UMA LEITURA DO AMOR FEMININO NA CONTEMPORANEIDADE À LUZ DE TRISTÃO E ISOLDA



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UMA LEITURA DO AMOR FEMININO NA CONTEMPORANEIDADE À LUZ DE TRISTÃO E ISOLDA 1Considerações iniciais: sobre o amor e a mulher Priscila Ferreira Silva Sem dúvida, uma das questões mais pertinentes que se coloca nos dias de hoje diz respeito à capacidade humana e, mais especificamente falando, à capacidade feminina de amar. É possível amar de fato em nossos dias? Mais ainda: é possível amar a um outro? Quem é a mulher de nosso tempo? A quem ama? Ao outro? Aos filhos? A si mesma? Consegue amar o outro como ama a si? A quantas anda a capacidade de amar, num mundo em que há muito parece ter se perdido tal potencial? (Creio que apenas aparentemente). Encontraríamos facilmente inúmeras mulheres dispostas a depositar suas expectativas de amor e felicidade num outro (mais exatamente num sexo oposto) e assim, estarão elas prontas a dedicar suas vidas aos amados, sacrificando as próprias, dispostas a viver para eles e para sua família? Obviamente, nosso mundo atual não apresenta uma configuração única. Temos grupos e grupos sociais. Assim, sempre encontramos aquelas que possuem uma concepção muito mais tradicional e conservadora em relação à noção de amor, de casamento, de família. No entanto, cada vez mais, tem-se uma tendência à criação de perfis femininos os quais baseiam-se muito mais numa noção de amor próprio e na busca de uma felicidade pessoal, particular, do que em qualquer oura forma. A origem da noção de amor, tal como se conhece em geral (ou ao menos aquele desejado pela maioria dos humanos), certamente remonta a uma das mais antigas e conhecidas lendas da Idade Média, Tristão e Isolda. É certo que a ideia de amor trazida pela lenda diz respeito ao amor cortês, característico dessa época medieval, segundo o qual o casal nutria um sentimento de grande paixão, de profundo desejo, de contemplação e, como o próprio nome diz, de cortesia (neste caso, o amor era correspondido); mas, ao mesmo tempo, proibido. Hoje o que se tem nas relações entre casais pouquíssimo se aproxima de um amor cortês (uns diriam que nada) no que concerne à questão da cortesia e da contemplação. É verdade que aquele amor arrebatador do jovem casal tivera início com uma poção mágica da qual ambos beberam e, assim, apaixonaram-se perdidamente. Um amor assim semelhante ao que nos sugere Bovo (2003): um misto de paixão e

loucura. Mas é bem verdade também que a obra nos deixa bem claro que Isolda já nutria por Tristão um- chamaremos assim- possível encantamento: A criada afastou-se então, mas ficou a saber que a aparente aversão de Isolda por Tristão procedia, sem que ela disso tivesse consciência, de um desejo amoroso inconfessado e desenganado (1982, p. 47). E mais adiante, sabemos que uma vez que Isolda tinha consciência de todos os efeitos que poderiam suceder a partir do momento em que ingerisse a poção, ainda assim não nega fazê-lo. Devo acrescentar também que, após o término do efeito do filtro mágico, ambos passam a gozar de um amor realmente verdadeiro e humano. Mas, sem mais delongas, vamos nos ater ao que interessa no momento. A partir da personagem Isolda, da obra referida anteriormente, como modelo de mulher/de perfil feminino a seu tempo e a seu modo, serão feitas algumas considerações analisando este caráter da personagem em relação ao amor e, posteriormente, relacionando-se às características do perfil feminino de nossos dias. 2Isolda, a mulher que realmente soube amar (?) Tomando como modelo a figura de Isolda, a loura, como é chamada na obra, temos a representação de uma mulher que, sem dúvida alguma, levou a sério a noção do amor-doação, amor-sacrifício, amor-renúncia. Vemos, em todo o cenário que compõe a obra, a configuração de uma sociedade que impõe sobre essa mulher inúmeras obrigações e deveres. Deveres esses que dizem respeito ao casamento, ao lar, ao marido/rei, às suas condições de rainha. Deve, então, apresentar-se resignada, submissa, cedente às vontades de todos, menos à sua. Não pode ter sonhos, planos para o futuro ou interesses pessoais; não pode ter vontades próprias, pois não tem voz nem vez. Assim, então, Isolda não é a mulher que escolhe seu homem, seu par ideal para o casamento. Não tem a oportunidade de, sequer, ficar meio à espreita para ver por quem o coração resolve bater mais depressa. Não há espaço para isso. Ela é aquela que é oferecida como prêmio. Se realmente ainda fosse ao jovem e bravo cavaleiro que tivera a coragem de matar o terrível dragão... Mas seria demais. Algo em seu destino decide que não seja a esse, mas a outro. Com tudo isso e mesmo sem ter sido dada liberdade aos amantes, o amor se deu. Mesmo sem chances. O que ocorre é que também não houve qualquer esforço de resistência de sua parte.

Seja como for, a personagem figura aquela que, mesmo ciente de suas obrigações e responsabilidades junto a seu povo e seu marido, depositou no amor suas esperanças e expectativas em relação ao futuro. Abandonou tudo o que a sociedade, a doutrina e os deveres lhe colocavam, por difícil que fosse, e fugiu com o amado. Verdade é que ambos hesitaram por longo tempo (apesar de fazerem de tudo para se encontrar às escondidas sempre que possível) e que esse amor nunca encontrou a paz em vida. Mas foi tão intenso, puro e verdadeiro que, se o preço para sua vivência plena era a morte, eles estavam dispostos a pagá-lo. E o fizeram. O importante aqui é que Isolda foi aquela que amou sem limites. Sua preocupação não estava na necessidade de um belo emprego, uma carreira profissional sólida, viagens (preocupações essas que, obviamente, nem cabiam em seu tempo mesmo). Não teve receio por abandonar seu título de rainha, a comodidade de seu casamento, no qual não tinha amor, mas, em contrapartida, lhe rendia um belo castelo como moradia, refeições fartas, criados responsáveis pelo serviço e o preparo de tudo, respeito e honra da parte de todos do reino. Também não pensou em vestidos finíssimos, joias valiosas e artigos de luxo e beleza. Mas, contrária a todas as expectativas, deixou prestígio e uma vida fácil- com tudo aquilo que seria amplamente desejado por todas- pela incerteza, mas uma tentativa corajosa de viver com Tristão na floresta. Plano de vida esse que todas as possibilidades tinha de não dar certo como, de fato, não deu. Mas não sem antes ter sido feita a tentativa. Fracassada, mas corajosa. Contudo, não deixou de amá-lo e de nutrir aas esperanças em relação a ele. Ao menos, todo aquele amor infinitamente superior a tudo e a todos, ficou mais do que provado. Seu amor era, sem sombra de dúvida, aquele homem. E nada, por difícil que fosse, estava acima dele. 3E no cenário atual? As perguntas que nos ficam em relação a tudo isso são: e hoje, como é que anda o amor das mulheres? Estão dispostas ou com a mesma disposição de Isolda para negar a si mesmas e a todo e qualquer tipo de interesse pessoal e dedicar-se inteiramente a alguém ou à busca desse alguém? Quem são os seus amores?

Em primeiro lugar, não vivemos mais no tempo em que se passa Tristão e Isolda. Sendo assim, dificilmente alguma de nós terá de escolher entre um belo castelo, os luxos e riquezas de um marido rei ou um bravo cavaleiro, lindíssimo e viril, que tenha matado o temido dragão. Agora, os dragões são outros. O que terá, talvez, assim como a personagem, é de escolher entre a conveniência e comodidade de um possível casamento sem amor (ruim, mas que, se declarado o fim, gerará transtornos, principalmente se tivermos filhos em jogo) ou um belo partido, jovem e atraente, que apareceu de maneira inesperada em sua vida. Mas isso é apenas um detalhe... Nos dias de hoje, por um lado, somos infinitamente mais livres para a escolha de quem nos interessa e nos atrai. Não devemos nada a ninguém. A sociedade, em tese, não nos cobra nada em relação a isso. Nenhuma obrigação. O casamento pode ser a qualquer momento e com qualquer um. Ninguém tem nada com isso. Por outro lado, somos altamente escravas de nossos próprios interesses. A sociedade nos impõe outras obrigações. Não basta ser mulher, e quando digo isso me refiro às tradicionais exigências do ser mulher- preocupar-se com beleza, com o cuidado do lar, dos filhos, do marido e ponto final. Agora, além de tudo isso, tem-se de trabalhar e, muitas vezes, com um retorno financeiro minimamente satisfatório ou suficiente para as necessidades; precisa-se de uma qualificação profissional; precisa-se de sucesso. Tudo isso, sem descuidar dos de sempre- do lar, dos filhos, do marido, do corpo, da beleza e, quem sabe, se sobrar um tempinho para si mesma... As mulheres desta época não estão preocupadas com um grande amor. Para começar, não precisam necessariamente de um marido. Podem ter seu estado civil solteira por muito tempo. Até, para sempre. Se, pelo caminho, tiverem a sorte de se depararem com uma grande paixão correspondida, ótimo. O jeito é aproveitar. Mas daí a renunciar aos seus sonhos e interesses particulares para ir atrás de outro, para viver a vida desse outro, parece impossível. Já que não têm mais uma real necessidade, estão muitíssimo mais seletivas. Não é qualquer um que as agrada. É preciso estar ao seu nível. Preferem investir no futuro de sua conta bancária; na qualificação de seu futuro profissional; na conquista de sua casa e carro próprios; roupas e acessórios de acordo com a última tendência. Há outras prioridades. Depois de tudo isso garantido e conquistado, até pode ser que um amor (masculino) seja possível. Mas sem que seu mundo precise sofrer grandes mudanças ou deixar de existir em prol deste outro.

Com relação à caracterização deste tipo de relacionamentos humanos de nosso tempo, encaixam-se perfeitamente aqui as palavras de Bauman: O compromisso com outra pessoa ou com outras pessoas, em particular o compromisso incondicional e certamente aquele do tipo até que a morte nos separe, na alegria e na tristeza, na riqueza ou na pobreza, parece cada vez mais uma armadilha que se deve evitar a todo custo. (BAUMAN, 2004, p. 111). Parece, inclusive, que se não forem evitadas algumas formas de amor, seremos levadas para trás; perderemos nossos objetivos de vida, nossa possibilidade de realização pessoal. Como se amar alguém fosse mais perda do que ganho. Ou, ao menos, algo a ser adiado. Essa pode ser a armadilha a ser evitada, neste caso. Não podemos esquecer de que aqui estamos falando da grande maioria feminina. Da tendência das mulheres do último século. As românticas e as não preocupadas com nada que não seja um homem e uma família estão por aí; por aqui; no nosso meio. Mas creio que, seguramente, já são minoria. O tempo, a sociedade e a demanda terminarão por arrastá-las. 4Considerações finais A partir de todas essas considerações feitas até aqui, parece legítimo afirmar que o entendimento em relação ao que seja amor no mínimo se modificou ao longo dos tempos. Principalmente falando-se do amor feminino. Passamos daquele amornecessidade, essencial na vida de qualquer uma, sem o qual não se poderia viver. Aquele princípio maravilhoso de amar o próximo como a si mesmo, neste caso parece não ter aplicação. Para ilustrar, mais uma vez Bauman: Amar o próximo como a si mesmo coloca o amor-próprio como um dado indiscutível, como algo que sempre esteve ali (...). Amor- próprio- o que significa isso? O que eu amo em mim mesmo? O que eu amo quando amo a mim mesmo? Nós, humanos, compartilhamos os instintos de sobrevivência com nossos primos animais (...)- mas, quando se trata de amor- próprio, nossos caminhos se separam e seguimos por conta própria. (BAUMAN, 2004, p. 99). Em geral, elas não amam mais como amam a si. Amam muito antes as idealizações de uma vida sólida, bem garantida e, obviamente, a busca por esses objetivos. Preferem a realização de seus desejos e interesses pessoais; almejam à construção de uma carreira profissional bem consolidada. Não querem que ninguém

lhes diga o que fazer ou para onde seguir. Acho até que o lado masculino da história está cada vez menos interessado em impedi-las ou em impor limites ao seu alcance. Ao contrário, parecem apoiar. Falo da tendência geral; não de todos. Longe de mim afirmar que as mulheres definitivamente não são mais capazes de amar como outrora, ou como a maioria pode esperar. O que parece certo é que esse amor apenas mudou. Sem que isso seja prejudicial a alguém. Os amores são outros. Os limites são outros. Passaram a amar mais a si mesmas; mas, se puderem, provavelmente até dividirão esse amor. E no fundo, pode ser que tudo isso seja muito bom para todos. Na verdade, lutamos tanto pela conquista de nossa voz e nosso espaço que é como se tudo o que alcançarmos ainda seja pouco, tendo em vista tanto tempo de atraso. Isolda foi até o fim pela busca do amor que escolheu. As mulheres da atualidade também precisam de um tempo para a conquista plena de seus amores. Finalmente, a interpretação do amor feminino na contemporaneidade, aqui apresentada, trata-se de uma proposta limitada e particular, tendo em vista a diversidade de enfoques possibilitados pela configuração ideológica e cultural da sociedade atual. Sendo assim, é inteiramente aberta a discussões. São apenas possibilidades. Referências TRISTÃO e Isolda. Trad. Maria do Anjo Braamcamp Figueiredo. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1982. BOVO, Cláudia Regina. O Romance de Tristão e Isolda: permanências e rupturas na estrutura de parentesco medieval.franca: Unesp, 2003. BAUMAN, Zigmunt. Amorlíquido-Sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004.