Alberto Consolaro. Professor Titular da FOB-USP e da Pós-graduação da FORP-USP.

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Transcrição:

58 Biologia da estética Fitas adesivas, Vanish e técnica clareadora caseira: aspectos importantes a serem considerados Alberto Consolaro Professor Titular da FOB-USP e da Pós-graduação da FORP-USP. Resumo Em trabalhos experimentais, o peróxido de hidrogênio revelou-se um promotor da carcinogênese química bucal e em outras mucosas gastrintestinais. O peróxido de hidrogênio representa um cocarcinógeno, pois não inicia sozinho uma neoplasia maligna epitelial, mas pode potencializar outros agentes iniciadores. Na boca, onde atuam vários carcinógenos, a mucosa está, em sua maior parte, desprotegida, pois não tem em sua superfície uma espessa e contínua camada de queratina, como a pele. Em qualquer forma de ação, o peróxido de hidrogênio o único clareador de dentes requer técnica que proteja a mucosa e a região cervical do esmalte na junção com o cemento, e dificulte que seja engolido, indo para as partes mais inferiores do trato gastrintestinal. Este trabalho centra-se principalmente na necessidade de convencer pacientes, profissionais e agentes do mercado de que a forma mais correta e segura de clarear dentes está no consultório dos profissionais treinados e conscientes. Palavras-chave: Clareamento dentário. Clareação dentária. Peróxido de hidrogênio. Fitas. adesivas Como citar esta seção: Consolaro A. Fitas adesivas, Vanish e técnica clareadora caseira: aspectos importantes a serem considerados..» Os autores declaram não ter interesses associativos, comerciais, de propriedade ou financeiros que representem conflito de interesse, nos produtos e companhias descritos nesse artigo.

Consolaro A 59 Os medicamentos e cosméticos não apresentam explicitamente seus princípios ativos, a não ser o minimamente exigido pela legislação. O tamanho das letras e o acúmulo de informações em uma pequena área das embalagens acabam por inibir a sua leitura pelo consumidor. Uma das possíveis razões para explicar essa conduta por parte do fabricante pode ser que, ao identificar o princípio ativo, o consumidor sem conhecimentos técnicos pode adquiri-lo e usá-lo sem orientação profissional e de forma inadequada. Esconder a informação não parece ser o melhor caminho, mas uma conscientização geral sobre certas drogas e substâncias evitaria seu uso inadequado. As pessoas, de um modo geral, até alguns anos atrás não sabiam que o princípio ativo de qualquer agente clareador é, necessariamente, o peróxido de hidrogênio. Também se popularizou que o agente químico clareador dentário é a água oxigenada e que conforme sua forma de apresentação, concentração e uso pode receber outros nomes como peróxido de ureia, peróxido de carbamida e perborato de sódio. O mercado de clareadores dentários A partir do momento em que foram vulgarizadas as técnicas de clareação dentária caseira, com a contribuição de profissionais da área, as pessoas comuns passaram a saber: dentes clareiam-se com água oxigenada. Em uma sociedade de mercado, as informações são fontes para se criar novas formas de ganhar dinheiro, se inserir ou firmar-se como um agente de negócios. As farmácias, lojas de presentes, supermercados, salões de beleza e outros estabelecimentos comerciais passaram a oferecer, diretamente ao consumidor, kits ou pacotes completos para clarear dentes. As instruções vinham em pequenos manuais bem ilustrados, e as pessoas passaram a usá-los indiscriminadamente, sem qualquer orientação profissional. Algumas indústrias de produtos de limpeza, higiene pessoal e cosméticos viram na clareação dentária mais uma oportunidade para aumentar seu conjunto de produtos oferecidos ao mercado consumidor, e criaram os clareadores dentários acompanhados de pincéis, chupetas, moldeiras, etc. Paralelamente, as farmácias de manipulação passaram a oferecer produtos clareadores dentários. Os salões de beleza e estabelecimentos similares, como clínicas de rejuvenescimento, clínicas de depilação e até grandes hotéis, passaram a ofertar esses serviços para seus clientes. Como no Brasil o clareador dentário é considerado um produto cosmético, sua fabricação e comercialização não tem a mesma regulamentação de um medicamento a ser prescrito por profissionais da saúde. Dessa forma, reconhece-se que a grande maioria, quase a totalidade, das clareações dentárias feitas no Brasil é realizada sem qualquer orientação de cirurgiões- -dentistas, numa verdadeira avalanche de automedicação. Outros profissionais, incluindo-se médicos, esteticistas e treinadores esportivos também passaram a ser consultados pelos seus clientes sobre qual a melhor forma e produto para se clarear os dentes. Em outras palavras, o clareador dentário passou a ser utilizado de forma generalizada na boca das pessoas,

60 Fitas adesivas, Vanish e técnica clareadora caseira: aspectos importantes a serem considerados ou melhor, o peróxido de hidrogênio passou a ser produto de consumo diário nas pessoas. Esse agente químico faz parte de dentifrícios, antissépticos e qualquer outro produto que promete clarear os dentes. Num primeiro momento, pode-se perguntar: - O peróxido de hidrogênio também não é usado para clarear pelos e cabelos? - Alguns alimentos não têm o peróxido de hidrogênio no seu processo de fabricação e na sua composição natural? Os processos industriais de alimentos seguem normas e são fiscalizados quanto à quantidade e concentração de peróxido de hidrogênio, que, quando muito pequenas e enquadradas, são toleradas e não agridem os nossos tecidos. Produtos naturais, tais qual o café, têm peróxido de hidrogênio em concentrações pequenas, mas o contexto de seu consumo não foi criado, oferecido ou indicado por um profissional da saúde. Na pele e nas mucosas O uso do peróxido de hidrogênio sobre o couro cabeludo e a pele para clarear os pelos e cabelos tem seu efeito sobre as células epiteliais dérmicas, protegidas por uma espessa e contínua camada de queratina, uma proteína resistente cuja função consiste exatamente em barrar agentes físicos, biológicos (como microrganismos) e químicos do meio ambiente. Nas mucosas da boca, faringe, esôfago, gástrica e intestinal, o peróxido de hidrogênio tem a oportunidade de entrar em contato direto com as células epiteliais e seu respectivo DNA. As mucosas, de um modo geral, não têm revestimento de queratina e, quanto o têm, esse não se compara, em espessura e continuidade, com o da pele. O peróxido de hidrogênio, quanto atua sobre o DNA das células epiteliais, não promove mutações, mas potencializa o efeito mutagênico e carcinogênico de outros agentes cancerígenos presentes a todo instante na boca. O peróxido de hidrogênio não é um iniciador na carcinogênese bucal química, mas é um promotor que induz a proliferação das células mutadas, inicialmente, por outros agentes carcinogênicos que atuaram ou irão atuar ainda sobre elas 1,2,3. Entre esses agentes carcinogênicos estão as milhares de substâncias presentes no tabaco, nas bebidas alcoólicas, no ar respirado, nos alimentos com conservantes, acidulantes e corantes, sem contar os pesticidas e agrotóxicos aplicados sobre os alimentos. Na boca temos, ainda, os vírus oncogênicos, como por exemplo o HPV, ou papilomavírus humano, e o Herpesvírus hominis tipo II. A cada dia que passa, os indicadores dos institutos oncológicos revelam que o câncer de boca afeta cada vez mais adultos jovens com 35 anos; mas, uma década atrás, o pacientes tinham, em média, mais de 50 anos. O uso continuado e diário do peróxido de hidrogênio, como se está caracterizando, sobre a mucosa bucal de forma generalizada inserindo em produtos de higiene, como dentifrícios e antissépticos faz com que os demais agentes carcinogênicos sejam potencializados. Será que a mudança de perfil dos pacientes com câncer bucal para uma idade mais precoce não tem relação com essa mudança de hábitos e o uso indiscriminado de químicos sobre a mucosa, como por exemplo o peróxido de hidrogênio? O peróxido de hidrogênio pode, e deve, ser usado na boca, até como antisséptico em algumas situações especiais como nas pericoronarites e gengivite aguda ulceronecrosante, mas seu uso direto e continuado, quase diário, sobre a mucosa deve ser eventual e para fins terapêuticos. Para o clareamento dentário, o peróxido de hidrogênio pode e deve ser utilizado, mas as técnicas de sua aplicação devem proteger os pontos frágeis da estrutura dentária e, especialmente, a gengiva e o restante da

Consolaro A 61 mucosa bucal. Da mesma forma, as técnicas aplicadas nos consultórios impedem que o paciente engula o peróxido de hidrogênio que, reconhecidamente, é cocarcinogênico 1,2,3 para toda a mucosa gastrintestinal, não apenas para a boca. Quem deve clarear os dentes dos pacientes? O clareamento dentário externo feito a cada ano no consultório, com proteção gengival e da região cervical do esmalte, oferece risco quase zero ao paciente. Principalmente se, antes de remover a proteção resinosa protetora da gengiva, o sugador remover todos os possíveis resquícios do gel clareador. Não se deve jogar água na boca do paciente sem antes remover-se todo o gel com o sugador. O peróxido de hidrogênio ingerido pode alterar o DNA da mucosa faringiana e de todo o trato gastrintestinal. O procedimento de clareação dentária deve ser um procedimento realizado em consultórios de profissionais bem treinados e conscientes. O paciente, ao realizar a clareação dentária, pode obter o efeito sobre os dentes, mas deixa o peróxido de hidrogênio atuando por muitos minutos e várias vezes ao dia ou por semanas, seguidamente. Para o paciente, de forma imediata, o que interessa são os dentes brancos, mas os profissionais e a classe odontológica como um todo devem conscientizar a população dos riscos que ela corre com a clareação caseira ou alternativa. No mundo midiático contemporâneo, muitos websites ensinam, sem qualquer orientação profissional, como clarear os dentes com peróxido de hidrogênio. Para exemplificar: em um desses sites, o passo a passo da técnica é ilustrado com fotos, e se ensina a bochechar ou borrifar água oxigenada a 10 volumes comprada em farmácias, como mostram as fotos. O bochecho ou o borrifar deve ser feito todos os dias antes de dormir e depois da higiene bucal. Outra alternativa ensina a colocar a escova de dentes em água oxigenada por meia hora e, depois, escovar os dentes com ela encharcada sempre após a higiene convencional e imediatamente antes de dormir. Um alerta do site: se espumar, significa que a água oxigenada está funcionando e clareando os dentes! Depois de explicar detalhadamente a técnica relatada acima, os comentários dos leitores são que estão fazendo e achando muito bom. Um dos debatedores questiona a responsável pelo site sobre como ela aprendeu. Segundo ela: foi a sua dentista! As fitas clareadoras adesivas As fitas clareadoras adesivas devem ser contextualizadas apenas como mais uma forma de se usar o peróxido de hidrogênio na boca. Tal como existem as moldeiras, os pincéis, chicletes e chupetas com clareadores bucais, também há as fitas adesivas. As limitações e implicações das fitas clareadoras continuam sendo as mesmas dos demais meios de se levar o peróxido de hidrogênio até a boca: 1. Colocam o peróxido de hidrogênio em contato direto com a mucosa bucal, sem qualquer controle. 2. Permitem que o peróxido de hidrogênio entre em contato com a orofaringe e seja ingerido pelo trato gastrintestinal, contatando suas respectivas mucosas. 3. Quem usa é o paciente, que tende a não controlar o tempo e a frequência de uso, podendo utilizá-las por longos períodos ou mais de uma vez por dia, durante semanas ou meses. 4. Os pacientes não têm como controlar as condições dentárias e das mucosas, para receber esse agente químico, pois sabe-se que o peróxido de hidrogênio interfere nas infiltrações das restaurações preexistentes, potencializa o aparecimento de manchas brancas hipoplásicas ou de cárie. 5. Aumentam a sensibilidade dentinária, por alargarem os gaps, ou junções, entre o esmalte e o

62 Fitas adesivas, Vanish e técnica clareadora caseira: aspectos importantes a serem considerados cemento, expondo e aumentando as áreas de dentina exposta nessa linha de junção. Essas implicações devem ser repassadas ao paciente quando pede orientações ao cirurgião-dentista sobre o uso das fitas adesivas clareadoras. Se possível, na forma de folhetos ou no site ou rede social do profissional. Clareamento dentário caseiro O clareamento dentário caseiro representa danos e riscos ao paciente. Representa uma forma amadora de se fazer um procedimento que deveria ser restrito ao profissional da Odontologia. O clareamento dentário deve ser feito por profissionais adequadamente treinados e conscientes do seu papel social e pessoal na vida das pessoas, e não apenas como um esteticista, com pensamento voltado única e exclusivamente para o resultado imediato de sua atuação técnica sobre os dentes. O clareador dentário peróxido de hidrogênio nunca deveria ser indicado para as pessoas quando, ao ser levado a agir sobre os dentes, permita-se que ele: alimentos industrializados, pesticidas, agrotóxicos, produtos da poluição e vírus oncogênicos. O uso do Vanish como clareador Além dos sites já mencionados com técnicas absurdas de clareamento dentário, a criatividade humana e a decorrente curiosidade levam a questionamentos por e-mails, perguntas pessoais ou em palestras que, num primeiro momento, assustam, mas que depois, melhor analisados, percebe-se que são justificáveis. Entre esses questionamentos, um cada vez mais comum é: Podemos clarear os dentes com o produto de limpeza, ou tira-manchas, comercialmente conhecido como Vanish ou outros similares? Os produtos de limpeza devem seguir regras para a sua fabricação, mas os cosméticos, como os clareadores dentários, seguem regras diferentes, pois serão usados no corpo. Se os clareadores dentários fossem considerados pela Anvisa como medicamentos, o rigor de sua fabricação e uso seria muito maior e detalhado. 1. Entre em contato com a mucosa bucal, incluindo a gengival. 2. Entre em contato com a junção amelocementária dos dentes. 3. Facilite ou induza o paciente a ingeri-lo, contatando as mucosas gastrintestinais. As alterações que o peróxido de hidrogênio possa induzir no esmalte são reversíveis e compensáveis por ação da saliva e de soluções aplicadas após o clareamento; mas as alterações induzidas sobre o DNA das células epiteliais expostas pelo seu contato direto podem ser irreversíveis e se somam ao longo da vida às mutações genéticas induzidas pelos demais inúmeros agentes carcinogênicos que atuam na boca, como as milhares de substâncias químicas do tabaco, bebidas alcoólicas, A resposta é não, não devemos usar esse tipo de produtos tira-manchas na boca dos pacientes, mas o princípio físico-químico é o mesmo, pois sua base de formulação é o peróxido de hidrogênio! Quando se usa o clareador dentário, o peróxido de hidrogênio limpa e clareia não só a estrutura do esmalte, mas todas as sujeiras mais discretas e profundas nas reentrâncias e irregularidades naturais do esmalte, opacifica e deixa-o mais ainda com um aspecto clareado ou branco. Clareamento dentário caseiro não é mais eficiente? Um questionamento muito comum sobre clareamento dentário é: A técnica caseira não é mais eficiente?

Consolaro A 63 A resposta é sim, muito mais eficiente, o que nos parece lógico. O paciente coloca substância clareadora em quantidade muito maior, usa com mais frequência e a deixa sobre os dentes por muito mais tempo, sem qualquer proteção ao esmalte cervical e mucosas. O clareador dentário entra em contato, irrestritamente, com todas as superfícies, inclusive nas mucosas. Assim, com mais tempo, disponibilidade e frequência de ação sobre os dentes, o clareador dentário caseiro é muito mais eficiente; mas, do ponto de vista biológico, é uma lástima, especialmente quanto ao seu efeito na carcinogênese bucal química. Quando realizado por profissional no consultório, controla-se a quantidade, o tempo e a frequência de uso, sem contar que protege-se a mucosa e os dentes, quando necessário. O efeito clareador no consultório é controlado e monitorado dentro de regras de segurança biológica e, quando obtido dentro da técnica adequada, pode ser mais duradouro e com menor possibilidade de dano às estruturas dentárias e bucais. Clarear os dentes sim, mas com segurança biológica. Considerações Finais 1. O clareamento dentário deveria ser restrito ao consultório odontológico, se considerarmos que a maior parte da superfície mucosa não tem uma camada protetora contínua e espessa de queratina, como na pele. Todos os clareadores dentários são à base de peróxido de hidrogênio, um agente reconhecidamente cocarcinogênico nas mucosas do trato gastrintestinal. 2. As técnicas de clareação devem proteger a mucosa do contato com o peróxido de hidrogênio e não devem deixar resíduos desse nos dentes e espaços interdentários. Apenas depois da remoção da proteção da mucosa e da sucção total do clareador é que se deve jogar água, para que o paciente não engula e leve o peróxido, também, para outras mucosas gastrintestinais, onde apresentam, potencialmente, o mesmo efeito. 3. As alterações que o peróxido possa induzir no esmalte podem ser corrigidas pela saliva e soluções aplicadas, mas as alterações no DNA podem ser permanentes e somatórias ao longo da vida. Referências: 1. Consolaro A. Reabsorções dentárias nas especialidades clínicas. 3a ed. Maringá: Dental Press; 2012. 2. Camargo WR. Análise do potencial carcinogênico de dentifrício com peróxido de hidrogênio e de agente clareador dentário. Avaliação clínico-macroscópica em hamsters no modelo de carcinogênese bucal DMBA-induzida [tese]. Bauru(SP): Universidade de São Paulo; 1999. 3. Pieroli DA. Avaliação do potencial carcinogênico dos agentes clareadores dentais [dissertação]. Bauru(SP): Universidade de São Paulo; 1997. Endereço para correspondência: consolaro@uol.com.br

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