O uso de animais na alimentação e o impacto sobre o ambiente



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Transcrição:

O uso de animais na alimentação e o impacto sobre o ambiente Caderno de orientações Argumentação objetiva sobre: Poluição, Desertificação, Escassez de Água, Aquecimento Global, Energia, Consumismo, Sustentabilidade, Agricultura Orgânica, Vegetarianismo. 2010 DISTRIBUIÇÃO GRATUITA 1

O USO DE ANIMAIS NA ALIMENTAÇÃO E O IMPACTO SOBRE O AMBIENTE Texto informativo distribuído gratuitamente entre participantes dos eventos sobre: Plantas Medicinais, Homeopatia, Agricultura Orgânica, Agroecologia, Trabalhos Comunitários, Família Agrícola, Educação Rural, Terapêuticas Tradicionais, Terapias Naturais e Qualidade de Vida, promovidos pela Universidade Federal de Viçosa. Texto distribuído a Escolas Rurais, Escolas Família Agrícola e a Voluntárias das Pastorais que acessam as pessoas de baixa renda. Programa de Extensão da Universidade Federal de Viçosa Divulgação das Plantas Medicinais, da Homeopatia e da Produção de Alimentos Orgânicos. Projetos Partilha de conhecimentos sobre plantas medicinais e terapêuticas tradicionais, Divulgação da produção e do consumo de alimentos orgânicos. APOIO: Projetos CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) nº. 551372/2007-9 e nº. 558358/2009-8. Projeto FAPEMIG (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais) nº. 6640-3.08/07. UNESCO/Fundação Banco do Brasil. Certificado de Tecnologia Social. PATROCÍNIO Fundação Arthur Bernardes / FUNARBE Convênio 1713. Pedidos (Distribuição Gratuita) Departamento de Fitotecnia / Vicente W. D. Casali Campus da Universidade Federal de Viçosa Viçosa-MG CEP: 36570-000 Tel: (31) 3899-1131 Fax: (31) 3899-2614 vwcasali@ufv.br Ao pedir, informar: nome e endereço completos, cidade, CEP, perfil (agricultor(a), terapeuta, estudante, professor(a), empresário(a), ou outra atividade). 2

Apresentação O conteúdo deste caderno de orientação tem como base o relatório da Food and Agriculture Organization, FAO, e informações diversas amplamente disponíveis na internet, com destaque a página www.svb.org.br O propósito é contribuir com a conscientização sobre o ambiente seguidamente deteriorado por nós, organismos humanos, dominados pela mídia. A degradação é entendida como sequência de erros e consequência das crendices modernas promovidas pelo consumismo. É hora de lembrar que biologicamente somos filhos de algo imenso e do Planeta Terra. Não somos filhos da tecnologia, nem do sistema hiperconsumista. Não temos compromisso com os projetos de consumo do sistema capitalista nem com a bolsa de valores. A natureza é capitalista sim, mas segue outro modelo e muito diferente do modelo dessa civilização. A natureza é mais inteligente, mais humana, mais evoluída que a bolsa de valores. 3

Introdução A humanidade está preocupada com as falas catástrofe ambiental, aquecimento global, perda de biodiversidade, mudanças climáticas e tantas outras. Antes, as falas eram urso panda, desperdício de água, reciclar latinhas de cerveja. As falas retratam a repetição (por décadas) dos hábitos de consumo coletivos e individuais. Todos predatórios e estimulados pela bolsa de valores do modelo capitalista e pelo hiperconsumismo. Entre esses hábitos perniciosos está o consumo indiscriminado de carne de qualquer animal. No total são 30 bilhões de aves, peixes e mamíferos (dezenas de espécies) que exercem perigosa pressão sobre todos os ecossistemas. Esses animais e cada um dos sete bilhões de animais humanos demandam sua porção de terra, água, alimento e energia (petróleo). Despejam seus dejetos sobre a terra e geram, direta e indiretamente, poluentes no solo, no ar e na água. Cada hambúrguer e salsicha provoca impactos e tem custo ambiental. Custo Ambiental dos Alimentos Você sabe quanto custa 1 quilo de carne (qualquer tipo)? O custo total não é apenas o valor do dinheiro que você gasta ao comprar. Há custos econômicos, culturais, sociais, estéticos, ambientais, morais. A produção de carne gera vários tipos de custos. Infelizmente esses custos são desconhecidos pelas pessoas. O custo ambiental da carne está entre os maiores problemas ambientais da Terra. 4

Cálculos e estudos estabeleceram a relação do consumo de carne com a saúde do planeta! por: No Brasil (em média) 1 quilo de carne bovina é responsável 10 mil metros quadrados de floresta desmatada. Consumo de 15 mil litros de água doce limpa. Emissão de dióxido de carbono e metano diretamente na atmosfera. Despejo de boro, fósforo, mercúrio, bromo, chumbo, arsênico, cloro, dentre outros elementos tóxicos, provenientes de fertilizantes e agrotóxicos que se infiltram no solo e atingem os lençóis freáticos. Descarte de efluentes como sangue, urina, gorduras, vísceras, fezes, ossos e outros. Alguns descartes chegam aos rios e oceanos depois de contaminarem o solo e aquíferos subterrâneos. Consumo de energia elétrica. Consumo de combustíveis fósseis. Despejos no ambiente: antibióticos, hormônios, analgésicos, bactericidas, herbicidas, inseticidas, fungicidas, vacinas e fármacos (via urina). Fezes, sangue e vísceras que inevitavelmente atingem os lençóis freáticos. Liberação de óxido nitroso 300 vezes mais prejudicial à atmosfera do que o CO 2. Pesados encargos dos cofres públicos com os tratamentos de saúde por causa da contaminação gerada pela pecuária. Gastos do poder público com infraestrutura e saneamento que diminuam os danos causados pela pecuária. Custo dos incentivos fiscais e subsídios concedidos pelos governos estaduais e federal à atividade pecuária. Tudo isso está relacionado a cada quilograma de carne, con- 5

sumido aos milhões nos churrascos e nas refeições diárias. É importante observar que a real contabilidade de produção de 1 kg de carne bovina não é estimativa alarmista. São constatações alarmantes de estudos científicos e dados oficiais. A criação de suínos, caprinos e ovelinos (ou de outros mamíferos de grande porte) gera dados semelhantes. A produção industrial de carnes está dentre as fontes mais impactantes e poluentes do ambiente. Exige áreas gigantescas, consome enorme volume de recursos naturais e energéticos, onera sensivelmente os cofres públicos, além de gerar bilhões de toneladas de resíduos tóxicos sólidos, líquidos e gasosos, que contaminam solo, água, ar, plantas, animais e pessoas. E alimentam moscas! A legislação brasileira é rigorosa em relação à poluição industrial. Porém, não há fiscalização no setor pecuário. A aplicação das leis ambientais tornaria praticamente inviável a atividade. Se o governo brasileiro retirasse incentivos / subsídios, cobrasse impostos integrais, obrigasse a pagar os custos energéticos / o uso de recursos naturais / os danos ambientais, cada quilo de alcatra custaria muito caro mesmo! O grande tsunami de 1960 atingiu a costa de Bangladesh. Apesar dos prejuízos materiais, não houve perdas humanas. No entanto, vários milhares de pessoas morreram quando outro tsunami similar arrasou a mesma área, em 1991. Por que a diferença? Após 1960 os imensos manguezais que davam proteção natural àquela região foram devastados pelas inúmeras fazendas industriais de carcinicultura (criação de camarões em cativeiro). O Solo No Brasil há enorme impacto ambiental da pecuária sobre o solo. A maior parte dos bovinos é criada pelo sistema extensivo. 6

Cada bovino precisa, no mínimo, de 1 hectare (10 mil metros quadrados) de pasto durante a engorda. Os rebanhos já contabilizam 200 milhões de cabeças e a pecuária ocupa mais de 250 milhões de hectares. Quase um terço do território nacional! Essa ocupação compromete nosso solo de várias maneiras. 1 a Florestas e cerrados são devastados e destinados a pastos ou grandes monoculturas de grãos (posteriormente viram ração). No Brasil, segundo o Instituto Centro de Socioeconomia e Planejamento Agrícola, CEPA, 1 boi precisa de 1 a 4 hectares de terra e produz (em média) 210 kg de carne, em 4 ou 5 anos. No mesmo tempo e na mesma quantidade de terra é produzido (em média): 8 ton de feijão 19 ton de arroz 22 ton de maçã 23 ton de trigo 32 ton de soja 34 ton de milho 35 ton de cenoura 44 ton de batata 56 ton de tomate É possível obter duas ou até três safras por ano desses vegetais combinados aumentando bastante essas produções. 2 a Quando as plantas nativas são eliminadas e os animais nativos que viviam naquele espaço saem por falta de alimento, a consequência é a perda da biodiversidade (redução de espécies). A remoção da cobertura vegetal causada pela formação de pastos também interrompe o equilíbrio do ciclo natural de nutrientes. Por baixo da exuberante floresta tropical, por exemplo, é comum a pequena camada de folhas, que é a reserva de nutrientes do solo. Sem a cobertura vegetal não há mais este recurso e o solo, normalmente pobre e arenoso, fica exposto à erosão e às intempéries. Na área sem cobertura vegetal e com pastoreio excessivo, a temperatura tende a aumentar 4 o C (em média). Cada vaca produz (em média) 40 kg de esterco (seco) por dia. Cada suíno produz 5 a 9 kg de fezes. O produtor não transforma es- 7

ses dejetos em adubo basicamente por falta de interesse comercial. O manejo adequado dos dejetos em grandes fazendas implicaria em armazenamento, tratamento, transporte e distribuição nos campos. O pecuarista não investe nesse sistema, pois aumentaria o trabalho e os custos operacionais sem trazer aumento proporcional da produção, e do lucro. Prefere usar fertilizantes químicos, menos volumosos e de aplicação mais simples. A agricultura orgânica brasileira, quando utiliza esterco, proíbe o estrume de animais criados à base de ração, hormônios, antibióticos e pesticidas em geral, que são contaminantes do solo. Portanto o esterco não está virando adubo utilizável nem na agricultura convencional. 3 a A destruição de florestas ou de cerrados possibilita pastos verdejantes por pouco tempo. Sem intervenções de adubo e de calcário, o pasto enfraquece e o produtor tende a abandonar a área. Em pouquíssimos casos, a cobertura é mantida. São iniciados os processos irreversíveis de desertificação. A testemunha é o deserto do Saara (norte da África) e o deserto da Patagônia (na América do Sul). Ambos são obra de intensa e secular atividade de pastoreio de cabras e ovelhas, respectivamente. 4 a O gado pisoteia e compacta o solo. Isso dificulta a absorção de água e facilita a ação superficial do vento e da água, resultando em erosão, inundações, deslizamentos e expansão das plantas invasoras. Segundo o Fundo Mundial para a Natureza, WWF-Brasil, cada quilo de carne produzido no cerrado brasileiro, causa a perda de 6 a 10 quilos de solo por erosão. 5 a A cada ano são produzidos, somente nos EUA, mais de 1,4 trilhão de quilos de excrementos animais. São 104 toneladas por segundo. Na maior parte dos casos, não são empregados na agricultura e não são direcionados a estações de tratamento. Estes excrementos prejudicam a água e o solo. Em Santa Catarina 5 milhões de suínos poluem as águas e o solo com emissão de dejetos e efluentes tóxicos equivalentes a 45 milhões de pessoas! Com a di- 8

ferença que o esgoto das pessoas geralmente é tratado. É absurdo o padrão de ocupação da terra baseado no sistema de produção industrial de carne. As pastagens já constituem um terço de todas as terras não-alagáveis do planeta, ocupando o espaço equivalente ao dobro de toda a área usada pelo homem no cultivo de alimentos. O Ar No relatório alarmante da FAO (2006) consta que os animais de consumo vivos têm maior responsabilidade pelas mudanças climáticas do que todos os veículos automotores do planeta somados! Do total da emissão de todos os gases causadores do aquecimento global 18% são gerados pelas indústrias da carne. Esse total inclui além das emissões de metano provocadas pelo sistema digestório dos animais, as emissões de CO 2 geradas pelas queimadas que precedem a formação de pastos. O relatório da FAO ressalta também que, no processamento de alimentos vegetais, todos os procedimentos que vão do plantio ao consumo são sensivelmente mais econômicos do ponto de vista da emissão de poluentes. De acordo com o relatório da FAO está claro, que a criação maciça dos animais destinados ao consumo humano é o centro de quase todas as catástrofes ambientais: destruição de florestas, desertificação, escassez de água doce, poluição do ar e da água, chuva ácida e erosão do solo. Os dois bilhões de bovinos do planeta emitem (pela volatilização dos seus arrotos e gases intestinais) 12% do metano lançado na atmosfera. O metano (segundo degradante da camada de ozônio) permanece na atmosfera menos tempo do que o CO 2 (primeiro degradante). Mas é 20 vezes mais potente como gerador de efeito es- 9

tufa e causador do aquecimento global. Os dejetos dos suínos também são responsáveis por grandes emissões de metano e de compostos perigosos na biosfera. Na Amazônia brasileira, as queimadas geram mais de 300 toneladas anuais de CO 2, ou seja, praticamente dois terços do total de emissões do Brasil. A Água O negócio foi diversificado e atualmente é o hidro-negócio, negócio da água. A água é apenas meio, pois o negócio mesmo é o lucro. Lucra-se com o uso da água na indústria, no saneamento público e ambiental, com engarrafamento da água mineral e, sobretudo, com o uso intensivo na irrigação e na pecuária. O lucro é o objeto fim, o ser humano é apenas meio. O Brasil é a maior potência mundial em volume de água. De todo o estoque global, 12% está nos rios e reservatórios subterrâneos brasileiros. Cerca de 70% dessa preciosidade é usada na agricultura (em especial a irrigação)! Mais da metade de tudo que é cultivado no Brasil destina-se à produção industrial de ração animal, consumida aqui e no exterior. Ou seja, vira alimento de bois/vacas, suínos, aves e até peixes, que depois estarão nas refeições das pessoas. O pior é que ninguém paga pelo consumo dessa água toda, nem pela poluição que os efluentes da produção de carne (sangue, gorduras, vísceras e fezes, somados aos hormônios, antibióticos, fertilizantes e agrotóxicos) causam aos reservatórios e aquíferos. Evitar o desperdício é simples. Basta executar alguns procedimentos. Fechar a torneira ao escovar os dentes ou fazer a barba, não lavar a calçada, consertar vazamentos em casa e menor tempo no banho. Como consumidores conscientes podemos ir muito além. O vegetarianismo é a forma mais eficiente de economizar água. Ar- 10

gumentos concretos e comprovados estão disponíveis. Animais de consumo humano e produção de alimentos Dentre todas as atividades, a criação maciça dos animais destinados ao consumo humano faz o uso mais ineficiente dos recursos hídricos. Exemplo: a carcinicultura (criação de camarões em cativeiro) consome comparativamente mais água doce que a irrigação da agricultura. São 50 a 60 mil litros d água por quilo de camarão produzido. A construção dos viveiros, principalmente no litoral nordestino, degrada nascentes e compromete os manguezais. Além disso, provoca alterações da fauna e flora, piora a qualidade da água potável, polui as águas costeiras com toneladas de excrementos e ainda expulsa os pescadores tradicionais dos mangues. É quase toda voltada à exportação. Beneficia apenas a elite empresarial, que obtém seus lucros em detrimento das comunidades tradicionais e da saúde do bioma litorâneo. O Relatório UNESCO do Fórum Mundial da Água em 2004, revelou o quanto é usado (em média por animal) e apenas nos bebedouros: Galinha = 0,1 litro/dia Suíno = 15 litros/dia Boi = 35 litros/dia Vaca leiteira = 40 litros/dia Considerando a água necessária na limpeza, o consumo de 1 vaca leiteira, por exemplo, sobe de 40 litros até 90 litros por dia. O chocante é que o favelado dos países pobres tem acesso (em média) a apenas 20 litros de água por dia. Irrigação das áreas de produção vegetal Aproximadamente 70% da água doce do planeta se destina à agricultura e mais da metade da produção agrícola mundial é destinada a alimentação de animais (em especial dos rebanhos norte- 11

americanos e europeus). Portanto a conclusão é que o precioso líquido vira ração. Pense: água vira ração. Em nome do lucro! No Brasil, a soja tomou conta dos cerrados, do centro-oeste e agora chegou no norte, em busca de água: Tocantins, Mato Grosso, Rondônia, Pará. Exportar grãos ou carne significa exportar água, sem custos. Produzir grãos e carne em outros países significa poupar água no próprio país. No Brasil, a pecuária utiliza e contamina via cadeia produtiva, mais água do que as cidades. São gastos 500 litros de água ao se obter 1 kg de soja. Produzir 1 kg de carne bovina gasta até 15 mil litros de água. Nesse cálculo está a água que os animais bebem durante a vida toda, a água utilizada na irrigação dos pastos e a água que é gasta ao processar as carcaças nos abatedouros. Dejetos dos animais destinados à alimentação humana Os dejetos produzidos pelos animais de consumo são quase sempre lançados, sem tratamento, na terra e na água. Isso causa a proliferação de algas e microorganismos que passam a competir pelo oxigênio da água com os peixes e outros organismos aquáticos. Há hipercontaminação por coliformes fecais, vetores de doenças (como salmonela e hepatite), hormônios e antibióticos. Tudo isso infiltra-se nas águas da superfície e do subsolo, poluindo lençóis freáticos, contaminando rios e mares e comprometendo a vida aquática e humana. Dejetos alimentam moscas. Qualquer fazenda com 5 mil bovinos produz a mesma quantidade de excrementos da cidade com 50 mil habitantes. A vaca produz aproximadamente 40 kg de esterco por dia. O suíno, entre 5 e 9 kg de urina e fezes, diariamente. Em alguns municípios de Santa Catarina a suinocultura é responsável por mais de 65% da emissão de poluentes. E o poder poluente dos dejetos suínos é 50 vezes maior que do esgoto huma- 12

no. Em algumas regiões do sul do Brasil, a contaminação das fontes naturais de abastecimento de água por coliformes fecais é 85%. Processo de abate dos animais A produção animal também consome água em abundância nas lavagens durante os procedimentos de abate: sangria, escaldagem, depenagem, depilação, evisceração, etc. Os abatedouros paulistas utilizam, em média, 12 litros de água ao processar a carcaça de 1 frango e 2.500 litros ao processar 1 bovino (dados do CETESB). Enquanto isso, a SABESP afirma que o consumo de 120 litros por habitante atende todas as necessidades diárias. Litros de água usados ao produzir 1 kg de alimentos (dados da Califórnia/EUA) Tomate 39 Trigo 42 Batata 48 Feijão 195 Leite 222 Ovos 932 Frango 1.397 Porco 2.794 Boi 8.931 Quantidade de água na Terra Mais de 2 bilhões de pessoas enfrentam escassez de água. Em 2025 serão 4 bilhões, segundo relatório da ONU de 2002. Parece incoerência falar de escassez no planeta que tem mais de 70% da sua superfície coberta de água. Mas pouco desse total é potável. 13

nos) 97,5% da água na Terra é salgada (está nos mares e ocea- 2,493% é água doce nas geleiras ou regiões subterrâneas inacessíveis 0,007% é água doce, disponível na superfície e na atmosfera No planeta Terra, cerca de 70% da água doce captada em rios, lagos e depósitos subterrâneos são destinados à atividade agropecuária. Os 30% restantes são utilizados nas demais atividades humanas, como consumo doméstico, atividade industrial, geração de energia, etc. A Energia A produção de carne consome 10 a 20 vezes mais energia por tonelada processada do que a produção de vegetais. O incremento das colheitas de grãos requer uso intensivo de energia: arar, ceifar, colher, bombear água, transportar, produzir e aplicar fertilizantes/agrotóxicos. Há o gasto de energia no descascar, triturar, moer, reduzir a umidade e torrar os grãos. Finalmente, energia também é usada ao transformar os grãos em ração. Depois no transporte da ração até as fazendas. A criação de aves e suínos em imensos galpões requer muita energia no controle da temperatura e na iluminação artificial. Abatedouros também usam imensa quantidade de energia ao bombear água, alimentar máquinas e processar carcaças. O transporte de animais das fazendas aos abatedouros/frigoríficos, demanda milhões de litros de petróleo. A pesca industrial utiliza energia no construir, transportar e manter frotas de imensas embarcações pesqueiras. Cada barco usa combustível ao movimentar e ao manter milhares de toneladas de 14

peixes congelados (por semanas e meses). Produtos à base de carne gastam mais energia em processamento, embalagem, conservação, transporte e refrigeração do que produtos vegetais. Em comparação, muitas hortaliças, frutas, tubérculos, rizomas e grãos demandam pouco ou nenhum processamento/refrigeração, gastando pouca energia em sua cadeia produtiva. Os principais e impactantes gastos de energia são: a) A energia, quase sempre à base de queima de combustíveis fósseis, usada na fabricação de insumos agrícolas; b) A energia gasta na produção de ração e no bombeamento de água; c) A energia que vai nos procedimentos de abate e processamento das carcaças; d) O combustível usado no transporte de animais vivos e de produtos processados de carne; e) O combustível usado nos tratores e máquinas agrícolas; f) A energia usada nos navios pesqueiros ao manterem os estoques congelados por várias semanas em alto mar; g) A energia de manutenção dos estoques refrigerados nos pontos de venda; h) A energia gasta nos lares que mantém as carnes refrigeradas até o momento do consumo. A Pesca A pesca de camarão é a atividade pesqueira mais predatória que o ser humano já inventou. O camarão rende apenas 2% do montante global pescado anualmente, mas responde por 35% do 15

desperdício total. Esta e outras modalidades de pesca industrial são responsáveis pelo grande descarte, hoje avaliado em 27 milhões de toneladas anuais, de peixes e outros organismos marinhos pegos na rede de malha fina. Devastação dos oceanos Durante séculos, o ser humano pescou toneladas anuais de peixes e outros frutos do mar. Mas os cardumes iam se recompondo naturalmente. Desde a década de 1950 a pesca comercial foi incrementada tecnologicamente e está devastando os oceanos. Nesse ritmo, em menos de quatro décadas haverá colapso. A atividade humana predatória nos oceanos provoca danos que afetam todas as pessoas. Só têm lucro os privilegiados do comércio pesqueiro. 1 Os principais mercados consumidores de pescado estão no Japão e Estados Unidos. No Japão, o peixe atum-azul vale, por unidade, mais de 100 mil reais! Estão sendo comercializados de tal modo que serão extintos rapidamente. 2 Algumas espécies marinhas têm sido exploradas exaustivamente por causa das inovações tecnológicas. São peixes que habitam oceanos profundos, pouco conhecidos e correm risco de extinção. 3 As criações de peixes que mais devastam o ambiente marinho e os biomas litorâneos são: salmão e camarão. Produzir 1 kg de salmão demanda 6,2 kg de pescado ao alimentar esses peixes caros. As fazendas pesqueiras processam milhares de toneladas diárias de peixes de pouco valor comercial, como a sardinha visando o salmão. Enquanto isso, as populações de sardinha vêm declinando com velocidade assustadora. Mais de um terço das capturas pesqueiras atuais é transformado em comida/ração de animais de cativeiro. Nesse ritmo não haverá mais sardinha nos oceanos. Não ha- 16

verá mais atum, nem garoupa, tainha, anchova e outros peixes graúdos dos mares, que dependem dos menores na cadeia alimentar. Além das sardinhas, a pesca industrial predatória elimina toda a fauna marinha Os peixes estão acabando. A população de 90% dos grandes peixes declinou acentuadamente nos últimos 20 anos. A atividade pesqueira atual precisa ser reduzida em pelo menos 60%. O que pode ser feito por pessoas comuns, além de não comer peixe? Pressionar os governos, promover educação alimentar e ambiental. Produção de peixes em cativeiro As fazendas aquáticas (aquicultura) tornaram-se populares com o declínio dos pescados de valor comercial. A enorme população de peixes e camarões em pequeno espaço requer o uso de grande quantidade de bactericidas e fungicidas. Além de, obviamente, prejudicar a qualidade da carne que será consumida por seres humanos, todos esses produtos químicos agravam a situação. Animais aquáticos em cativeiro lançam milhões de toneladas de excrementos anualmente nos oceanos. O resultado é a poluição das águas adjacentes, degradação dos ecossistemas costeiros e disseminação de doenças entre espécies marinhas e terrestres, incluindo o homem. Outro grave problema, segundo a Federação do Salmão-do-Atlântico, é que milhares de peixes fogem dos tanques e se juntam aos cardumes nativos. Além de contaminá-los com doenças de cativeiro, o cruzamento desses peixes é desastroso, pois dá origem a gerações inaptas à sobrevivência e a procriarem no ambiente natural, agravando o declínio de populações inteiras. As fugas também propiciam o cruzamento de variedades exóticas com nativas e colocam em perigo o delicado equilíbrio genético marinho. Por fim, essas fazendas sendo construídas no litoral, já eliminaram metade dos manguezais da Terra. Pelo menos um terço dos manguezais brasileiros foram destruídos. Incrivelmente, a taxa de 17

destruição dos mangues já é maior do que das florestas tropicais. O mangue, ecossistema frágil, é muito importante em termos de biodiversidade e segurança contra inundações e tempestades. A falta da barreira natural feita pelos mangues em grande parte do sudeste asiático e da Indonésia está entre as principais causas das mortes e prejuízos do tsunami de 2004. Tecnologia cruel e destruidora Recifes de corais magníficos que cresceram durante milênios são dinamitados em segundos. Os atuns-azuis, peixes imensos e velozes, capazes de nadar milhares de quilômetros em suas migrações anuais, são facilmente localizados com o uso de helicópteros e aviões equipados com moderna tecnologia. Cardumes de sardinhas com milhões de peixes não têm como escapar da localização superavançada por satélites de rastreamento e barcos equipados com emissores de ultrassom, que os capturam em poucos minutos. Tecnologia de ponta e barcos ultramodernos sequestram em massa a vida oceânica visando o prato de consumidores vorazes que não estão conscientizados. Os métodos de pesca comercial são brutais apesar de proibidos. Ainda usam dinamite no mar e depois colhem os milhares de peixes que flutuam mortos. Com isso também são sepultados extensos bancos de corais milenares e outros seres marinhos. Outra técnica, igualmente proibida e praticada clandestinamente, é pulverizar recifes de coral com cianeto de sódio. Os peixes que se abrigam nas fendas dos corais ficam atordoados com a falta de oxigênio e viram presas fáceis dos caçadores de espécies exóticas de aquários. Após atingidos pelo cianeto, os recifes morrem, levando consigo dezenas de espécies animais e vegetais. Outra técnica monstruosa foi proibida e criminalizada. A rede imensa, presa a pesados cilindros, que arrastam tudo entre 750 e 18

1.500 metros de profundidade. Foi proibida, mas já arrasou ecossistemas inteiros. No entanto, o arrastão tradicional, entre os quais se inclui a pesca de camarões, continua permitido e é largamente difundido, praticamente sem restrições. Agressão chocante A aquicultura (criação em cativeiro), com seu gigantesco impacto ecológico, chama a atenção, mas não é o único fator degradante dos ambientes marinhos. Há muito mais atrocidades escondidas. Na pesca de camarão, as redes lançadas capturam com alguns camarões: centenas de peixes, tartarugas, corais, tubarões e outras espécies. Mortos ou agonizantes são descartados no mar logo após a separação dos camarões que interessam. De cada quilo de camarão, sobram até 20 quilos de organismos mortos. Não queira ver essa cena, você vai chorar e entrar em depressão. Cerca de mil mamíferos marinhos são capturados e mortos todos os dias, por redes de arrastão: golfinhos, botos, toninhas, focas e até baleias. Calcula-se que, cada ano, até 150 mil tartarugas marinhas sejam vitimadas pelas mesmas armadilhas submarinas. É muito desastre provocado pelo lucro. Na Ásia, devido à fama das barbatanas como afrodisíacas, são mortos anualmente milhões de tubarões de diversas espécies, muitas quase extintas. Dentre os fatores que mais causam preocupação aos ambientalistas está a idade e o tamanho dos peixes vendidos no mercado. Ambos estão diminuindo drasticamente. O imediatismo inconsequente da atividade pesqueira industrial tem retirado do mar cada vez mais animais que não atingiram a maturidade sexual e, portanto, não tiveram chance de reproduzirem. A indústria pensa na próxima geração de peixes? 19

Os Biomas Brasileiros e a Indústria de Carne Dezenas de milhões de hectares da vegetação nativa brasileira são queimados anualmente. Ao contrário do que tem sido falado, madeireiras, rodovias e urbanização desordenada são secundárias nessa destruição. A pecuária bovina sempre foi a principal na história da ocupação do Brasil. A pecuária bovina é responsável pela quase extinção da Mata Atlântica e pela devastação do Cerrado. A meta é acabar com a Amazônia. Há duas décadas, a pecuária tem poderoso aliado nessa missão destrutiva: a monocultura da soja. A soja brasileira alimenta, nos países desenvolvidos, rebanhos de animais. A remoção acelerada da vegetação original transforma completamente o ambiente que fica impróprio à maioria das espécies nativas. Os raros animais nativos que conseguem se adaptar são mortos pelos criadores. Além disso, diversas doenças, como raiva, toxoplasmose e febre maculosa, transmitidas pelo gado, resultam quase sempre na eliminação dos animais nativos. A produção industrial de carne afeta todos os nossos biomas e a biodiversidade do planeta. Danos à Zona Costeira As restingas e os manguezais, são áreas de berçário, refúgio e alimentação da diversificada fauna marinha. Com vegetação única e adaptável a altos teores de salinidade, os mangues estão sendo arrasados pela criação de camarões. No Nordeste, no lugar desses ricos ecossistemas há centenas de tanques. É fato, está havendo diminuição da biodiversidade e prejuízos diretos na economia e na segurança alimentar de inúmeras comunidades tradicionais. Como o litoral brasileiro é recortado por incontáveis rios e lagunas, o impacto da produção industrial da carne também pode ser medido pela poluição, assoreamento e eutrofiza- 20

ção das fontes de água doce de toda a região costeira. Danos ao Cerrado Os cerrados eram consideradas áreas improdutivas do ponto de vista agrícola. Havia apenas pequenas lavouras e criações de animais. Com as novas tecnologias agrícolas, os cerrados foram tomados por grandes latifúndios de monocultura, atualmente responsáveis por 40% da produção nacional de grãos. Há milho, feijão e outros, mas predomina a soja (que vira ração do gado europeu e norte-americano). O cerrado responde por 41% da produção nacional de grãos. Mas 42% do rebanho bovino brasileiro pasta no cerrado. Desde a década de 70, o cerrado (segundo maior bioma do país), perdeu 50% de sua vegetação nativa comprometendo nascentes, rios e riachos. Se essa vegetação sumir, acabam os mananciais da região, a grande caixa d água brasileira. O rio São Francisco tem ali 80% da origem de suas águas. É no planalto central que são alimentadas várias bacias hidrográficas. Danos na Caatinga A pecuária não ameaça o bioma caatinga rico em biodiversidade, tanto vegetal quanto animal (sobretudo de insetos), simplesmente porque não é viável economicamente. No final do século 16 o gado do litoral foi levado ao interior visando não competir com a cana e o algodão plantado na zona costeira. A partir dessa época a tendência pela aridez da caatinga foi intensificada. A terra que era antes viável, hoje é quase deserto. Danos ao Pantanal Essa vasta planície de inundação, toda entrecortada por cursos d'água, sustenta a vida de inúmeras aves aquáticas, de espécies migratórias ou grandes répteis e mamíferos de todos os tipos. O pantanal ainda tem ricas reservas de vida selvagem. Entretanto, as queimadas, derrubadas de árvores e assoreamento dos rios ameaçam sua vida. O motivo é a fome da pecuária por novos pastos. O turismo, que parecia ser boa alternativa econômica à criação de gado, na realidade é perigoso. Tragicamente, pesca e caça esportivas já ultrapassam os limites de sustentabilidade daquele ecossistema. 21

Mata Atlântica Neste bioma vivem mais de 80% dos brasileiros. Da floresta original que cobria todo o litoral brasileiro, resta menos de 7%. O mais rico bioma brasileiro em biodiversidade foi destruído pela exploração de pau-brasil, cana-de-açúcar, café e pela abertura de pastos. É o exemplo mais contundente e visível do modelo de desenvolvimento predatório. Pampa São campos vastos, matas ciliares, matas de encosta, banhados e capões. Apesar de caracterizada por extensas planícies aparentemente homogêneas, a região dos pampas tem fauna e flora ricas. A infinidade de insetos alimenta enorme variedade de pássaros. O bioma ainda sofre as consequências do erro cometido nos anos 60, quando o governo estadual trouxe sementes de capim africano sem antes realizar testes. Difundidas entre os fazendeiros, parte dessas sementes escondiam o intruso capim annoni. Pesquisas posteriores mostraram o baixo valor do capim africano como alimento do gado e, em 1978, foi proibida a comercialização das sementes. Tarde demais pois o annoni atualmente é praga e infesta significativa parcela do pampa. Outra ameaça ao bioma é a expansão descontrolada da soja, que vem promovendo a transformação dos campos naturais em áreas de monocultura, com uso intensivo de agrotóxicos e emprego de cultivares transgênicos. Amazônia A Amazônia guarda a maior diversidade biológica do mundo e escoa 20% de toda água doce do planeta. Esse bioma está na mira implacável da pecuária. O estrago começou nos anos 70, quando o projeto desenvolvimentista do regime militar vendia a ideia de que a Amazônia era terra sem homens, de homens sem terra. Em menos de 40 anos, o rebanho amazônico passou de 1,5 milhão a 60 milhões de cabeças (um terço do rebanho brasileiro). Na Amazônia atualmente há 3 vezes mais bois do que pessoas. E 70% da carne produzida lá é consumida na rica região Sudeste. Churrasco de floresta amazônica : é isso o que as pessoas fazem quando comem o tal boi verde brasileiro. Além da perda de biodiversidade, da interferência danosa no ciclo das águas e da 22

ameaça à vida das frágeis populações locais, o desmatamento de 3 milhões de hectares de floresta por ano joga 300 milhões de toneladas de carbono na atmosfera, ou dois terços das emissões totais no país. Assim, o Brasil fica entre os cinco maiores poluidores e causadores do aquecimento global! Impactos Ambientais e Sociais A prioridade que o Brasil concede ao agronegócio é muito inoportuna, precipitada e discutível. A insustentabilidade desse modelo destrói nossos biomas e conflita com projeto de erradicação da fome dos brasileiros. O agronegócio é primordialmente voltado à exportação. A soja que devasta o Cerrado e invade a Amazônia não gera alimento de pessoas. É exportada e transformada em ração de bois/vacas, frangos, suínos e peixes criados em cativeiro. Enquanto isso, fome e desnutrição assolam quase metade da população mundial. O agronegócio de alta tecnologia voltado à exportação, com suas técnicas avançadas de cultivo, é opção produtiva absolutamente cruel em países com taxas altíssimas de desemprego. Na Amazônia, a grande fazenda padrão emprega diretamente 1 funcionário por 700 cabeças de gado, em 1.000 hectares. Comparado aos 100 empregados de cooperativas de agricultura familiar ou 250 trabalhadores em agro-floresta com regime de permacultura (operando em área equivalente). Este é o custo social da carne. Basta verificar o índice de desenvolvimento humano da ilha de Marajó, por exemplo, e constatar que a pecuária intensiva é fonte de renda apenas do fazendeiro. Em Marajó o lavrador foi marginalizado, expulso da terra, deu lugar aos bois e às máquinas. Quem lucra são coronéis do gado. O mesmo acontece em todas as regiões tomadas pela pecuá- 23

ria. A terra fica, invariavelmente com poucos latifundiários e a mínima mão-de-obra. A atividade ainda recebe constantes subsídios governamentais canalizados por lobistas da bancada pecuarista. Os desempregados vão morar nas periferias das cidades. O efeito negativo socioambiental da produção de carne vai mais além quando contabilizamos a degradação dos abatedouros. Comunidades inteiras têm ocupação aviltante e desumana. Boiadeiros, açougueiros, tratadores e muitas outras categorias estão envolvidos na deplorável indústria da carne. São pessoas desmoralizadas, barbarizadas. Pela pressão econômica perdem o humanismo e a sensibilidade. Pobres animais, pobres humanos! O Brasil continua no colonialismo ambiental e faz avançar as lucrativas fronteiras agrícolas. Populações indígenas continuam sendo brutalmente expulsas de suas terras. Comunidades ribeirinhas assistem impotentes à degradação dos rios, seu meio de subsistência. A atividade pecuária é a campeã brasileira da escravidão, pois mantém pelo menos 62% da mão-de-obra escrava do Brasil. Impacto da Fome Metade da agricultura do planeta é voltada à produção de ração dos animais. A carne dos animais abatidos é acessível a menos de 15% dos seres humanos. O consumo mundial de carne está restrito a poucos países. Destacam-se: Estados Unidos, União Europeia, China e Brasil com cerca de 60% da carne bovina, mais de 70% da carne de frango e mais de 80% da carne de suíno. Há países com alto percentual de consumo, porém com baixa população. A maior parte da população global, pratica o semivegetarianismo compulsório. Os lobistas da carne afirmam que o aumento na produção pecuária poderia tornar a carne acessível a todos. Mas não confessam que alimentar 6,5 bilhões de carnívoros, demanda mais 24

dois planetas como a Terra só com pastagens e produção de grãos/ração. Os lobistas enlouqueceram. O lucro causa loucura. Pergunta: se o consumo de carne fosse repentinamente abolido, grãos e hortaliças, antes destinadas aos animais, seriam repassadas às pessoas, solucionando o problema da fome mundial? As causas do problema da fome são muitas e o vegetarianismo não pode (nem pretende) assegurar que os alimentos chegarão a quem tem fome, porque isso esbarra em questões políticas e econômicas de conveniência do sistema de distribuição de recursos em relação aos interesses de grandes empresas, oligarquias seculares e aspirações imperialistas de alguns governos, etc. O vegetarianismo tem sua contribuição a dar pela produtividade. Qualquer projeto de combate à fome e de implementação de sistemas produtivos sustentáveis, em que o uso da terra seja otimizado de forma a satisfazer as necessidades do maior número possível de pessoas, deverá, obrigatoriamente, considerar o vegetarianismo. O Vegetarianismo A maior parte dos grãos cultivados no mundo é utilizada na alimentação de animais de criação. Mesmo que depois estes animais alimentassem todas as pessoas não se justificaria tanto desperdício. É preciso 11 a 17 calorias de proteínas de grãos ao produzir 1 caloria de proteína de carne bovina. A carne de peixe, frango ou suína não oferece grande variação nestes valores. A dieta vegetariana elimina intermediários da cadeia alimentar. Então os grãos são usados com maior eficiência quando consumidos diretamente por seres humanos! O volume do desperdício é entendido pelo exemplo. O gato 25

de estimação norte-americano consome mais grãos por dia, indiretamente, comparado ao ser humano da Ásia, da África ou da América Latina. A fração irrisória, 0,3% das 465 milhões de toneladas de grãos utilizados na alimentação de animais salvaria da desnutrição os seis milhões de crianças menores de cinco anos que morrem todos os anos. Apenas 2,5% erradicaria a fome no Brasil. Com 50%, acabamos com a fome no planeta. A Sustentabilidade e Novos Paradigmas A natureza é vista como grande fábrica. Acontece que as engrenagens estão quebrando e não há reposição. Nosso modelo de civilização avançou tremendamente no mundo virtual, mas não modificou os fundamentos energéticos do avanço industrial. Evoluímos no plano técnico e quase nada no plano ético. Basta ver todas as consequências do uso dos combustíveis fósseis. Poluímos a água, o solo e o ar. Comprometemos a biodiversidade. Acumulamos lixo, devastamos florestas e mares. Seguimos o padrão de uso da terra inventado no período neolítico. A viabilidade é questionável há 500 anos, quando ainda éramos cerca de meio bilhão de pessoas vivendo no planeta. A população cresceu 13 vezes e o sistema continua o mesmo. Usamos o solo até a exaustão, abandonamos a terra arrasada e iniciamos a exploração de novo espaço. Se continuarmos engessados pelo capitalismo o planeta vai entrar em colapso de forma irreversível em duas ou três décadas. A sociedade humana já percebeu a dimensão do problema. É hora de repensar! O padrão de consumo que o capitalismo impõe é insustentável. É hora de rever nossa relação com os demais seres vivos e com o planeta. ( Eu queria que fôssemos civilizados como os animais Roberto Carlos / cantor e compositor). 26

O Que Você Pode Fazer Você pode tomar decisões! Adotar atitudes. Agir como indivíduo, local e globalmente. No plano pessoal Mudar os padrões de consumo. A dieta carnívora, sobretudo em larga escala, é comprovadamente insustentável. Ao eliminar o consumo de carne você diminui, ao mesmo tempo, o desperdício de água, de proteínas vegetais, o desmatamento, a desertificação, a extinção de espécies, a destruição de habitats e até de biomas inteiros. Ajuda a diminuir o rebanho bovino, a emissão de metano e o efeito estufa. O gesto individual não tem resultado mensurável, mas quando é postura cada vez mais coletiva, influi objetivamente nas condições do planeta. No plano local Participar de eventos e movimentos coletivos, marcando presença em manifestações públicas e abaixo-assinados, denunciando agressões ambientais, etc. Assim seremos aquela voz a mais. Converse com sua turma. Fale muito desse impacto onde você estiver. No plano global Colaborar com entidades ambientalistas e de organizações que promovem o vegetarianismo. Eleger representantes idealistas quanto a conservação de ecossistemas e proteção das reservas ambientais. O produtor de carne não paga a água que usa, nem se responsabiliza pelos abundantes efluentes (água contendo restos químicos e orgânicos) que gera. No preço da carne não estão contabilizados estes custos, nem os danos ambientais causados pela criação de animais. A indústria da carne vai parar de crescer, quando não for bom negócio! Os custos ambientais devem ser contabilizados. O consumidor deve exercer poder sobre o mercado. Vamos identificar as atitudes e ações que possam minimizar impactos insustentáveis e negativos sobre o meio ambiente em que vivemos que desejaríamos oferecer às futuras gerações. 27

Conclusão Esse caderno não pretende insinuar que o consumo de carne seja o único ou o principal responsável pelas dificuldades ambientais que a espécie humana tem causado ao planeta. Mas está entre os principais. É escolha de cada pessoa. Talvez você não possa morar fora da grande metrópole. Nem possa gastar mais ao consumir alimentos vegetais orgânicos. Nem tenha alternativa de chegar ao trabalho em transporte coletivo. Mas a decisão de incluir carne em seu cardápio diário está ao seu alcance e, em última instância, só depende de você. Você pode começar diminuindo, e gradativamente se libertará. 28