GABINETE DO GOVERNADOR PARECER Nº 14.072 Licenciatura curta. Pós-graduação lato sensu. Validade. Alteração de nível. Possibilidade. O Departamento de Recursos Humanos da Secretaria da Educação encaminha minuta de decreto à Equipe Legislativa da Assessoria Jurídica da mesma Pasta, com vistas à Casa Civil, com o fim de propor nova redação ao art. 1º, do Decreto nº 34.824, de 02 de agosto de 1993, alterado pelo Decreto nº 38.946, de 13 de outubro de 1998, que regula os procedimentos e documentação necessários à alteração de nível no Plano de Carreira do Magistério Público Estadual. Em síntese, a proposta de alteração prevê o nível 4 aos professores que apresentem diploma de licenciatura curta e certificado de conclusão em cursos de especialização, com no mínimo 360 horas-aula, ou curso de estudos adicionais, e o nível 6 aos professores com diploma de licenciatura plena que apresentem certificado de cursos de pós-graduação. A Assessoria Jurídica da Secretaria da Educação posicionou-se contra aquela alteração, dizendo que os professores com diploma de licenciatura curta possuem graduação em nível superior, podendo, portanto, ter acesso aos cursos de pós-graduação, alcançando, conseqüentemente, o nível 6, previsto na legislação estadual. Aquele Departamento de Recursos Humanos, afirmando que a partir da Lei Federal nº 9.394, de 20.12.96, a licenciatura curta fora extinta, não sendo mais considerada graduação de nível superior, e, portanto, os portadores de tal diploma não poderiam ter acesso a cursos de pós-graduação, solicitou ao Secretário da Educação que a proposição de novo decreto fosse submetida à Casa Civil, com vista à Subchefia Jurídica e Legislativa, para exame da possibilidade da nova regulamentação sugerida. A Subchefia Jurídica da Casa Civil sugere seja ouvida a Procuradoria-Geral do Estado. É o relatório.
A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei Federal nº 9.394, de 20.12.96), no Capítulo IV, "Da Educação Superior", mais especificamente no art.44, estabelece os requisitos mínimos de acesso à educação superior. Dispõe que, para os cursos de graduação é necessário ter concluído o ensino médio ou equivalente; para cursar pós-graduação, dentre os quais os cursos de especialização, é preciso ser diplomado em curso de graduação e atender às exigências das instituições de ensino. Essa nova lei, no seu artigo 62, determina expressamente que a formação de docentes para atuar na educação básica deverá ser em nível superior, em curso de licenciatura de graduação plena, silenciando sobre a licenciatura curta. Extinguiu, portanto, a chamada licenciatura curta, não só porque exigiu a licenciatura plena à atuação em toda a educação básica, não referindo, deliberadamente, a curta, mas, também, porque revogou, de modo expresso, toda a legislação que dela tratava. Entretanto, tal extinção, por si só, não leva à conclusão de que os diplomados em licenciatura curta adquiriram nova habilitação ou perderam qualquer outro direito ou qualificação que tivessem. E nem poderiam perdê-los, porque a Constituição Federal, no art. 5º, inciso XXXVI, garante que a lei respeitará o ato jurídico perfeito e o direito adquirido, que são institutos integrantes do princípio da segurança jurídica, que, aliás, é um dos princípios basilares do Estado Democrático de Direito. Portanto, não é surpresa que a Resolução nº 2, de 19.05.99, da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação, que dispõe sobre a plenificação de licenciaturas curtas, não se refira aos anteriores diplomados para lhes impor obrigações ou condições, como faz com as instituições que ofereciam vagas à formação em licenciatura curta. Ao contrário, preocupa-se em assegurar o direito daqueles que, naquele momento, fossem alunos, em perfeita consonância com a exigência da disposição constitucional antes citada. No entanto, como o acesso aos cursos de pós-graduação tem como único requisito legal a graduação em nível superior, deixando as demais exigências às instituições de ensino, e, por outro lado, essa graduação em nível superior, a partir da Lei Federal nº 9.394, de 20.12.96, pressupõe a licenciatura plena, há de se perquirir, primeiro, se os diplomados em licenciatura curta atendem ao requisito da graduação em nível superior, com o qual estão aptos a cursar e obter diploma de pós-graduação. Segundo, se o diploma de licenciatura de curta duração lhes permitia, sob a égide da legislação anterior, cursar e obter diploma de pósgraduação, pois, por óbvio, não podem adquirir mais direitos do que tinham. A resposta à primeira pergunta está no artigo 30, da Lei nº 5.692, de 11.08.71, com a redação dada pela Lei nº 7.044, de 18.10.82, que se transcreve:
"Art. 30 - Exigir-se-á como formação mínima para exercício de magistério: a) no ensino de 1º grau, da 1ª a 4ª séries, habilitação específica de 2º grau; b) no ensino de 1º grau, da 1ª a 8ª séries, habilitação específica de grau superior, ao nível de graduação, representada por licenciatura de 1º grau, obtida em curso de curta duração; c) em todo o ensino de 1º e 2º graus, habilitação específica obtida em curso superior de graduação correspondente a licenciatura plena. 1º (...) 2º - Os professores a que se refere a alínea "b" poderão alcançar, no exercício do magistério, a 2ª série do ensino de 2º grau mediante estudos adicionais no mínimo, a um ano letivo. 3º - Os estudos adicionais referidos nos parágrafos anteriores poderão ser objeto de aproveitamento em cursos ulteriores." Assim, como se vê no texto do artigo citado, não só a licenciatura de curta duração atribuía ao diplomado a graduação em nível superior, como também os estudos adicionais, de que tratava o 2º daquele artigo, podiam, conforme o 3º, ser utilizados em outros cursos. E disso se pode, tranqüilamente, deduzir que os cursos de licenciatura de curta e plena duração eram independentes, que não faziam parte um do outro, e que ambos atribuíam a graduação de nível superior aos diplomados. E mais, a graduação de nível superior não foi e nem poderia ter sido retirada do diplomado em licenciatura de 1º grau, de curta duração, pela nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Passando, então, à análise da legislação anterior sobre o acesso aos cursos de pós-graduação - segunda pergunta - pode-se constatar que vigiam as Resoluções nº 5, de 10.03.83, e nº 12, de 06.10.83, ambas do antigo Conselho Federal de Educação, que estabeleciam normas aos cursos de pós-graduação, respectivamente, "stricto sensu" e "lato sensu". Na Resolução CFE nº 5/83, assim estava previsto no art. 10: "Para matrícula nos cursos de pós-graduação, além do diploma do curso de graduação, as instituições deverão estabelecer requisitos que assegurem rigorosa seleção intelectual dos candidatos." Na Resolução CFE nº 12 /83, nos artigos 1º e 2º: "Art. 1º Os cursos de especialização e aperfeiçoamento, que se destinem à qualificação de docentes para o Magistério Superior do Sistema Federal de Ensino, deverão observar, para que tenham validade, o disposto nesta Resolução.
Art. 2º Os cursos, a que alude o artigo antecedente, serão abertos à matrícula de graduados em nível superior e poderão ser oferecidos por instituições de ensino desse nível, que ministrem, na mesma área de estudos, curso de pós-graduação credenciado, ou de graduação reconhecido, pelo menos, há 5 (cinco) anos." Mesmo sob a égide da Resolução CFE nº 12/83, que se destinava especificamente àqueles cursos de especialização destinados ao magistério superior pois nem todos se destinavam, e, portanto, nem todos precisavam atender aos requisitos daquela Resolução para serem válidos a única exigência legal para a matrícula era graduação em nível superior. Portanto, a não ser que o diploma de licenciatura plena fosse exigência interna da instituição de ensino que oferecia o curso de pós-graduação, o que era permitido sob o império da legislação anterior, não havia óbice legal ao diplomado em licenciatura curta graduado em nível superior cursar e obter diploma de curso de pós-graduação. Atualmente, a Câmara de Educação Superior CES do Conselho Nacional de Educação CNE, quando expediu a Resolução nº 1, de 03 de abril de 2001, que estabelece normas para o funcionamento de cursos de pós-graduação, também dispôs, no 2º do art. 6º, que os cursos de pós-graduação lato sensu se destinam aos portadores de diploma de curso superior. É certo que, a partir da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação, a graduação de nível superior em licenciatura será sempre de graduação plena. Mas também é certo que, se tal legislação quisesse ter restringido o acesso aos cursos de pós-graduação apenas aos graduados em licenciatura plena, deveria assim tê-lo previsto e expressamente. Portanto, a legislação federal não obsta que o graduado em nível superior em curso de licenciatura de curta duração tenha acesso aos cursos de pósgraduação. Disso decorre que, os diplomas de cursos de pós-graduação, desde que tais cursos tenham atendido todos os requisitos legais, em especial, atualmente, os constantes da aludida Resolução CNE/CES nº 01/01, são válidos em todo o território nacional, não havendo como o Estado deixar de reconhecer-lhes tal validade. Essa análise tem relevância para examinar a possibilidade de, na carreira do Magistério Público Estadual (Lei º 6.672, de 22.04.74), alterar o nível do professor habilitado em licenciatura curta (nível 3) ou alterar o nível do professor habilitado em licenciatura curta com estudos adicionais (nível 4) diretamente ao nível de habilitação de pós-graduação (nível 6), isto é, sem que o professor seja habilitado em licenciatura plena (nível 5).
No "Capítulo II - Da estrutura da carreira" do Estatuto e Plano de Carreira do Magistério Público Estadual, artigos 4º ao 9º, a lei estadual trata das classes e dos níveis, demonstrando como eles estruturam a carreira do magistério. A carreira é dividida em seis classes, cada uma com número certo de cargos, designadas de "A" a "F" e escalonadas de forma ascendente. O acesso de classe a classe é sucessivo, mediante promoção. Em outras palavras, o professor, provido na primeira classe, sob a forma de nomeação em virtude de concurso público, ascende sucessivamente às demais classes por meio de promoção, não podendo suprimir ou saltar nenhuma. de habilitação. Cada classe, por sua vez, compreende, no máximo, seis (6) níveis Os níveis correspondem às diferentes habilitações para o magistério, a eles foram atribuídos pela lei valores distintos de remuneração, numa escala crescente, que varia conforme a habilitação do professor ou do especialista em educação. Justamente porque o nível varia conforme a habilitação específica do professor, ele é pessoal, daí porque se conservar o mesmo nível quando o mestre é promovido à classe superior (art. 9º). Da mesma forma, o professor pode ingressar na carreira em qualquer nível e após alterá-lo para qualquer outro, não havendo exigência de progressão sucessiva. Então, se a legislação federal admite que o graduado em licenciatura curta obtenha diploma válido de curso pós-graduação, que é o requisito ao nível 6, previsto no art. 7º, da Lei º 6.672, de 22.04.74, não há como a Administração negar a alteração de nível, ressalvados, por óbvio, os casos em que os cursos não sejam válidos porque não atenderam os requisitos da legislação federal, ou, ainda ressalvados os cursos que não guardam a correlação direta e imediata com a licenciatura exercida, conforme exige o art. 34, da Constituição Estadual e, exemplificativamente, os Pareceres PGE nºs 10.825/96, 10.216/94, 8.923/91 e 8.922/91. Com efeito, parece flagrante a desigualdade de exigência e formação entre um professor que possua a graduação em licenciatura plena e curso de doutorado e outro com graduação em licenciatura de curta duração e curso de especialização. No entanto, ambas as habilitações os colocam no mesmo nível. Todavia, atribuir o nível 6 aos professores diplomados em cursos de pós-graduação foi a interpretação que sempre se deu à legislação estadual para valorizar o professor que continuasse se aperfeiçoando, se reciclando, pois a habilitação ao ensino superior, que se pode obter com aqueles cursos, vai além
daquela necessária para atuar na educação básica à qual se destina a Rede Estadual de Ensino Público. Finalmente, examina-se a pretensão do Departamento de Recursos Humanos da Secretaria da Educação de estabelecer o nível 4 para os habilitados em licenciatura curta que tivessem estudos adicionais de, no mínimo, um ano, a qualificálos ao magistério até a 2º série do 2º grau, ou curso de especialização, e reservar o nível 6 apenas aos pós-graduados que fossem previamente habilitados à licenciatura plena. Certamente tal alteração é possível apenas mediante projeto de lei encaminhado à Assembléia Legislativa para modificação do Estatuto do Magistério Público Estadual, ou seja, mudança de disposição de lei não pode ser realizada por decreto, sob pena de ilegalidade. Este é o parecer. Porto Alegre, 16 de junho de 2004. ANASTAZIA NICOLINI CORDELLA, PROCURADORA DO ESTADO. Processo nº 102523-1900/03-2.
Processo nº 102523-19.00/03-2 Acolho as conclusões do PARECER nº 14.072, da Procuradoria de Pessoal, de autoria da Procuradora do Estado Doutora ANASTAZIA NICOLINI CORDELLA, aprovado pelo Conselho Superior, na sessão realizada no dia 30 de setembro de 2004. Encaminhe-se ao Excelentíssimo Senhor Governador do Estado, com proposição de aprovação na forma do artigo 82, XV, da Constituição Estadual, tendo em vista a necessidade de atribuição de caráter jurídico-normativo ao decidido, especialmente em face do que dispõe o artigo 26, 1º, I, da Lei Complementar nº 11.742, de 17 de janeiro de 2002. Em 30 de setembro de 2004. Helena Maria Silva Coelho, Procuradoa-Geral do Estado.