Onde Estão os Mortos? Lucas 16:19-31

Transcrição

1 llllllllllllllllllllllllllllllllllllllllll Onde Estão os Mortos? Lucas 16:19-31 llllllllllllllllllllllllllllllllllllllllll llllllllllllllllllllllllllllllllllllllllll A pergunta: Onde estão os mortos? tem despertado o interesse de muitas pessoas. Tantas coisas gostaríamos de saber: para onde iremos imediatamente após a nossa morte; se os que já se foram estão conscientes ou não; se nossos entes queridos sabem que sentimos a falta deles 1 e assim por diante. Algumas dessas perguntas não podemos responder, pois a vontade de Deus tem sido ocultar certos detalhes concernentes à próxima vida. Deus certamente tem um propósito benéfico em limitar nosso conhecimento acerca da vida após a morte. Não seria desconfortável crer que os entes queridos já falecidos estão perto de nós, observando tudo o que dizemos ou fazemos? Não estamos dizendo que é isto o que acontece, mas se fosse esse o caso, saber que somos observados causaria desconforto a muitos de nós. Basicamente, o Senhor quer que vivamos em um desses mundos por vez. É provável que ficar excessivamente a par dos detalhes da próxima vida nos desqualificaria para as questões práticas desta vida. Por ser a vontade de Deus ocultar alguns detalhes do mundo vindouro (veja Deuteronômio 29:29), precisamos nos satisfazer com o que sabemos e dizer: Que seja feita a Tua vontade (veja Mateus 26:42). Todavia, temos o direito de saber o que Deus já nos revelou sobre o assunto. Estudaremos uma história contada por Jesus para encontrar a resposta bíblica à pergunta: Onde estão os mortos? : Ora, havia certo homem rico que se vestia de púrpura e de linho finíssimo e que, todos os dias, se regalava esplendidamente. Havia também certo mendigo, chamado Lázaro 2, coberto de chagas, que jazia à porta daquele; e desejava alimentar-se das migalhas que caíam da mesa do rico; e até os cães vinham lamber-lhe as úl- 1 Alguns usam Hebreus 12:1 para ensinar que estamos cercados pelas almas dos mortos. Hebreus 12:1 4 usa a analogia de uma corrida para ensinar o valor da perseverança no viver cristão. Não devemos destacar detalhes de uma ilustração para elaborar em cima deles posições doutrinárias. 2 O Lázaro daqui não é o mesmo que viveu em Betânia e foi amigo de Jesus (João 11). ceras. Aconteceu morrer o mendigo e ser levado pelos anjos para o seio de Abraão; morreu também o rico e foi sepultado. No inferno, estando em tormentos, levantou os olhos e viu ao longe a Abraão e Lázaro no seu seio. Então, clamando, disse: Pai Abraão, tem misericórdia de mim! E manda a Lázaro que molhe em água a ponta do dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama. Disse, porém, Abraão: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em tua vida, e Lázaro igualmente, os males; agora, porém, aqui, ele está consolado; tu, em tormentos. E, além de tudo, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que querem passar daqui para vós outros não podem, nem os de lá passar para nós. Então, replicou: Pai, eu te imploro que o mandes à minha casa paterna, porque tenho cinco irmãos; para que lhes dê testemunho, a fim de não virem também para este lugar de tormento. Respondeu Abraão: Eles têm Moisés e os Profetas; ouçam-nos. Mas ele insistiu: Não, pai Abraão; se alguém dentre os mortos for ter com eles, arrepender-se-ão. Abraão, porém, lhe respondeu: Se não ouvem a Moisés e aos Profetas, tampouco se deixarão persuadir, ainda que ressuscite alguém dentre os mortos (Lucas 16:19 31). Muitas lições podem ser colhidas desta passagem 3, mas analisaremos apenas um aspecto neste sermão: o que esta passagem ensina sobre o estado dos mortos? Antes que alguém conteste que não podemos extrair nenhuma conclusão com base nesses versículos, por constituírem uma parábola e não fornecerem um retrato exato da vida após a morte, convém observarmos que esta parábola não se enquadra no modelo geral das parábolas 4 contadas por Jesus. Exemplificando, Jesus citou o nome da personagem da história: Lázaro. Ele não fez isto em nenhuma outra parábola registrada na Bíblia. Além disso, a idéia básica de uma parábola era usar um incidente 3 Veja o sermão Uma Carta do Inferno, na edição A Vida de Cristo Parte 8, p. 45ss. 4 Veja uma exposição sobre esta passagem ser ou não uma parábola na edição A Vida de Cristo Parte 8, pp. 40s. 1

2 com o qual todos estavam familiarizados para ensinar uma lição espiritual. O ouvinte comum dificilmente estaria bem familiarizado com o tema do estado dos mortos. Os fatos disponíveis sugerem que não se tratava de uma parábola, mas de uma história da vida real contada por Jesus para que Ele comunicasse a Sua mensagem. Por outro lado, se reconhecêssemos o texto como uma parábola, isto faria pouca diferença para as verdades nele declaradas. A palavra parábola não é sinônimo de conto fantástico. Uma parábola traçava um paralelo de uma situação da vida real com uma aplicação espiritual 5. Não acreditamos que Lucas 16:19 31 seja uma parábola mas, mesmo que seja, o texto ainda constitui uma descrição precisa do que acontece aos espíritos desencarnados. Diante disto, acreditamos que podemos usar a história do rico e Lázaro como uma das principais referências da resposta de Deus à pergunta: Onde estão os mortos? 6 Analisando a passagem, chegaremos a várias conclusões. OS MORTOS ESTÃO EM ALGUM LUGAR E ESTÃO CONSCIENTES Alguns responderiam a pergunta-título deste estudo com um sonoro em lugar nenhum 7. Acreditam estes que não há vida além desta vida. Eles têm certeza de que esta vida é uma via de sentido único que termina na morte. Entretanto, se Lucas 16 ensina alguma coisa, ensina que o homem vive além da morte. Outros, que acreditam na vida além da morte, ensinam que os indivíduos deixam de existir quando morrem (eles só existem na memória de Deus) e que um dia haverá uma ressurreição (na verdade, uma re-criação), na qual os justos ganharão imortalidade e os maus serão aniquilados. O rico e Lázaro não deixaram de existir após morrerem. Ambos estavam vivos e conscientes. Alguns que defendem as duas correntes acima mencionadas costumam dizer: Se o espírito continuar vivendo, após a morte, então não houve morte. Quando solicitados a definir morte, per- cebe-se que para eles morte significa extinção, mas essa definição é dificilmente compatível com passagens como as seguintes: Romanos 7:9. Paulo disse: Outrora, sem a lei, eu vivia; mas, sobrevindo o preceito, reviveu o pecado, e eu morri. O apóstolo, porventura, deixou de existir? Colossenses 3:3. Paulo também escreveu: porque morrestes, e a vossa vida está oculta juntamente com Cristo, em Deus. Será que seus leitores foram extintos? 1 Timóteo 5:6: Ele também disse que a [mulher] que se entrega aos prazeres, mesmo viva, está morta. A mulher que o apóstolo descreveu não deixou de existir. A palavra morte refere-se basicamente a uma separação 8 o fim de um estado ou de uma condição e não a uma extinção. Via de regra, aqueles que sustentam os pontos de vista mencionados negam a existência da parte imortal do homem chamada alma ou espírito. A alma refere-se apenas à vida física dentro de nós, dizem eles. Insistem também que o espírito é nada mais do que o fôlego que Deus deu a cada um. A palavra grega traduzida por alma (psique) pode referir-se ao fôlego, ao lugar dos sentimentos ou até a um ser vivo; mas também pode se referir a uma essência que difere do corpo e não se desfaz com a morte 9. Da mesma forma, a palavra grega equivalente a espírito (pneuma) pode se referir a vento, fôlego, ou o princípio vital pelo qual o corpo é animado, mas também se refere a um espírito... uma essência simples, destituída de toda ou parte da matéria bruta, e possuidora do poder de saber, desejar, decidir e agir;... uma alma humana que deixou o corpo 10. Muitas passagens bíblicas indicam que o homem é um ser duplo, e que, quando o corpo deixa de existir, o espírito continua vivendo. Aqui estão algumas dessas passagens: 5 Reveja comentários sobre o significado da palavra parábola nas páginas 5 e 6 da edição A Vida de Cristo Parte 5. 6 Há também os que acreditam que Lucas 16 descreve o estado dos mortos somente antes de, e não após, Jesus morrer na cruz. Esse ponto de vista é comentado mais adiante no artigo Os Justos Vão Diretamente para o Céu?. 7 Poderiam dizer no túmulo mas, como o corpo se decompõe e depois se mistura à terra ao seu redor, a resposta final dessa corrente é em lugar nenhum. 8 Estamos mortos no pecado (Efésios 2:1) quando nossos pecados nos separam de Deus (Isaías 59:1, 2). Estamos fisicamente mortos quando o espírito está separado do corpo (Tiago 2:26).. A segunda morte (Apocalipse 20:14) ocorre quando a pessoa é separada de Deus por toda a eternidade (2 Tessalonicenses 1:9). 9 C. G. Wilke e Wilibald Grimm, A Greek-English Lexicon of the New Testament, trad. e rev. Joseph H. Thayer. Edinburgh, Escócia: T. & T. Clark, 1901; reimpressão; Grand Rapids, Mich.: Baker Book House, 1977, p Thayer, p

3 E o pó volte à terra, como o era, e o espírito volte a Deus, que o deu (Eclesiastes 12:7). Jesus lhe respondeu: Em verdade te digo que hoje estarás comigo no paraíso (Lucas 23:43). Então, Jesus clamou em alta voz: Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito! E, dito isto, expirou (Lucas 23:46). E apedrejavam Estêvão, que invocava e dizia: Senhor Jesus, recebe o meu espírito! (Atos 7:59). Por isso, não desanimamos; pelo contrário, mesmo que o nosso homem exterior se corrompa, contudo, o nosso homem interior se renova de dia em dia. Sabemos que, se a nossa casa terrestre deste tabernáculo se desfizer, temos da parte de Deus um edifício, casa não feita por mãos, eterna, nos céus... Temos, portanto, sempre bom ânimo, sabendo que, enquanto no corpo, estamos ausentes do Senhor; visto que andamos por fé e não pelo que vemos. Entretanto, estamos em plena confiança, preferindo deixar o corpo e habitar com o Senhor (2 Coríntios 4:16 5:8). Onde obtemos nossos espíritos? A Bíblia referese a Deus como o Pai espiritual (Hebreus 12:9). O profeta Zacarias disse que o Senhor formou o espírito do homem dentro dele (Zacarias 12:1). A primeira resposta à pergunta: Onde estão os mortos? é: Eles estão em algum lugar e estão conscientes. Há, contudo, mais verdades para aprendermos com esse texto bíblico. OS MORTOS NÃO ESTÃO REENCARNADOS EM NOVOS CORPOS AQUI NA TERRA A doutrina da reencarnação consiste na crença de que as almas dos mortos retornam sucessivamente à terra em novas formas de vida ou corpos. Essa é a doutrina básica do hinduísmo, de muitas religiões orientais e do espiritismo. Em alguns países do mundo onde o povo acredita na reencarnação, animais como macacos, vacas, elefantes e cobras são considerados sagrados. Os adeptos dessas seitas acreditam que tais animais podem ser reencarnações de seus ancestrais. Alguns judeus acreditavam numa variação dessa crença (veja Mateus 16:13, 14). Contrariando tais doutrinas, em Lucas 16 o rico e Lázaro não voltaram à terra em novos corpos ou formas físicas. Eles continuaram sendo os mesmos, e o texto enfatiza que seu estado era permanente. O versículo 26 diz: E, além de tudo, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que querem passar daqui para vós outros não podem, nem os de lá passar para nós. De fato, Abraão mostrou que nenhum deles poderia voltar à terra em nenhuma forma. Não deve nos causar admiração quando a mídia conta histórias de supostos casos de reencarnação. Temos um critério para nossas vidas e crenças: a Bíblia. Idéias novas podem ser interessantes, mas o teste que devemos aplicar é este: como isto se alinha com os ensinos da Palavra? A pura verdade é que a doutrina da reencarnação não é ensinada na Bíblia. Observemos alguns princípios bíblicos básicos: Eclesiastes 3:2: há tempo de nascer e tempo de morrer. Hebreus 9:27:...aos homens está ordenado morrerem uma só vez, vindo, depois disto, o juízo. Eclesiastes 12:7: e o pó volte à terra, como o era, e o espírito volte a Deus, que o deu. 2 Coríntios 5:10: Porque importa que todos nós compareçamos perante o tribunal de Cristo, para que cada um receba segundo o bem ou o mal que tiver feito por meio do corpo. A Bíblia não ensina a doutrina da reencarnação. Sendo assim, ela não pode ser aceita por meio da fé (Romanos 10:17). Lucas 16 deixa claro que essa doutrina é falsa. OS MORTOS NÃO PASSAM DIRETAMENTE PARA O DESTINO ETERNO Alguns acreditam que as pessoas, ao morrerem, vão diretamente para o céu ou para o inferno. O rico e Lázaro ainda não haviam chegado aos seus destinos finais (como será notado mais adiante neste estudo) 11. Se as pessoas fossem diretamente para o seu destino eterno, isto invalidaria, em grande escala, o ensino bíblico sobre o Dia do Juízo. A Bíblia enfatiza que haverá um dia em que todos, os bons e os maus, serão julgados (Mateus 25:31, 32; João 16:8; Atos 17:31; Hebreus 6:2; 9:27; veja Atos 24:25). Esse julgamento incluirá os que tiverem morrido antes da volta do Senhor (veja Mateus 12:41, 42). Pedro escreveu que o Senhor sabe livrar da provação os piedosos e reservar, sob castigo, os injustos para o Dia de Juízo (2 Pedro 2:9). O teor geral do ensi- 11 Veja mais sobre o ponto de vista de que houve uma mudança após a morte de Cristo no artigo suplementar Os Justos Vão Diretamente para o Céu?, mais adiante nesta edição. 3

4 no bíblico sobre o Julgamento é que ele acontecerá quando o Senhor voltar, no momento em que tanto os vivos como os mortos comparecerão perante Deus. Parece, portanto, improvável que os mortos fossem transportados para o céu ou o inferno, para depois serem retirados de lá no Dia do Juízo, e voltarem novamente ao lugar em que já estavam 12. Há, de fato, duas passagens que parecem indicar que os justos vão diretamente para o seu destino eterno: Paulo disse aos coríntios que era preferível deixar o corpo e habitar com o Senhor (2 Coríntios 5:8). O mesmo apóstolo escreveu aos filipenses que ele tinha o desejo de partir e estar com Cristo (Filipenses 1:23). Nossa sugestão é que o propósito destas duas passagens não é ensinar sobre o estado final dos mortos, e sim enfatizar que a morte é uma vitória para quem está preparado. Num sentido, os justos que partirem estão com Cristo, cercados pelo Seu amor, mas não no sentido de que irão diretamente para o céu 13. Novamente sugerimos que, quando Paulo morreu, ele foi estar com o Senhor, mas ele ainda não recebeu sua coroa no céu. Jesus ensinou que os que expressam amor aos outros (Lucas 14:12, 13) serão recompensados na ressurreição dos justos (v. 14), e não assim que morrerem. A maioria dos estudiosos acredita que Jesus referiu-se à segunda vinda quando disse:...voltarei e vos receberei para mim mesmo, para que, onde eu estou, estejais vós também (João 14:3). Falando de sua coroa de justiça, Paulo escreveu que o Senhor, o reto juiz, me dará naquele Dia; e não somente a mim, mas também a todos quantos amam a sua vinda (2 Timóteo 4:8). Observemos a expressão naquele dia e o fato de que Paulo indicou que quem ama a volta de Cristo receberá a mesma coroa no mesmo dia. No contexto, a referência era ao Dia do Juízo. Até este ponto, temos sido bastante negativos em nossa perspectiva da história de Lucas 16. Rejeitamos as diversas idéias de que os mortos não estão em lugar nenhum, de que voltam à terra em corpos diferentes e de que já estão no céu ou no inferno. Mas a pergunta insiste: Onde, afinal, estão os mortos? Passemos agora para um exame mais positivo desse trecho bíblico. 12 Uma objeção semelhante é levantada contra o conceito de hades. Falaremos mais a respeito no sermão a seguir e no artigo Os Justos Vão Diretamente para o Céu?, mais adiante. 13 Exploraremos mais essas idéias no artigo Os Justos Vão Diretamente para o Céu?, mais adiante. OS MORTOS ESTÃO NUM ESTADO INTERMEDIÁRIO À ESPERA DO JUÍZO No decorrer dos anos, os pregadores do evangelho têm usado uma variedade de diagramas para visualizar o hades descrito em Lucas 16. Esses diagramas possuem um ponto fraco, pois deixam a impressão de que o hades é um ponto geográfico, o que não é verdade. Mais do que um lugar, o hades é um estado. Todavia, desconhecemos um modo mais eficaz de salientar as diferentes situações retratadas na história, por isso vamos expor um diagrama que utiliza as designações citadas no texto original de Lucas 16. Tormento ou Tártaro HADES (o mundo invisível) GRANDE ABISMO O Rico Lázaro Seio de Abraão ou Paraíso Vejamos os componentes desse diagrama. Primeiramente, observemos o título no alto: HADES (traduzido por inferno, ou seja, o mundo invisível ). O rico levantou os olhos no HADES (Lucas 16:23). A Bíblia refere-se ao estado dos mortos com o termo hades. Hades é uma palavra grega que, a grosso modo, equivale ao termo hebraico sheol, citado no Antigo Testamento 14. A palavra hades significa basicamente invisível 15 e refere-se ao [mundo] invisível dos mortos. Thayer deu a seguinte definição à palavra conforme seu uso em Lucas 16: o receptáculo comum dos espíritos desencarnados 16. Hoje, a palavra hades geralmente é usada como um eufemismo de inferno 17, mas inferno (geena) 14 O Antigo Testamento tem menos a dizer sobre o estado dos mortos do que o Novo. A palavra hebraica sheol é um termo mais geral (e vago) do que o grego hades. Sheol geralmente se refere ao túmulo. 15 O léxico de Thayer diz que não deve ser visto, p Thayer, p A confusão se deve às traduções mais populares que usaram inferno no lugar de hades. 4

5 é o estado eterno dos mortos maus, enquanto (conforme veremos) hades é o estado intermediário de todos os mortos, bons e maus. Vejamos novamente o diagrama. Há dois componentes distintos no mundo do hades. O rico estava em um deles; Lázaro estava no outro. Há também uma divisão denominada GRANDE ABISMO. Analisemos cada aspecto mais detalhadamente, começando com o estado do rico. No inferno, estando em tormentos (Lucas 16:23a; grifo meu). Já designamos a situação em que o rico se encontrava como tormento. Abaixo da palavra tormento aparece ou tártaro. Essa terminologia vem de 2 Pedro 2:4, que descreve uma condição semelhante, senão a mesma, à do rico: Ora, se Deus não poupou anjos quando pecaram, antes, precipitando-os no inferno, os entregou a abismos de trevas, reservando-os para juízo. A palavra traduzida por inferno em 2 Pedro 2:4 não é geena, que se refere ao castigo eterno, e sim uma variante de tartaros 18. Tartaros era usado pelos gregos para designar a parte do hades onde os maus eram confinados e atormentados 19. A NVI diz que os anjos que pecaram foram presos em abismos tenebrosos a fim de serem reservados para o juízo. Notemos que o juízo ainda não havia acontecido, pois esse era um estado intermediário antes do Dia do Juízo. Como já dissemos, a situação parece semelhante, senão for a mesma, à do estado em que o rico foi confinado. Voltemos o olhar para o estado de Lázaro: a condição dele foi denominada no diagrama de Seio de Abraão, porque o rico viu ao longe a Abraão e Lázaro no seu seio (Lucas 16:23). Estar no seio de alguém era estar muito perto, desfrutar de comunhão e comunicação íntimas 20. Obviamente, Lázaro gozava de felicidade e paz. Esse é o estado em que os justos aguardam o Juízo. Abaixo das palavras Seio de Abraão, colocamos ou Paraíso. Essa designação procede da ida de Jesus ao hades, após a Sua morte. Na cruz, Ele disse ao ladrão arrependido:... hoje estarás comigo 18 A sentença precipitando-os no inferno é a tradução de um único verbo grego que significa literalmente tendo[- os] destinado a tartaros, segundo algumas versões interlineares. 19 The Analytical Greek Lexicon.Londres: Samuel Bagster & Sons Ltd., 1971, p Essa figura de linguagem provavelmente derivou-se dos hábitos alimentares daquela época: a pessoa reclinada à direita do anfitrião (o lugar de mais elevada honra) era descrita como estando no seu seio (João 13:23, 25; 21:20; veja João 1:18). O termo se repete em expressões atuais como no seio da família. no paraíso (Lucas 23:43). Paraíso é uma palavra persa que significa lugar de prazer ou jardim de prazer 21. O termo é às vezes usado na Bíblia referindo-se ao céu (veja Apocalipse 2:7) mas esse não é o caso aqui, pois após Sua rápida estada no paraíso, Jesus disse que ainda não havia subido para o Pai (João 20:17). No sermão de Pedro no dia de Pentecostes, ele deu a entender que enquanto o corpo de Jesus estava no túmulo, Seu Espírito estava no hades (Atos 2:31) 22. Juntando Lucas 23:43 com Atos 2:31, concluímos que o espírito de Jesus estava numa parte do hades que pode ser chamada de paraíso. Parece plausível deduzir que esse paraíso equivale a estar no seio de Abraão. Em outras palavras, ambas as expressões referem-se ao estado dos justos que morreram um estado em que aguardam o Juízo, mas uma situação repleta de paz, felicidade e segurança. Tendo observado que havia dois estados em que os mortos aguardavam o Juízo um com paz e segurança e outro com tormento e angústia podemos questionar: Mas se os justos já estão felizes e os maus já estão sendo atormentados, qual é o propósito do Dia do Juízo? 23 Não deve nos incomodar a idéia de admitir que tentar discorrer a respeito da vida após a morte poderia ser comparado a dois fetos especularem sobre como deve ser a vida fora do útero. Nossas respostas sempre colocarão em exposição a nossa ignorância. Entretanto, alguns comentários sobre esta questão fazem-se necessários. Uma possível resposta seria que o Dia do Juízo não será tanto para determinar culpados e inocentes quanto para emitir a sentença um dia em que tanto a misericórdia como a justiça de Deus serão perfeitamente demonstradas. A resposta final, porém, certamente reside em compreender que quando falamos de tormento e seio de Abraão, não estamos nos referindo a lugares, mas a estados, condições. Onde quer que uma alma se encontre, só o fato de saber que estará em falta no Dia do Juízo tornará a sua espera um tormento. Onde quer que a alma de um justo esteja, ele saberá que Deus lhe dirá no Dia do Juízo: Muito 21 Na Septuaginta, a palavra que deu origem a paraíso foi usada para o jardim do Éden. 22 O que a ERAB traduz por inferno é uma flexão da palavra usada em Atos 2:31, hades. 23 Veremos mais sobre isto no artigo Os Justos Vão Diretamente para o Céu? A questão representa um problema para quem acredita que existe um estado intermediário para os mortos, mas não representa um problema maior para quem ensina que os justos que já morreram vão imediatamente para o céu (como veremos a seguir). 5

6 bem, servo bom e fiel (Mateus 25:21a) e ele aguardará feliz. A ilustração seguinte pode ou não ser útil. Imagine que você foi acusado de um crime terrível e aguarda julgamento, sabendo, sem sombra de dúvida, que será emitido o veredito correto. Se você for inocente, será completamente ressarcido. Tendo toda essa confiança, você pode esperar o julgamento em plena felicidade e paz. Todavia, se você for culpado, certamente estará cheio de medo enquanto contempla o que o aguarda. Esta ilustração está longe de ser perfeita, mas pelo menos mostra como pode haver duas atitudes mentais diferentes antes do Juízo final. Alguém pode olhar o diagrama acima e perguntar: Isto não se parece com a idéia do purgatório? De modo algum. O conceito de purgatório não está contido nas Escrituras. A palavra nem se encontra na Bíblia 24. No purgatório está inerente a idéia de que uma alma pode migrar de um estado de sofrimento (purgatório) para um estado de tranqüilidade (céu). Em outras palavras, a doutrina ensina que o homem pode ter uma segunda chance após a morte. Vejamos novamente o diagrama e observemos o GRANDE ABISMO. Abraão disse ao rico: está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que querem passar daqui para vós outros não podem, nem os de lá passar para nós (Lucas 16:26; grifo meu). A Bíblia ensina que não há segunda chance após a morte: Apocalipse 2:10. Sê fiel até à morte, e dar-teei a coroa da vida. 2 Coríntios 5:10. Porque importa que todos nós compareçamos perante o tribunal de Cristo, para que cada um receba segundo o bem ou o mal que tiver feito por meio do corpo (grifo meu) não segundo o que outro fez por ele após ele deixar seu corpo. 24 Purgatório (do latim limpar ) é uma doutrina católica romana, segundo a qual os condenados vão diretamente para o inferno, mas os que morreram na graça, ainda que seus pecados não tenham sido perdoados, vão para o purgatório. O propósito do purgatório é limpar, purgar, as almas por meio de sofrimento. Os vivos são incentivados a oferecer missas, orações e esmolas em prol dos que se encontram no purgatório a fim de encurtar o tempo em que seus entes passarão nesse lugar terrível. Essa doutrina tem gerado uma fonte substanciosa de renda para a Igreja Católica Romana. João 8:21. Quem morre em seus pecados, não pode ir para onde Cristo está. CONCLUSÃO Estivemos partilhando o que acreditamos ser a resposta bíblica à pergunta: Onde estão os mortos? Isto é tudo o que Deus quis revelar a nós. E devemos nos contentar com isto. Ao encerrarmos, façamos uma pergunta mais prática e mais pessoal: para onde você iria se moresse nos próximos minutos? É isto o que realmente deve preocupá-lo. Cristo nos convida a crer nele (João 8:24), a nos arrependermos de nossos pecados (Lucas 13:3), a confessarmos a nossa fé nele (Mateus 10:32) e a sermos imersos em água para a remissão de nossos pecados (Marcos 16:16; Atos 2:38; Romanos 6:3 6). Depois disso, devemos andar com Ele diariamente pelo resto de nossas vidas (Apocalipse 2:10). Você já fez isto? Está vivendo uma vida de confiança e obediência? Se a sua resposta for não, oramos para que você obedeça imediatamente ao Senhor. Nada é mais importante! lllllllllllllll Notas Este sermão, já prometido na edição A Vida de Cristo Parte 8, baseou-se em diversas fontes e têm sido pregado por muitos defensores do evangelho. Expressamos aqui nossos agradecimentos a todos que já pregaram e escreveram sobre este assunto. Embora este sermão não seja dos mais longos, ele pode ser reduzido excluindo-se o trecho sobre o purgatório. O material também pode ser dividido em duas apresentações ou usado no ambiente de sala de aula. Até pouco tempo, o autor deste artigo desconhecia que alguns irmãos discordam das conclusões sugeridas neste sermão. Segundo estes desde a morte, sepultamento e ressurreição de Cristo os justos vão diretamente para o céu após a morte. Respeitando este parecer, incluímos a seguir o artigo suplementar Os Justos Vão Diretamente para o Céu? Quem está convicto de que a situação descrita em Lucas 16:19 31 aplica-se à nossa época julgará o artigo um desperdício. Quem acredita que a passagem não se aplica aos dias de hoje julgará nossas afirmações e respostas insuficientes para os seus argumentos. Emprestando as palavras de Pilatos, o que escrevi escrevi (João 19:22). 6 Autor: David Roper Copyright 2008 by A Verdade para Hoje TODOS OS DIREITOS RESERVADOS