N º 3 0 - N o v e m b r o 2 0 0 4 A Autoridade da Concorrência elaborou um documento relativo à forma como vê o Mercado dos Combustíveis em Portugal, documento este que continha um Projecto de Recomendação ao Governo, e que foi objecto de consulta pública até 10 de Outubro passado. A APETRO, evidentemente, deu o seu contributo a esta consulta pública mas, por princípios éticos, não o divulgou. Veio agora no dia 15 de Novembro a Autoridade da Concorrência recomendar formalmente ao Governo (Recomendação nº 3/2004) todas as medidas que constavam do projecto em consulta pública. E, apesar destas recomendações se dirigirem ao Mercado Petrolífero, onde as Associadas da APETRO têm uma representação de grande significado, nenhuma das questões que suscitámos foi tida em consideração. Sendo assim, e na nossa opinião, justifica-se transmitir aos habituais destinatários desta FOLHA a nossa posição sobre a questão que tem sido mais mediatizada pela Autoridade da Concorrência: os Postos de Abastecimento em Hipermercados. A Recomendação da AdC Propõe-se a alteração da Portaria nº 131/2002, de 9 de Fevereiro, no sentido de serem eliminadas todas as disposições que impedem uma concorrência não falseada, ao inviabilizarem o acesso ao mercado de certas categorias de operadores, in concreto, as grandes superfícies comerciais; Av. Engº Duarte Pacheco - Amoreiras - Torre 2, 6º piso, sala 1-1070-102 LISBOA Telef. 213 844 065 Fax 213 844 075 E-mail: apetro@mail.telepac.pt
Os requisitos de segurança impostos à instalação de postos de abastecimento, deverão ser objectivos, de aplicação universal, não discriminatórios e transparentes; A Posição da APETRO A interpretação que a AdC faz da Portaria nº 131/2002 é confusa e, por consequência, errada. Não se pode interpretar que a legislação anterior como a AdC faz crer permitisse a instalação de postos em superfícies comerciais. A legislação era simplesmente omissa, e não caracterizava as grandes superfícies comerciais. A Portaria actualmente em vigor não proíbe. Obriga, sim, a que todos os postos de abastecimento obedeçam ao mesmo Regulamento de Construção e Exploração. Desconhece, talvez, a AdC que o primeiro Posto de Abastecimento integrado no espaço de uma grande superfície foi construído por uma das 8 majors que a AdC refere no seu documento. Hoje, não poderia ser construído por razões de segurança e ambientais. E este exemplo não é único; vários postos enquadrados em grandes superfícies são brand named pelas majors. O que acontece é que o anterior regulamento datava de 1992 e, como facilmente se reconhece, em 10 anos registaram-se significativas alterações técnicas nos materiais e equipamentos utilizados, nos produtos e serviços disponibilizados, nos layouts dos próprios Postos e, sobretudo, na envolvente dos mesmos. Será, portanto, pertinente rever as principais alterações introduzidas por este novo regulamento de 2002: Edifício que recebe público O regulamento de 1992 definia edifício que recebe público, de uma forma genérica, como local onde se exerça qualquer actividade destinada ao público em geral ou a determinados
grupos de pessoas, nomeadamente escolas, museus, teatros, cinemas e terminais de passageiros de transportes públicos. O Regulamento de 2002 acrescenta hotéis, centros comerciais, supermercados. Os Centros Comerciais e Supermercados não são edifícios que recebem público? Não devem, em rigor, ser abrangidos nesta definição? Área Sensível O Regulamento de 2002 introduz o conceito de área sensível que define como a área que pela sua dimensão ou utilização possa originar embaraços ou perigos para a circulação, tal como parques de estacionamento inseridos, contíguos ou adjacentes a recintos desportivos, de espectáculos e culturais, superfícies comerciais, os acessos exclusivos de todas as estruturas atrás referidas, bem como parques de estacionamento públicos os privados para mais de 50 veículos. Os parques de estacionamento dos Centros Comerciais e Supermercados não são áreas sensíveis? Qual a justificação para os omitir? Condições de implantação dos postos O Regulamento de 2002 determina que não é permitida a instalação de postos em áreas sensíveis. Devem os sãos princípios de segurança permiti-lo? E, se assim fosse, qual a fundamentação? Acessos O Regulamento de 2002 determina que as entradas e saídas de postos de abastecimento devem, no caso de novas construções, ser
efectuadas directamente da via pública, por vias de sentido único exclusivamente adstritos ao seu funcionamento. Ainda à luz dos sãos princípios de segurança, esta regra é questionável? Não é claramente mais seguro que os acessos aos postos sejam feitos directamente da via pública? Distâncias de segurança O Regulamento de 2002 indica que a distância mínima de unidades de abastecimento de gasolina ou gasóleo a áreas sensíveis deverá ser de 25 metros. Imaginemos um hipotético cenário de acidente. É excessiva uma distância de 25 metros a áreas sensíveis? Não deve haver uma zona de segurança à volta de áreas sensíveis? São estas, fundamentalmente, as disposições que parecem ter causado uma interpretação distorcida dos objectivos e da aplicabilidade da Lei. Este novo conjunto normativo não foi feito para condicionar o acesso à comercialização de combustíveis directamente ao consumidor. Desde a adesão de Portugal à então CEE, em 1986, que foram sendo sucessivamente removidos condicionalismos de natureza legal que, na prática, impediam ou dificultavam o acesso à actividade. Hoje, a comercialização de combustíveis é uma actividade livre. Mas, exactamente por ser livre, deve ser constantemente enquadrada por legislação que salvaguarde o utilizador. Neste caso, que salvaguarde o seu direito a ter postos de abastecimento seguros. É, tão somente, uma questão de prudência. Prudência que parece ser frontalmente posta em causa pela AdC que, no seu documento, afirma que A regulamentação em matéria de salvaguarda de segurança não deverá constituir, em termos de direito ou de facto, uma barreira à instalação de novos operadores. Para a Indústria Petrolífera, a secundarização da segurança não é admissível e, quem a advoga ou venha a advogar, terá que suportar o ónus da decisão.
Contudo, independentemente das questões técnicas e de segurança abordadas no documento da AdC, há outras questões relacionadas com a recomendação de abertura de postos em hipermercados que não são de modo nenhum negligenciáveis: são questões que se relacionam com as políticas económicas, sociais e de ordenamento do território a que o Governo está, com certeza, atento. Referimos, por exemplo, o caso francês que a AdC elege como o mercado mais eficiente ; em 1980 a densidade da rede de retalho em França era de 7,52 postos por 100 Km2 e em 2003 era 2,58 postos por 100 Km2. Aliás, o modelo francês começa a dar as primeiras indicações de se estar a esgotar, pois só em 2002 encerraram cerca de 50 postos da rede de hipermercados. Não estará a AdC a recomendar um modelo já, ele mesmo, em mutação? Para que se possa avaliar a sustentabilidade desta recomendação da AdC é importante lembrar que este organismo produziu, em 10 de Fevereiro do ano corrente, um documento formal onde caracterizava o Mercado dos Produtos Petrolíferos e nele se lia que a venda ao público de combustíveis líquidos era feita através de diversos canais, sendo um deles hipermercados, como é o caso do (marca referida). Em geral, a presença destas empresas no negócio dos produtos petrolíferos constitui uma actividade com função de chamariz para o seu objectivo principal, praticando normalmente, preços a margens nulas Enfim, aguardemos tranquilamente que o Governo pondere tão estranha recomendação e confiemos que continuem a ser os consumidores e o próprio mercado a decidir o equilíbrio entre os diferentes tipos de distribuição não uma decisão administrativa.