COMBATENDO A DESERTIFICAÇÃO ATRAVÉS DOS SABERES TRADICIONAIS: USO DE PLANTAS MEDICINAIS

Documentos relacionados
PROJETO PROSPERA CAATINGA Cartilha Ambiental e o Recaatingamento

CARTILHA DE COMBATE Á DESERTIFICAÇÃO: Pensando em uma possível solução

Caracterização dos Territórios de Identidade Território 01 - Irecê

MALPIGHIACEAE EM UMA ÁREA DE CAATINGA NA MESORREGIÃO DO SERTÃO PARAIBANO

Geografia. Aspectos Físicos e Geográficos - CE. Professor Luciano Teixeira.

IDENTIFICANDO A PERCEPÇÃO DE ESTUDANTES SOBRE A CAATINGA PARA CONTRIBUIR COM UMA EDUCAÇÃO AMBIENTAL CONTEXTUALIZADA INTRODUÇÃO

A PROBLEMÁTICA DA SEMIARIDEZ NO SERTÃO PARAIBANO

PORTARIA N o 29 DE 21 DE SETEMBRO DE 2006 (publicada no DOU de 22/09/2006, seção I, página 105) ARIOSTO ANTUNES CULAU

A NATUREZA DO BRASIL: CLIMA E VEGETAÇÃO

PERTENCIMENTO A MATA ATLÂNTICA E PERCEPÇÃO AMBIENTAL DE ALUNOS DO IFSULDEMINAS CAMPUS INCONFIDENTES NA DISCIPLINA DE GEOGRAFIA

PALAVRAS-CHAVE: Geoprocessamento, Ecologia da Paisagem, Uso e Cobertura,

BIOMAS. Os biomas brasileiros caracterizam-se, no geral, por uma grande diversidade de animais e vegetais (biodiversidade).

Título do Trabalho O JUAZEIRO (Zizyphus joazeiro Mart) NO CONTEXTO RURAL DO MUNICÍPIO DE VENTUROSA-PE

Soc o i c o i - o B - io i d o i d v i e v r e si s da d de do Brasil

102 - A contribuição da APOMS na implementação da política territorial no Território da Cidadania da Grande Dourados

VARIABILIDADE ESPACIAL DE PRECIPITAÇÕES NO MUNICÍPIO DE CARUARU PE, BRASIL.

TIPOS DE VEGETAÇÃO E OS BIOMAS BRASILEIROS. Profº Gustavo Silva de Souza

BIOMAS DO BRASIL E DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS. Prof ª Gustavo Silva de Souza

A Concentração de Terra

1º Período Conteúdos Habilidades Atividades desenvolvidas

1º Período UNIDADE 1. O Planeta Terra

A PRESERVAÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS E A AMEAÇA DA DESSERTIFICAÇÃO DO SEMIÁRIDO NORDESTINO

GEOGRAFIA FÍSICA DO BRASIL

A FALTA DE CHUVAS E AS DIFICULDADES PARA OS PEQUENOS AGRICULTORES DO SEMI-ÁRIDO ALIMENTAREM OS ANIMAIS NA SECA

Indicadores Econômicos e Fomento à Indústria

FATORES SOCIOECONÔMICOS COMO INDICADORES DE SUSCEPTIBILIDADE À DESERTIFICAÇÃO EM MICROREGIÕES DO SERTÃO DE PERNAMBUCO PE

Biomas / Ecossistemas brasileiros

ARBORIZAÇÃO COMO FORMA DE PRESERVAÇÃO DO BIOMA CAATINGA E DE MANUTENÇÃO DA BIODIVERSIDADE

Biomas do Brasil. Ciências Humanas e suas Tecnologias. Professor Alexson Costa Geografia

Edson Vidal Prof. Manejo de Florestas Tropicais ESALQ/USP

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECOLOGIA E CONSERVAÇÃO PROCESSO SELETIVO 2012.

TÉCNICAS DE LEVANTAMENTO FAUNÍSTICO E FLORÍSTICO E ALTERNATIVAS DE LICENCIAMENTO AMBIENTAL, PARA PEQUENAS ÁREAS

Política Nacional de Meio Ambiente: unidades de conservação. Biogeografia - aula 4 Prof. Raul

MUDANÇAS DE USO DA TERRA NO NORDESTE E IMPACTOS NO PROCESSO DESERTIFICAÇÃO

LISTA DE EXERCÍCIOS 2º ANO

a natureza ensina a viver.

ANÁLISE DA ACURÁCIA DO MAPEAMENTO DAS CARACTERÍSTICAS AMBIENTAIS NO ÂMBITO DO CADASTRO AMBIENTAL RURAL NO MUNICÍPIO DE CURAÇÁ BA

RIQUEZA DE ESPÉCIES EM ÁREA SERRANA NO MUNICÍPIO DE SUMÉ, CARIRI PARAIBANO

CACTACEAE JUSS. DE UMA MESORREGIÃO DO SERTÃO PARAIBANO, NORDESTE DO BRASIL

ANÁLISE DA VARIAÇÃO PLUVIOMÉTRICA DO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DE PIRANHAS PB: SÉRIE HISTÓRICA DE 1911 À 2016

CLASSIFICAÇÃO DO ÍNDICE DE ARIDEZ DO CARIRI OCIDENTAL-PB

Região Norte: Apresentação e aspectos físicos

GEOGRAFIA MÓDULO 11. As Questões Regionais. As divisões regionais, região e políticas públicas, os desequilíbrios regionais. Professor Vinícius Moraes

DIVISÃO REGIONAL BRASILEIRA

Projeto Agrupado de Reflorestamento na Área de Proteção Ambiental do Pratigi. OCT Organização de Conservação da Terra do Sul da Bahia Volney Fernandes

DATA: 27 / 11 / 2017 III ETAPA AVALIAÇÃO ESPECIAL DE GEOGRAFIA 5.º ANO/EF

3 Bolsista de iniciação cientifica Fapemig Ufla-MG. 4 Pesquisadora Doutora Epamig Lavras-MG. 5 Pesqiusadora Mestre Epamig Lavras-MG

PARTE II V2 MACROZEE-SF MESA2 BA

A Bolsa Nacional de terras Escola Profissional de Desenvolvimento Rural de Serpa - 30 de maio de 2017

Clipping de notícias. Recife, 21 de junho de 2017.

PRESERVAÇÃO DO SEMIÁRIDO BRASILEIRO: UM ESTUDO SOBRE A EVOLUÇÃO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL ANTECEDENTES, CENÁRIO ATUAL E PERSPECTIVAS

Fonte:

Quais práticas podem contribuir para o desenvolvimento do turismo de base local nas comunidades do entorno da Lagoa do Cajueiro?

Dr. Mário Jorge de Souza Gonçalves

A MOBILIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO NOS PROBLEMAS SÓCIO- EDUCACIONAIS E MIGRATÓRIOS NO SEMIÁRIDO NO MUNICÍPIO DE NOVA PALMEIRA-PB

Colégio Santa Dorotéia Disciplina: Geografia / ESTUDOS AUTÔNOMOS Ano: 5º - Ensino Fundamental - Data: 13 / 8 / 2018

CONSERVANDO A CAATINGA: ÁREAS DE PROTEÇÃO NO ALTO SERTÃO ALAGOANO E SERGIPANO

AS REGIÕES DO BRASIL: REGIÃO NORDESTE

Geografia. As Regiões Geoeconômicas do Brasil. Professor Luciano Teixeira.

Luan Matheus Cassimiro;Romildo Lima Souza; Raphael de Andrade Braga; José Adeildo de Lima Filho

Projeto - Os saberes dos quintais: plantas que curam

Anais do Seminário de Bolsistas de Pós-Graduação da Embrapa Amazônia Ocidental

Clipping de notícias. Recife, 15 de dezembro 2017.

LOCALIZAÇÃO DO ESTADO NO BRASIL

PLANTIO DE ESPÉCIES VEGETAIS NATIVAS DA CAATINGA

DIAGNÓSTICO DE RISCOS AMBIENTAIS E ALTERNATIVAS PARA RECUPERAÇÃO AMBIENTAL DE TRECHO DO RIO GUANDU

A FAMÍLIA BIGNONIACEAE JUSS. EM UMA ÁREA DE CAATINGA DE ALTA IMPORTÂNCIA BIOLÓGICA NO SERTÃO PARAIBANO

MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS LEI Nº /2010 DECRETO Nº 7.404/2010

Pressões antrópicas no Baixo Sertão Alagoano, mapeamento das áreas remanescentes de Caatinga no município de Dois Riachos, Alagoas.

Divisão Geoeconômica

PROCESSO DE DESERTIFICAÇÃO E A EXPLORAÇÃO DE LENHA NA PARAÍBA DESERTIFICATION PROCESS AND AN EXPLORATION OF FIREWOOD IN PARAÍBA

ECOLOGIA 1- Trilha Sensitiva 2- Trilha da Água Pura 3- Eco-Origem 4- Expresso Ecológico. ANIMAIS SUSTENTÁVEIS 1- Minhocário 2- Abelhas sem ferrão

O PERCURSO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL DENTRO E FORA DO CONTEXTO EDUCACIONAL

ANÁLISE DE PARÂMETROS QUÍMICOS DE POTABILIDADE DA ÁGUA DE BICAS EM OURO FINO - MG RESUMO

Região Nordestina. Cap. 9

Mil Madeiras Preciosas ltda. PROCEDIMENTO OPERACIONAL PC-007/2007

POLÍTICA PUBLICA DE CONVIVÊNCIA COM O SEMIÁRIDO: CONSTRUÇÃO E VIABILIDADE DE CISTERNAS NA REGIÃO DE IRECÊ-BA

AVALIAÇÃO DE IMPACTOS AMBIENTAIS NA LAGOA DO ACARACUZINHO, MARACANAÚ-CE

VII.XIII: Legislação Ambiental relacionada ao PMMA

BIOLOGIA. Ecologia e ciências ambientais. Biomas brasileiros. Professor: Alex Santos

IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS E A TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO: UM OLHAR SOBRE O EIXO LESTE

NORDESTE: BREVE HISTÓRICO

ANÁLISE TEMPORAL DO REGIME FLUVIOMÉTRICO DO RIO PIANCÓ AO LONGO DE 41 ANOS: ESTUDO DE CASO DA ESTAÇÃO PAU FERRADO

Lista de Siglas e Abreviaturas

Anais 5º Simpósio de Gestão Ambiental e Biodiversidade (21 a 23 de junho 2016)

Plano de Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco. O plano de bacias tem como objetivo a programação de ações no âmbito de cada bacia hidrográfica.

CEAI O QUE O ALUNO DEVE APRENDER. PROCEDIMENTO METODOLÓGICO Capítulo 1: Identificar a. Exposição dialogada Orientação para se. importância do Sol

Unidade. A dinâmica da natureza. As grandes paisagens da natureza. Capítulo 10. Livro: Parte I, p Tópicos do capítulo

Sistema Nacional de Unidade de Conservação

Colégio São Paulo Teresópolis/RJ

BRASIL: ESPAÇO E NAÇÃO

MONITORAMENTO DA VAZÃO NAS NASCENTES DA SERRA DA CAIÇARA, MARAVILHA NO SEMIÁRIDO ALAGOANO.

CONHECIMENTO BÁSICO SOBRE MATA DE IGAPÓ DE ALUNOS DO 8 e 9 ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL II DE INSTITUIÇÕES DE ENSINO PRIVADA DO MUNICÍPIO DE BELÉ- PA

Geografia. Clima. Professor Luciano Teixeira.

Osvaldo Antonio R. dos Santos Gerente de Recursos Florestais - GRF. Instituto de Meio Ambiente de MS - IMASUL

Anatomia vegetal: como é uma folha por dentro? Luiz Felipe Souza Pinheiro*; Rosana Marta Kolb

Recorrência de Incêndios Florestais: Concelho de Mondim de Basto

PADRÕES DE DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DAS ESPÉCIES DE CAESALPINIOIDEAE (FABACEAE) DE UM AFLORAMENTO GRANÍTICO NO SEMIÁRIDO PARAIBANO

LISTA DE EXERCÍCICIOS 2 REGIONALIZAÇÃO DO BRASIL

Transcrição:

COMBATENDO A DESERTIFICAÇÃO ATRAVÉS DOS SABERES TRADICIONAIS: USO DE PLANTAS MEDICINAIS Cláudio Roberto Meira de Oliveira 1 & Denise dos Santos Colares de Oliveira 2 (Universidade do Estado da Bahia Campus XVI, BA, Brasil 1 ; Universidade Federal de Pelotas Campus Capão do Leão, RS, Brasil 2. claudiomeira@gmail.com) Resumo: A Bahia está dividida em 27 Territórios de Identidade, os quais podem ser definidos como um espaço físico, geograficamente delimitado, geralmente contínuo, caracterizado por múltiplos critérios. A presente pesquisa foi desenvolvida no Território de Identidade de Irecê e teve por objetivo analisar a compreensão dos moradores do município de Lapão sobre os efeitos (nocivos) da ação antrópica sobre a fauna e a flora local. As pessoas entrevistadas responderam as perguntas sobre questões relacionadas ao uso medicinal da fauna e da flora locais e a importância destas para a conservação da biodiversidade local. As espécies da flora citadas eram comumente usadas para consumo, sendo algumas indicadas para uso medicinal em infusão com cachaça. No tocante as espécies da flora, foram citadas grandes quantidades de espécies, sendo a família Fabaceae aquela que concentrava a maioria delas. Os usos eram os mais diversos, sendo indicados para dores estomacais, problemas respiratórios e do aparelho digestório. As folhas foram a parte mais utilizada, seguida da casca, e o chá o modo de preparo mais citado. Entender a importância do uso medicinal da flora local como forma de preservação ambiental pelas comunidades pode contribuir para a preservação do ambiente e retardar o avanço do processo de desertificação, uma vez que a vegetação não é retirada e esse tipo de prática não é aceito, pois existe valorização das plantas por causa do uso medicinal. Palavras chave: Conhecimento popular; Educação ambiental; Caatinga.

Introdução A configuração dos Territórios de Identidade teve como principal indutor o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) que, em 2003, através da Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT), introduziu o Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Territórios Rurais (Pronat) com o objetivo de promover o planejamento e a autogestão do processo de desenvolvimento sustentável dos territórios rurais e o fortalecimento e dinamização de sua economia (SEPLAN, 2016). De acordo com a Secretaria de Planejamento do Estado da Bahia (2016), o Território de Identidade pode ser definido como um espaço físico, geograficamente definido, geralmente contínuo, caracterizado por critérios multidimensionais, tais como o ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições, e uma população com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade, coesão social, cultural e territorial. O Território de Identidade de Irecê abrange uma área de 27.490,80 km² e é composto por 20 municípios: Central, Gentio do Ouro, Itaguaçu da Bahia, João Dourado, Xique-Xique, América Dourada, Barra do Mendes, Barro Alto, Cafarnaum, Canarana, Ibipeba, Ibititá, Ipupiara, Irecê, Jussara, Lapão, Mulungu do Morro, Presidente Dutra, São Gabriel e Uibaí. A população total do território é de 403.070 habitantes, dos quais 155.392 vivem na área rural, o que corresponde a 38,55% do total. Possui 41.011 agricultores familiares, 1.532 famílias assentadas e 26 comunidades quilombolas. Seu IDH médio é 0,61 (BRASIL, 2013). Os biomas brasileiros ricos em diversidade biológica encontram-se ameaçados. A Caatinga é o tipo de vegetação mais característico do semiárido. Na Caatinga predominam árvores e arbustos espinhentos com folhagem decídua, ou seja, que perdem as folhas na estação seca. Outra característica é o desaparecimento das plantas herbáceas na época seca reaparecendo na estação chuvosa. O nome caatinga vem dessa característica, pois a palavra deriva do tupi caa-tinga, que significa mata clara, em relação à claridade propiciada pela ausência da folhagem (COSTA et al., 2002). Garzoni e Pellin (2010) relatam que Educação Ambiental (EA), além de agregar diferentes dimensões, tais como social, política, econômica, cultural e histórica, se propõe a clarear e reforçar as relações de interdependência entre o homem e o meio ambiente, a valorizar a atitude cidadã com o intuito de ter sujeitos corresponsáveis e pró-ativos. Assim, a EA propõe o estímulo a uma consciência crítica, visando um resgate da postura ética e modificações de nossas atitudes em relação ao meio. Configura-se como um processo transformador que pode contribuir para desenvolver uma postura social e política preocupada e comprometida com as problemáticas ambientais (GARZONI e PELLIN, 2010). A presente pesquisa foi desenvolvida no Território de Identidade de Irecê e teve por objetivo analisar a compreensão dos moradores do município de Lapão sobre os efeitos (nocivos) da ação antrópica sobre a fauna e a flora local.

Material e métodos - Local do estudo O estudo foi realizado na zona urbana do município de Lapão (Latitude: 11º 23' 00" S Longitude: 41º 49' 55" W) Bahia, Nordeste brasileiro, apresentando altitude de 775m, área de 645 km2 e população de 25.646 habitantes. Apresenta a distância de, aproximadamente, 402 km da cidade de Salvador, capital da Bahia e 9,65 km da cidade de Irecê, principal cidade do Território de Identidade. Os moradores são, em maioria, agricultores de subsistência, residindo há mais de duas gerações na comunidade (CAR, 2004). Lapão apresenta uma população de aproximadamente 25.646 habitantes, com densidade demográfica de 38,43 hab./km² em uma área territorial de 605,78 km² (IBGE, 2010). A Figura 1 apresenta a localização do município estudado. Figura 1: Localização do Território de Identidade de Irecê e do município de Lapão, em destaque. Fonte: Nepomucemo e Lobão, 2016). - Coleta e análise dos dados Os dados foram coletados através de entrevistas feitas com a comunidade local na zona urbana da cidade em dias de feira, quando os moradores da zona rural normalmente são encontrados uma vez que se deslocam para compra e venda de produtos. As entrevistas aconteceram de maneira aleatória e de acordo com a disponibilidade das pessoas, tendo como base as que apresentassem algum conhecimento sobre o uso da flora do município, sendo complementadas por conversas informais, de acordo com a metodologia proposta por Melo-Batista e Oliveira, 2014 (adaptada de Albuquerque & Lucena, 2004).

Antes de cada entrevista foram explicados a natureza e os objetivos da pesquisa e solicitada à permissão aos entrevistados para registrar os informes. Com base nas citações e amostras, as espécies foram identificadas utilizando consultas às bibliografias especializadas e comparações com materiais previamente identificados por especialistas. As plantas foram apresentadas a partir dos seus nomes populares regionais, acompanhados com as identidades taxonômicas científicas seguindo a classificação filogenética APG Angiosperm Phylogeny Group - II (2003), representando a variação da denominação popular de uma mesma planta na região. De posse desses dados, foi analisada também a interação entre as plantas medicinais e a educação ambiental, no contexto da preservação do ambiente local e contenção dos danos causados pelo processo de desertificação. Resultados e discussão O estudo da percepção ambiental é fundamental para que se conheçam as relações entre os seres humanos, a flora e suas ações, conhecimentos, julgamentos e condutas. No decorrer da pesquisa buscou-se determinar inúmeros pontos sobre as afinidades e a utilização da flora silvestre ocorrente no município de Lapão - Bahia. Os relatos dos moradores obtidos através das entrevistas realizadas mostram a importância do uso de plantas medicinais pela sua eficácia e custo baixo, sendo utilizadas cotidianamente pelos mesmos. Foi informada também a importância da preservação das plantas nativas e medicinais pelos entrevistados, confirmando a necessidade desse conhecimento ser transmitido aos descendentes. Entretanto, nenhuma medida é tomada por parte deles. Ainda foi relatado o pouco desenvolvimento de trabalhos de sensibilização e conscientização dos moradores no tocante a preservação das plantas e manutenção do equilíbrio ambiental evitando assim o desaparecimento das espécies, da cultura local e o aparecimento ou aumento do processo da desertificação. Muitas das plantas citadas pela população entrevistada e que ainda são encontradas no município de Lapão são árvores, sendo muitas pioneiras e secundárias ao passo que outras caracterizam-se como herbáceas e arbustivas. Nesse entendimento, a preservação dessas espécies para manutenção do equilíbrio ambiental configura-se como de grande importância uma vez que a preservação destas espécies se dá através do uso como remédio pela população local, evitando assim que os processos de desertificação se acentuem ou tomem proporção maior nesta região. No Brasil o Território Semiárido Brasileiro, historicamente conhecido pela questão das secas, foi demarcado como susceptível ao fenômeno. Os significados mais imediatos destes acontecimentos foram a construção do Plano Nacional de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca (PAN-BRASIL, 2004). Dentre as questões abordadas destacam-se as vinculações entre os processos de degradação e desertificação com os padrões da territorialização desigual do desenvolvimento, associados às políticas de modernização do setor agropecuário em moldes conservadores que marcaram o Nordeste Semiárido (MACEDO, 2010).

O mesmo autor destaca ainda que o Território de Identidade de Irecê está entre os locais no estado da Bahia que se encontra em processo acentuado de desertificação e verificou-se que, nesse espaço regional, a degradação e a desertificação estão relacionadas ao legado do modelo de crescimento econômico fundamentado na noção de inesgotabilidade dos recursos naturais, visto que o modelo de exploração adotado décadas atrás consistia na completa retirada da vegetação como prática mais comum, sendo as áreas críticas àquelas onde a agropecuária se constitui como a base da atividade econômica (2000). No Pólo Irecê predominam áreas de moderada vulnerabilidade a desertificação (PAE- BAHIA, 2014), mas que podem evoluir para um estado mais grave como os observados em Juazeiro e Jeremoabo caso medidas de contenção ao processo da desertificação não sejam tomadas. Assim, a manutenção da cultura local do uso e preservação das plantas medicinais pela população local configura-se como uma das atividades a serem apoiadas ao passo que os estabelecimentos que visam apenas empregar métodos de exploração econômica têm contribuído para acelerar os processos de degradação ambiental e, consequentemente, da desertificação. Conclusões O uso de plantas medicinais pela população local e a transmissão desse conhecimento às novas gerações constitui-se em forma de preservar as espécies nativas medicinais e outras com potencial medicinal servindo diretamente como forma de preservação do ambiente local, evitando que o processo de desertificação se alastre pelo Território como pode-se observar nas áreas onde a agricultura é praticada pelo método de exploração dos recursos naturais pautados na noção de inesgotabilidade dos recursos naturais. Finalmente, cabe destacar que o incentivo ao desenvolvimento de projetos ambientais e de educação ambiental podem ser mecanismos eficientes para estimular a valorização e preservação das espécies da flora local, fato que poderá facilitar o processo de recuperação e repovoamento de áreas em processo de desertificação da Caatinga. Referências ALBUQUERQUE, U. P.; LUCENA, R. F. P. Métodos e técnicas para coleta de dados. In: ALBUQUERQUE, U.P; LUCENA, R. F. P. Métodos e técnicas na pesquisa etnobotânica. NUPEEA/Livro Rápido: Recife, p.37-62, 2004. APG II. An update of the Angiosperm Phylogeny Group classification for the orders and families of flowering plants: APG II. The Linnean Society of London, Botanical Journal of the Linnean Society, 141: 399-436, 2003. BRASIL. Programa de Ação Nacional de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca (PAN - Brasil). Brasília: Ministério do Meio Ambiente, Secretaria de Recursos Hídricos, 2004. BRASIL. Sistema de Informações Territoriais. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Agrário. Disponível em: <http://www.territoriosdacidadania.gov.br/dotlrn/clubs/territriosrurais/irecba/one-community? (83) page_num=0> 3322.3222 Acessado em: 03 de out. de 2016.

BAHIA. Plano Estadual de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca PAE/BA. - Versão Validada - Secretaria de Meio Ambiente. Governo do Estado da Bahia. Salvador, 2014. BAHIA. Política Territorial. Secretaria do Planejamento. Governo do Estado da Bahia. Salvador, 2016. Disponpivel em: <http://www.seplan.ba.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=51> Acessadp em: 03 de out. de 2016. CAR (Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional BA.). Programa de Desenvolvimento Regional Sustentável da Região Irecê PSDR IRECÊ. Salvador, 2004. COSTA, J. A. S.; NUNES, T. S.; FERREIRA, A. P. L.; STRADMANN, M. T. S; QUEIROZ, L. P. Leguminosas forrageiras da Caatinga: espécies importantes para comunidades rurais do sertão da Bahia. Feira de Santana: Universidade Estadual de Feira de Santana, SASOP, 2002. GARZONI, E.C. e PELLIN, A. A educação ambiental como ferramenta de mobilização social no processo de implementação do Corredor de Biodiversidade Miranda Serra da Bodoquena (Mato Grosso do Sul, Brasil). INGEPRO Inovação, Gestão e Produção, v.2: 69-81, 2010. IBGE - INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Populacional 2010. (29 de novembro de 2010). Disponível em: <http://censo2010.ibge.gov.br/en/> Acessado em: 11 de dezembro de 2015. MACÊDO, L. R. de L. Dinâmica Socioprodutiva de Territórios Susceptíveis à Desertificação no Estado da Bahia: o caso de Irecê. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual de Feira de Santana UEFS. 2010. 176p. NEPOMUCENO, M. Q.; LOBÃO, J. S. B.; VALE, R. M. C. Estudo da fragmentação da vegetação como indicador da susceptibilidade a desertificação no polo de Irecê - BA. Disponível em: <http://www.xvisemic.esy.es/arquivos/sessao-vi/maurilio-queirosnepomuceno.pdf>. Acessado em: 03 de out. de 2016.