A ARGUMENTAÇÃO E MOVIMENTO DAS LÍNGUAS: O SIMBÓLICO NA CENA PÚBLICA DE LITÍGIO NO MANDADO DE SEGURANÇA PROCESSOS DE REPRESENTAÇÃO E IDENTIFICAÇÃO

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Transcrição:

A ARGUMENTAÇÃO E MOVIMENTO DAS LÍNGUAS: O SIMBÓLICO NA CENA PÚBLICA DE LITÍGIO NO MANDADO DE SEGURANÇA PROCESSOS DE REPRESENTAÇÃO E IDENTIFICAÇÃO SCHREIBER DA SILVA, Soeli Maria (xoila@terra.com.br) Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) Este estudo vem sendo desenvolvido na Unidade de Pesquisa em Estudos Históricos, Políticos e Sociais da Linguagem, do Departamento de Letras da Universidade Federal de São Carlos. Insere-se no projeto A Argumentação no Movimento de Línguas no Espaço de Enunciação em São Carlos: o político no texto jurídico, e também no Projeto História das Idéias Lingüísticas em torno da questão dos controles da representação e identificação nos processos jurídicos. O corpus constitui-se, para este estudo, de um Mandado de Segurança cujo objeto é a base de cálculo do ICMS e bonificações nas vendas que correspondem a abatimentos sob a forma de unidades físicas de seus produtos e a empresa impetrante considera inválida a inclusão dos valores correspondentes às saídas bonificadas na base de cálculo do ICMS. Trato deste processo na Cena Pública de Litígio. No espaço simbólico jurídico há um conflito constante entre as instituições envolvidas no processo e o modo dos sujeitos se significarem pelo simbólico é político e vai redividindo o espaço jurídico por procedimentos de controles de representação e identificação. Nesse conflito, três línguas que visibilizam a memória da origem do conceito jurídico representam a contradição com o real e a afirmação de redivisão. Os processos de significação no texto jurídico emergem como neutralidade num aparato sistematizado de controles de representação e identificação. Estudo o sujeito falante, predicado 1

como falante, sujeito que fala, e a polissemia organiza aquele lugar específico. O modo analítico da Semântica do Acontecimento dá-se pelos memoráveis a polissemia é um movimento na normatividade e é a divisão material do sentido. O espaço de enunciação constitui-se com a divisão de línguas e dos sujeitos. Quando se trata do espaço de enunciação em São Carlos, a divisão constitutiva não se resume ao espaço real. Há um funcionamento próprio simbolizado na língua e aí o real demanda sentido. Quando falamos em realidade, há um sentido sobre o espaço de enunciação em questão, o real da história é sujeito a equívocos. A normatividade da lei e da jurisprudência divide o real. É na cena enunciativa e no agenciamento enunciativo caracterizado pelos modos de dizer e posição-sujeito que temos o movimento enunciativo configurado pelo agenciamento, pela língua, pelos enunciadores e pela posição-sujeito dos enunciadores. No agenciamento enunciativo, a normatividade divide o real e redivideo. Há aí conflito entre o real e o simbólico, já estamos falando de relações históricas e políticas. A argumentação, a língua e os conflitos são constituídos por locutores afetados pelos lugares-sociais e nos modos de dizer a divisão dá-se também entre as três línguas: a língua latina, língua portuguesa e a língua inglesa. Os locutores mobilizam as línguas por operações enunciativas que se caracterizam como: (...) agenciamentos específicos pelos quais o acontecimento do dizer mobiliza a língua em textualidades particulares. Esses agenciamentos se caracterizam pelas marcas que a enunciação apresenta como diferenças no fio de textualidade que se mostra como formulada pelo presente do locutor. (Guimarães, 2005, p. 2). O modo de ver essa diferença é a reescrituração: (...) procedimento pelo qual a enunciação de um texto rediz insistentemente o que já foi dito fazendo interpretar uma forma como diferente de si. Este 2

procedimento atribui (predica) algo ao reescriturado. (Guimarães, 2005, p. 2). Ao atribuir algo ao reescriturado, a predicação: trata-se de uma operação pela qual no fio do dizer uma expressão se reporte a outra pelos mais variados procedimentos ou por negar a outra ou por retomá-la, ou por redizê-la com outras palavras ou por anáfora, catáfora, substituição. (Guimarães, 2005, pp. 2-3). As operações de predicação vão se dando num Domínio Semântico de Determinação (DSD). As reescrituras e a articulação, ou seja procedimentos de articulação dizem respeito às relações próprias das contigüidades locais. (Guimarães, 2005, p.2). Interessa a noção de determinação para especificar que tipo de relação existe entre as palavras num domínio semântico relativo a um conjunto de palavras, tratadas relativamente a seu sentido. (Guimarães, 2005, p. 3). Proponho-me, então, a analisar os modos específicos de acesso à palavra e como se configura o agenciamento enunciativo ou como os falantes são tomados por agenciamentos enunciativos. Se de um lado temos aí a cena enunciativa distribuindo e redistribuindo pelas divisões do político, trato no discurso jurídico da cena enunciativa de litígio no processo Mandado de Segurança. Aí o real demanda sentido. Vou me preocupar com as trajetórias do visível/invisível nos modos de dizer. Essas trajetórias são representadas pelo imaginário. Na cena pública de litígio, o agenciamento enunciativo redistribui os territórios da linguagem pelo modo de dizer dos sujeitos políticos. Os processos de subjetivação constituídos nessa temporalidade deslocam os lugares pela representação imaginária no conflito com a normatividade do jurídico instaurando uma nova identidade para os sujeitos políticos. Vejamos excertos dos advogados T. A. K. e F. A. G. do processo nº 1.706/2004: 3

1. Justifica-se a impetração do presente mandado de segurança que visa a proteger direito subjetivo líquido e certo da EB S/A mediante a sentença de medida liminar. (Processo nº 1.706/2004, p.4). 2. As razões de fato e fundamento de direitos expendidos no presente exordial, por certo, resultarão na concessão da liminar pretendida initio lites, bem como, por conseguinte, na concessão definitiva de segurança pleiteada através do presente mandamos. (Processo nº 1.706/2004, p.13). Os locutores advogados de defesa T.A.K. e F.A.G. constituem o litígio afirmando o Mandado de Segurança em: proteger direito subjetivo líquido e certo razões de fato e fundamento de direito concessão de liminar concessão definitiva de segurança através do presente Mandamos Direito subjetivo líquido e certo e razões de fato e fundamento de direito determinam a Constituição do Mandado de Segurança e o resultado antecipado será a Concessão da liminar e a Concessão definitiva de segurança pleiteada através do presente Mandamus. Determinações da enunciação universal da lei direito subjetivo líquido e certo e fatos e fundamentos de direito orientam para a exclusão da base de cálculo do imposto todos e quaisquer valores a título de bonificações em mercadorias por ser uma cobrança institucional do ICMS. O memorável da lei reescreve direito líquido e certo como razões de fato e fundamento de direito. O Mandado de Segurança está representado como uma liminar do juiz para excluir a base de cálculo do ICMS o valor de vendas bonificados; essa segurança é pleiteada pelo Mandamus. A materialidade do Mandado de Segurança constitui-se na liminar do juiz; o gênero do texto dos locutores advogados de defesa é o mandamus. 4

Há mobilização de três línguas dos locutores advogados impetrantes: na língua portuguesa o processo é de mandado de segurança; a decisão do juiz é a liminar e o documento dos impetrantes e impetrado é o mandamus. Não há portanto sinonímia ou equivalência entre a língua latina e língua portuguesa. O que há é uma divisão na cena enunciativa de litígio. Vejamos os recortes do juiz: 1. A compensação, neste momento, é absolutamente inadequada, no mínimo pela circunstância de não se conhecer seu montante, o qual não foi submetido ao exame de autoridade fiscal. (Processo nº 1.706/2004, p. 151). 2. Seria preciso apurar o montante, percebendo-se a inconveniência para não se dizer impossibilidade dessa tarefa em mandado de segurança. (Processo nº 1.706/2004, p. 151). O locutor-juiz afirma a compensação inadequada determinada por apurar montantes para a autoridade fiscal e afirma inconveniente a tarefa de Mandado de Segurança determinada por falha administrativa. Compensação inadequada Apurar montantes para a autoridade fiscal Inconveniente Impossibilidade da tarefa de Mandado de Segurança O locutor predicado pelo lugar social do juiz afirma a inadequação e a inconveniência subjetivada pela normatividade jurídica na relação com a autoridade coatora. Na enunciação universal, o modo de dizer aponta a falha administrativa e a posição sujeito identifica-se pela manutenção dos interesses do Estado na 5

interdiscursividade que apaga o poder do juiz para julgar o Mandado de Segurança. Vejamos os recortes do ofício do DTR do processo nº 1.068/2004 ao juiz: 1. Requeiro seja reconhecida a incompetência desse r. Juízo para o julgamento deste mandamus, impetrado contra ato que me é atribuído, na qualidade de Delegado Regional Tributário de Araraquara em razão de a minha sede funcional estar localizada no município de Araraquara-SP. (Processo nº 1.068/2004, p. 164). 2. Identificada e certa a sede funcional, o ordenamento jurídico é quem evidencia a regra de competência para o processo e julgamento do Mandado de Segurança. Enfim, o critério para a determinação de competência para o mandamus é a qualificação de autoridade coatora, definindo o órgão judiciário que ira originalmente, conhecer e julgar. (Processo nº 1.068/2004, p. 165). 3. Para a fixação do juízo competente em Mandado de Segurança não interessa a natureza do ato impugnado; o que importa é a sede de autoridade coatora e sua categoria funcional, reconhecida nas normas de organização judiciária pertinentes (...). (In Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de Injunção, Habeas Data Editora Revista dos Tribunais - 13ª ed. 1988, págs. 45/46). (Processo nº 1.068/2004, p. 166). 4. No mandado de segurança a competência funcional do juiz se mede pela natureza e hierarquia da autoridade contra a qual é requerida. A garantia constitucional, sendo irrelevante a matéria discutida. (In: Mandado de Segurança em Matéria Tributária, Editora 6

Revista dos Tribunais, 1994, p. 44). (Processo nº 1.068/2004, p. 167) 5. Com efeito é de notória evidência que as planilhas anexadas pela impetrante à inicial são insuficientes para demonstrar a existência de qualquer direito líquido e certo neste mandamus. (Processo nº 1.068/2004, p. 181). 6. Basta, para negar o writ, a seguinte indagação: pode o juiz autorizar que se tome um crédito que não sabe existente? (Processo nº 1.068/2004, p. 185). No DSDI incompetência desse juízo para o julgamento deste mandamus é determinada pela qualidade de Delegado Regional. DSDI Delegado Regional Incompetência desse juízo para julgamento deste mandamus No DSDII a sede funcional do ordenamento jurídico determina a competência para o processo e julgamento do Mandado de Segurança. A qualificação de autoridade coatora determina a competência para o mandamus. DSDII Sede funcional Competência para o processo e julgamento do Mandado de Segurança. Qualificação de autoridade coatora Competência para o mandamus 7

A definição das competências se dá num Domínio Semântico de Determinação. No DSDI, o locutor predicado pelo lugar social de Delegado Regional determina a competência de juízo para o mandamus. Nessa relação de determinação, o locutor social Delegado Regional é privilegiado pela normatividade jurídica representada pela definição de competências na relação com o memorável de poder atribuir competência e memorável da qualidade do cargo. O locutor social Delegado Regional divide-se como qualidade de delegado, qualidade de impetrado, e qualificação de autoridade coatora. No DSDII a sede funcional do ordenamento jurídico determina a competência para o processo e julgamento do Mandado de Segurança; a qualificação autoridade coatora determina a competência para o mandamus. Nas determinações em DSDI e DSDII temos o conflito no qual há a divisão entre as línguas: mandamus é o documento do impetrante e do impetrado (os ofícios, as razões); Mandado de Segurança é o julgamento do mandamus. No DSDIII a sede da autoridade coatora e categoria funcional determinam a fixação do juízo competente. No DSDIV a natureza e hierarquia da autoridade contra a qual é requerida a garantia constitucional determinam a competência funcional do juiz no Mandado de Segurança no memorável dos interesses do Estado. Isso se dá na divisão Estado autoridade coatora impetrado. E é uma enunciação de denegação dos interesses do impetrante em benefício dos interesses do Estado. DSDIV Natureza e hierarquia da autoridade coatora Competência funcional do juiz DSDIII Sede da Autoridade Coatora e Categoria Funcional Fixação do Juízo Competente No DSDV a evidência das planilhas determina a inexistência de direito líquido e certo. 8

DSDV Evidência das planilhas Direito líquido e certo No DSDVI, o memorável da pergunta do locutor social autoridade coatora pode o juiz autorizar um crédito que não sabe existente? é uma enunciação de denegação - não haver mérito no writ. Aqui o writ funciona como homônimo de julgamento do Mandado de Segurança. DSDVI Pode o juiz autorizar um crédito que não sabe existente? Negação do writ O lugar-social de qualidade de impetrado no modo de dizer universal da normatividade do DSDI e da posição-sujeito que atribui competência determinam a incompetência do juízo para julgamento no equívoco que desconhece a posição-social de impetrado, na relação com o interdiscurso como norma disciplinar do Estado para gerir as contribuições pecuniárias. No DSDII essa norma disciplinar é identificada pela qualificação de autoridade coatora ; essa predicação no modo de dizer universal do DSDII e da posição-sujeito que se subjetiva pelo Estado coincidem com a autoridade que julga o Mandado de Segurança no interdiscurso de manutenção institucional de poder. A identificação dá-se no agenciamento enunciativo e no processo de representação das figuras no acontecimento. No agenciamento enunciativo e no acontecimento se identificam os gêneros por meio das línguas portuguesa e latina. Mandamus nesse acontecimento enunciativo é o documento dos locutores impetrantes e do impetrado, no processo de subjetivação do locutor-social e no 9

agenciamento enunciativo na divisão entre as predicações sociais do locutor. Na cena enunciativa de litígio, o agenciamento enunciativo divide a língua e temos a redistribuição Mandado de Segurança e Mandamus. A constituição dos gêneros no acontecimento enunciativo foi tratada por Dias (2004). No DSDIII e DSDIV, o memorável dos interesses do Estado na divisão autoridade coatora/categoria funcional - Delegado Regional fixam o juízo em Mandado de Segurança. A posição-sujeito é de manutenção dos interesses do Estado no equívoco da divisão de locutores que apaga o lugar-social de impetrado, dos interesses dos impetrantes e também a competência do juiz. O DSDIII determina a sede do juízo na sede da autoridade coatora. Nesse domínio semântico de determinação define-se o juízo do Mandado de Segurança pela sede de autoridade e categoria funcional. Na relação com o interdiscurso, no modo de dizer universal da normatividade, mantém-se a administração do Estado e os privilégios das autoridades pela manutenção do juízo na sede. Em DSDV o direito de dizer se a evidência das planilhas determina o direito líquido e certo da posição-sujeito da normatividade da lei e do lugar-social da autoridade coatora coincidem com o lugar-social de delegado impetrado. A distribuição de poder dá-se no acontecimento pela definição do locutor-social autoridade coatora, determinando o mérito para o writ. A língua inglesa nesse acontecimento é homonímia de Mandado de Segurança, no equívoco de estabelecer a hierarquia do locutor-social autoridade coatora. Da posição-sujeito subjetivada pelo Estado pela normatividade jurídica, o locutor autoridade coatora redistribui o poder estabelecendo uma hierarquia que o põe acima do juiz do Mandado de Segurança. A redivisão põe-se no modo de dizer universal, pela normatividade saber não saber qual é o crédito. Essa normatividade e esse equívoco na relação com o interdiscurso revelam o indizível: o locutor-social impetrado define o mérito ou não do Mandado de Segurança do juiz no privilégio do locutorsocial impetrado em detrimento dos locutores-sociais-advogados impetrantes. As denegações redistribuem a cena enunciativa pública de litígio pelos deslocamentos de juízo competente, correta indicação 10

do juízo e da sede do juízo, mérito do julgamento do juiz, mérito do direito líquido e certo e o descarte das planilhas determinadas pelo juiz. O movimento de línguas dá-se nesse litígio no agenciamento enunciativo. O locutor autoridade coatora controla e identifica pela redistrtibuição dos poderes nas contribuições pecuniárias, desautorizando o mandamus dos impetrantes e o Mandado de Segurança do juiz. A negação do mérito do juiz redistribui também as línguas, sendo o Mandado de Segurança um writ, movimento determinado pelo conflito no agenciamento enunciativo e o mandamus documentos dos impetrados e impetrantes. No entremeio temos a cena pública de litígio envolvendo três instituições: a delegacia regional tributária, o judiciário e uma grande empresa. Esse acontecimento dá-se no entremeio. Os conflitos e as contradições do processo identificam-no como público no acontecimento e na divisão do político. A identificação do público é estabelecida pelos controles de representação no simbólico. A forma sujeito jurídica constitui-se no processo de agenciamento enunciativo. Essa análise vai estabelecendo um novo modo teórico de tratar a argumentação. O processo que se dá na divisão e redivisão na cena enunciativa, e que se constitui no político na cena pública de litígio, organiza-se por operações enunciativas nas quais se dão relações de determinação. Os domínios semânticos de determinação orientam a argumentação na divisão. No DSDI do ofício do DRT, o Delegado Regional determina a incompetência do juízo esquecendo da divisão Delegado Regional Juiz Locutores Impetrantes Locutor Impetrado. Esse esquecimento é decisivo para orientar para a incompetência do juiz. E a argumentação é definida também na cena pública de litígio na relação com o Estado e com o interdiscurso no agenciamento enunciativo, temporalidade na qual a direção argumentativa dá-se pela divisão e redistribuição de poderes na relação com a lei e jurisprudência. 11

Bibliografia: 1-DESCEMBRE, Romain. Aux origines des théories de la raison d Etat: Giovanni Botero, l Eglise et la politique nouvelle. Conferência (SEM-LSH Lyon) e UNICAMP, Setembro, 2005. Mimeo. 2-DIAS, Luis Francisco. Modos de Enunciação e Gêneros Textuais: em busca de um novo olhar sobre gêneros de texto. In: FONSECA, M. C. Em torno de Lingua(gem): questões e análises. Vitória da Conquista: UESB, 2004, no prelo. 3-GUIMARÃES, Eduardo. Semântica do Acontecimento. Campinas, Pontes, 2002. 4-GUIMARÃES, Eduardo. Civilização na Lingüística Brasileira no Século XX. 2005. Mimeo. 5-OLIVEIRA, Sheila E. de. Cidadania: história e política de uma palavra. Tese de Doutorado, UNICAMP, 2004. 6-ORLANDI, Eni P. Discurso e Texto Formulação e Circulação dos Sentidos. Campinas, Pontes, 2001. 7-PÊCHEUX, Michel. O Discurso: estrutura ou acontecimento? Campinas, Pontes, 1990. 12