizagem irregular por parte de poucos moçambicanos. Conforme vimos em Zamparoni (2009) os moçambicanos jamais falaram a normapadrão europeia. Os poucos escolarizados começaram a simplificar algumas regras, influenciados de certa forma pelas LB criando assim a variedade moçambicana. (TIMBANE, 2014, p. 11) Assim, a aprendizagem de Português, apesar de ser considerada extremamente relevante para a ascensão social dos moçambicanos, apresenta muitas dificuldades e obstáculos que ainda precisam ser mais explorados, especialmente porque os indivíduos das áreas rurais mantêm o uso de suas línguas bantu, como marcas de suas origens e sua cultura. Além disso, questões como a baixa escolarização e o grande número de pessoas que vivem longe das áreas urbanas têm forte influência sobre a variedade de Português utilizada em Moçambique, como problematizam Timbane e Berlinck (2012): 49

50 Para além da fraca taxa de alfabetização, a maioria da população mora na zona rural e não é falante nativa da LP, pois esta é a segunda ou terceira língua para os moçambicanos. Não se pode negligenciar o crescente número de falantes de português como língua materna nas cidades, resultante da mudança de parte da população do campo para cidade. Nas cidades, muitos pais ensinam aos seus filhos e estes por sua vez passam a usá-la como língua primeira. Mas os pais não são falantes nativos na sua maioria e muitas vezes não têm uma escolaridade que lhes permite usar norma culta. Há na fala desses pais uma mistura de línguas, o uso de empréstimos e estrangeirismos resultantes do contato que têm com as LB. É este português que chega às crianças e que é a língua primeira de muitas crianças nas grandes cidades. Em alguns casos há transposição de construções gramaticais da LB para LP, o que provoca uma variação em relação ao PE esperado e exigido pelas autoridades políticas. (TIMBANE; BERLINCK, 2012, p. 210) Sendo o PM uma L2 ou uma LE para a maioria dos moçambicanos, acredita-se de grande importância a caracterização desta variedade, inerentemente variável e, certamente, influenciada pelo contato linguístico com as línguas locais. Isto ocorre principalmente pelo caráter totalmente heterogêneo do input recebido pelos aprendizes, haja vista as evidências contraditórias a que estão expostos, sendo ora advindas de falantes não nativos do PE padrão, ora dos manuais escolares e meios de comunicação, nos quais predomina a gramática considerada padrão. Por conseguinte, entende-se que a escola é a maior e melhor fonte de acesso ao PE padrão, que se deseja como forma de obter prestígio e ascensão social: Em comunidades multilíngues, como é o caso das sociedades póscoloniais, a falta de evidências positivas para certas estruturas da língua colonial adoptada como língua oficial e falada em geral como L2 pode tornar-se particularmente dramática devido ao facto de o input estar relativamente diluído. Nestas comunidades, muito do que os aprendentes de L2 ouvem é produzido por outros falantes de L2, e este input contaminado pode aumentar as possibilidades de fossilização precoce de estruturas não convergentes com a língua-alvo. [...] No caso específico de Moçambique, [...] para além das estruturas geradas pela gramática do PE padrão, o ambiente linguístico contém também estruturas geradas pela nova gramática, que estão erradas do ponto de vista da gramática do PE. [...] Por essa razão, nestas comunidades, o sucesso na aquisição da L2 torna-se mais dependente do acesso ao ensino formal, onde existem mais oportunidades de exposição à línguaalvo padrão a sua forma escrita, que é mais homogênea que a língua oral. (GONÇALVES, 2010, p. 76) Caberia aos professores, portanto, o papel fundamental de transmitir esse suposto PE padrão, através de estratégias de ensino de língua adequadas com base no 50

51 conhecimento pelo docente de possíveis áreas de tensão entre a língua alvo e a língua materna (NGUNGA, 2012, p. 13). Em outras palavras, entende-se que apenas pelo ensino formal o falante de Português L2 pode tornar-se capaz de alcançar o modelo padrão do PE, especialmente na língua escrita. No entanto, é necessário destacar que, em meio ao caráter multilíngue da sociedade moçambicana, a aquisição de Português como L2 tem consequências diversificadas para seus aprendentes, que não utilizarão a língua-alvo nos mesmos contextos em que usam suas línguas maternas. Em suma, cada língua assumirá um papel de relevância diferente para cada falante. Ademais, embora as crianças tenham como modelo escolar o Português padrão, suas redes de contato fora da escola são compostas majoritariamente por falantes de Português como L2. Além disso, até mesmo na escola é possível questionar o tipo de input recebido pelos alunos, uma vez que os próprios professores de Língua Portuguesa podem vir a ser falantes de Português também como L2, sendo, consequentemente, modelos de uma norma que nem mesmo eles dominam por completo. Por conseguinte, a maior parte do input da língua a que os aprendentes terão acesso são variedades não-nativas estruturadas de forma complexa (STROUD, 1997, p. 36). Corroboram esse ponto de vista Moreno; Tuzine (1997), ao discutirem a questão do ensino de Língua Portuguesa em Moçambique: debate-se ainda com o problema da norma linguística a ensinar, uma vez que se observa um distanciamento entre o que se adquire/aprende na escola, como modelo de língua, as práticas linguísticas quotidianas e a norma europeia, declarada oficial em Moçambique. (MORENO; TUZINE, 1997, p.82) A esse complexo cenário de ensino/aprendizagem da Língua Portuguesa por parte dos moçambicanos, somam-se questões relacionadas à busca de identidade dos indivíduos e à atitude dos mesmos para com as línguas em contato no meio da sociedade. Diante de tanta diversidade, destacam-se os indivíduos negros, que não só se assumem, mas também são considerados pelos outros habitantes das províncias como assimilados, além dos mestiços, que muito se assemelham aos portugueses, especialmente em relação ao julgamento sobre o estatuto das línguas em contato em Moçambique. Esses dois grupos são aqueles que, apesar da presença ainda viva das línguas locais, declaram-se falantes somente de Português, desconhecedores dos idiomas 51

52 nacionais. Trata-se, portanto, em alguns casos, de moçambicanos que evitam sua própria cultura em prol de um status social mais elevado, promovido pela elite portuguesa e instituído pelo uso da Língua Portuguesa. Sendo assim, ao lado dos indivíduos que declaram abertamente seu conhecimento bilíngue, existem alguns que recusam já ter feito parte dessa realidade, mas às vezes assumem apenas compreender as línguas bantu, e ainda existem outros que, de fato, afirmam nunca terem compartilhado dela. Desse modo, estabelecer o limite entre esses dois grupos é tarefa bastante complicada, sendo as declarações desses informantes a única fonte de respostas, sejam elas totalmente verdadeiras ou não. Dessa forma, conclui-se que o tipo de aquisição do Português de Moçambique é bastante heterogêneo para cada indivíduo, sendo ora considerado segunda língua, ora língua estrangeira, ora língua oficial, mas em todos os casos um idioma que sofreu mudanças por seu contato direto com línguas locais, gerando alterações significativas em relação ao Português Europeu, tido como modelo de aquisição. As variações podem ser evidentes por seu caráter estigmatizador, quando se mostram contrárias às regras gramaticais consideradas padrão, mas ao mesmo tempo podem não ser percebidas, sobretudo aquelas que já são intrínsecas à língua, de modo que seus falantes não as consideram como desvios à norma tida como padrão. Por esse motivo, esta pesquisa busca investigar como a mudança pode ter alterado os padrões de concordância verbal na variedade moçambicana. 3.3 Conceitos básicos sobre o Bilinguismo Tendo em vista que a Língua Portuguesa é, para a grande maioria dos habitantes de Maputo, uma língua aprendida em situações e ambientes distintos daqueles propícios à aquisição de uma L1, como os vistos na seção anterior, podendo ser altamente influenciada por outras línguas que com ela convivem intensamente, acredita-se que, para aprofundar os conhecimentos sobre esse intenso contato linguístico, seja preciso compreender melhor alguns conceitos relacionados à aquisição de mais de uma língua simultaneamente, como o bilinguismo, a mudança de código, a transferência, e os calques ou empréstimos. Sendo a sociedade moçambicana, de um modo geral, bilíngue e/ou multilíngue, o primeiro conceito a ser explorado deve ser o de bilinguismo. Acerca deste conceito, levanta-se a questão de que, mesmo aqueles falantes considerados não proficientes em 52

53 Língua Portuguesa e/ou aqueles que afirmam falar apenas o Português e não ter conhecimento nenhum das línguas locais, mas que as compreendem, poderiam ser considerados como indivíduos, no mínimo, bilíngues, de acordo com as propostas de Romaine (1995) e Appel; Muysken (2005). Analisando os principais problemas relacionados ao bilinguismo, Romaine (1995) destaca que, inevitavelmente, learning to speak more than one language often involves putting together material from two languages 13 (ROMAINE, 1995, p. 2). No entanto, a autora salienta que nos estudos sobre bilinguismo a ideia de mixed languages (línguas misturadas) não é bem aceita, pois, mesmo que o indivíduo use material das duas línguas ao mesmo tempo, ele sabe identificar claramente qual elemento faz parte de cada uma delas. Assim, ela cita as palavras de Biggs (1972): Anyone who speaks a language A, knows that he is speaking A, and not a different language B. Moreover, a bilingual can always distinguish between the two languages in which he is competent. True, he may use words, phrases and whole sentences from both languages in a single discourse, but at any given point, he is able to say which language is concerned. It is obviously impossible to suddenly scramble the two languages in such a way that they can be said to be thoroughly mixed [...] the continuing tradition of a language cannot be broken unless it ceases to be spoken at all. At any one time a speaker knows what language he is speaking. He can never claim to be speaking two languages at once, or a fusion of two languages. (BIGGS: 1972, p. 44 apud ROMAINE, 1995, p. 3) 14 No entanto, Romaine afirma que, nos estágios iniciais do processo de aprendizagem bilíngue, é bastante difícil dizer se a criança está falando a língua A com inserções da língua B ou vice-versa em situações de contato linguístico muito intenso. Por isso, a situação permitiria a criação de um terceiro sistema de comunicação, a partir da convergência dos dois sistemas com os quais a criança tem contato: 13 Aprender a falar mais de uma língua frequentemente envolve unir/misturar material de duas línguas (Romaine, 1995, p. 2). Tradução nossa. 14 Qualquer um que fale a língua A sabe que está falando a língua A e não a língua B. Além disso, um bilíngue sempre consegue distinguir as duas línguas em que ele é competente. É claro que ele pode usar palavras, sintagmas e até orações inteiras das duas línguas no mesmo discurso, mas em determinado momento, ele é capaz de dizer qual língua está envolvida. Obviamente, é impossível embaralhar as duas línguas de forma que possam ser consideradas completamente misturadas [...] a tradição de uma língua não pode ser quebrada a menos que ela deixe de ser falada por completo. Em qualquer momento o falante sabe qual língua ele está falando. Ele nunca poderá afirmar que está falando as duas línguas ao mesmo tempo ou uma fusão das duas línguas. (BIGGS: 1972:44 apud ROMAINE, 1995, p. 3) Tradução nossa. 53

54 In situations of intense linguistic contact it is possible for a third system to emerge which shows properties not found in either of the input languages. Thus, through the merger or convergence of two systems, a new one can be created. (ROMAINE, 1995, p. 4) 15 No caso da Língua Portuguesa falada em Moçambique, ainda não é possível afirmar a existência de um terceiro sistema de comunicação, devido à pouca descrição formalizada das línguas bantu, mas, de fato, pode-se pensar em convergências que possam afetar o produto final, ou seja, itens gramaticais e lexicais dos idiomas locais que alteram o Português falado naquela região, especialmente nas áreas rurais, em que o uso das línguas nacionais é muito mais evidente do que o da língua do colonizador (cf. Capítulo 2 para mais detalhes). Além disso, o fluxo de pessoas de diferentes regiões da África, bastante comum na cidade de Maputo, faz com que a presença de diferentes idiomas atue consideravelmente sobre a variedade de Português falada pelos moçambicanos. Cabe ressaltar que, assim como ocorre com a variedade popular do Português Brasileiro e, sem dúvida, com qualquer outra língua que surja em situações de contato linguístico com outros idiomas, o produto final desta língua, quando muito alterado por conta das várias línguas envolvidas, sofre forte estigmatização, considerado pelos defensores da gramática padrão europeu como uma língua deficitária, incorreta, que deve ser abolida. Entretanto, existem muitos casos, e Moçambique é um deles, em que a língua do colonizador não tomou totalmente o lugar das línguas locais e, apesar de ser a língua oficial, usada na escola e nos meios urbanos, não há indicações de que em algum momento possa vir a ser a única língua utilizada por todos os habitantes da região em todos os ambientes de interação. Assim sendo, parece que se está lidando com indivíduos que vivem e possivelmente continuarão vivendo um contato muito intenso entre, no mínimo, duas línguas, e que, mesmo não sendo totalmente fluentes na segunda língua (ou nas demais línguas) que conhecem, podem ser considerados bilíngues, ao menos bilíngues passivos, pois compreendem as duas línguas e sabem em qual momento devem usar cada uma delas. 15 Em situações de intenso contato linguístico é possível o surgimento de um terceiro sistema, que mostra propriedades não encontradas em nenhuma das línguas que servem de input. Assim, através da fusão ou convergência de dois sistemas, um novo sistema pode ser criado. (ROMAINE, 1995, p. 4). Tradução nossa. 54

55 Isto envolve aquilo que os linguistas chamam de competência comunicativa (termo utilizado pela primeira vez por HYMES, 1972), ou seja, mesmo não possuindo a competência linguística total daquela língua, ele sabe quando e como utilizá-la, como Romaine reflete: Competence may therefore encompass a range of skills, some of which may not be equally developed, in a number of languages and varieties. The fact that speakers select different languages or varieties for use in different situations shows that not all languages/varieties are equal or regarded as equally appropriate or adequate for use in all speech events. (ROMAINE, 1995, p. 9) 16 Em outras palavras, pode-se dizer que mesmo aqueles indivíduos que são estigmatizados e sofrem preconceito linguístico podem ser considerados bilíngues, porque existem estágios diferentes de bilinguismo, isto é, ainda que eles não produzam sentenças completamente compreensíveis na L2/LE, eles são capazes de compreendê-la por já estarem habituados a recebê-la como input, mesmo que o output por eles produzido seja considerado deficiente : [...] a person maybe bilingual to some degree, yet not be able to produce complete meaningful utterances. A person might, for example, have no productive control over a language, but be able to understand utterances in it. (ROMAINE, 1995, p. 11) 17 Ao que tudo indica, a sociedade moçambicana parece encaixar-se perfeitamente nessas definições, já que existem diferentes níveis de proficiência da Língua Portuguesa entre seus falantes e as muitas outras línguas em uso concomitante. Isto quer dizer que cada indivíduo, seja ele proficiente ou não em mais de uma língua, inevitavelmente passa pelo processo de bilinguismo, sabendo em quais situações as línguas em uso devem ser utilizadas e qual a função social de cada uma delas, como é o caso daqueles que informam apenas compreender as línguas locais, mas não as falam e, por isso, não se assumem 16 A competência pode, portanto, abranger uma gama de habilidades, dentre as quais algumas podem não ser igualmente desenvolvidas, em uma série de línguas e suas variedades. O fato de que os falantes selecionam línguas ou variedades diferentes para uso em situações diferentes mostra que nem todas as línguas/variedades são iguais ou consideradas como igualmente apropriadas ou adequadas para uso em todos os eventos de fala. (ROMAINE, 1995, p. 9). Tradução nossa. 17 [...] uma pessoa pode ser bilíngue até certo nível e ainda assim não ser capaz de produzir enunciados com significados completos. A pessoa pode, por exemplo, não ter controle produtivo sobre a língua, mas ser capaz de compreender os enunciados nessa língua. (ROMAINE, 1995, p. 19). Tradução nossa. 55

56 bilíngues. Diante disso, Romaine defende que, se não houvesse necessidade de línguas diferentes para propósitos diferentes, nenhuma sociedade se manteria bilíngue e, consequentemente, as línguas minoritárias deixariam de existir por si só: Any society which produced functionally balanced bilinguals who used both languages equally well in all contexts would soon cease to be bilingual because no society needs two languages for the same functions. (ROMAINE, 1995, p. 19) 18 Appel; Muysken (2005) corroboram as afirmações de Romaine ao falarem sobre as dimensões psicológicas do bilinguismo. Os autores afirmam que, independentemente do nível de competência do indivíduo, as duas línguas devem permanecer isoladas na mente do falante em termos de produção e percepção e que bilinguals are quite capable of speaking one language while listening to somebody else speaking another language 19 (APPEL; MUYSKEN, 2005, p. 79). Eles afirmam que esse tipo de bilíngue, chamado compound, une as duas línguas conceitualmente, pois elas estão no mesmo ambiente de uso, apesar de estarem totalmente separadas em termos de prestígio social. Este parece ser, particularmente, o caso de grande parte dos falantes moçambicanos, que vivem em constante contato tanto com o Português quanto com as (mais de 20) línguas nacionais faladas em todo o território. Por conta disso, parece ser muito difícil para esses indivíduos definirem qual das línguas é a sua L1, já que fazem o uso simultâneo de ambas, como destaca Romaine: Thus, a mother tongue would be the language one knows best. Given the fact that competence in more than one language is rarely ever equally distributed across all domains of life, many bilinguals might know one language better because they have been schooled in it, yet feel a stronger affective attachment to another language which was learned and used in the home. Thus, the language an individual identifies with is often referred to as the mother tongue. (ROMAINE, 1995, p. 22) Qualquer sociedade que produzisse bilíngues funcionalmente equilibrados, que usassem as duas línguas igualmente bem em todos os contextos, rapidamente deixaria de ser bilíngue porque nenhuma sociedade precisa de duas línguas para as mesmas funções. (ROMAINE, 1995, p. 19). Tradução nossa. 19 bilíngues são perfeitamente capazes de falar uma língua enquanto escutam outra pessoa falando uma outra língua (APPEL; MUYSKEN, 2005, p. 79). Tradução nossa. 20 Assim, a língua materna seria a língua que aquele indivíduo sabe melhor. Dado que a competência em mais de uma língua raramente é distribuída por igual em todos os domínios da vida, muitos bilíngues tendem a saber melhor uma das línguas, porque foram educados nela. Mesmo assim, eles sentem fortes ligações com a língua que foi aprendida e usada em casa. Desse modo, a língua com a qual o indivíduo se 56

57 Esse sentimento de identificação com a língua faz com que, por muitas vezes, a direção da mudança não seja unicamente para o uso de uma das línguas, mas do balanço entre elas, de maneira que as línguas minoritárias não deixem de existir, mesmo que seja de conhecimento de todos que a língua oficial continuará sendo o idioma de maior prestígio no seio da comunidade. Sobre este assunto, Appel; Muysken (2005) alegam que, apesar de, em sociedades como a africana, a tendência ser a de que a população passe a usar cada vez mais a língua majoritária, em todos os domínios, porque esta promove melhores oportunidades de mobilidade social e ascensão econômica, a direção da mudança pode ser invertida, por razões especialmente sociais de manutenção da língua/cultura local: Sometimes it seems that shift can be equated with shift towards the majority or prestigious language, but in fact shift is a neutral concept, and also shift towards the extended use of the minority language can be observed. [...] After a period of shift towards the majority language, there is often a tendency to reverse the process, because some people come to realize that the minority language is disappearing, and they try to promote its use. These defenders of the minority language are often young, active members of cultural and political organizations that stand up for the social, economic and cultural interests of the minority group. (APPEL; MUYSKEN, 2005, p. 32). 21 Tal afirmação justifica a implementação de políticas para o ensino bilíngue em Moçambique (cf. Seção 2 para mais informações), com o intuito de agregar aqueles estudantes que não possuem muito contato prévio com a Língua Portuguesa antes de entrarem para a escola. Ademais, parece que o próprio valor dado às línguas nacionais vem se fortalecendo, com o objetivo de renovar e enaltecer o valor da cultura local, já que saber Português não impede que haja outros tipos de preconceitos sociais dentro da comunidade e que os indivíduos continuem tendo dificuldades tanto nos estudos quanto na vida profissional, mesmo que já tenham aprendido a língua do colonizador. identifica, frequentemente é a que ele se refere como sendo sua língua materna. (ROMAINE, 1995, p. 22). Tradução nossa. 21 Às vezes, parece que mudança pode ser equiparada a mudança em direção à língua majoritária ou de prestígio, porém mudança é, na verdade, um conceito neutro e a mudança em direção ao maior uso de línguas minoritárias também pode ser observada. [...] Depois de um período de mudança em direção à língua majoritária, frequentemente existe a tendência de se reverter o processo, porque algumas pessoas percebem que a língua minoritária está desaparecendo e tentam promover o seu uso. Esses defensores das línguas minoritárias geralmente são jovens, membros ativos de organizações culturais e políticas, que apoiam os interesses sociais, econômicos e culturais dos grupos minoritários. (APPEL; MUYSKEN, 2005, p. 32). Tradução nossa. 57

58 Esse novo valor positivo sobre os idiomas nacionais tem grande relação com a distribuição geográfica dos membros desses grupos linguísticos, pois a necessidade de uso da língua majoritária é muito mais evidente para aqueles que vivem nos centros urbanos, como declaram os autores: When residing on a farm, where perhaps the neighbours are members of the same linguistic minority group, there is not much need to use the majority language. The home is the most important domain of language use, and this domain is reserved for the minority language. On the contrary, people living in the urban centres will be forced in various situations to use the majority language daily, which will weaken the position of the minority tongue. (APPEL; MUYSKEN, 2005, p ) 22 Entretanto, outras condições sociais, principalmente a educação, contribuem para trazer à tona a necessidade de manutenção das línguas locais de maneira que toda criança tenha, supostamente, a mesma chance de evoluir e concluir seus estudos com sucesso. Assim, é preciso salientar que a situação de contato linguístico não é nada simples para seus usuários, pois deixar de usar suas línguas significa, de certa forma, perder suas raízes em troca de algo que nem sempre vai trazer bons resultados e, por outro lado, deixar de aprender a língua majoritária pode significar, na grande maioria das situações, um isolamento da vida social e do acesso aos bens necessários à sobrevivência como, por exemplo, o comércio. Por essa razão, os autores declaram que: Language shift and loss are not inevitable processes, however. Minority groups can experience that shift towards the majority language does not always imply better chances for educational achievement and upward social mobility. A group may give away its language without getting social-economic advantages in return. It is no longer discriminated against because of language, but because of colour, culture, etc. On the basis of such experiences minority group members may develop strategies to foster use of the minority language and to improve proficiency in the minority language, which is then revitalized. (APPEL; MUYSKEN, 2005, p. 45) Quando moram em áreas rurais, onde possivelmente os vizinhos são membros do mesmo grupo linguístico minoritário, não há muita necessidade de se usar a língua majoritária. O lar é o domínio mais importante de uso da língua e esse domínio é reservado para a língua minoritária. Ao contrário, pessoas que moram nos centros urbanos serão forçadas em várias situações a usar a língua majoritária diariamente, o que enfraquecerá a posição da língua minoritária. (APPEL; MUYSKEN, 2005, p ). Tradução nossa. 23 Mudança e perda linguística não são processos inevitáveis, no entanto. Grupos minoritários podem experienciar que a mudança em direção à língua majoritária nem sempre implica melhores chances para o 58

59 Tudo isto está relacionado ao fato de que a realidade linguística do país pode criar segregações muito fortes, que vão separar claramente os que sabem falar Língua Portuguesa daqueles que, teoricamente, não sabem. Com isso, os indivíduos que ficam entre esses dois grupos, ou seja, não fazem parte da elite letrada que desenvolveu formalmente o Português na escola e nem são aqueles que vivem nas áreas rurais e possuem pouco e/ou nenhum contato com o Português, mas somente o compreendem como forma de sobrevivência, parecem ser aqueles que ainda lutam pela manutenção das línguas locais, para além dos educadores e linguistas que entendem a importância das mesmas. Portanto, estes são aqueles que, ao que parece, usam as duas línguas ao mesmo tempo, na tentativa de não perder o que há de bom e positivo em cada uma delas. Ao que tudo indica, esses indivíduos são aqueles usuários mais prototípicos dos outros fatores que atuam diretamente na variação da língua-alvo em situação de contato linguístico: a mudança de código ou code-switching, a transferência, e os calques ou empréstimos (STROUD, 1997). Por mudança de código, entende-se a mudança de uma língua para outra ao longo do discurso, quando o falante é fluente em mais de uma língua. Geralmente, a mudança é intencional e serve como estratégia de comunicação para o falante, que faz uso de estruturas e/ou vocabulário das línguas que conhece para alcançar seu objetivo comunicativo. Segundo a autora Myers-Scotton, há três motivos que explicam a mudança de código: (i) o assunto ou o contexto discursivo pode caber melhor em um ou outro código; (ii) ambos os falantes são proficientes em ambas as línguas ou (iii) um deles pode ter preferência por uma delas (MYERS-SCOTTON, 1993 apud PETTER, 2015, p. 217). De acordo com Mesquita (2014), a expressão mudança de código é utilizada para se referir ao fenômeno reconhecidamente inerente a falantes bilíngues ou multilíngues e não raro está relacionado a situações de contato linguístico e sociocultural (MESQUITA, 2014, p. 53). O autor ainda acrescenta a fala de Grosjean (1982), que define o code-switching como uso alternado de dois ou mais códigos por indivíduos bilíngues numa mesma interação conversacional, destacando que esse uso alternado não é aleatório (MESQUITA, 2014, p. 53). sucesso educacional e crescente mobilidade social. Um grupo pode entregar sua língua sem receber vantagens sociais e econômicas em troca. Ele não será mais discriminado pela sua língua, mas por causa de sua cor, cultura etc. Baseado nas experiências dos membros desses grupos minoritários, ele pode desenvolver estratégias para promover o uso da língua minoritária e melhorar a sua proficiência nessa língua, que será, então, revitalizada. (APPEL; MUYSKEN, 2005, p. 45). Tradução nossa. 59

60 Uma das colaboradoras entrevistadas na presente amostra relata que o Português de Moçambique é diferente do Português Europeu, que seria seu suposto modelo de aquisição, por conta dessa possibilidade de mistura de códigos: sim eles falam mu:ito rápido o português dele mesmo ((risos)) é muito diferente do nosso [...] o que acontece é numa conversa de amigas minhas eu posso falar uma frase em changana outra em português outra vez em changana sim podemos fazer mistura (PMOA2M) Nessa perspectiva, entende-se que nenhum falante deve ser caracterizado como deficiente somente porque alterna o uso de duas línguas. Antes, isso indica competência linguística por parte do indivíduo que, tendo um bom conhecimento de ambas as línguas, consegue uni-las: [...] não se deve relacionar o code-switching necessariamente com deficiência de nenhum falante, tampouco das línguas envolvidas e que, pelo contrário, trata-se de um bom indicador da habilidade bilíngue dos falantes com competência em ambas as línguas. (MESQUITA, 2014, p. 54). A partir disso, o autor destaca a existência de modelos de classificação de codeswitching, dentre eles, o Matrix Language Frame Model MFL, criado por Myers- Scotton (1993, 2002). Neste modelo, que parece se aplicar bem à situação linguística de Moçambique, frisa-se a questão da assimetria dos dados linguísticos em questão, pois apontam a conexão entre duas línguas com configuração de poder desigual, ou seja, estão envolvidas no contato uma língua matriz e uma (ou mais) língua(s) encaixada(s). A língua matriz é aquela que fornece a base gramatical das estruturas e a língua encaixada se integra, seguindo restrições do sistema: Segundo a MFL, uma das línguas envolvidas cede o sistema morfológico e suas categorias funcionais, constituindo o quadro no qual os elementos da outra língua podem se integrar. [...] a língua mais abrangente estruturalmente é a LM (língua matriz) e a outra é a LE (língua encaixada) 24. A língua matriz, portanto, fornece os quadros gramaticais abstratos onde a LE é encaixada. (MESQUITA, 2014, p. 58) 24 Legendas e grifos meus. 60

61 A partir dessa declaração, entende-se que a união entre a língua matriz e a(s) encaixada(s) só é possível quando o usuário tem conhecimento bastante abrangente sobre a estrutura de todas as línguas envolvidas no processo. Com isso, confirma-se a ideia de que a mudança de código é, na verdade, um fenômeno que demonstra um bom conhecimento das línguas por parte do falante, pois este sabe exatamente como utilizar as estruturas e como encaixar as diferentes línguas para que o enunciado faça sentido. Salienta-se, então, que o modelo de marcação do fenômeno está diretamente ligado a fatores sociolinguísticos, como Mesquita assinala: [...] a língua matriz é, geralmente, a opção não marcada na interação em que se manifesta o code-switching e não raro coincide com a L1 do falante e da comunidade de fala em que está inserido. Fatores sociopolíticos, educacionais, situacionais, enfim, macro e micro contextos são relevantes e podem determinar, por exemplo, que a L1 do falante se converta em língua encaixada. (MESQUITA, 2014, p. 58) Tal situação parace ser exatamente o que ocorreu na variedade em estudo, uma vez que as línguas locais foram perdendo prestígio, apesar de ainda serem utilizadas, e dando lugar à então língua oficial, o Português. Desta forma, para as situações de codeswitching, ao contrário do que se espera do modelo prototípico, por razões políticosociais, a língua matriz das estruturas em que se observa mistura é a L2/LE de muitos desses indivíduos, enquanto suas línguas maternas são encaixadas na estrutura gramatical principal. Considerando, então, essa realidade, é possível dizer que a língua matriz seria o Português, já que é a língua de maior uso, usada em quase todos os contextos, especialmente em ambientes urbanos e mais formais, enquanto a(s) língua(s) encaixada(s) seria(m) aquela(s) de conhecimento dos falantes, podendo ser apenas uma ou mais, que são inseridas, principalmente em termos de vocabulário, dentro das estruturas sintáticas de Língua Portuguesa produzidas pelos falantes, especialmente aqueles que mais fazem mistura de código. 25 Gonçalves e Chimbutane (2015) corroboram essa ideia ao discutirem a influência da língua Changana no Português falado em Maputo, indicando que, de fato, as 25 Cabe ressaltar que esta afirmação relaciona-se, principalmente, às impressões obtidas ao longo das entrevistas. Até o presente momento, ainda não se constatou, em termos linguísticos, tais propriedades. No entanto, a realidade da mistura de línguas parece indicar que o encaixe entre as línguas tende a ocorrer nessa direção. 61

62 interferências dessa língua bantu são mínimas no PM, em termos gramaticais. Sendo assim, pode-se supor a confirmação da hipótese de que, considerando que haja influência do Changana no Português e ela não é reconhecida diretamente em propriedades gramaticais, possivelmente é o vocabulário do Changana que aparece mais encaixado na estrutura gramatical do Português e não as estruturas em si: [...] a influência das línguas bantu não consiste necessariamente numa transferência directa de propriedades da sua gramática para a gramática do PM, pelo que nem sempre é possível reconhecer, nas inovações sintácticas que se observam no PM, propriedades equivalentes nas línguas bantu. (GONÇALVES; CHIMBUTANE, 2015, p. 92) Essas influências fornecidas pela língua de substrato, nesse caso, as línguas bantu, são as chamadas transferências e os empréstimos. A transferência, já explorada na Seção 3.2, está relacionada ao uso de estruturas de uma língua na outra, ou seja, o uso de estruturas de L1 no lugar das estruturas de L2/LE, o que pode gerar transferências incorretas do ponto de vista da língua padrão. Frequentemente são estruturas usadas de maneira inconsciente pelos falantes que ainda não atingiram domínio da língua-alvo. Por fim, calques ou empréstimos são elementos incorporados à língua-alvo pela falta de outros que atendam às necessidades comunicativas do falante, usualmente relacionados a fenômenos culturais. A título de exemplificação, pode-se citar um jargão muito usado na cidade de Maputo, promovido por uma rádio, que diz a seguinte frase: Moçambique é maningue nice. Nesta frase, vemos claramente a estrutura gramatical do Português, com uma combinação de empréstimos lexicais de duas línguas diferentes. O primeiro empréstimo, a palavra maningue, proveniente de uma das principais línguas locais da cidade, chamada Changana, significa muito. O segundo empréstimo vem do inglês, nice, e significa legal. Assim, temos uma estrutura que poderia ser plenamente dita em Língua Portuguesa: Moçambique é muito legal, mas que, provavelmente, por motivos sociais, cede à interinfluência linguística. Os indivíduos brincam, de certa forma, com esse conhecimento multilíngue, e usam a estrutura misturada como uma indicação de que o uso simultâneo de línguas, ou o fenômeno de code-switching, é perfeitamente normal e compreensível dentro da comunidade moçambicana. 62

63 Por fim, pode-se destacar que, sendo o Português de Moçambique concebido como uma variedade ainda em formação, pesquisadores do assunto (GONÇALVES; STROUD, 1997) acreditam que, independentemente das questões sociais, tanto falantes de áreas urbanas quanto suburbanas têm chances de adquirir conhecimentos mais aprofundados da Língua Portuguesa, que poderão, futuramente, colaborar com o desenvolvimento de seu desempenho linguístico. Essa posição relaciona-se com o conceito de redes sociais 26 (TUZINE, 1997). Através desse conceito, entende-se que nem todos os indivíduos têm as mesmas oportunidades de interações sociais regulares, sejam estas sócio-profissionais, de amizade ou de vizinhança. Resumidamente, entende-se que os falantes que estabelecem contatos sociais rurais têm uma tendência maior a se afastar da aplicação das normas consideradas padrão, enquanto aqueles que convivem com mais frequência em meios urbanos apresentam comportamento linguístico mais próximo da norma de prestígio. Dado o exposto, é possível perceber que estamos diante de uma situação muito complexa, na qual se encontram indivíduos minimamente bilíngues, com níveis de proficiência distintos e que não só fazem usos alternados das línguas que conhecem, como também traçam valores diferentes sobre o uso destas, estando estes associados ou não a outros fatores sociais que possam vir a alterar o produto final da Língua Portuguesa que produzem. Ainda assim, é evidente que a variedade falada por esses indivíduos não pode ser considerada como algo único e totalmente distanciado da influência das línguas locais, como se elas não mais existissem e não pudessem afetar de alguma forma a língua majoritária. A seguir, será abordado, ainda, o tipo de função que, geralmente, é atribuído a cada uma das línguas envolvidas em uma sociedade multilíngue. 3.4 Estatuto social das línguas em sociedades multilíngues Em meio à diversidade linguística de todo o continente africano e todos os fatores linguísticos e extralinguísticos que atuam diretamente na dinâmica funcional das línguas utilizadas na África, as nações tomaram atitudes políticas de valorização, prioritariamente, das línguas coloniais, em detrimento às línguas nacionais. Em Moçambique, mais especificamente, os colonos portugueses não deram importância à 26 O autor define redes sociais como um conjunto de pessoas com quem alguém interage numa base regular. (TUZINE, 1997, p. 75). 63

64 escolarização dos nativos, sendo esta realizada em Português, a língua que distinguiria o assimilado, ou seja, o africano civilizado, que havia aprendido os elementos distintivos da civilização a língua e os costumes do colonizador (PETTER, 2015, p. 194). Com isso, a nação considerada plurilíngue, termo que não somente estabelece a oferta e o domínio de diferentes línguas, mas também a relação entre língua e cultura, é formada por uma grande quantidade de falantes multilíngues aprendentes/falantes de variadas línguas (MENEZES, 2013, p. 30). Em outras palavras, diante de tão vasta distribuição linguística, o falante faz uso de uma ou outra língua de maneira não arbitrária, ou seja, a dinâmica social de uso das línguas vai depender das políticas e juízos de valor nelas envolvidos, como afirma Petter (2015): No plano individual, o multilinguismo implica o uso pelo falante de uma ou outra língua em função do contexto comunicacional. Essa escolha, no entanto, não é arbitrária nem inconsequente; ela vai provocar a valorização de algumas línguas, as mais utilizadas conhecidas como majoritárias, e o desprestígio, e possível desparecimento de outras, aquelas que têm uso restrito ao ambiente familiar, com poucos falantes consideradas minoritárias. É a dinâmica social, que sofre impactos de ações políticas dos governos, que vai selecionar e hierarquizar o uso das línguas em presença. (PETTER, 2015, p. 195) A partir das hierarquias mencionadas pela autora, as línguas recebem diferentes papéis, caracterizadas e nomeadas como oficiais, nacionais ou veiculares. Faz-se, então, de suma importância mencionar, brevemente, o que significa cada uma delas. Língua oficial é o idioma utilizado na formação escolar e nos assuntos administrativos do país. Na maioria dos países africanos é a língua colonial, como acontece em Moçambique com o Português. Mesmo não sendo a língua utilizada por 100% dos moçambicanos, é privilegiada por sua tradição escrita e favorece, de certa maneira, assumindo seu papel de língua oficial, a unidade nacional, sendo ela o meio pelo qual se faz a comunicação entre os habitantes de todo o país. No entanto, a realidade das línguas oficiais na África teve resultado um pouco diferente do ocorrido no Brasil, por exemplo, já que o Português manteve uso restrito aos meios urbanos e às necessidades da vida moderna em grande parte das nações africanas; nas zonas rurais e no ambiente doméstico continua o emprego das línguas locais (PETTER, 2015, p. 196). As línguas nacionais, por sua vez, são os idiomas locais, de vasta extensão e grande número de falantes nos países, que as têm, na maioria das vezes, como suas línguas maternas. Essas línguas podem, futuramente, devido ao prestígio entre seus próprios 64

65 falantes e alguns linguistas, ser gramatizadas, de maneira que possam servir de fonte de ensino escolar bilíngue (cf. entre outros CHIMBUTANE, 2015; MENEZES, 2013), garantindo sucesso escolar aos que não dominam a língua oficial. Em Moçambique, esses idiomas são nomeados de línguas Bantu ou banto 27, originalmente intituladas pelo linguista Wilhem Bleek, que observou a recorrência da raiz ntu para designar ser humano, homem, pessoa e do prefixo ba- para indicar pluralidade nas línguas da região central e sul da África (PETTER, 2015, p. 36). Assim, o nome Bâ-ntu é utilizado para identificar as línguas faladas naquelas regiões do continente africano. Por fim, língua veicular é uma língua nacional considerada como língua franca do país, que serve para unificar a comunicação de falantes de línguas diversas. Geralmente, é uma língua difundida por comerciantes e pode chegar a ser mais utilizada do que a língua oficial no país em que atua. De acordo com Petter (2015, p. 197), o idioma suaíli, além de ser língua oficial da Tanzânia, Quênia e Uganda, é falado como língua franca em muitos países da costa oriental africana: no Burundi, na Somália, em Moçambique 28 e na África do Sul. O contato entre tantas línguas africanas e as línguas europeias teve como consequência a formação de novas línguas veiculares, conhecidas como pidgins ou crioulos. De acordo com Holm (2000), pidgins são línguas resultantes do contato entre falantes que não possuem uma língua em comum, os quais necessitam estabelecer comunicação verbal, especialmente comercial, mas não adquirem um a língua nativa do outro. Basicamente, trata-se de mudanças na língua como a simplificação (ex. flexões de número) e a expansão de significados das palavras para a acomodação de falantes das duas línguas, de maneira que a língua utilizada é o bastante para o contexto que precisam. 27 Terminologia linguística. Falantes leigos reconhecem como línguas locais ou nacionais. 28 Ao que tudo indica, o suaíli é falado por uma minoria de pessoas ao norte de Moçambique, apesar de ter mais de 140 milhões de falantes espalhados pela costa africana. É uma língua Bantu com grande influência da língua árabe. Segundo Said (2016): O suaíli é uma das línguas oficiais da União Africana e foi introduzido na Reunião da União em O suaíli não foi escolhido por acaso mas sim pela sua popularidade e pelo facto de já ser língua franca em grande parte de África. É uma língua africana que tem escrita desde o século XIV em caracteres árabes e no século XIX começou a ser escrito em caracteres latinos. É ainda uma língua africana que foi estandardizada muito mais cedo (1934) que as outras línguas africanas. Para além disso, também é usado amplamente em diferentes contextos socioeconómicos e políticos em África e no mundo em geral. Por exemplo, o suaíli é uma língua africana usada nas mídias internacionais. [...] A costa suaíli foi um lugar que teve muitos contactos entre povos porque historicamente foi uma zona de comércio. [...] Também tem influência da língua portuguesa, devido à dominação portuguesa na costa suaíli no século XVI e XVII na costa oriental de Africa. (SAID, 2016, p.34-35) 65

66 De maneira geral, pidgins são limitados a contextos específicos, com vocabulário restrito e não são línguas nativas de quaisquer de seus usuários. Vale ressaltar que: Usually those with less power (speakers of substrate languages) are more accommodating and use words from those with more power (the superstrate), although the meaning, form and use of these words may be influenced by the substrate languages. (HOLM, 2000, p. 5) 29 Os crioulos, por sua vez, surgiriam após a fase de pidginização. São línguas consideradas nativas, utilizadas por uma comunidade de fala, especialmente aquelas que de alguma maneira foram deslocadas de suas terras (ex. escravos) e, consequentemente, tiveram suas origens linguísticas, sociais e culturais repartidas. Em termos de exemplificação, Holm (2000) menciona o caso das crianças, filhas de escravos africanos, nascidas no novo mundo, em que o contato com os pidgins deu origem a uma nova língua, diferente das línguas nativas de seus pais. Esta, considerada um crioulo, sofreu reestruturações e acomodações que a transformaram em uma língua nativa. Although it appears that the children were given highly variable and possibly chaotic and incomplete linguistic input (because their parents used pidgins with influences from their native languages), they were somehow able to organize it into a creole that was their native language, an ability which may be an innate characteristic of our species. (HOLM, 2000, p.7) 30 Sobre a existência desses idiomas, afirma-se que há poucos crioulos na África e, particularmente, Moçambique não possui essas línguas veiculares específicas, características de Guiné-Bissau, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe, devido à situação de contato diferente em que a LP se formou nesses lugares, como afirma Petter (2015): Tradicionalmente, considera-se que o crioulo é o desenvolvimento de um pidgin, quando este se torna língua materna de uma população. Mufwene (2007), no entanto, afirma que crioulos e pidgins se 29 Geralmente, aqueles com menos poder (falantes das línguas de substrato) tendem a acomodar mais a língua e usam as palavras daqueles que têm mais poder (o superstrato), embora o significado, a forma e o uso das palavras sejam possivelmente influenciados pelas línguas de substrato. (HOLM, 2000, p. 5). Tradução nossa. 30 Embora pareça que as crianças receberam um input altamente variável e possivelmente caótico e incompleto, elas foram, de alguma forma, capazes de organizá-lo em um crioulo que se transformou na língua nativa delas, uma habilidade que pode ser considerada uma característica inata da nossa espécie. (HOLM, 2000, p. 7) Tradução e grifo nossos. 66

67 desenvolveram em espaços separados, onde europeus e não europeus interagiram diferentemente: em colônias de exploração desenvolveramse os pidgins, em colônias de povoamento surgiram os crioulos. A maioria dos pidgins está concentrada na costa Atlântica da África e nas ilhas do Pacífico, enquanto a maior parte dos crioulos se encontra no Atlântico, ilhas do oceano Índico e na costa atlântica das Américas. (PETTER, 2015, p. 211) Logo, é possível concluir que, diferentemente do ocorrido com a variedade brasileira em que o Português se consolidou como uma norma local, em áreas rurais e urbanas, para além das línguas faladas por indígenas e imigrantes, o PM tende a sofrer forte influência das línguas nacionais, já que estas continuam presentes e são realmente faladas em contextos familiares, religiosos e rurais, o que não ocorreu no PB. Nas palavras de Timbane (2014): O Português de Moçambique surgiu de contextos semelhantes com as de TLI 31, mas teve um destino diferente. Por essa razão não surgiram pidgins nem crioulos, quer dizer, os moçambicanos não precisaram de um código emergencial porque houve insistência no uso das LB. Não houve um contato direto entre os colonos e os escravos porque havia capatazes (cipaios) que serviam de intermediários (intérpretes). Os capatazes eram moçambicanos e tinham a obrigação de aprender português por ser assimilados. Por outro lado os escravos só tinham que cumprir com as obrigações impostas sob tutela dos capatazes. As LB continuavam a ser utilizadas nas igrejas independentistas africanas e a LP era quase uma ficção. [...] Em situações de TLI, as línguas nativas tenderiam a ser abandonadas, mas o que se verificou foi uma resistência acerada de tal forma que até 1980 (cinco anos após a independência), Moçambique só tinha 24.4% de falantes de português, após 500 anos de colonização. (TIMBANE, 2014, p. 9, 10) A situação encontrada em Moçambique (sobretudo nas áreas urbanas), portanto, pode ser entendida de maneira mais clara a partir do conceito de Diglossia, termo cunhado pelo linguista Psycharis, que representa um quadro linguístico no qual uma comunidade faz uso de duas línguas distintas na mesma área geográfica. Cada uma dessas línguas, no entanto, é selecionada para uma situação comunicativa e um contexto distinto. Em outras palavras, existe uma (ou mais) língua(s) primária(s), falada(s) por todos na região, 31 TLI = Transmissão Linguística Irregular Conceito que engloba tanto os processos de mudança provenientes do contato entre línguas através dos quais uma determinada língua sofre alterações muito profundas na sua estrutura, do que resulta o surgimento de uma língua nova denominada pidgin ou crioulo, quanto os processos nos quais uma língua sofre alterações decorrentes do contato com outras línguas, sem que essas alterações cheguem a configurar a emergência de uma nova língua. Definição disponível em: Acesso em 22 de agosto de

68 especialmente em contextos mais familiares, que convive diretamente com uma outra língua, aquela mais utilizada em contextos escolares e na escrita, como esclarece Ferguson (1972): Diglossia is a relatively stable language situation in which, in addition to the primary dialects of the language (which may include a standard or regional standards), there is a very divergent, highly codified (often grammatically more complex) superposed variety, the vehicle of a large and respected body of written literature, either of an earlier period or in another speech community, which is learned largely by formal education and is used for most written and formal spoken purposes but is not used by any section of the community for ordinary conversation. (FERGUSON, 1972, p ) 32 Segundo o autor, a diglossia é subdivida em nove aspectos que diferem o tipo de situação que ocorre em cada sociedade (cf. FERGUSON, 1972), a depender das línguas em contato e de questões político-sociais; são eles: (i) as funções sociais de cada língua enquanto uma das línguas é usada para obter serviços públicos e religiosos, a outra serve para comunicação dentro de casa; (ii) o prestígio a norma de uma das línguas é considerada como padrão, limitando o uso da outra aos contextos de uso vernacular; (iii) norma literária uma das línguas é tida como representativa da cultura escrita e de uma literatura mais ampla, já que a outra se reduz à cultura oral, basicamente; (iv) aprendizagem a língua de maior prestígio costuma ser aquela que é aprendida na escola e não a língua materna, já conhecida pelos falantes; (v) material didático e normativo as variedades vernaculares são, em sua grande maioria, desprovidas desse tipo de material, enquanto as variedades mais prestigiadas apresentam facilidade de acesso a eles; (vi) estabilidade a existência de diglossia é sinal de que ela dura, estavelmente, por muitas gerações, então estabelece-se uma situação conhecida por todos; (vii) gramática, (viii) léxico e (ix) fonologia os três últimos aspectos indicam a existência de diferenças muitos grandes entre as variedades em competição nesses itens do sistema linguístico, que podem vir a se complementar quando há a tentativa de usar uma no domínio da outra 32 Diglossia é uma situação linguística relativamente estável na qual, além dos dialetos primários da língua (que podem incluir um único padrão ou padrões regionais), existe uma variedade muito divergente, altamente codificada (e até gramaticalmente mais complexa) e sobreposta, que funciona como veículo de uma grande e respeitada parcela da literatura escrita, quer de um período anterior quer de outra comunidade de fala, que é aprendida, preferencialmente, pela educação formal e é usada na maioria dos contextos escritos e formais, mas não é usada por nenhum segmento da comunidade para a conversação ordinária. (FERGUSON, 1972, p , tradução nossa). 68

69 por exemplo, caso o indivíduo queira escrever algo na língua menos prestigiosa, vai precisar de apoio da língua majoritária para fazê-lo. Diante disso, percebe-se que a diglossia é um tipo de organização da distribuição das línguas em uma sociedade bilíngue (ou multilíngue) e que ela pode direcionar a situação de bilinguismo em termos sociais, uma vez que distingue os âmbitos de uso de cada língua em questão dentro da sociedade. Tomando Moçambique como exemplo, nota-se que, de fato, pode-se supor um quadro bastante real de diglossia no país, no qual o Português assume todas as funções destacadas por Ferguson como aspectos da diglossia, enquanto os idiomas nacionais continuam com o papel de caracterizar os ambientes mais familiares e representativos da cultura moçambicana. Em poucas palavras, a Língua Portuguesa é o idioma oficial, tido como responsável pela comunicação na prestação de serviços públicos, é a língua de maior prestígio dentro da sociedade, e representativa da cultura literária. Ela é aprendida formalmente na escola, através do uso de material didático (geralmente) produzido em Portugal e todos os itens do sistema gramatical podem vir a ser incorporados nas línguas locais, por ausência de itens próprios que tenham a mesma função. Além disso, a situação diglóssica, ao que parece, existe desde o início da colonização portuguesa e não apresenta indícios de chegar ao fim, o que fortalece seu caráter estável, já que a presença de línguas locais é ainda muito forte na cidade e o valor cultural das mesmas parece estar se fortalecendo com o passar das gerações. Em suma, a grande diversidade de línguas presente em Moçambique demonstra que, na presente situação de intenso bilinguismo e diglossia, é fundamental a função de cada uma delas, com valores e implicações distintos, que indicarão quando o uso de uma ou outra deve ser feito. Ao que tudo indica, mesmo que seja a língua oficial do país, o Português possui características próprias em sua variedade moçambicana, diferentes da europeia, influenciadas pela presença de línguas nacionais, cujo valor cultural não se perdeu para muitos moçambicanos, ainda que a Língua Portuguesa dita padrão seja o modelo de idioma de prestígio, de instrução formal e de comunicação geral nas áreas urbanas. Em um estudo sobre as atitudes de alunos universitários de Maputo em relação ao estatuto social das línguas faladas na sociedade, Cao Ponso (2016) faz as seguintes afirmações: 69

70 O sentimento de identificação com as línguas locais ou a preferência pelo português não variam apenas entre os falantes conforme a etnia, escolaridade, sexo, idade, bairro, mas em um mesmo falante conforme a situação de fala, o tópico, os interlocutores, a intenção, etc. Quanto maior a gama de relações pessoais do indivíduo, quanto mais alargada é sua rede social, maior variabilidade terão os estatutos das línguas, e a alternância de atitudes sobre elas tende a ser frequente e instável conforme, inclusive, os repertórios linguísticos dos outros falantes com que entra em contato ao longo da vida. [...] O que o contexto estudado em Maputo mostra é que, em uma situação plurilíngue, se multiplicam de tal forma as possibilidades de alternância desses valores na negociação, que o que chama a atenção não são as atitudes em si, mas a transferência de uma atitude a outra, ou seja, a relação no mesmo falante entre uma atitude favorável e desfavorável em relação à mesma língua em um espaço muito curto de tempo (ou ainda uma atitude favorável em relação a duas ou mais línguas com estatutos sociais muito diferentes). (CAO PONSO, 2016, p ) Assim, entende-se que, de fato, a situação de Moçambique causa conflitos entre seus falantes, que ora valorizam uma língua em detrimento da outra, e ora atribuem valor positivo a todas as línguas em contato, mesmo que estas tenham estatutos diferentes dentro da sociedade. A seguir, então, tratar-se-á de como o aspecto multilíngue e todo esse panorama parece funcionar na variedade moçambicana, considerando, especialmente, os elementos que a aproximam e a diferenciam das outras variedades, constituindo os eixos de um continuum de variação. 3.5 Formação das variedades do Português: das origens ao continuum afrobrasileiro Considerando as questões discutidas na seção anterior, faz-se necessário apresentar, de maneira sucinta, o profícuo debate sobre as origens do Português Brasileiro, já que o estudo tem como um dos seus objetivos observar, mesmo que de forma resumida, se o contato linguístico presente antes e durante o processo de difusão da Língua Portuguesa por parte dos colonizadores europeus na África e atuante até os dias correntes exerce alguma influência sobre o Português falado hoje nessas áreas e definir quais as implicações desses resultados para a interpretação do que aconteceu durante o período de aquisição da Língua Portuguesa por parte dos moçambicanos. 70

71 Assumindo o princípio do uniformitarismo 33 (LABOV, 2001), acredita-se que os resultados desta pesquisa poderão auxiliar na compreensão do processo histórico de inserção da língua também em outras variedades, como a brasileira, que surgiram igualmente em situação de contato linguístico com línguas indígenas e desde então provocam forte oposição (rural x urbano / mais x menos escolarizado) nas comunidades de fala. Assim, ao descrever as características do PM e tentar aproximá-las às do PB e/ou do PE, configura-se naturalmente um debate sobre a origem das variedades, de modo que é relevante compreender a polêmica discussão em torno desse assunto. Ao investigar as origens do PB, encontram-se duas importantes linhas de pensamento, que divergem em seus conceitos sobre como teria se dado a formação dessa variedade. Uma dessas linhas, defendida por Naro; Scherre (2007), é conhecida como a Tese da Deriva Secular e a outra, defendida por Lucchesi (2009), trata da hipótese do contato entre línguas. Segundo Naro; Scherre (2007), o Português Brasileiro seria uma continuação do Português arcaico, com algumas pequenas alterações, pois nada se identificou no Brasil que também não ocorresse em Portugal (NARO; SCHERRE, 2007, p. 13). Assim, os autores afirmam que o PB não necessitava de qualquer influência estrutural vinda de fora, porque, se existiu alguma influência externa, nenhum vestígio dela permaneceu, uma vez que não produziu nenhuma estrutura nova ou qualquer outro efeito identificável. Dessa forma, eles acreditam que as diferenças entre o PB e o PE são apenas uma questão de grau e não de tipo, pois o contexto social do Brasil permitiu graus mais altos de liberdade para a evolução de variações, uma vez que a hipótese deles está baseada no pressuposto de que o PB tendia a levar adiante tendências que já estavam presentes (NARO; SCHERRE, 2007, p. 67) no Português Europeu. Em outras palavras, os autores assumem que não é possível evidenciar influências como o multilinguismo de falantes adultos ou a interferência de primeiras línguas no Português Brasileiro que fossem, a longo prazo, visivelmente diferentes das estruturas advindas de Portugal. Assim, não teria ocorrido qualquer efeito diferente do input 33 Labov (2001) postula que o princípio do uniformitarismo se baseia na utilização do presente para explicar o passado. Isto quer dizer que os eventos linguísticos que encontramos hoje são do mesmo tipo dos que se desenvolveram em épocas passadas. Existem especificidades, como as regras que são aplicadas, que são diferentes em cada época e não podem ser desprezadas. Ainda assim, os padrões gerais de mudança tender a ser sempre os mesmos. 71

72 europeu, mas as condições linguísticas e sociais teriam apenas acelerado a tendência de entrada de novas variantes durante o processo de nativização do PE: A língua portuguesa já veio para o Brasil com suas características inapropriadamente denominadas de crioulizantes, que aqui floresceram, regadas por condições sociais generosas, como uma norma linguística mais branda e flexível, criada no contexto da existência de multilinguismo generalizado e da aquisição de português como 2ª língua. (NARO; SCHERRE, 2007, p. 133) Por outro lado, para Lucchesi (2009), o PB seria consideravelmente diferente do PE por causa, dentre outros fatores, da presença de pessoas de origem africana no Brasil, cujas línguas nativas teriam influenciado o PB. Do ponto de vista teórico, essa influência poderia ter ocorrido por meio de um estágio de pidgin ou de um crioulo de base lexical portuguesa. Nesse caso, o autor refere-se ao conceito clássico de crioulização, ou seja, um processo que passa por dois estágios: (i) no primeiro deles, há um pidgin que é utilizado por não haver uma língua natural em comum entre as comunidades, estágio em que o vocabulário surge de uma língua base e qualquer estrutura que estabeleça comunicação é válida; (ii) no segundo estágio, normas gramaticais começam a surgir, dando início à crioulização de fato, quando o pidgin se torna a língua nativa de uma das comunidades. A esse conceito relaciona-se a ideia de Transmissão Linguística Irregular, ou seja, a Língua Portuguesa falada pelos brasileiros teria sua origem ligada ao contingente de africanos que adquiriram o Português de forma defectiva, produzindo uma variedade linguística muito diversificada e, teoricamente, não suscetível de análise ordenada. Não havendo evidências inquestionáveis para os processos de pidgnização e crioulização na formação do PB, o autor defende que teria havido um processo de transmissão linguística irregular e que, no entanto, essa transmissão teria sido do tipo leve porque não levou à reestruturação total da L2, como ocorre nas línguas crioulas. O fenômeno da variação na concordância verbal é um dos temas mais usados para exemplificar esse debate. Para a tese da Deriva Secular, a concordância seria um processo contínuo e gradual de perda de marcas morfológicas, enquanto para a hipótese da transmissão linguística irregular o contato linguístico teria produzido uma variedade marcada pela redução da morfologia lexical do verbo, o que negaria a hipótese da Deriva. Em outras palavras, o contato teria influenciado de maneira tão intensa que pensar apenas em um processo gradual de perdas não refletiria o que realmente ocorreu: uma 72

73 massificação dos modelos urbanos sendo introduzida nos contextos mais abrangentes como a escola e os meios de comunicação, que permitiram a reprodução desse novo modelo de morfologia reduzida em todas as áreas da sociedade. As regras de concordância teriam sido profundamente afetadas; ao passo que, a partir de meados do século XX, a regra estaria sendo reintroduzida nessas comunidades rurais por influência dos modelos linguísticos urbanos, através do deslocamento populacional, da influência dos meios de comunicação de massa e massificação do ensino público (LUCCHESI, 2009, p. 349) As críticas de Lucchesi sobre a abordagem derivista estão relacionadas a questões como a desvalorização de alguns fatores sociais específicos da variedade brasileira, a polarização sociolinguística e o seletivismo. Sobre os fatores sociais desconsiderados na abordagem da Deriva, o autor destaca o papel importante dos afrosdescendentes, com suas línguas maternas diversificadas, o que propiciava forte e constante contato linguístico para os indivíduos durante o processo de aquisição do Português: [...] se a crioulização do português do Brasil foi, na melhor das hipóteses, um fenômeno historicamente efêmero e localizado, não se pode pensar seriamente que a língua portuguesa não foi diretamente afetada pelo contato do português com as línguas africanas de uma forma bem ampla e representativa, até porque os afrodescendentes se integraram em todos os segmentos sociais e nos mais diferentes ramos da atividade econômica, em todas as regiões do país; concentrando-se, porém, na base da pirâmide social, em função das adversidades históricas que tiveram que enfrentar. (LUCCHESI, 2009, p. 28) Com isso, percebe-se que as condições para o aprendizado da língua do colonizador eram bastante adversas, restringindo o conhecimento ao uso de um vocabulário reduzido e à falta de estruturas gramaticais que alicerçassem a construção da língua modelo que se pretendia alcançar. Assim, as crianças tinham acesso a um modelo de língua defectivo, como ressalta Lucchesi (2009): [...] as crianças têm de atender aos requerimentos de marcadores de tempo, modo e aspecto, de regência e ligação, operadores pronominais, etc., inerentes ao desenvolvimento de sua língua materna, a partir de dados linguísticos primários que provêm, no caso da maioria dos adultos que as cercam, de uma segunda língua desprovida da maior parte desses elementos e mecanismos gramaticais (LUCCHESI, 2009: p. 29) 73

74 Para além disso, o autor afirma que muitas análises sobre a Língua Portuguesa deixam de investigar o que ocorreu com aqueles indivíduos que não faziam parte da elite portuguesa, ou seja, observam somente aqueles que adquiriram a língua com falantes nativos, fazendo dela sua língua materna. Este é o princípio criticado por Lucchesi quanto à polarização sociolinguística, que, de acordo com ele, é ignorada nas abordagens da Deriva: A polarização sociolinguística que marca a formação histórica da realidade linguística brasileira, apartando a fala de uma elite que sempre teve os olhos voltados para a Europa, em busca de seus modelos culturais e linguísticos, da fala da grande maioria da população que, no cadinho de sua pluralidade étnica, cultural e linguística, forjou os elementos definidores da originalidade cultural e linguística do Brasil, que tanto assombram e encantam o mundo ocidental, desautoriza todos os estudos que apresentam uma história única para o português brasileiro. Assim como o português são dois, a sua história é igualmente bifurcada. (LUCCHESI, 2009, p. 30) Por fim, sobre o seletivismo, o autor critica o fato de que a Tese da Deriva é baseada em dados isolados, que levam a uma determinada tendência, ao invés de indicarem o panorama geral das mudanças ocorridas na Língua Portuguesa falada no Brasil. O autor justifica esse pensamento ao mencionar a simplificação morfológica: Porém essa simplificação morfológica, característica das situações de contato entre línguas, não se restringe, no português do Brasil, à eliminação das regras de concordância. Em vários planos da estrutura linguística, observa-se um quadro matizado e complexo, no qual os processos de variação e mudança induzidos pelo contato entre línguas apresentam resultados quantitativos diferenciados nas distintas normas linguísticas que constituem a realidade da língua no Brasil atualmente. (LUCCHESI, 2009, p. 72) Assim, para Lucchesi, é possível concluir que mesmo que não tenha havido um processo abrupto de crioulização no PB, que desse origem a uma nova variedade totalmente diferente do PE não se pode desconsiderar o papel extremamente relevante do contato linguístico na formação dessa variedade. Como explica a hipótese de Lucchesi (2009): [...] se as condições em que o contato do português com as línguas indígenas e africanas ocorreram no Brasil não deram ensejo a processos de crioulização do português duradouros e representativos, elas foram bastante propícias a que os processos de variação e mudança 74

75 desencadeados pelo contato linguístico afetasse, direta ou indiretamente, todas as variedades históricas do português brasileiro, sem atingir a intensidade necessária para produzir uma variedade linguística qualitativamente distinta das demais, pois tal processo (a crioulização) deve ter ocorrido, mas de forma localizada e efêmera, não produzindo uma variedade linguística que se conservasse em uso até os dias de hoje. (LUCCHESI, 2009, p ) A partir de tal reflexão sobre as origens do PB, entende-se que, devido à similaridade da formação deste com a formação do PM, principalmente devido ao intenso contato linguístico durante o período de estabelecimento da Língua Portuguesa, demonstra-se um fator muito significativo para a análise de ambas as variedades, mesmo que alguns dos processos, como o estágio de crioulização, por exemplo, não sejam comuns às duas. Se no Brasil, em que o contato ocorreu com mais vigor no início do processo, alguns linguistas defendem a influência das línguas indígenas e africanas na formação da variedade que se fala hoje, o papel das línguas locais em Moçambique é igualmente relevante, ou até ainda mais expressivo, dado que a quantidade de línguas em contato com o Português é muito maior e está fortemente presente nos dias atuais. Sendo assim, a variedade moçambicana estaria mais próxima da variedade brasileira, em termos de formação sócio-histórica, do que da europeia, que é, supostamente, seu modelo de aquisição e instrução escolar. Ponderando, então, as semelhanças no processo de formação do PB e do PM e levando em conta os desvios da norma europeia encontrados em ambos (sobre os erros em relação ao PE encontrados no PM, cf. Capítulo 2), cabe observar que cada variedade da Língua Portuguesa indica similaridades e diferenças que ora as aproximam, ora as afastam. Como aponta Petter (2015), a simetria entre PB e PM parece ocorrer pelo fato de as duas variedades terem sido, em princípio, formadas de maneira bem parecida, em contextos pós-coloniais: A história colonial, compartilhada pela maioria dos países de língua oficial portuguesa, difundiu a visão de que o português falado na metrópole deveria ser o modelo para as demais variedades nãoeuropeias dessa língua. As ex-colônias, no entanto, desenvolveram uma expressão própria de português, e criaram formas divergentes daquelas da antiga metrópole, o que suscitou estudos comparativos que apontavam os traços que afastavam da norma europeia as novas variedades de português. (PETTER, 2015, p. 306) O estudo comparativo das variedades do Português, especialmente a brasileira, a 75

76 moçambicana e a angolana, permite que se reconheça a existência não só de diferenças com relação ao Português Europeu, mas de semelhanças entre as três, haja vista o fato de compartilharem suas origens em contatos linguísticos com línguas africanas de origem bantu (cf. PETTER, 2015). As semelhanças fonológicas, lexicais e morfossintáticas sugerem, nos termos de Petter (2008), a formação de um continuum afro-brasileiro do português, já que a expansão da Língua Portuguesa teria ocorrido da mesma maneira, isto é, através de um processo de colonização, semelhante à romanização, comum às três variedades (PA, PB, PM): Assim como o continuum de línguas românicas, o continuum dessas variedades de português resulta de uma mistura de línguas locais com uma língua dominadora comum. No caso da expansão do latim, essa mistura não só uniu as variedades linguísticas derivadas desse contato reconhecidas hoje como línguas românicas, mas também as separou em diferentes línguas. (PETTER, 2015, p. 307) Com esse continuum, entende-se que a língua europeia se multiplica em variedades que partem de uma origem comum e passam por processos de mudança distintos, a depender dos contextos em que se encontram. O PB, por exemplo, contava ainda, na época de sua implantação, com a influência de línguas indígenas, enquanto o PM, ainda hoje, convive em situação de contato linguístico intenso, já que as línguas nacionais estão presentes na fala de uma comunidade que tem a Língua Portuguesa como língua oficial, seja ela sua L1 ou L2. Portanto, propõe-se que: [...] as variedades não europeias de português sejam colocadas num continuum que tem num dos extremos as línguas parcialmente reestruturadas as variedades angolana, brasileira e moçambicana e, no outro, as línguas completamente reestruturadas as variedades crioulas de Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe. (PETTER, 2015, p. 315) Ocorre que, como já atestado em trabalhos científicos e no continuum de polarização de Lucchesi (2015), o Português do Brasil apresenta níveis variados de aplicação da regra, definidos em grande parte por fatores de natureza extralinguística, como a escolaridade e o eixo rural-urbano e outros de natureza linguística, como a posição do sujeito em relação ao verbo, a saliência fônica, o paralelismo discursivo/oracional e a distância entre o sujeito e o verbo. Sobre a variedade moçambicana, no entanto, é necessário aprofundar a descrição linguística propriamente dita, ancorada em quadros 76

77 teóricos sólidos, que permitam explorar, de forma sistemática, os fatores internos e externos envolvidos no desencadeamento de fenómenos de variação a nível da CV (GONÇALVES, 2015, p. 15), uma vez que os trabalhos realizados (cf. trabalhos citados na p. 86) sobre a variedade moçambicana não apresentam nenhum tipo de aprofundamento que os caracterize e que permita não só a comparação com outras variedades, mas também a constatação da hipótese do continuum afro-brasileiro do português. Portanto, ainda que as pesquisas mencionadas (Seção 4.2.3) não sejam compatíveis com as já realizadas sobre o PB e o PE em termos quantitativos, e muito menos apresentem respostas definitivas sobre a variedade moçambicana do Português, elas trazem luzes ao que se pretende buscar no presente estudo, ou seja, a constatação não só de que há variação linguística nesta variedade, como há em qualquer língua natural, mas a de que ela está intrinsecamente ligada às questões sociolinguísticas, como se verá a seguir. Esse cenário é altamente produtivo para a pesquisa tanto qualitativa quanto quantitativa, à luz dos pressupostos teóricos que se pretende empregar. 77

78 4 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA: A CONCORDÂNCIA VERBAL Tema de grandes debates no que tange às variedades do Português, pretende-se apresentar, resumidamente, nesta seção, os aspectos mais relevantes sobre a concordância verbal. Considerando, primeiramente, a perspectiva dos compêndios gramaticais tradicionais, serão levantadas as regras gerais de formação da marcação de número da Língua Portuguesa, exploradas ao longo da Seção 4.1. Ao lado da tradição, no entanto, caminham estudos sobre as variedades do Português que demonstram a existência de variação na aplicação dessas regras, especialmente nas variedades brasileira e africana, ou seja, nem todas as regras postuladas pelas gramáticas, que têm o Português Europeu como modelo padrão, são aplicadas da mesma maneira nas variedades. Logo, faz-se relevante explorar o que as pesquisas encontraram como resultado dessa variação, para que se tenha um panorama geral da situação em que se encaixa o fenômeno em estudo. Sendo assim, objetiva-se, em seguida, na Seção 4.2, apontar os principais estudos sobre essas variedades: a brasileira, que demonstra caráter efetivamente variável, será apresentada na Seção 4.2.1; na Seção 4.2.2, observa-se a variedade europeia, cujos resultados demonstram preferência pelos usos considerados padrão, caracterizando uma regra semicategórica; e, por fim, as variedades africanas, analisadas na Seção 4.2.3, que carecem ainda de estudos mais aprofundados, parecem estar localizadas entre as variedades brasileira e europeia com uma regra variável, de forma menos produtiva do que no caso da brasileira, e não tão próxima do categórico, como no caso da europeia, sendo objetivo de tal pesquisa explorar a variedade falada em Maputo. 4.1 Abordagem tradicional A abordagem tradicional, além de descrever as estruturas da língua, adota uma orientação normativa, postulando regras diversas de comportamento social, sobretudo para a escrita literária, dentre as quais está a de marcação de número, instituindo o que constituiria o modelo de norma-padrão. De acordo com esse tratamento, o verbo e o sujeito são solidários, uma vez que a forma verbal varia para se conformar à pessoa e ao número expressos no sujeito, constituindo, assim, a concordância verbal padrão. Postula-se a regra geral, então, para construções com sujeito de um só núcleo, de maneira que o verbo deve concordar em gênero e número com esse sujeito simples. Já 78

79 para o caso de existir mais de um núcleo na construção, o chamado sujeito composto, o verbo deve ir para o plural e para a pessoa que tiver primazia na construção. O quadro a seguir mostra as definições fornecidas pelos gramáticos brasileiros Cunha; Cintra e Rocha Lima: Quadro 1 Regras gerais de concordância verbal de acordo com gramáticas tradicionais brasileiras. Sujeitos simples (apenas um núcleo) Sujeitos compostos (mais de um núcleo) Regra geral O verbo concorda em número e pessoa com o seu sujeito, venha ele claro ou subentendido (Cunha; Cintra, 2007, p. 511) [...] quanto à pessoa, irá: a) para a 1ª pessoa do plural, se entre os sujeitos figurar um da 1ª pessoa; b) para a 2ª pessoa do plural, se, não existindo sujeito da 1ª pessoa, houver um da 2ª; c) para a 3ª pessoa do plural, se os sujeitos forem da 3ª pessoa. (Cunha; Cintra, 2007, p. 512) Havendo um só núcleo (sujeito simples), com ele concorda o verbo em pessoa e número. (Lima, 1998, p. 353) o verbo vai o plural e para a pessoa que tiver primazia, na seguinte escala: a) A 1ª pessoa pretere todas as outras. b) Não figurando a 1ª pessoa, a precedência cabe à 2ª. c) Na ausência de uma e outra, o verbo assume a forma da 3ª pessoa (Lima, 1998, p. 353) Ao lado da concordância gramatical, que abarca as regras de marcação nos verbos com relação ao seu sujeito, a tradição apresenta o conceito de concordância ideológica, que trata das realizações estruturais que fogem às regras básicas postuladas nos compêndios. Nas palavras de Bechara (1987, p. 95), a concordância ideológica significa um consentimento que se faz do vocábulo para o sentido. Dessa maneira, a forma é desprezada e o foco é dado à ideia representada na palavra, ou seja, à ideia que a palavra gera. Para além da regra geral e da possibilidade de se concordar com a ideia ou sentido plural, as gramáticas tradicionais apresentam, ainda, outras regras que são definidas como particulares ou exceções. São elas: as expressões partitivas, as expressões de quantidade aproximada, as construções com o verbo ser, com os pronomes 79

80 interrogativos, indefinidos e demonstrativos, o pronome relativo que, expressões como um e outro e mais de um, que podem ser sintetizadas no quadro a seguir: Quadro 2 Regras particulares de concordância verbal de acordo com gramáticas tradicionais brasileiras. Expressões partitivas Expressões de quantidade aproximada (cerca de, perto de, mais de, menos de, etc.) Verbo ser Regras Particulares/Exceções Quando o sujeito é constituído por expressão partitiva (como: parte de, uma porção de, o grosso de, o resto de, metade de e equivalentes) e um substantivo ou pronome plural, o verbo pode ir para o singular ou para o plural. (CUNHA; CINTRA, 2007, p. 513) Postas antes de um número no plural para indicar quantidade aproximada, estas expressões requerem a concordância no plural, exceto com o verbo ser, em que há vacilação. (LIMA, 1988, p. 361) Quando o sujeito do verbo ser é um dos pronomes isto, isso, aquilo, tudo, o (que) = aquilo (que), ou uma palavra de sentido coletivo (o resto, etc.), e o verbo vem acompanhado de um predicativo constituído por um substantivo do plural, o verbo concorda, em regra geral, com o predicativo. (SILVEIRA, 1983, p. 216) Quando o verbo ser, usado impessoalmente, tem um predicativo, concorda com este. (SILVEIRA, 1983, p. 217) Pronomes interrogativos, indefinidos e demonstrativos Pronome relativo que Se o sujeito é formado por algum dos pronomes interrogativos (quais?, quantos?), dos demonstrativos (estes, esses, aqueles) ou dos indefinidos no plural (alguns, muitos, poucos, quaisquer, vários), seguido de uma das expressões de nós, de vós, dentre nós ou dentre vós, o verbo pode ficar na 3ª pessoa do plural ou concordar com o pronome pessoal que designa o todo. (CUNHA; CINTRA, 2007, p. 517) (i) O verbo que tem como sujeito o pronome 80

81 um e outro mais de um relativo que concorda em número e pessoa com o antecedente desse pronome; (ii) se o antecedente do relativo que é um demonstrativo, que serve de predicativo ou aposto de um pronome pessoal sujeito, o verbo do relativo pode concordar com o pronome pessoal sujeito [...] ou ir para a 3ª pessoa, em concordância com o demonstrativo; (iii) quando o relativo que vem antecedido das expressões um dos, uma das, o verbo de que ele é sujeito vai para a 3ª pessoa do plural ou, mais raramente, para a 3ª pessoa do singular; (iv) depois de (um) dos que (= um daqueles que) o verbo vai normalmente para a 3ª pessoa do plural. (CUNHA; CINTRA, 2007, p ) O substantivo que se segue à expressão um e outro só se usa no singular, mas o respectivo verbo pode empregar-se no singular ou no plural. (LIMA, 1988, p. 356) Fica no singular o verbo, concordando com o substantivo que acompanha a expressão. Se a expressão mais de um estiver repetida, ou se for intenção do escritor inculcar idéia de reciprocidade, é ao plural que recorrem os bons autores. (LIMA, 1988, p. 357) Através da descrição dos casos particulares, como a concordância ideológica e as exceções supracitadas, indica-se que, no uso real da língua, a regra geral postulada nas gramáticas não é aplicada categoricamente em todos os contextos, quando colocada em prática pelos falantes. A partir das descrições sociolinguísticas, verifica-se, entretanto, que a variabilidade presente no fenômeno da concordância ocorre em muitos contextos, ainda que não explicitamente legitimada nos compêndios, e alcança alta produtividade 81

82 especialmente na gramática da fala popular, como já constatado em estudos realizados sobre a oralidade. Vale ressaltar que as gramáticas aqui mencionadas têm como propósito a sistematização da gramática do Português padrão brasileiro, ou seja, elas consideram as normas gramaticais da Língua Portuguesa que se encontram presentes na literatura de escritores brasileiros, portugueses e africanos (cf. CUNHA; CINTRA, 2007). Em outras palavras, baseiam-se nas normas daquilo que se considera o padrão da língua escrita, que teve como modelo idealizado o Português Europeu, reconhecidamente muito distante do Português popular brasileiro, especialmente em sua modalidade oral. Ao que parece, esse cenário de um modelo padrão idealizado que sofre divergências, particularmente na variedade popular do Brasil, é bastante similar ao que ocorre no Português de Moçambique, onde muitos materiais didáticos de ensino de Língua Portuguesa são produzidos por portugueses e a gramática é toda voltada para o Português padrão escrito, enquanto a língua oral sofre fortes influências das línguas bantu em uso na sociedade, causando uma separação entre o que se vê na escola e o que se vivencia nos outros ambientes. Sendo assim, o estudo da gramática da fala desta variedade tende a apresentar as mesmas variações ou, pelo menos, muito similares, encontradas no PB, que são passíveis, portanto, de serem sistematizadas em estudos variacionistas quantitativos e qualitativos. A seguir, apresentam-se as principais tendências sociolinguísticas quanto à concordância verbal nas três variedades do Português: a brasileira, a europeia, a sãotomense e a moçambicana, respectivamente, com o objetivo de revisar a literatura sobre o assunto e delimitar o escopo da presente pesquisa. 4.2 Descrições sociolinguísticas: tendências gerais A Sociolinguística postula a variação como propriedade inerente à língua, e seu objeto de estudo considera a sistematização da heterogeneidade presente nessa variação, o que permite a caracterização das variedades de Língua Portuguesa. Segue, então, o resumo das sistematizações da língua já realizadas por trabalhos variacionistas que se debruçaram sobre o fenômeno da concordância verbal. 82

83 4.2.1 No Português Brasileiro Sobre a formação do Português Brasileiro (PB), especialmente sobre a variação na concordância verbal, profícuo debate já desenvolvido por renomados linguistas (NARO, 1981; SCHERRE; NARO, 1993, 2007; LUCCHESI; BAXTER; SILVA, 2009) levanta a possibilidade de existirem, pelo menos, duas concepções para seu desenvolvimento, como resumido por Vieira; Bazenga (2013): uma que pressupõe que os índices brasileiros de cancelamento da marca de número tiveram origem no Português Europeu (PE) transplantado para o Brasil, de acordo com o movimento próprio da deriva linguística; e outra que propõe ser a falta de concordância brasileira resultante da intensa situação de contato linguístico, que teria dado origem a uma transmissão linguística irregular. (VIEIRA; BAZENGA, 2013, p. 29) De acordo com esses pressupostos, Lucchesi; Baxter; Silva (2009), que defendem a segunda proposta, sugerem o estabelecimento de um continuum que demonstra um caráter crescente de aplicação das marcas no PB quando se observam a localidade (rural x urbano) e a escolaridade dos falantes (menos escolarizados x mais escolarizados): No que diz respeito à variação na aplicação da regra de concordância verbal associada à 3ª pessoa do plural, o panorama sociolinguístico da língua portuguesa no Brasil fornece importantes evidências empíricas favoráveis à hipótese do contato entre línguas como móvel do processo de variação e mudança. A primeira delas diz respeito aos níveis diferenciados de variação que se encontram nas diferentes variedades do português brasileiro, constituindo o seguinte continuum: (i) nas comunidades rurais afro-brasileiras do interior do Estado da Bahia, o nível de aplicação da regra de concordância é da ordem de 16%; (ii) em comunidades de pescadores analfabetos ou pouco escolarizados, no norte do Estado do Rio de Janeiro, esse nível sobe para 38% (VIEIRA, 1997); (iii) na fala de analfabetos da cidade do Rio de Janeiro, o nível de aplicação já é de 48% (NARO, 1981); (iv) na fala de indivíduos escolarizados das cidades do Rio de Janeiro e de Florianópolis, na região Sul do Brasil, a regra de concordância verbal já é aplicada com uma frequência de 73% e 79%, respectivamente (SCHERRE; NARO, 1997; MONGUILHOTT; COELHO, 2002, respectivamente); (v) na norma urbana culta do Rio de Janeiro, os falantes usam a regra com uma frequência de 94% (GRACIOSA, 1991). (LUCCHESI; BAXTER; SILVA, 2009, p. 348) A interpretação desse continnum é confirmada pelos muitos pesquisadores que já 83

84 investigaram a concordância verbal de 3ª pessoa na variedade brasileira e comprovaram claramente o panorama do comportamento de uma regra variável 34 na marcação de plural, além de constatarem as diferentes taxas de aplicação da regra dentro do continuum proposto por Lucchesi et al. (cf., entre outros trabalhos variacionistas, NARO, 1981; GRACIOSA, 1991; SCHERRE; NARO, 2006; VIEIRA, 1995; VIEIRA; BAZENGA, 2013). Ressalte-se que, ainda que sejam destacadas apenas as investigações do mesmo estado (Rio de Janeiro), os resultados obtidos em cada uma delas são bastante distintos, como se verá a seguir (Tabela 5). Essa evidente distinção, relacionada principalmente aos eixos do continnum de Lucchesi et al., demonstra claramente aquilo que os autores chamam de polarização sociolinguística brasileira no que tange às regras de concordância: Os resultados das análises sociolinguísticas disponíveis revelam dois processos distintos de variação e mudança: um processo de variação estável nos segmentos urbanos intermediários (com um ligeira gradação geracional na norma culta) e um processo de incremento do uso da regra de concordância nos segmentos populares do campo e da cidade. [...] A diferença nas tendências do processo de variação e mudança nos estratos sociais urbanos de alta e média escolaridade, por um lado, e nos segmentos populares, por outro, bem como as diferenças quantitativas na frequência de uso das regras e as diferenças qualitativas na avaliação subjetiva das variantes linguísticas, estão na base da formulação da polarização sociolinguística do Brasil aqui apresentada. (LUCCHESI, 2015, p ) Assim, para distinguir cada eixo desse continuum de polarização, Lucchesi (2015) utiliza a seguinte nomenclatura, que identifica as variedades quanto aos níveis de escolaridade e a localidade: o português urbano culto, representado por informantes de áreas urbanas com ensino superior completo; o português urbano médio, retratado pelos indivíduos que possuem de um a onze anos de escolarização, também de zonas urbanas; o português popular rurbano, reproduzido por informantes com pouca ou nenhuma escolaridade, moradores da periferia de comunidades urbanas, onde há integração entre as culturas urbanas e rurais; o português popular urbano, refletido nos falantes 34 Conforme desenvolvido na Seção 3.1 deste trabalho, consoante Labov (2003), considera-se uma regra variável aquela que atinge até, aproximadamente, 94% de aplicação da regra, e semicategórica, aquela que varia entre 95% e 99% de aplicação. A categórica, consequentemente, seria aquela que chega aos 100% de aplicação da regra. 84

85 analfabetos ou com pouquíssima escolaridade, residentes do interior; e o português popular rural, que designa a língua de indivíduos também pouco escolarizados ou analfabetos da zonal mais rural, com traços descontinuados e muito estigmatizados pelos falantes urbanos cultos. Tendo em vista que a variedade brasileira vem sendo investigada há muito tempo e por muitos variacionistas dentro de cada uma das categorias listadas, optou-se por destacar, na presente seção, trabalhos realizados no estado do Rio de Janeiro, já que não caberia levantar dados de todas as investigações já realizadas sobre o fenômeno. Considerando, então, a tipologia de normas proposta por Lucchesi (2015), a investigação de Graciosa (1991) seria representante do português urbano culto, cuja amostra foi baseada em entrevistas do projeto NURC-RJ; Scherre; Naro (2006), com base no corpus PEUL-RJ, investigam o chamado português urbano médio; Naro (1981), cujo trabalho teve como informantes indivíduos analfabetos da amostra Mobral-RJ, representaria o português popular urbano. Vieira (1995), por sua vez, representa o português popular rural, com pesquisa que utiliza amostras do Projeto Aperj-RJ. Por fim, vale destacar que Lucchesi, Baxter; Silva (2009), ao discutirem o continuum de uso da regra de concordância verbal na variedade brasileira como um todo, trazem, ainda, dados de fala vernacular da comunidade de Helvécia-BA, representativos do português popular rural. Apesar de ser um estudo com dados do estado da Bahia, acredita-se ser importante mencionar o resultado final deste trabalho, já que este retrata o extremo do continuum que não é descrito naqueles trabalhos realizados no Rio de Janeiro. Considerando, portanto, todas essas pesquisas, é possível esboçar o continuum de aplicação da regra de concordância, que vai de 94%, na investigação de Graciosa (1991) do português urbano culto, a 16%, na pesquisa de Lucchesi et al. (2009) do português popular rural. A partir dessa distribuição e com base na proposta dos autores sobre a polarização sociolinguística brasileira, Vieira; Bazenga (2013, p. 61) sugerem a seguinte distribuição para demonstrar o continuum: 85

86 Tabela 5 Continuum de marcação de pluralidade em verbos de P6 consoante os traços rural / urbano e os graus de escolaridade em variedades brasileiras na proposta de Lucchesi et al. (2009). [+ marcas] [- marcas] RJ RJ RJ RJ BA Urbano Urbano Urbano Rural Rural Altamente Moderadamente Comunidades Analfabeto Analfabeto escolarizado escolarizado afrobrasileiras Graciosa Scherre; Naro Lucchesi et al. Naro (1981) Vieira (1995) (1991) (2006) (2009) 48% 38% 94% 73% 16% Fonte: Vieira; Bazenga, 2013, p. 61 Verificando sobretudo os extremos desse continuum, é possível observar a polarização sociolinguística presente no PB, relacionada, principalmente aos fatores escolaridade e perfil rural/urbano, já que é possível perceber o extremo distanciamento, em termos percentuais, entre o Português da elite escolarizada (94%) versus o Português das áreas mais rurais (16%). Em suma, quanto mais urbanos e mais escolarizados são os indivíduos, mais altos são os índices de marcação de plural. Por outro lado, quanto mais isoladas forem as comunidades, menores são as taxas de escolaridade e, consequentemente, os índices de concordância são igualmente mais baixos. Os estudos supracitados também demonstram que o cancelamento da marca de concordância na variedade brasileira ocorre em contextos bastante variados. Observando três desses trabalhos no Quadro 3 (GRACIOSA, 1991; SCHERRE; NARO, 2006; VIEIRA, 1995) e os níveis de escolaridade dos informantes, Vieira; Bazenga (2013, p. 70) trazem o seguinte quadro, que resume as variáveis selecionadas como mais relevantes: Quadro 3 Variáveis relevantes em estudos de concordância verbal de P6: amostras brasileiras com diferentes níveis de escolaridade. Nível superior de escolaridade (Graciosa, 1991) Posição do sujeito em relação ao verbo Distância entre sujeito e verbo Nível intermediário de escolaridade (Scherre; Naro, 2006) Saliência fônica (exceto 9-11 anos) Posição do sujeito em relação ao verbo Ausência de escolaridade (Vieira, 1995) Saliência fônica Paralelismo oracional e discursivo 86

87 Paralelismo discursivo Traço semântico do sujeito sem dados ou não controlados Paralelismo oracional e discursivo Traço semântico do sujeito Posição do sujeito em relação ao verbo Traço semântico do sujeito Presença do relativo que Presença de pausa: sujeito e verbo Fonte: Vieira; Bazenga, 2013, p. 70 Distância entre sujeito e verbo De acordo com o Quadro 3, os contextos estruturais explorados a seguir, comuns à marioria dos estudos já realizados, parecem ser os mais significativos no fenômeno da concordância verbal na variedade brasileira: (i) a posição do sujeito em relação ao verbo sujeitos em posição anterior ao verbo favorecem a colocação das marcas de plural (ex. As encomendas chegaram), ao contrário do que ocorre com sujeitos em posição posterior, pois o verbo perde a referência singular/plural, permitindo maiores possibilidades de apagamento das marcas de número no verbo (ex. Chegou as encomendas); (ii) a saliência fônica verbos em que a diferenciação entre as formas de singular e plural é mais evidente propiciam a presença das marcas, como ocorre, por exemplo, no par é x são. Por outro lado, formas muito similares como come x comem, em que a diferença pode ocorrer apenas pelo acréscimo de nasalidade (-m), as chances de ocorrer ausência de marcas de plural são mais elevadas; (iii) o paralelismo de acordo com esse princípio, a presença de marcas em todos os constituintes do sujeito induz, por conta da repetição de formas, a marcação de número no verbo (ex. Os meninos pequenos brincam no parque). Já a ausência de marcas no sujeito possibilita o inverso, ou seja, o apagamento das marcas no verbo seguida da falta de marcas do sujeito (ex. Os meninoø pequenoø brincaø no parque); (iv) traço semântico do sujeito o traço semântico [+ animado] (ex. as pessoas) favorece a presença de marcas de número, enquanto o traço [-animado] tende a desfavorecê-la (ex. a fraqueza). As variáveis que tendem a demonstrar maior relevância estatística em termos de atuação sobre a marcação de plural, no entanto, parecem ser as sociais, especialmente a escolaridade, já que tal tema é motivo de avaliações sociais bastante críticas e evidencia 87

88 grandes diferenças entre a fala dos europeus e dos brasileiros. Esses julgamentos sociais relacionam a ausência de concordância, em certos contextos, à falta de instrução escolar. Como afirmam Vieira; Bazenga (2013): [...] a ausência de marca de plural ocorre na fala de indivíduos escolarizados brasileiros somente em construções que podem ser consideradas não marcadas ou pouco salientes, aquelas que só chegam ao nível da consciência em situações mais monitoradas: (i) sujeito posposto (chegou os livros); (ii) sujeito anteposto, quando distante do verbo, representado pelo relativo que, com discreta diferenciação fônica entre as formas singular e plural (o rapaz e a moça que sempre de manhã pode ver o sol nascer). Assim, no PB, constitui traço indexical de iletramento/pouca instrução a ausência de marca de plural em contextos salientes: sujeito anteposto (sobretudo quando não marcado), próximo ao verbo com alto grau de saliência fônica (como em os menino saiu). VIEIRA; BAZENGA, 2013, p ) A partir das observações da diversidade de contextos em que a ausência de concordância verbal ocorre no PB, seja por motivos estruturais ou por razões sociais, como a escolaridade e o perfil rural/urbano, é possível chegar à conclusão de que a marcação de plural nessa variedade constitui, nos termos de Labov (2003), uma regra variável, ou seja, varia, em diversificados contextos, entre os 5% e os 95% de aplicação das regras de marcação de plural no verbos de terceira pessoa do plural No Português Europeu O Português Europeu é a variedade tida como modelo de formação para todas as outras variedades do Português, por ter-se configurado historicamente como língua de maior prestígio, representante do colonizador e das oportunidades de ascensão social. Por representar a idealização do que seria o padrão correto a ser seguido, o PE é, muitas vezes, considerado como uma língua em que a variação é inexpressiva, especialmente no que tange ao fenômeno da concordância verbal, porque sua ocorrência seria ínfima. Ao explorar essas ocorrências classificadas como ínfimas, Lucchesi (2006, p. 108) questiona: esse nível irrisório de variação não poderia ser melhor analisado como acidentes de performance, não se configurando, portanto, um processo efetivo de variação estruturada?. No entanto, Naro; Scherre (2007) afirmam que é possível encontrar, no Português Europeu, estruturas variáveis muito semelhantes às encontradas no Português Brasileiro, seja no momento atual ou no período anterior à colonização, mesmo que essas 88

89 ocorrências sejam em menor quantidade e em contextos menos variados. Assim, Naro; Scherre (2007), ao realizarem um estudo com documentos do século XVI, encontraram 200 ocorrências de ausência de concordância em textos medievais no Português Europeu. Nos 8 textos analisados, foram encontrados casos de formas verbais sem a presença de marcas de terceira pessoa do plural, casos de verbo no singular em que supostamente a norma exigia a forma plural. Alguns trabalhos variacionistas (VAREJÃO, 2006; MONGUILHOTT, 2009; GANDRA, 2009; VIEIRA, 2011; RUBIO, 2012; MONTE, 2012; VIEIRA; BAZENGA, 2013), ainda que sejam poucos em comparação à quantidade de estudos sobre a variedade brasileira, se voltaram ao estudo do fenômeno no Português Europeu e confirmaram a existência de certos casos de oscilação na marcação de número, em alguns dos contextos em que ocorre ausência de marcas, seja no PB, seja no PM. Os principais contextos mencionados por esses autores são: sujeito posposto, sujeito não realizado, sujeito inanimado e sujeitos representados por pronome relativo que. Essa oscilação, portanto, poderia representar uma regra semicategórica, ou seja, a aplicação das regras de concordância oscilaria entre 95% e 99% de marcação. Em outras palavras, ao contrário do que inicialmente se acreditava, não é possível afirmar que estamos diante de uma variedade com índices categóricos de marcação de plural, mas, ao mesmo tempo, ela não pode ser comparada aos níveis totalmente variáveis do PB, por exemplo. Vieira; Bazenga (2013) em estudo comparativo sobre a concordância em P6 entre as variedades do Português registram os resultados dos trabalhos de VAREJÃO, 2006; MONGUILHOTT, 2009; GANDRA, 2009; RUBIO, 2012; MONTE, 2012; VIEIRA; BAZENGA, , constatando que, independentemente da localidade em que a comunidade de fala se encontra, a realização das marcas de plural é preferência entre os falantes da variedade portuguesa, já que todas as amostras apresentam mais de 90% de realização da marca (VIEIRA; BAZENGA, 2013, p. 62). Considerando apenas os trabalhos que trataram estatisticamente as variáveis relevantes à marcação de número no PE, as autoras destacam o seguinte panorama, que representa os poucos fatores que revelariam os contextos nos quais houve ausência de concordância na variedade europeia: 35 Os índices de marcação dos estudos são, respectivamente, 91%, 91%, 96.5%, 93.9%, 93.1%, 99.2% em Cacém e 94.7% em Funchal. 89

90 Quadro 4 Variáveis relevantes em estudos de concordância verbal de P6 com amostras europeias. Monguilhott (2009) Rubio (2012) Monte (2012) Traço semântico do sujeito Posição do sujeito em relação ao verbo Tipo de verbo Posição do sujeito em relação ao verbo Traço semântico do sujeito Tipo morfológico do sujeito Posição do sujeito em relação ao verbo Traço semântico do sujeito Tipo estrutural do sujeito/sn Tipo de verbo (verbo ser versus outros verbos) Saliência fônica Fonte: Vieira; Bazenga, 2013, p. 71. Diferentemente do que ocorre na variedade brasileira, no PE os contextos em que a ausência de marcas de plural ocorre parecem ser mais restritos, relacionados basicamente à posição e ao traço semântico do sujeito, como se pode ver no quadro. O tipo de verbo e o tipo estrutural do sujeito também parecem ser relevantes para a variação, ainda que não sejam os primeiros fatores selecionados como principais atuantes. Monte (2012) corrobora essas afirmações ao resumir os resultados de sua pesquisa: Os nossos resultados mostram que há uma regra mais consistente do ponto de vista estrutural no PE para a concordância, que vai se pautar em uma percepção mais nítida da função sujeito ou da ideia de que a marca de plural no verbo é um modo de marcar a relação desse verbo com o sujeito. Vemos que aspectos mais ligados ao processamento linear da relação sujeito-verbo (paralelismo, adjacência/ruptura) atuam na variação da concordância verbal no PB, mas não afetam a concordância verbal no PE. (MONTE, 2012, p.161) Sobre os resultados do PE quanto à escolaridade dos indivíduos, variável extremamente relevante na variedade brasileira, Monte (2012) acrescenta: A variável que mais se mostrou relevante na amostra do PB foi a escolaridade. Já na amostra lusitana, a variável não obteve significância estatística. Na amostra brasileira, vemos nitidamente a crescente frequência de concordância à medida que aumenta a escolarização. Na amostra do PE, as diferenças nos índices de frequência são irrelevantes 90

91 do ponto de vista estatístico. (MONTE, 2012, p. 161) Por fim, vale salientar que, ponderando os resultados obtidos nos trabalhos ora citados e consoante Labov (2003), Vieira; Bazenga (2013) ainda destacam os registros que variam de 91% a 94% de aplicação das regras, discutindo se esses índices poderiam representar uma regra variável no PE, já que estariam abaixo do limiar delimitado para o estudo que fizeram. Sendo assim, por se encontrarem abaixo dos 95% de aplicação das regras de concordância verbal, esses resultados não confirmariam seguramente a tese de que no PE existiria somente uma regra semicategórica. No entanto, após amplo debate sobre os procedimentos metodológicos adotados em cada estudo, as autoras demonstram que os critérios referentes à coleta dos dados seriam os principais responsáveis pela diferença nos índices gerais de concordância. Sendo assim, Vieira; Bazenga (2013) concluem que, seja pelos aspectos quantitativos ou qualitativos, o PE e o PB vernacular são bastante distintos, apesar de os dois apresentarem alguns contextos semelhantes de ausência de marcas. Por sua vez, as restrições em relação à concordância verbal são de ordens extremamente diferentes: enquanto o PB registra uma lista de restrições sociais e estruturais particulares da variedade, o PE parece demonstrar falta de concordância em contextos de caráter universal, ou seja, contextos estritamente linguísticos que não podem ser generalizados como representativos das origens de uma única variedade porque eles [...] constituem tão somente o registro do comportamento específico de estruturas sintática, semântica e foneticamente particulares; de fato, o conjunto de fatores em atuação nas três variedades do PE parece obedecer a condicionamentos morfofonológicos (sândi-externo) e sintático-semânticos do tipo genérico ou universal, não podendo ser indicadores que caracterizam cada uma destas variedades. (VIEIRA; BAZENGA, 2013, p. 74) Sabe-se, então, que PB e PE representam polos opostos de acordo com as restrições linguísticas e extralinguísticas que atuam sobre a variação na concordância verbal. Resta, então, compreender o fenômeno em estudo nas variedades africanas, com o objetivo de estabelecer semelhanças e diferenças que as aproximem mais do PB ou do PE, em termos qualitativos e quantitativos. 91

92 4.2.3 No Português de Moçambique As variedades africanas do Português, e de modo particular a moçambicana, carecem de trabalhos variacionistas que se ocupem do fenômeno da concordância verbal em termos quantitativos, ou seja, que apresentem resultados que permitam a caracterização dos padrões de concordância verbal, especialmente o de 3ª pessoa 36, que é de interesse da presente pesquisa. Gonçalves (2015) resume o que já foi feito nessa área de estudo: A maior parte dos estudos sobre a CV em PM, num total de 8, foram realizados numa perspectiva descritiva e, em alguns casos, têm como horizonte intervenções didáticas, destinadas a promover a competência gramatical dos estudantes nesta área gramatical. Esta dimensão didática decorre do fato de que, em Moçambique, tal como acontece no Brasil, a não-realização da regra de concordância verbal constitui um traço de diferenciação social, de cunho estigmatizante (Vieira, 2007, p. 85). Até ao momento presente, não foram realizados estudos quantitativos com o objetivo de descrever detalhadamente o padrão da concordância variável no SV. (GONÇALVES, 2015, p. 13) Esses poucos trabalhos já realizados (cf. GONÇALVES, 1997; GONÇALVES et al. 1998; ANTÓNIO, 2011; BAVO, 2011; NHONGO, 2005; JEQUE, 1996; JUSTINO 2015; MORENO; TUZINE, 1997) 37 mostram, em certa medida, tendências similares às verificadas no PB, apresentando alguns desvios à norma do PE com relação à marcação de número no verbo, como se verá a seguir. Gonçalves (1997) apresenta a caracterização da Tipologia de erros do Português Oral de Maputo, considerando aspectos de léxico, léxico-sintaxe, sintaxe e morfossintaxe em dados de fala. Tal tipologia faz parte do projeto Panorama do Português Oral de Maputo (PPOM), cujo objetivo era a construção de um corpus da modalidade 36 Os poucos trabalhos realizados sobre a variedade são-tomense (Figueiredo, 2009, 2010; Jon-And, 2011; Vieira, 2011; Brandão; Vieira, 2012, Vieira; Bazenga, 2013, Vieira; Brandão, 2014) mostram tendência de uma aplicação parcial da regra no PST, assumindo comportamento de uma regra variável, como ocorre na variedade brasileira. Ocorre que o Português do Brasil apresenta níveis mais baixos de aplicação da regra e uma gama muito mais variada de contextos desfavorecedores da marcação de número. Portanto, a concordância nessa variedade africana se encontraria entre as duas variedades, não alcançando níveis tão similares aos da variedade europeia, nem apresentando níveis tão baixos quanto os do PB em variedades urbanas populares. 37 Cabe ressaltar que esses trabalhos apenas apontam os fenômenos sintático-semânticos que sofrem variação, sem caracterizá-los de forma quantitativa. Assim, ainda que apresentem exemplos relacionados à concordância verbal de 3ª pessoa, não indicam resultados que determinem o padrão de CV da variedade moçambicana. 92

93 oral do Português de Moçambique, que servisse de fonte para estudos sobre a variedade. Considerando apenas falantes de Português como L2, a autora tinha como objetivo identificar as estruturas da fala desses informantes que fugissem à norma padrão do PE e categorizá-las de acordo com propriedades específicas do sistema linguístico do PM. Sobre o uso da palavra erros a autora explica: No âmbito da pesquisa, estas construções não padrão foram classificadas como erros por razões de natureza diversa. Por um lado, este termo é usado numa perspectiva prescritiva e, por outro lado, é aplicado na perspectiva de aquisição/aprendizagem de uma língua. A perspectiva prescritiva foi motivada, em primeiro lugar, pelo facto de considerarmos que as dimensões reduzidas do corpus [...] não autorizava ainda a formulação de generalizações válidas para o corpus de uma forma geral [...] Além disso, tendo em conta que a competência linguística dos informantes selecionados se apresenta muito variável e diversificada, não é ainda possível tratar as construções não padrão por eles produzidas como norma(s) local(is) [...] No decurso da aquisição / aprendizagem [...] o termo é usado como indicador das áreas de fossilização do Português/L2 [...] vistas como zonas desta língua para as quais são provavalemente requeridas metodologias específicas de ensino (GONÇALVES, 1997, p. 3-4) Apesar de não aprofundar os estudos sobre a concordância verbal em si, é válido destacar sua percepção de que No que se refere aos erros 38 de concordância em número, predominam os casos de uso de formas verbais no singular em contextos que requerem o plural. (GONÇALVES, 1997, p. 61). Os exemplos usados pela autora são especificamente de 3ª pessoa do plural, em sujeitos pospostos, contexto de alta relevância para a ausência das marcas de concordância verbal, mas também em sujeitos antepostos. (GONÇALVES, 1998, p. 128,129) 39 : a. As senhoras também amantiza. (PE= também se amantizam) b. Se os preços dos transportes público fosse um bocado baixos... (PE= fossem) c. De momento agora as coisas está normal. (PE= estão) d. Ultimamente os casamentos não dura. (PE= duram) 38 A autora considera como erros os casos em que a flexão do verbo em número não está de acordo com as regras gramaticais europeias. 39 Destacam-se, também, nos trabalhos da referida autora, casos (que não foram objeto de investigação na presente pesquisa) em que há desvios de concordância quanto à pessoa do verbo e casos em que ocorre flexão verbal no plural em sujeitos que representam coletivos. 93

94 e. Foi quando começou os problemas. (PE= começaram) f. Então chega as pessoas. (PE= chegam) g. Vai começar as eleições. (PE= vão) Investigando textos escritos por universitários do primeiro ano de ensino de Português da Universidade Pedagógica da Beira, Nampula e Quelimane, António (2011) destaca 42 frases que apresentam desvios à concordância verbal, produzidas por 32 informantes do corpus em questão. Em suma, constatou-se que os «erros» mais evidentes são os que se registam em frases que envolvem as seguintes estruturas: SN/SU coordenados (SN/SUs complexos) e SN/SUNulo ser PredSU/temporal. (ANTÓNIO, 2011, p. 24). A seguir, exemplos extraídos de seu estudo: [SN concorrência desleal e a lei de vence o mais forte] [pl] obriga-nos[sing] a optar por profissões (LAN/05/NAM) (= obrigam-nos) [SN o clima e a temperatura][pl] mudou[sing] os pensamentos (MRO/05/NAM) (= mudaram) penso que [SN um ou outro jovem][sing] sabem[pl] algo sobre (USS/05/QUE) (= sabe) dois jovens, com características esfomeadas e todos esfarrapados ( ) pensei que também [-]SU era[sing] viajante (NOC/05/QUE) (= eram) a polícia que estava a dez metros do local, simplesmente [-]SU limitaram-se[pl] a dizer (NOC/05/QUE) (= limitou-se) os estudantes do ensino superior ( ) iludidos pelo dinheiro que necessitam uma vez que [-]SU não vai[sing] fazer nada (SAL/05/QUE) (= vão) acontece[sing] [SN muitos problemas] [pl] (RAV/05/BEI) (= acontecem) ainda não existem[pl] [SN maneira eficaz de eliminação][sing] (LUI/05/QUE) (= existe) existe[sing] [muitos ladrões] [pl] (LAN/05/NAM) (= existem muitos ladrões) António afirma que os contextos mais propícios a erros, que ele chama de áreas problemáticas, ocorrem com três tipos de sujeito: o pronome relativo, os sujeitos complexos e os nulos. Além dessa discussão, é possível ver destacados nesse trabalho os mesmos casos exemplificados por Gonçalves (1998), como a ausência de marcas quando 94

95 os sujeitos estão pospostos ao verbo e a presença de verbos flexionados no plural em contextos em que a norma do PE seleciona verbos no singular. Depois da exposição dos erros, o autor lista estratégias de ensino da regra gramatical para esses desvios, ainda que apresentem baixa ocorrência, num corpus que registrava palavras. Assim como ele, Bavo (2011) também dá ênfase a estratégias de ensino e aprendizagem da Língua Portuguesa, apresentando listas de exercícios para o treinamento da concordância verbal em sala de aula. Tanto António (2011) quanto Bavo (2011) usaram, como base teórica para suas pesquisas, o estudo de Nhongo (2005), primeiro trabalho que buscou os desvios da concordância verbal em corpus escrito por (60) estudantes universitários. As tendências encontradas no trabalho da autora são as mesmas explicitadas por António e Bavo, sendo que Nhongo (2005) dá destaque ao fato de os dados mostrarem que as divergências em relação à norma ocorrem na concordância em número, mas não em pessoa, especialmente no discurso de falantes com grau de escolaridade superior. Alguns exemplos de Nhongo (2005) são distribuídos em dois grupos: (i) verbos em que não há marca explícita de plural quando ela é exigida pela gramática europeia 40. Os desvios dessa natureza encontrados no corpus ocorrem em sujeitos compostos (a); sujeitos complexos (b); sujeito não realizado em frases complexas (c) e sujeitos pospostos ao verbo (d): a. As doenças, a fome e a morte é outra tragédia. 41 (PE: são) b.... bens necessários e básicos para um indivíduo adquirir está muito além das suas capacidades. (PE: estão) c. Muitos jovens enfrentam estas dificuldades, no entanto [ - ]i não desiste. (PE: desistem) d. [ - ] acontece muitos problemas. (PE: acontecem) 40 É importante ressaltar que os exemplos retirados de tal pesquisa utilizam a sigla PE para demonstrar aquilo que seria a concordância padrão da variedade europeia, como se esta não fosse passível de variação e nunca houvesse registro de uso não padrão destas formais verbais. Para maiores informações sobre o PE, cf. Seção anterior (4.2.2) 41 Tal estrutura poderia representar uma leitura de tópico, na qual o verbo copulativo concorda com o elemento pós-verbal e a concordância com o sujeito da oração no plural sugeriria certa inaceitabilidade. Para maior aprofundamento dessa interpretação, conferir Galves (1998). 95

96 (ii) Aqueles em que a norma exige o verbo em sua forma singular, mas este aparece flexionado no corpus em questão. Essas ocorrências foram encontradas em casos de presença de verbo existencial (e) e de sujeitos que representam coletivos (f, g): e. Estou certo de que [ - ] haverão leis que vão defender as crianças clonadas. (PE: haverá) f. A camada juvenil não tinham preocupação com o seu futuro. (PE: tinha) g. A população desta zona usam roupa importada da África do Sul. (PE: usa) Em outra testagem feita com alunos universitários, Justino (2015a) reforça os argumentos sobre os casos em que mais ocorre falta de concordância e o papel da variável escolaridade nesse fenômeno, como resume Gonçalves (2015) a seguir, assinalando que os alunos: revelam mais dificuldades em aplicar as regras de CV quando a posição de sujeito está vazia, quer porque este está posposto ao verbo, quer por não estar realizado lexicalmente em frases complexas. Os resultados parecem indicar que esta é a área da CV que apresenta maiores desafios para a população moçambicana, mesmo para aquela que tem um grau de instrução superior. (GONÇALVES, 2015, p. 14) Diferentemente das outras abordagens, Jeque (1996) teve por objetivo testar a hipótese de que a falta de marcas de concordância no verbo estaria relacionada ao maior preenchimento do sujeito. Os resultados, no entanto, não permitiram tal constatação, uma vez que muitos dos registros utilizados pelo autor apresentavam sujeitos preenchidos. Sobre esse contexto específico, Duarte; Varejão (2013) discutem a relação entre sujeitos (não)preenchidos e a flexão verbal nas variedades brasileira e europeia, afirmando que não existe uma correlação direta entre os dois elementos, ou seja, não haveria compensação morfológica no verbo pela presença de um sujeito explícito. Essa ideia de compensação parece ser a explicação da hipótese inicial do autor para a ausência de marcas de concordância. As autoras, todavia, declaram que o PB está em processo de mudança em progresso, pois, apesar de haver elementos externos que auxiliem a identificação do sujeito nulo, os contextos típicos de sujeitos nulos referenciais apresentam, preferencialmente, sujeitos preenchidos, independentemente da presença de um sujeito referencial. A tendência geral, portanto, é a de se preencher os sujeitos na maioria dos contextos, já que está se perdendo a possibilidade de identificar o referente 96

97 sujeito pela desinência verbal. Ao que parece, o preenchimento do sujeito cada vez maior é uma consequência da ausência de marcas de plural no verbo e não o contrário. Por fim, Moreno; Tuzine (1997) analisam o papel dos fatores sociais na variação linguística do Português de Moçambique. Os autores estudaram esses fatores em uma amostra com entrevistas de 20 informantes do corpus PPOM (Panorama do Português Oral de Maputo), fazendo um estudo das variáveis linguísticas em relação às variáveis extralinguísticas (idade, escolaridade, profissão, e local de residência). De acordo com os autores: Os resultados obtidos permitem-nos observar que os fenómenos de variação que se manifestam no POM não podem nem devem ser explicados recorrendo-se apenas a uma ou duas variáveis sociais isoladamente, parecendo, pelo contrário, decorrer de uma multiplicidade de factores, actuando em conjunto. Assim, os resultados da análise mostram que o nível de escolaridade e a profissão são factores mais relevantes do que a idade e o local de residência, para a ocorrência de desvios no discurso dos falantes da nossa amostra. (MORENO; TUZINE, 1997, p. 87) Assim, pode-se concluir que a concordância verbal é, de fato, uma área da gramática da Língua Portuguesa que merece atenção na variedade moçambicana. Ao que tudo indica, o olhar quantitativo faz-se necessário para a constatação do tipo de regra existente nessa variedade e, consequentemente, o estudo qualitativo das ocorrências encontradas pode levantar hipóteses importantes sobre o Português de Moçambique que parece estar se construindo de maneira independente distanciando-se um pouco tanto do PB quanto do PE. A próxima seção, portanto, dedica-se à exploração da metodologia utilizada para a obtenção dos resultados estatísticos da variedade em questão. 97

98 5 METODOLOGIA A presente seção é dedicada à apresentação dos aspectos metodológicos da pesquisa, dentre os quais se destaca a descrição do corpus utilizado para este estudo, necessária para a compreensão de suas especificidades, especialmente no que tange ao perfil dos informantes. Além disso, também são apresentadas as etapas realizadas ao longo do trabalho e, mais especificamente, os procedimentos iniciais adotados quanto às rodadas estatísticas executadas para a obtenção dos resultados que serão apontados no Capítulo Montagem e elaboração do corpus O banco de dados utilizado nesta pesquisa faz parte de uma amostra elaborada e construída pela autora deste trabalho e sua orientadora, Professora Silvia Rodrigues Vieira, em pesquisa de campo realizada no período de 15 a 29 de setembro de 2016, em Maputo, Moçambique-África. Inicialmente, buscava-se entrevistar, ao menos, 18 indivíduos nascidos em Maputo, que se declarassem falantes de Português como língua materna. Esses 18 indivíduos deveriam preencher os critérios estabelecidos para a pesquisa em relação à idade, à escolaridade e ao sexo, critérios que já haviam sido usados na constituição de amostras brasileiras e europeias, quais sejam: um homem e uma mulher de cada uma de três faixas etárias (18-35 anos; anos; acima de 56 anos) e de três níveis de escolaridade (ensino fundamental; ensino médio; ensino superior). Com base em um planejamento inicial junto aos pesquisadores Perpétua Gonçalves e Victor Mércia Justino Cumbana, da Universidade Eduardo Mondlane, e a professora Maria João Carrilho Diniz, diretora da Biblioteca Central de Maputo, realizaram-se 35 entrevistas sociolinguísticas com indivíduos moçambicanos residentes na comunidade urbana de Maputo. Ressalte-se que a professora Maria João Carrilho Diniz, moçambicana, nascida na província de Cabo Delgado, por ter atuado durante muito tempo como professora de Língua Portuguesa nas escolas de Moçambique e ser conhecedora da atuação das línguas locais em relação ao Português, concedeu-nos um relato extra, riquíssimo em informações 42 No início do Capítulo 7, são descritos os amálgamas entre os fatores durante as análises das rodadas multivariadas. 98

99 sobre a multiplicidade de línguas e o possível perfil básico do PM falado atualmente no país. Tal relato foi devidamente gravado de modo a constituir referência para as reflexões feitas na presente pesquisa, especialmente acerca das variáveis sociais, uma vez que suas declarações trazem luz à interpretação dos resultados obtidos e permitem o levantamento de hipóteses quanto à formação do Português de Moçambique. A elaboração do corpus foi uma atividade vinculada ao projeto Estudo comparado de padrões de concordância em variedades africanas, brasileiras e portuguesas: a natureza das restrições e o contato linguístico 43, financiado pela FAPERJ (Projeto E-26/ /2014), no âmbito do Programa de Pós-graduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro. O objetivo principal do citado projeto é tratar da concordância e, a partir dela, descrever o perfil sociolinguístico das comunidades de fala da Língua Portuguesa, quais sejam: brasileiras, europeias e/ou africanas. Os dados obtidos são oportunamente submetidos a uma abordagem contrastiva. Tendo em vista essa abordagem, buscaram-se perfis sociais que se encaixassem e fossem comparáveis àqueles já selecionados em trabalhos realizados nas outras variedades do Português, como a brasileira e a europeia. No entanto, a observação cuidadosa dos perfis fez notar que, devido ao caráter social bastante distinto entre a comunidade em questão e as outras já estudadas, a distribuição dos informantes pelas células sociais não pôde ser feita exatamente da mesma maneira. Assim, cabe ressaltar a importância de se compreender a riqueza cultural e a diversidade de origens e de línguas dos informantes entrevistados nessa amostra. Todos os informantes são falantes de Língua Portuguesa, seja ela sua língua materna ou não, já contrariando o primeiro dos critérios estabelecidos a princípio. Ao longo das entrevistas, eles foram inquiridos acerca dos hábitos culturais da vida em Moçambique, situações da vida cotidiana (transporte, educação, saúde, política) e da família (hábitos e tradições), e, ainda, da(s) língua(s) que falam e/ou compreendem, além do Português, na sua comunicação diária na comunidade (para mais detalhes sobre o roteiro da entrevista, cf. Anexo I). 43 O projeto submetido à FAPERJ é parte integrante do grupo de trabalho da ALFAL (Associação de Filologia e Linguística da América Latina), intitulado Estudo comparado dos padrões de concordância em variedades africanas, brasileiras e europeias do Português (Projeto ALFAL Fase 2). 99

100 5.2 Seleção dos informantes Para compreender os perfis entrevistados para esta pesquisa, é necessário destacar alguns fatos extremamente relevantes para a sociedade moçambicana e, especialmente, para os habitantes de Maputo; são eles: a relação do indivíduo com a Língua Portuguesa e as línguas locais, e sua escolaridade. Além disso, o local de origem do indivíduo parece afetar consideravelmente essa relação entre o Português e as diferentes línguas nacionais faladas nas diversas províncias. Sendo Maputo a capital do país, houve, como ocorre na maioria dos centros urbanos de que se tem conhecimento, migrações para a cidade especialmente depois da independência de pessoas em busca de melhores condições de vida, à procura de melhores empregos e educação de qualidade. Com isso, o primeiro cenário que se encontra na cidade é o de pessoas de origens muito distintas, vindas de todas as províncias de Moçambique: Zambézia, Tete, Niassa, Gaza, Inhambane, Nampula, Sofala, Manica e Cabo Delgado. A Figura 1, a seguir, demonstra a distribuição geográfica das províncias e a distância delas em relação à capital, Maputo: Figura 1 Mapa das Províncias de Moçambique 100

A CONCORDÂNCIA VERBAL DE TERCEIRA PESSOA DO PLURAL NO PORTUGUÊS POPULAR DA COMUNIDADE RURAL DE RIO DAS RÃS - BA

A CONCORDÂNCIA VERBAL DE TERCEIRA PESSOA DO PLURAL NO PORTUGUÊS POPULAR DA COMUNIDADE RURAL DE RIO DAS RÃS - BA Página 57 de 510 A CONCORDÂNCIA VERBAL DE TERCEIRA PESSOA DO PLURAL NO PORTUGUÊS POPULAR DA COMUNIDADE RURAL DE RIO DAS RÃS - BA Juscimaura Lima Cangirana (UESB) Elisângela Gonçalves (UESB) RESUMO Procura-se,

Leia mais

RESENHA: INTRODUÇÃO À LINGUÍSTICA BANTU

RESENHA: INTRODUÇÃO À LINGUÍSTICA BANTU RESENHA: INTRODUÇÃO À LINGUÍSTICA BANTU BOOK REVIEW: INTRODUÇÃO À LINGUÍSTICA BANTU Alexandre António Timbane 1 Universidade de Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira NGUNGA, Armindo. Introdução

Leia mais

PADRÕES DE CONCORDÂNCIA VERBAL DE TERCEIRA PESSOA PLURAL NO PORTUGUÊS DE SÃO TOMÉ E NO PORTUGUÊS DE MOÇAMBIQUE

PADRÕES DE CONCORDÂNCIA VERBAL DE TERCEIRA PESSOA PLURAL NO PORTUGUÊS DE SÃO TOMÉ E NO PORTUGUÊS DE MOÇAMBIQUE 9 CAPÍTULO PADRÕES DE CONCORDÂNCIA VERBAL DE TERCEIRA PESSOA PLURAL NO PORTUGUÊS DE SÃO TOMÉ E NO PORTUGUÊS DE MOÇAMBIQUE 1. INTRODUÇÃO KAREN CRISTINA DA SILVA PISSURNO Os estudos sociolinguísticos sobre

Leia mais

A REALIZAÇÃO DO SUJEITO PRONOMINAL DE REFERÊNCIA ARBITRÁRIA NA COMUNIDADE LINGUÍSTICA DE VITÓRIA DA CONQUISTA *

A REALIZAÇÃO DO SUJEITO PRONOMINAL DE REFERÊNCIA ARBITRÁRIA NA COMUNIDADE LINGUÍSTICA DE VITÓRIA DA CONQUISTA * 249 de 298 A REALIZAÇÃO DO SUJEITO PRONOMINAL DE REFERÊNCIA ARBITRÁRIA NA COMUNIDADE LINGUÍSTICA DE VITÓRIA DA CONQUISTA * Daiane Gomes Bahia ** Elisângela Gonçalves *** Paula Barreto Silva **** RESUMO

Leia mais

UMA ANÁLISE SOCIOFUNCIONALISTA DA DUPLA NEGAÇÃO NO SERTÃO DA RESSACA

UMA ANÁLISE SOCIOFUNCIONALISTA DA DUPLA NEGAÇÃO NO SERTÃO DA RESSACA Página 143 de 511 UMA ANÁLISE SOCIOFUNCIONALISTA DA DUPLA NEGAÇÃO NO SERTÃO DA RESSACA Savanna Souza de Castro Julinara Silva Vieira Valéria Viana Sousa Jorge Augusto Alves Silva RESUMO A negação é um

Leia mais

A colonização de Moçambique e Brasil por Portugal e o reflexo deste fato na língua nacional.

A colonização de Moçambique e Brasil por Portugal e o reflexo deste fato na língua nacional. A colonização de Moçambique e Brasil por Portugal e o reflexo deste fato na língua nacional. Ana Júlia; Emilly Mayara; Ingrid Vitória e Suellen Rayene. (ETE-PERNAMBUCO) 1 RESUMO A chegada de Vasco da Gama

Leia mais

Jorge D. M. Palamussa

Jorge D. M. Palamussa Jorge D. M. Palamussa Introdução Metodologia Padrões migratórios Integração social Integração económica Conclusão Zambezianos constituem o quarto maior grupo de imigrantes em Maputo O primeiro grupo de

Leia mais

EXPRESSÕES NOMINAIS GENÉRICAS NUM CORPUS ORAL DO PORTUGUÊS DE ANGOLA ALBANO AGOSTINHO EDUARDO

EXPRESSÕES NOMINAIS GENÉRICAS NUM CORPUS ORAL DO PORTUGUÊS DE ANGOLA ALBANO AGOSTINHO EDUARDO EXPRESSÕES NOMINAIS GENÉRICAS NUM CORPUS ORAL DO PORTUGUÊS DE ANGOLA ALBANO AGOSTINHO EDUARDO SETEMBRO, 2015 Versão corrigida e melhorada após defesa pública i Dissertação apresentada para cumprimento

Leia mais

Escrito por Davi Eberhard - SIL Dom, 10 de Abril de :47 - Última atualização Qui, 14 de Abril de :19

Escrito por Davi Eberhard - SIL Dom, 10 de Abril de :47 - Última atualização Qui, 14 de Abril de :19 Advertência 1: Motivação Motivação é essencial. Se você não tiver motivação própria, você não vai aprender outra língua. Não adianta ter motivação imposta pelos outros, aprender por razões dos outros,

Leia mais

1 Em comparação com os resultados a nível nacional apresentados nas avaliações de pobreza anteriores, as estimativas

1 Em comparação com os resultados a nível nacional apresentados nas avaliações de pobreza anteriores, as estimativas Nota técnica sobre a significância estatística das principais estimativas apresentadas na Quarta Avaliação Nacional da Pobreza e Bem-Estar em Moçambique (IOF 2104/15) Os resultados gerais da pobreza de

Leia mais

Determinantes da Prevalência de HIV em Moçambique. Por: Isa Fidélia Francisco Chiconela UNU - WIDER

Determinantes da Prevalência de HIV em Moçambique. Por: Isa Fidélia Francisco Chiconela UNU - WIDER Determinantes da Prevalência de HIV em Moçambique Por: Isa Fidélia Francisco Chiconela UNU - WIDER HIV em Moçambique Moçambique é considerado o quinto país com maiores taxas de prevalência no mundo. Apesar

Leia mais

A VARIAÇÃO NÓS/ A GENTE NO PORTUGUÊS FALADO DE FEIRA DE SANTANA: COMPARAÇÃO ENTRE FALARES DO PB

A VARIAÇÃO NÓS/ A GENTE NO PORTUGUÊS FALADO DE FEIRA DE SANTANA: COMPARAÇÃO ENTRE FALARES DO PB Página 63 de 510 A VARIAÇÃO NÓS/ A GENTE NO PORTUGUÊS FALADO DE FEIRA DE SANTANA: COMPARAÇÃO ENTRE FALARES DO PB Josany Maria de Jesus Silva (CAPES/UESB/PPGLin) Cristiane Namiuti Temponi (UESB/PPGLin)

Leia mais

2 Bilingüismo e bilingualidade

2 Bilingüismo e bilingualidade 2 Bilingüismo e bilingualidade Quando as pessoas usam o termo bilíngüe imaginam alguém que fala duas línguas perfeitamente, conforme lembra Valdés (apud HEYE, 2001, p. 37). Geralmente, imaginam que essa

Leia mais

GRAMATICALIZAÇÃO DO PRONOME PESSOAL DE TERCEIRA PESSOA NA FUNÇÃO ACUSATIVA

GRAMATICALIZAÇÃO DO PRONOME PESSOAL DE TERCEIRA PESSOA NA FUNÇÃO ACUSATIVA Página 133 de 511 GRAMATICALIZAÇÃO DO PRONOME PESSOAL DE TERCEIRA PESSOA NA FUNÇÃO ACUSATIVA Elizane de Souza Teles Silva Jodalmara Oliveira Rocha Teixeira Jorge Augusto Alves da Silva Valéria Viana Sousa

Leia mais

A VARIAÇÃO DO MODO SUBJUNTIVO: UMA RELAÇÃO COM O PROCESSO DE EXPRESSÃO DE MODALIDADES

A VARIAÇÃO DO MODO SUBJUNTIVO: UMA RELAÇÃO COM O PROCESSO DE EXPRESSÃO DE MODALIDADES 477 de 663 A VARIAÇÃO DO MODO SUBJUNTIVO: UMA RELAÇÃO COM O PROCESSO DE EXPRESSÃO DE MODALIDADES Vânia Raquel Santos Amorim 148 (UESB) Valéria Viana Sousa 149 (UESB) Jorge Augusto Alves da Silva 150 (UESB)

Leia mais

LHEÍSMO NO PORTUGÛES BRASILEIRO: EXAMINANDO O PORTUGÛES FALADO EM FEIRA DE SANTANA Deyse Edberg 1 ; Norma Lucia Almeida 2

LHEÍSMO NO PORTUGÛES BRASILEIRO: EXAMINANDO O PORTUGÛES FALADO EM FEIRA DE SANTANA Deyse Edberg 1 ; Norma Lucia Almeida 2 359 LHEÍSMO NO PORTUGÛES BRASILEIRO: EXAMINANDO O PORTUGÛES FALADO EM FEIRA DE SANTANA Deyse Edberg 1 ; Norma Lucia Almeida 2 1. Bolsista FAPESB, Graduanda em Letras Vernáculas pela Universidade Estadual

Leia mais

Língua. Prof. Veríssimo Ferreira

Língua. Prof. Veríssimo Ferreira Língua Prof. Veríssimo Ferreira Língua Sistema ou código de comunicação utilizado por uma determinada comunidade. Língua Meio de comunicação baseado em um conjunto estabelecido de sons que se selecionam

Leia mais

As construções de tópico marcado no português falado no Libolo/Angola

As construções de tópico marcado no português falado no Libolo/Angola UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS RAQUEL AZEVEDO DA SILVA As construções de tópico marcado no português falado no Libolo/Angola São Paulo 2017 RAQUEL AZEVEDO DA

Leia mais

TRABALHO COM OS GÊNEROS / ENSINO DA LÍNGUA PADRÃO

TRABALHO COM OS GÊNEROS / ENSINO DA LÍNGUA PADRÃO TRABALHO COM OS GÊNEROS / ENSINO DA LÍNGUA PADRÃO META Problematizar o trabalho com gêneros nas aulas de língua materna, diante do desafi o de apresentar aos alunos a variante padrão, conforme descrita

Leia mais

APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS DEFINITIVOS DO CENSO 2007

APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS DEFINITIVOS DO CENSO 2007 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS DEFINITIVOS DO CENSO 2007 18 de Novembro, 2009: Dia Africano de Estatística INTRODUÇÃO Nesta apresentação vamos abordar 15 tópicos do Censo 2007 relacionados com: Tamanho e

Leia mais

INSTITUTO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO PANORAMA. do PORTUGUÊS ORAL. de MAPUTO VOLUME III ESTRUTURAS GRAMATICAIS DO PORTUGUÊS:

INSTITUTO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO PANORAMA. do PORTUGUÊS ORAL. de MAPUTO VOLUME III ESTRUTURAS GRAMATICAIS DO PORTUGUÊS: INSTITUTO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO PANORAMA do PORTUGUÊS ORAL de MAPUTO VOLUME III ESTRUTURAS GRAMATICAIS DO PORTUGUÊS: PROBLEMAS E APLICAÇÕES Perpétua Gonçalves e Christopher Stroud Cadernos

Leia mais

CRIAÇÃO LEXICAL: O USO DE NEOLOGISMOS NO PORTUGUÊS FALADO EM DOURADOS

CRIAÇÃO LEXICAL: O USO DE NEOLOGISMOS NO PORTUGUÊS FALADO EM DOURADOS CRIAÇÃO LEXICAL: O USO DE NEOLOGISMOS NO PORTUGUÊS FALADO EM DOURADOS Paulo Gerson Rodrigues Stefanello ¹; Elza Sabino da Silva Bueno². ¹Aluno do 4º ano do Curso de Letras Português/Espanhol. Bolsista

Leia mais

Estágio Actual da Ocupação da Terra em Moçambique

Estágio Actual da Ocupação da Terra em Moçambique Ministério da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural Estágio Actual da Ocupação da Terra em Moçambique Conferência Comemorativa de 20 anos da Lei de Terras. Maputo, 19 de Outubro de 2017 Contextualização

Leia mais

Estudo sociolinguístico da concordância verbal de 3ª pessoa do plural no português de São Tomé e Príncipe

Estudo sociolinguístico da concordância verbal de 3ª pessoa do plural no português de São Tomé e Príncipe Revista Digital do Programa de Pós-Graduação em Letras da PUCRS Porto Alegre, v. 10, n. 1, p. 18-29, janeiro-junho 2017 e-issn 1984-4301 http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/letronica/ http://dx.doi.org/10.15448/1984-4301.2017.1.24957

Leia mais

A VARIAÇÃO/ESTRATIFICAÇÃO DO SUBJUNTIVO EM ORAÇÕES PARENTÉTICAS

A VARIAÇÃO/ESTRATIFICAÇÃO DO SUBJUNTIVO EM ORAÇÕES PARENTÉTICAS Página 109 de 511 A VARIAÇÃO/ESTRATIFICAÇÃO DO SUBJUNTIVO EM ORAÇÕES PARENTÉTICAS Vânia Raquel Santos Amorim (UESB) Valéria Viana Sousa (UESB) Jorge Augusto Alves da Silva (UESB) RESUMO Neste trabalho,

Leia mais

REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE MINISTÉRIO DA TERRA, AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO RURAL DIRECÇÃO NACIONAL DO AMBIENTE DEPARTAMENTO DE GESTÃO AMBIENTAL

REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE MINISTÉRIO DA TERRA, AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO RURAL DIRECÇÃO NACIONAL DO AMBIENTE DEPARTAMENTO DE GESTÃO AMBIENTAL REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE MINISTÉRIO DA TERRA, AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO RURAL DIRECÇÃO NACIONAL DO AMBIENTE DEPARTAMENTO DE GESTÃO AMBIENTAL TERMOS DE REFERÊNCIA PARA A REALIZAÇÃO DO INVENTÁRIO DE TERRAS

Leia mais

A INSTITUCIONALIZAÇÃO DO PORTUGUÊS NO BRASIL E O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA

A INSTITUCIONALIZAÇÃO DO PORTUGUÊS NO BRASIL E O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA Página 293 de 315 A INSTITUCIONALIZAÇÃO DO PORTUGUÊS NO BRASIL E O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA Paula Barreto Silva 114 (UESB) Ester Maria de Figueiredo Souza 115 (UESB) RESUMO Este trabalho pretende verificar

Leia mais

Informe 3 Novembro de 2008

Informe 3 Novembro de 2008 Parceria para os Direitos da Criança em Moçambique Informe 3 Novembro de 2008 O QUE DIZ A PROPOSTA DE ORÇAMENTO DO ESTADO 2009 SOBRE A PREVISÃO DE RECURSOS NO SECTOR DE SAÚDE? Mensagens Chave Aumento significativo

Leia mais

VARIAÇÃO LINGUÍSTICA NA SALA DE AULA: UM RELATO DE EXPERIÊNCIAS NAS AULAS DE LÍNGUA PORTUGUESA

VARIAÇÃO LINGUÍSTICA NA SALA DE AULA: UM RELATO DE EXPERIÊNCIAS NAS AULAS DE LÍNGUA PORTUGUESA VARIAÇÃO LINGUÍSTICA NA SALA DE AULA: UM RELATO DE EXPERIÊNCIAS NAS AULAS DE LÍNGUA PORTUGUESA Ana Paula de Souza Fernandes Universidade Estadual da Paraíba. E-mail: Aplins-@hotmail.com Beatriz Viera de

Leia mais

Workshops and games on linguistic variation

Workshops and games on linguistic variation Oficinas e jogos de variação linguística Workshops and games on linguistic variation Monique Débora Alves de Oliveira, mestranda, FAPERJ/UFRJ/SME, mnqdbr@gmail.com. Resumo Este trabalho tem a preocupação

Leia mais

Concordância verbal, variação e ensino

Concordância verbal, variação e ensino Concordância verbal, variação e ensino RENATA LÍVIA DE ARAÚJO SANTOS Doutoranda em Linguística pelo Programa de Pós-Graduação em Letras e Linguística da Universidade Federal de Alagoas. Resumo: Este trabalho

Leia mais

Variação social ou diastrática

Variação social ou diastrática L.E. Semana 3 Sábado Variação social ou diastrática Variação linguística a partir da posição social ocupada pelo falante A idade do falante é um importante elemento na produção do discurso oral e escrito.

Leia mais

ANÁLISE DA OCORRÊNCIA DE ARTIGOS DEFINIDOS DIANTE DE POSSESSIVOS PRÉ-NOMINAIS E ANTROPÔNIMOS EM DADOS DE FALA* 1

ANÁLISE DA OCORRÊNCIA DE ARTIGOS DEFINIDOS DIANTE DE POSSESSIVOS PRÉ-NOMINAIS E ANTROPÔNIMOS EM DADOS DE FALA* 1 ANÁLISE DA OCORRÊNCIA DE ARTIGOS DEFINIDOS DIANTE DE POSSESSIVOS PRÉ-NOMINAIS E ANTROPÔNIMOS EM DADOS DE FALA* 1 Alane Luma Santana Siqueira (UFRPE/UAST) alane.siqueira@gmail.com 1. Introdução O Português

Leia mais

O USO CORRENTE DA VARIEDADE NÃO-PADRÃO DA LÍNGUA PORTUGUESA: UM ESTUDO DE CASO DA COMUNIDADE DA DERRADEIRA MUNICÍPIO DE VALENÇA

O USO CORRENTE DA VARIEDADE NÃO-PADRÃO DA LÍNGUA PORTUGUESA: UM ESTUDO DE CASO DA COMUNIDADE DA DERRADEIRA MUNICÍPIO DE VALENÇA 73 de 368 O USO CORRENTE DA VARIEDADE NÃO-PADRÃO DA LÍNGUA PORTUGUESA: UM ESTUDO DE CASO DA COMUNIDADE DA DERRADEIRA MUNICÍPIO DE VALENÇA Taylane Santos do Nascimento * (Uneb) RESUMO Este artigo tece considerações

Leia mais

Informe 6 Novembro de 2008

Informe 6 Novembro de 2008 Parceria para os Direitos da Criança em Moçambique Informe 6 Novembro de 28 O QUE DIZ A PROPOSTA DE ORÇAMENTO DO ESTADO 29 SOBRE A PREVISÃO DE RECURSOS NO SECTOR DE ACÇÃO SOCIAL? Mensagens Chave A Proposta

Leia mais

Como responde a procura de educação à qualidade na oferta escolar. Por: Esmeralda Antonio Napaua UNU - WIDER

Como responde a procura de educação à qualidade na oferta escolar. Por: Esmeralda Antonio Napaua UNU - WIDER Como responde a procura de educação à qualidade na oferta escolar Por: Esmeralda Antonio Napaua UNU - WIDER Educação é uma dimensão chave do desenvolvimento Inscrita no Objectivo de Desenvolvimento Sustentável

Leia mais

A ORALIDADE E O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

A ORALIDADE E O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES A ORALIDADE E O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Maria de Fátima de Souza Aquino (UEPB) 1. Introdução Nas últimas décadas os estudos sobre a oralidade têm avançado significativamente,

Leia mais

Agradecimentos. Ao meu orientador, Prof. Doutor José António Espírito Santo, pela confiança que depositou no meu trabalho. e nas minhas capacidades,

Agradecimentos. Ao meu orientador, Prof. Doutor José António Espírito Santo, pela confiança que depositou no meu trabalho. e nas minhas capacidades, Agradecimentos Ao meu orientador, Prof. Doutor José António Espírito Santo, pela confiança que depositou no meu trabalho e nas minhas capacidades, pelo apoio incansável nos momentos mais aflitivos, pelas

Leia mais

EMENTÁRIO HISTÓRIA LICENCIATURA EAD

EMENTÁRIO HISTÓRIA LICENCIATURA EAD EMENTÁRIO HISTÓRIA LICENCIATURA EAD CANOAS, JULHO DE 2015 DISCIPLINA PRÉ-HISTÓRIA Código: 103500 EMENTA: Estudo da trajetória e do comportamento do Homem desde a sua origem até o surgimento do Estado.

Leia mais

sintaticamente relevante para a língua e sobre os quais o sistema computacional opera. O resultado da computação lingüística, que é interno ao

sintaticamente relevante para a língua e sobre os quais o sistema computacional opera. O resultado da computação lingüística, que é interno ao 1 Introdução A presente dissertação tem como tema a aquisição do modo verbal no Português Brasileiro (PB). Tal pesquisa foi conduzida, primeiramente, por meio de um estudo dos dados da produção espontânea

Leia mais

A DISTRIBUIÇÃO DO PROCESSO DE APAGAMENTO DO RÓTICO NAS QUATRO ÚLTIMAS DÉCADAS: TRÊS CAPITAIS EM CONFRONTO

A DISTRIBUIÇÃO DO PROCESSO DE APAGAMENTO DO RÓTICO NAS QUATRO ÚLTIMAS DÉCADAS: TRÊS CAPITAIS EM CONFRONTO A DISTRIBUIÇÃO DO PROCESSO DE APAGAMENTO DO RÓTICO NAS QUATRO ÚLTIMAS DÉCADAS: TRÊS CAPITAIS EM CONFRONTO Aline de Jesus Farias Oliveira (UFRJ/IC-FAPERJ)) Dinah Maria Isensee Callou (UFRJ/CNPq) dcallou@gmail.com

Leia mais

Enquadramento. Este inquérito é o primeiro exercício deste género em Moçambique.

Enquadramento. Este inquérito é o primeiro exercício deste género em Moçambique. Enquadramento O Inquérito à Transição Ensino-Emprego dos Finalistas Universitários tem como foco a transição dos jovens finalistas universitários, da educação para o mercado de trabalho. Este inquérito

Leia mais

1 Introdução. 1 Tal denominação da variante da Língua Portuguesa foi retirada da dissertação de Mestrado

1 Introdução. 1 Tal denominação da variante da Língua Portuguesa foi retirada da dissertação de Mestrado 15 1 Introdução O presente trabalho tem como tema o uso de modalidades expressas pelo subjuntivo e pelo infinitivo em orações completivas no português padrão distenso falado no Brasil, ou seja, no português

Leia mais

1. A população de Portugal não tem um número elevado de filhos porque não pode ou porque não quer?

1. A população de Portugal não tem um número elevado de filhos porque não pode ou porque não quer? O Inquérito à Fecundidade, realizado em 2013, resultou de uma parceria entre o Instituto Nacional de Estatística (INE) e a Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS). O momento para apresentação da totalidade

Leia mais

Cadernos do CNLF, Vol. XIII, Nº 04

Cadernos do CNLF, Vol. XIII, Nº 04 O PROCESSO DE GRAMATICALIZAÇÃO DO ELEMENTO DE REPENTE Aline Pontes Márcia Peterson (UFRJ) marciapetufrj@hotmail.com INTRODUÇÃO Este estudo tem por objetivo focalizar o processo de gramaticalização das

Leia mais

Informe 4 Novembro de 2008

Informe 4 Novembro de 2008 Parceria para os Direitos da Criança em Moçambique Informe 4 Novembro de 2008 O QUE DIZ A PROPOSTA DE ORÇAMENTO DO ESTADO 2009 SOBRE A PREVISÃO DE RECURSOS NO SECTOR DE EDUCAÇÃO? Mensagens Chave Decréscimo

Leia mais

A CONCORDÂNCIA VERBAL: A RELEVÂNCIA DAS VARIÁVEIS LINGÜÍSTICAS E NÃO LINGÜÍSTICAS

A CONCORDÂNCIA VERBAL: A RELEVÂNCIA DAS VARIÁVEIS LINGÜÍSTICAS E NÃO LINGÜÍSTICAS 543 A CONCORDÂNCIA VERBAL: A RELEVÂNCIA DAS VARIÁVEIS LINGÜÍSTICAS E NÃO LINGÜÍSTICAS Constância Maria Borges de Souza * Introdução Os estudos da Concordância Verbal têm demonstrado que os falantes de

Leia mais

Apresentação Conceitos básicos Gramática, variação e normas Saberes gramaticais na escola... 31

Apresentação Conceitos básicos Gramática, variação e normas Saberes gramaticais na escola... 31 Sumário Apresentação... 9 Conceitos básicos... 11 Gramática, variação e normas... 13 Dinah Callou A propósito de gramática e norma... 15 O ensino e a constituição de normas no Brasil... 21 A propósito

Leia mais

Maria Inês Amaro Catarina Batista. Vidas. 25 anos de voluntariado. de Missão. dos Leigos para o Desenvolvimento

Maria Inês Amaro Catarina Batista. Vidas. 25 anos de voluntariado. de Missão. dos Leigos para o Desenvolvimento Maria Inês Amaro Catarina Batista Vidas de Missão 25 anos de voluntariado dos Leigos para o Desenvolvimento Lisboa Universidade Católica Editora 2012 Índice Nota prévia 9 Introdução 11 Capítulo 1 Acção,

Leia mais

A SOCIOLINGUÍSTICA E O ENSINO DE LINGUA PORTUGUESA: UMA PROPOSTA BASEADA NOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS

A SOCIOLINGUÍSTICA E O ENSINO DE LINGUA PORTUGUESA: UMA PROPOSTA BASEADA NOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS A SOCIOLINGUÍSTICA E O ENSINO DE LINGUA PORTUGUESA: UMA PROPOSTA BASEADA NOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS Fabiana Gonçalves de Lima Universidade Federal da Paraíba fabianalima1304@gmail.com INTRODUÇÃO

Leia mais

Os Determinantes da Pobreza em Moçambique, 2014/15

Os Determinantes da Pobreza em Moçambique, 2014/15 Os Determinantes da Pobreza em Moçambique, 2014/15 Maimuna Ibraimo com Vincenzo Salvucci Objectivo Estudar as variáveis correlacionadas com a pobreza de consumo e a pobreza multidimensional em Moçambique

Leia mais

ANÁLISE DA ELEVAÇÃO DAS VOGAIS MÉDIAS PRETÔNICAS SEM MOTIVAÇÃO APARENTE 1. INTRODUÇÃO

ANÁLISE DA ELEVAÇÃO DAS VOGAIS MÉDIAS PRETÔNICAS SEM MOTIVAÇÃO APARENTE 1. INTRODUÇÃO ANÁLISE DA ELEVAÇÃO DAS VOGAIS MÉDIAS PRETÔNICAS SEM MOTIVAÇÃO APARENTE DÉBORAH VIEIRA PINTO AGUIAR 1 ; MARIA JOSÉ BLASKOVSKI VIEIRA 2 1 Universidade Federal de Pelotas ddeborahvieira@gmail.com 1 2 Universidade

Leia mais

A ELISÃO DA VOGAL /o/ EM FLORIANÓPOLIS-SC RESULTADOS PRELIMINARES

A ELISÃO DA VOGAL /o/ EM FLORIANÓPOLIS-SC RESULTADOS PRELIMINARES A ELISÃO DA VOGAL /o/ EM FLORIANÓPOLIS-SC RESULTADOS PRELIMINARES Letícia Cotosck Vargas (PUCRS/PIBIC- CNPq 1 ) 1. INTRODUÇÃO Esta pesquisa tem por objetivo examinar um dos processos de sândi externo verificados

Leia mais

1 Introdução. 1 Nesta dissertação, as siglas PL2E, PL2 e PLE estão sendo utilizadas, indistintamente, para se

1 Introdução. 1 Nesta dissertação, as siglas PL2E, PL2 e PLE estão sendo utilizadas, indistintamente, para se 16 1 Introdução O interesse pelo tema deste trabalho, o uso de estruturas alternativas às construções hipotéticas com se e com o futuro simples do subjuntivo, surgiu da experiência da autora ensinando

Leia mais

ÍNDICE ÍNDICE DE GRÁFICOS... VI ÍNDICE DE QUADROS... VII AGRADECIMENTOS... IX RESUMO... XI INTRODUÇÃO... 1 CAPÍTULO I ENQUADRAMENTO TEÓRICO...

ÍNDICE ÍNDICE DE GRÁFICOS... VI ÍNDICE DE QUADROS... VII AGRADECIMENTOS... IX RESUMO... XI INTRODUÇÃO... 1 CAPÍTULO I ENQUADRAMENTO TEÓRICO... I II ÍNDICE ÍNDICE DE GRÁFICOS....... VI ÍNDICE DE QUADROS....... VII AGRADECIMENTOS........ IX RESUMO.......... XI INTRODUÇÃO......... 1 CAPÍTULO I ENQUADRAMENTO TEÓRICO.... 3 1.- ACERCA DO CONCEITO DE

Leia mais

ESTARÁ O PORTUGUÊS BRASILEIRO DEIXANDO DE SER LÍNGUA DE SUJEITO-PREDICADO? *

ESTARÁ O PORTUGUÊS BRASILEIRO DEIXANDO DE SER LÍNGUA DE SUJEITO-PREDICADO? * 255 de 298 ESTARÁ O PORTUGUÊS BRASILEIRO DEIXANDO DE SER LÍNGUA DE SUJEITO-PREDICADO? * Elisângela Gonçalves ** Daiane Gomes Bahia *** Paula Barreto Silva **** RESUMO Este trabalho consiste em um recorte

Leia mais

PARÂMETROS SOCIOLINGUÍSTICOS DO PORTUGUÊS DE NATAL. Palavras-chave: variação lingüística; sociedade; conectores coordenativos

PARÂMETROS SOCIOLINGUÍSTICOS DO PORTUGUÊS DE NATAL. Palavras-chave: variação lingüística; sociedade; conectores coordenativos 27 PARÂMETROS SOCIOLINGUÍSTICOS DO PORTUGUÊS DE NATAL Simone Queiroz Mendonça Resumo A partir de uma reflexão sobre a formação da língua portuguesa tendo como base o aparato teórico-metodológico da sociolingüística

Leia mais

De tudo ficaram três coisas: A certeza de que estamos sempre recomeçando A certeza que precisamos continuar A certeza que seremos interrompidos antes

De tudo ficaram três coisas: A certeza de que estamos sempre recomeçando A certeza que precisamos continuar A certeza que seremos interrompidos antes De tudo ficaram três coisas: A certeza de que estamos sempre recomeçando A certeza que precisamos continuar A certeza que seremos interrompidos antes de terminar Portanto, devemos fazer da interrupção

Leia mais

Aprendizagem ao Longo da Vida Inquérito à Educação e Formação de Adultos 2007

Aprendizagem ao Longo da Vida Inquérito à Educação e Formação de Adultos 2007 Aprendizagem ao Longo da Vida Inquérito à Educação e Formação de Adultos 2007 25 de Novembro de 2009 A publicação Aprendizagem ao Longo da Vida Inquérito à Educação e Formação de Adultos 2007, apresenta,

Leia mais

Realizações do sujeito expletivo em construções com o verbo ter existencial na fala alagoana

Realizações do sujeito expletivo em construções com o verbo ter existencial na fala alagoana Realizações do sujeito expletivo em construções com o verbo ter existencial na fala alagoana ELYNE GISELLE DE SANTANA LIMA AGUIAR VITÓRIO Doutoranda em Linguística pelo Programa de Pós-Graduação em Letras

Leia mais

Silvia Figueiredo Brandão Universidade Federal do Rio de Janeiro/cnpq, Brasil

Silvia Figueiredo Brandão Universidade Federal do Rio de Janeiro/cnpq, Brasil PAPIA 22(1), p. 7-39, 2012. ISSN 0103-9415 eissn 2316-2767 A concordância nominal e verbal no Português do Brasil e no Português de São Tomé: uma abordagem sociolinguística Noun and verb agreement in Brazilian

Leia mais

OS PRONOMES PESSOAIS-SUJEITO NO PORTUGUÊS DO BRASIL: NÓS E A GENTE SEGUNDO OS DADOS DO PROJETO ATLAS LINGÜÍSTICO DO BRASIL

OS PRONOMES PESSOAIS-SUJEITO NO PORTUGUÊS DO BRASIL: NÓS E A GENTE SEGUNDO OS DADOS DO PROJETO ATLAS LINGÜÍSTICO DO BRASIL 167 de 297 OS PRONOMES PESSOAIS-SUJEITO NO PORTUGUÊS DO BRASIL: NÓS E A GENTE SEGUNDO OS DADOS DO PROJETO ATLAS LINGÜÍSTICO DO BRASIL Viviane de Jesus Ferreira (UFBA) Suzana Alice Marcelino da Silva Cardoso

Leia mais

Variações linguísticas: Norma Padrão e Norma culta

Variações linguísticas: Norma Padrão e Norma culta L.E. Semana 2 Segunda Feira Variações linguísticas: Norma Padrão e Norma culta Diferença entre a norma padrão e a norma culta o português não é homogêneo O português, como todas as línguas, é heterogêneo:

Leia mais

Unidade 1 O que é o Celpe-Bras?

Unidade 1 O que é o Celpe-Bras? Unidade 1 O que é o Celpe-Bras? UNIDADE 1 1. O que é o Celpe-Bras? O Celpe-Bras é o Certificado de Proficiência em Língua Portuguesa para Estrangeiros desenvolvido e outorgado pelo Ministério da Educação

Leia mais

LINGUÍSTICA APLICADA AO ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

LINGUÍSTICA APLICADA AO ENSINO DE LÍNGUA MATERNA TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Linguística Aplicada ao Ensino de Língua Materna: uma entrevista com Luiz Carlos Travaglia. ReVEL. Vol. 2, n. 2, 2004. ISSN 1678-8931 [www.revel.inf.br]. LINGUÍSTICA APLICADA AO

Leia mais

A VARIAÇÃO DE PLURALIDADE NO SN E O ENSINO DA VARIEDADE PADRÃO (THE VARIATION OF PLURALITY IN THE SN AND THE TEACHING OF THE STANDARD VARIATION)

A VARIAÇÃO DE PLURALIDADE NO SN E O ENSINO DA VARIEDADE PADRÃO (THE VARIATION OF PLURALITY IN THE SN AND THE TEACHING OF THE STANDARD VARIATION) A VARIAÇÃO DE PLURALIDADE NO SN E O ENSINO DA VARIEDADE PADRÃO (THE VARIATION OF PLURALITY IN THE SN AND THE TEACHING OF THE STANDARD VARIATION) Ana Luzia Videira PARISOTTO (PG UNESP) ABSTRACT: This study

Leia mais

MOÇAMBIQUE UMA OPORTUNIDADE DE INVESTIMENTO. Vitor Brito

MOÇAMBIQUE UMA OPORTUNIDADE DE INVESTIMENTO. Vitor Brito MOÇAMBIQUE UMA OPORTUNIDADE DE INVESTIMENTO Vitor Brito vbrito@betar.pt 2 / 30 BETAR - APRESENTAÇÃO 1973 Sector dos edifícios e utilities 1988 Sector da obras de arte e estruturas especiais 1998 Sistema

Leia mais

Livros didáticos de língua portuguesa para o ensino básico

Livros didáticos de língua portuguesa para o ensino básico Livros didáticos de língua portuguesa para o ensino básico Maria Inês Batista Campos maricamp@usp.br 24/09/2013 Universidade Estadual de Santa Cruz/UESC Ilhéus-Bahia Objetivos Compreender o livro didático

Leia mais

Língua portuguesa em África: políticas linguísticas e crioulos em debate

Língua portuguesa em África: políticas linguísticas e crioulos em debate Língua portuguesa em África: políticas linguísticas e crioulos em debate Alexandre António Timbane Academia de Ciências Policiais - Moçambique Universidade Federal de Goiás- Brasil Sabrina Rodrigues Garcia

Leia mais

DO ANTIGO AO NOVO: DA MUDANÇA DA TEORIA LINGUÍSTICA À MUDANÇA DA LÍNGUA

DO ANTIGO AO NOVO: DA MUDANÇA DA TEORIA LINGUÍSTICA À MUDANÇA DA LÍNGUA 471 de 663 DO ANTIGO AO NOVO: DA MUDANÇA DA TEORIA LINGUÍSTICA À MUDANÇA DA LÍNGUA Sivonei Ribeiro Rocha 146 (UESB) Jorge Augusto Alves da Silva 147 (UESB) RESUMO Este trabalho compara o conceito de mudança

Leia mais

1.1 Os temas e as questões de pesquisa. Introdução

1.1 Os temas e as questões de pesquisa. Introdução 1 Introdução Um estudo de doutorado é, a meu ver, um caso de amor, e em minha vida sempre houve duas grandes paixões imagens e palavras. Escolhi iniciar minha tese com o poema apresentado na epígrafe porque

Leia mais

POBREZA E BEM-ESTAR EM MOÇAMBIQUE:

POBREZA E BEM-ESTAR EM MOÇAMBIQUE: POBREZA E BEM-ESTAR EM MOÇAMBIQUE: RESUMO DA QUARTA AVALIAÇÃO NACIONAL (IOF 2014/15) Índice 1. Introdução... 1 2. Dados e definições... 1 2.1 Fontes de dados... 1 2.2 Definição da pobreza... 2 3. Pobreza

Leia mais

Nados vivos segundo a nacionalidade dos pais, Portugal, 1995 a 2009 análise exploratória de dados

Nados vivos segundo a nacionalidade dos pais, Portugal, 1995 a 2009 análise exploratória de dados Nados vivos segundo a nacionalidade dos pais, Portugal, 1995 a 2009 Joana Malta Instituto Nacional de Estatística Graça Magalhães Instituto Nacional de Estatística Nados vivos segundo a nacionalidade dos

Leia mais

O programa de saúde da família: evolução de sua implantação no Brasil. Instituto de Saúde Coletiva - Universidade Federal da Bahia

O programa de saúde da família: evolução de sua implantação no Brasil. Instituto de Saúde Coletiva - Universidade Federal da Bahia Título do Estudo: O programa de saúde da família: evolução de sua implantação no Brasil Instituição executora: Instituto de Saúde Coletiva - Universidade Federal da Bahia Instituição financiadora: Ministério

Leia mais

ESCOLA SECUNDÁRIA DO MONTE DA CAPARICA Curso de Educação e Formação de Adultos NS Trabalho Individual Área / UFCD

ESCOLA SECUNDÁRIA DO MONTE DA CAPARICA Curso de Educação e Formação de Adultos NS Trabalho Individual Área / UFCD 1 de 6 Impactos económicos, culturais e sociais dos fluxos migratórios no Portugal Contemporâneo OBJECTIVO: reconhecer a diversidade de políticas de inserção e inclusão multicultural. Este trabalho foi

Leia mais

Língua portuguesa: ultrapassar fronteiras, juntar culturas

Língua portuguesa: ultrapassar fronteiras, juntar culturas A MONOTONGAÇÃO DIANTE DE /S/ NO AÇORIANO-CATARINENSE Cláudia Regina BRESCANCINI 1 RESUMO: O processo de redução verificado em ditongos decrescentes seguidos por fricativa palato-alveolar (como em [sej

Leia mais

CRENÇAS QUE ALUNOS DE LETRAS PORTUGUÊS/INGLÊS MANIFESTAM A RESPEITO DO PAPEL DA GRAMÁTICA NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA

CRENÇAS QUE ALUNOS DE LETRAS PORTUGUÊS/INGLÊS MANIFESTAM A RESPEITO DO PAPEL DA GRAMÁTICA NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA CRENÇAS QUE ALUNOS DE LETRAS PORTUGUÊS/INGLÊS MANIFESTAM A RESPEITO DO PAPEL DA GRAMÁTICA NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA Maria Avelino de Araujo (BIC/ARAUCÁRIA), Letícia Fraga (Orientadora), e- mail: leticiafraga@gmail.com

Leia mais

INFLUÊNCIAS PROSÓDICAS, ACÚSTICAS E GRAMATICAIS SOBRE A PONTUAÇÃO DE TEXTOS ESCRITOS

INFLUÊNCIAS PROSÓDICAS, ACÚSTICAS E GRAMATICAIS SOBRE A PONTUAÇÃO DE TEXTOS ESCRITOS Página 21 de 315 INFLUÊNCIAS PROSÓDICAS, ACÚSTICAS E GRAMATICAIS SOBRE A PONTUAÇÃO DE TEXTOS ESCRITOS José Júnior Dias da Silva 5 (UESB) Vera Pacheco 6 (UESB) RESUMO O presente trabalho visa analisar redações

Leia mais

Análise das religiões relativa à localidade, escolaridade e poder aquisitivo dos fiéis.

Análise das religiões relativa à localidade, escolaridade e poder aquisitivo dos fiéis. Análise das religiões relativa à localidade, escolaridade e poder aquisitivo dos fiéis. Por James Mytho. Faltando pouco mais de 2 anos para o próximo Censo, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e

Leia mais

DOMÍNIOS DE Revista Eletrônica de Lingüística Ano 1, nº1 1º Semestre de 2007 ISSN

DOMÍNIOS DE Revista Eletrônica de Lingüística Ano 1, nº1 1º Semestre de 2007 ISSN ESTUDO EM TEMPO APARENTE E EM TEMPO REAL DO USO DO SUJEITO NULO NA FALA DE BELO HORIZONTE Nasle Maria Cabana RESUMO Neste artigo, analisa-se o comportamento do sujeito pronominal lexical e sujeito pronominal

Leia mais

BALANÇO DE PRODUÇÃO SOBRE APRENDIZAGEM COOPERATIVA E EDUCAÇÃO SUPERIOR

BALANÇO DE PRODUÇÃO SOBRE APRENDIZAGEM COOPERATIVA E EDUCAÇÃO SUPERIOR GT11 - Política da Educação Superior Pôster 520 BALANÇO DE PRODUÇÃO SOBRE APRENDIZAGEM COOPERATIVA E EDUCAÇÃO SUPERIOR Karina Nonato Mocheuti - UNEMAT Resumo Este ensaio apresenta os passos da construção

Leia mais

USO DO FUTURO DO PORTUGUÊS BRASILEIRO EM BLOG JORNALÍSTICO: UM ESTUDO PRELIMINAR SOBRE A GRAMATICALIZAÇÃO DO ITEM IR

USO DO FUTURO DO PORTUGUÊS BRASILEIRO EM BLOG JORNALÍSTICO: UM ESTUDO PRELIMINAR SOBRE A GRAMATICALIZAÇÃO DO ITEM IR 463 de 663 USO DO FUTURO DO PORTUGUÊS BRASILEIRO EM BLOG JORNALÍSTICO: UM ESTUDO PRELIMINAR SOBRE A GRAMATICALIZAÇÃO DO ITEM IR Milca Cerqueira Etinger Silva 142 (UESB) Gilsileide Cristina Barros Lima

Leia mais

A FLEXÃO PORTUGUESA: ELEMENTOS QUE DESMISTIFICAM O CONCEITO DE QUE FLEXÃO E CONCORDÂNCIA SÃO CATEGORIAS SINTÁTICAS DEPENDENTES 27

A FLEXÃO PORTUGUESA: ELEMENTOS QUE DESMISTIFICAM O CONCEITO DE QUE FLEXÃO E CONCORDÂNCIA SÃO CATEGORIAS SINTÁTICAS DEPENDENTES 27 Página 75 de 315 A FLEXÃO PORTUGUESA: ELEMENTOS QUE DESMISTIFICAM O CONCEITO DE QUE FLEXÃO E CONCORDÂNCIA SÃO CATEGORIAS SINTÁTICAS DEPENDENTES 27 Iany França Pereira 28 (UESB) Cristiane Namiuti Temponi

Leia mais

Formação de professores e tecnologia: construindo o site institucional

Formação de professores e tecnologia: construindo o site institucional Formação de professores e tecnologia: construindo o site institucional Luma Cristina Ferreira de Oliveira¹, Carla Conti de Freitas² ¹Universidade Estadual de Goiás, ²Universidade Estadual de Goiás Resumo:

Leia mais

REFLEXÕES INICIAIS SOBRE LETRAMENTO

REFLEXÕES INICIAIS SOBRE LETRAMENTO REFLEXÕES INICIAIS SOBRE LETRAMENTO Jéssica Caroline Soares Coelho 1 Elson M. da Silva 2 1 Graduanda em Pedagogia pela UEG- Campus Anápolis de CSEH 2 Doutor em Educação e docente da UEG Introdução O objetivo

Leia mais

Manual para a elaboração do TCC em formato Monografia Curso de Publicidade e Propaganda 2º/2016

Manual para a elaboração do TCC em formato Monografia Curso de Publicidade e Propaganda 2º/2016 Manual para a elaboração do TCC em formato Monografia Curso de Publicidade e Propaganda 2º/2016 Realizar uma Monografia é uma das modalidades de pesquisa que o aluno dispõe como alternativa para o Trabalho

Leia mais

própria comunidade científica, o contato foi considerado apenas como fator secundário. Quando nos voltamos para a realidade dos estudos lingüísticos

própria comunidade científica, o contato foi considerado apenas como fator secundário. Quando nos voltamos para a realidade dos estudos lingüísticos 1. Introdução Línguas em contato pressupõem indiscutivelmente pessoas em contato. Nesta perspectiva, ao considerarmos que as necessidades do homem desde o início da história da humanidade levaram os indivíduos

Leia mais

CAPÍTULO I DAS DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

CAPÍTULO I DAS DISPOSIÇÕES PRELIMINARES CAPÍTULO I DAS DISPOSIÇÕES PRELIMINARES Art. 1º O presente regulamento visa normatizar as atividades relacionadas ao Trabalho de Conclusão do Curso (TCC) de Graduação - Bacharelado em Ciências Econômicas

Leia mais

III VARIÁVEIS MORFOSSINTÁTICAS

III VARIÁVEIS MORFOSSINTÁTICAS III VARIÁVEIS MORFOSSINTÁTICAS 8 CAPÍTULO CONCORDÂNCIA NOMINAL NO PORTUGUÊS DE SÃO TOMÉ E NO PORTUGUÊS DE MOÇAMBIQUE SILVIA FIGUEIREDO BRANDÃO 1. INTRODUÇÃO: POR QUE FOCALIZAR VARIEDADES AFRICANAS DO

Leia mais

Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos

Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos A VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: PARTE INTEGRANTE DA LÍNGUA Patricia Damasceno Fernandes (UEMS) damasceno75@gmail.com Natalina Sierra Assêncio Costa (UEMS) nattysierra2011@hotmail.com RESUMO O presente trabalho

Leia mais

Processamento fonológico e habilidades iniciais. de leitura e escrita em pré-escolares: enfoque no. desenvolvimento fonológico

Processamento fonológico e habilidades iniciais. de leitura e escrita em pré-escolares: enfoque no. desenvolvimento fonológico Renata Maia Vitor Processamento fonológico e habilidades iniciais de leitura e escrita em pré-escolares: enfoque no desenvolvimento fonológico Dissertação de mestrado apresentada ao curso de Pós-Graduação

Leia mais

Departamento de Ciências Sociais e Humanas Ano

Departamento de Ciências Sociais e Humanas Ano Departamento de Ciências Sociais e Humanas Ano 2017-2018 Disciplina: História e Geografia de Portugal (5º e 6º Anos) Critérios de Avaliação ENSINO BÁSICO - 5º E 6º ANOS MATERIAL NECESSÁRIO Manual, caderno

Leia mais

Conscientização sociolinguística

Conscientização sociolinguística L.E. Semana 2 Segunda Feira Conscientização sociolinguística Relação entre a estrutura linguística e os aspectos sociais e culturais da produção linguística o português não é homogêneo Produção linguística

Leia mais

Naturalidade dos sistemas e conseqüências na aprendizagem Maria Cecília Mollica (UFRJ/CNPq)

Naturalidade dos sistemas e conseqüências na aprendizagem Maria Cecília Mollica (UFRJ/CNPq) Naturalidade dos sistemas e conseqüências na aprendizagem Maria Cecília Mollica (UFRJ/CNPq) Na palestra, tenho o objetivo de demonstrar como os princípios imanentes dos sistemas das línguas podem ser úteis

Leia mais

Uma avaliação do potencial de conflito

Uma avaliação do potencial de conflito Moçambique 2003 Uma avaliação do potencial de conflito Estrutura económica no fim do período colonial Gráfico 6a. Origem do PIB, Moçambique 1962 Gráfico 6b. Origem do PIB, Moçambique 1973 Primário 25%

Leia mais

O%USO%DA%INTERNET%COMO%FERRAMENTA%TECNOLÓGICA%NO% ENSINO%DE%LÍNGUAS%ESTRANGEIRAS:%O%PAPEL%DO%PROFESSOR% REFLEXIVO%%

O%USO%DA%INTERNET%COMO%FERRAMENTA%TECNOLÓGICA%NO% ENSINO%DE%LÍNGUAS%ESTRANGEIRAS:%O%PAPEL%DO%PROFESSOR% REFLEXIVO%% OUSODAINTERNETCOMOFERRAMENTATECNOLÓGICANO ENSINODELÍNGUASESTRANGEIRAS:OPAPELDOPROFESSOR REFLEXIVO USINGTHEINTERNETASATECHNOLOGICALTOOLINFOREIGN LANGUAGETEACHING:THEROLEOFAREFLEXIVETEACHER# CrislaineLourençoFranco

Leia mais

FACULDADE SUMARÉ COORDENAÇÃO DE PESQUISA PROGRAMA DE PESQUISA - INICIAÇÃO CIENTÍFICA EDITAL DE INSCRIÇÃO Nº 01/2017

FACULDADE SUMARÉ COORDENAÇÃO DE PESQUISA PROGRAMA DE PESQUISA - INICIAÇÃO CIENTÍFICA EDITAL DE INSCRIÇÃO Nº 01/2017 FACULDADE SUMARÉ COORDENAÇÃO DE PESQUISA PROGRAMA DE PESQUISA - INICIAÇÃO CIENTÍFICA EDITAL DE INSCRIÇÃO Nº 01/2017 A Coordenação de Pesquisa da Faculdade Sumaré torna público o presente Edital para abertura

Leia mais

225,4 Mil estrangeiros adquiriram a nacionalidade portuguesa entre 2008 e 2016

225,4 Mil estrangeiros adquiriram a nacionalidade portuguesa entre 2008 e 2016 Dia Internacional dos Migrantes 2017 15 de dezembro de 225,4 Mil estrangeiros adquiriram a nacionalidade portuguesa entre 2008 e Entre 2008 e, o número total de aquisições da nacionalidade portuguesa atingiu

Leia mais

XX Encontro Anual de Iniciação Científica EAIC X Encontro de Pesquisa - EPUEPG

XX Encontro Anual de Iniciação Científica EAIC X Encontro de Pesquisa - EPUEPG ESTUDO COMPARATIVO SOBRE A VISÃO DA CIÊNCIA DOS ESTUDANTES DO ENSINO MÉDIO Raquel Roberta Bertoldo (PIBIC/FUNDAÇÃO ARAUCÁRIA/UNIOESTE), Angela Camila P. Duncke, Márcia Borin da Cunha, Marcelo Giordan,

Leia mais