O PT E A POSIÇÃO DE SUJEITO RÉU NO ACONTECIMENTO DISCURSIVO DO JULGAMENTO DO IMPEACHMENT DE DILMA ROUSSEFF

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Transcrição:

Página 511 de 543 O PT E A POSIÇÃO DE SUJEITO RÉU NO ACONTECIMENTO DISCURSIVO DO JULGAMENTO DO IMPEACHMENT DE DILMA ROUSSEFF Thaiane Dutra Luz Costa (UESB/LAPADis/PPGLIN/CAPES) Maria da Conceição Fonseca-Silva (UESB/LAPADis/PPGLIN/PPGMLS/CNPQ) RESUMO Neste trabalho, apresentamos resultados parciais de pesquisa que tem como objetivo identificar e analisar o funcionamento da posição de sujeito réu no acontecimento discursivo do julgamento do Impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff. O corpus foi constituído de textos transcritos da Sessão Extraordinária de julgamento do Impeachment no Senado Federal que se deu do dia 25 de agosto a 31 de agosto de 2016. Na análise, mobilizamos conceitos do dispositivo teórico analítico da Análise de Discurso (AD). PALAVRAS-CHAVE: Análise de Discurso. Posição-sujeito. Efeitossentido. Acontecimento discursivo. Impeachment de Dilma Rousseff. INTRODUÇÃO Neste trabalho, resultado de pesquisa ligada ao projeto temático Efeitos de memória efeitos de justiça em julgamento político e jurídico de casos de corrupção política que é desenvolvido no Laboratório de Pesquisa em Análise de Discurso (LAPADis), consideramos que um acontecimento histórico precede a discursivização do acontecimento discursivo e, portanto, da produção de efeitos de sentido e analisamos a posição de sujeito réu na discursividade sobre do processo de Impeachment. Em meio à maior crise política, econômica e institucional do período de redemocratização, o Brasil, mergulhado em grandes escândalos de corrupção que envolvem indivíduos que se subjetivam

Página 512 de 543 em posições de sujeito das esferas do poder privado e das esferas de poder público, a exemplo do poder executivo e do poder legislativo, foi marcado, em 2016, pela segunda vez, por processo de impeachment, após eleições diretas. Guardadas suas diferenças, o primeiro diz respeito ao processo que levou à destituição de Fernando Collor de Mello, que governou o país de 15 de março de 1990 a 2 de setembro de 1992. O segundo caso e o que nos interessa neste trabalho refere-se ao processo que levou à destituição de Dilma Rousseff, que governou o país de janeiro de 2011 a 2014, ano em que foi reeleita para exercer o segundo mandato cujo período seria de 2015 a 2018. O impedimento de exercer o cargo de presidenta do Brasil foi concretizado pelo acontecimento histórico discursivizado no acontecimento discursivo da Sessão Extraordinária de julgamento do Impeachment no Senado Federal que se deu do dia 25 de agosto a 31 de agosto de 2016. O processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff teve início em 2 de dezembro de 2015, quando o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha deu prosseguimento ao pedido dos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal. Com duração de 273 dias, o caso se encerrou em 31 de agosto de 2016, tendo como resultado a cassação do mandato, mas sem a perda dos direitos políticos de Dilma. Em 17 de abril de 2016, a Câmara dos Deputados autorizou a abertura de processo de Impeachment de Dilma Rousseff. A Comissão de Impeachment do Senado aceitou e Sessão Extraordinária foi convocada para dar início às 9h do dia 25 de agosto de 2016, uma quinta-feira. Em 31 de Agosto de 2016, o Senado aprovou, por 61 votos favoráveis e 20 votos contrários e nenhuma abstenção, o afastamento de Dilma Rousseff com a justificativa de ela ter cometido crime de responsabilidade fiscal. Na posição de Ré, a acusada foi condenada à perda do cargo de Presidente da República Federativa do Brasil. Em votação subsequente, o Senado decidiu, por 42 votos favoráveis, 36 contrários e 3 abstenções, afastar a pena de inabilitação para o exercício de cargo público, em virtude de não se ter obtido nesta votação dois terços dos votos constitucionalmente previstos.

Página 513 de 543 MATERIAL E MÉTODOS A pesquisa que resultou este trabalho é qualitativa quanto à abordagem; pesquisa; aplicada, quanto à natureza; explicativa, quanto a seus objetivos; e estudo de caso, quanto ao procedimento. O corpus foi constituído do livro publicado pelo Senado Federal com a transcrição da Sessão Extraordinária que ocorreu entre os dias 25 de Agosto de 2016 e 31 de Agosto de 2016, composto por 688 páginas., bem como de vídeos da Sessão Extraordinária, disponível no canal do YouTube da respectivas casa. Tomamos como campo discursivo de referência a discursividade sobre a posição de sujeito réu no processo de Impeachment, na Sessão Extraordinária dos dias 25 a 31 de Agosto de 2016, no Senado. Operamos recortes de Sequências discursivas (SDs) que tratam da questão para análise. Na análise das SDs, mobilizamos o dispositivo teóricometodológico da Análise de Discruso, compreendendo com Orlandi (1996, 37) o linguístico e o histórico, enquanto indissociáveis no processo de produção do sujeito do discurso e dos sentidos que (o) significam. RESULTADOS E DISCUSSÃO As análises indicaram que no processo de Impeachment, posição de sujeito réu é, juridicamente, ocupada por Dilma Rousseff, mas que, na discursividade do julgamento do Impeachment, outros sujeitos são convocados para ocupar essa posição, a exemplo do Partido dos Trabalhadores (PT). Identificamos regularidade nas SDs analisadas que indicam efeitos de sentido do PT como um partido envolvido com práticas criminosas, como pode ser observado nas SDs 1 e 2: (SD1) [...] o PT é um partido fora da lei. Para o PT, a lei é um papel que não precisa ser cumprido. (SD2) É isto que o PT está fazendo com o nosso País: diante do que é inadmissível, eles

Página 514 de 543 agem com tamanha naturalidade, que até nós, cidadãos comuns, acabamos nos acostumando com o ilícito. O PT é convocado para ocupar a posição do sujeito réu quando é discursivizado como o PT que não reconhece os erros, engana a população, não respeita as leis, não sabe gerir a coisa pública, como indicam as SDs a seguir: (SD3) O PT acredita que tem o dom de poder interpretar os fatos como eles acham que devem ser interpretados. E aí eles passam a acusar todos que não comungam com eles. (SD4) O PT não aceita, por não acreditar na força da cidadania, não respeita as leis e não acredita que as leis são para todos. SD5) [...] este País tem uma Lei de Responsabilidade Fiscal, que também não foi assinada pelo PT, que, então, não se sente na obrigação de cumprir. (SD6) o PT não assinou a Constituição Federal de 1988; o PT votou contra a Lei de Responsabilidade Fiscal. (SD7) A dívida do Brasil... Esse é o maior problema do governo do PT. [...], o governo do PT gastou um rio de dinheiro e gastou erradamente: [...]. Essas SDs apresentadas são algumas das SDs selecionadas para análise, a título de exemplo, que indicam o efeito de sentido de que o PT é também réu no processo, que deve ser condenado para que o país se reorganize política e economicamente. CONCLUSÕES Os resultados das análises apontam que o entrecruzamento de discursos que passaram por repetição, retomadas, modificações e atualizações no domínio de posição-sujeito réu traz como produto o efeito de memória gerado ao redor da posição-sujeito réu, neste

Página 515 de 543 trabalho ocupada não apenas pelo sujeito Dilma Rousseff, embora a mesma o ocupe processualmente, mas também por outros sujeitos durante a Sessão Extraordinária do Processo de Impeachment no Senado Federal. REFERÊNCIAS ORLANDI. E. P. Interpretação; autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólico. Petrópolis, RJ: Vozes, 1996.. Análise de Discurso: princípios e procedimentos. Campinas, Pontes, 1999. PÊCHEUX, M. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. Campinas/SP: Editora da UNICAMP, 1988. Edição Original: 1975.