DESENHO INDUSTRIAL: POSSIBILIDADE DE DUPLA PROTEÇÃO 1



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Transcrição:

1 DESENHO INDUSTRIAL: POSSIBILIDADE DE DUPLA PROTEÇÃO 1 Laura Wolff Pletsch 2 Resumo: No mundo moderno, em que o consumidor cada vez mais leva em consideração o design aplicado aos produtos, quando da sua escolha, torna-se complexa a atividade das empresas que atuam no campo da tecnologia. Tal complexidade esta relacionada ao direito de propriedade industrial, uma vez que, no mundo globalizado, os desenhos industriais são fatores determinantes ao sucesso de uma empresa. No Brasil, a Lei 9.279/96 tratou de regular a proteção dos desenhos industriais. Embora haja previsão legal, esta se limita a completar o quadro das criações no campo da indústria, sem entrar no mérito artístico nem técnico do produto, caso em que, seria necessária a proteção da Lei do Direito do Autor, Lei 9.610/98. Assim, surge a polêmica: se é possível, em certos aspectos, a cumulação da proteção dos desenhos industriais com a do direito do autor sobre a inserção estética que lhe dá origem. Há quem defenda que não há possibilidade de dupla proteção sobre o objeto, por não haver expressa previsão legal. Há quem defenda que há o direito à dupla proteção, uma vez que o rol previsto na Lei de Propriedade Industrial é meramente exemplificativo, não existindo nenhum dispositivo que impeça tal cumulação. Palavras-chave: Desenho Industrial. Dupla Proteção. Direito do Autor. Propriedade Industrial. Sumário: 1. Introdução. 2. Um breve referencial histórico do surgimento dos desenhos industriais. 3. Desenho Industrial. 3.1 Conceito. 3.2 Requisitos para Registrabilidade. 3.3 Desenhos Excluídos da Proteção Legal. 3.4 Formalidades para Registro. 3.5 Nulidade do Registro. 3.6 Extinção do Registro. 4. A Dupla 1 Artigo extraído do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, aprovado, com grau máximo pela banca examinadora composta pela orientadora Professora. Dra. Helenara Braga Avancini,Me. Álvaro Vinícius Paranhos Severo e Prof. Plínio Saraiva Melgaré, em 09 de junho de 2009. 2 Acadêmica do Curso de Ciências Jurídicas e Sociais Faculdade de Direito PUCRS. Contato: laurawpletsch@gmail.com

2 Proteção e seus Desdobramentos. 4.1 Inter-relação com Outras Áreas. 4.1.1 Desenho Industrial x Patente (Modelo de Utilidade). 4.1.2 Desenho Industrial x Marcas (Figurativas e Tridimensionais). 5. Casos no Brasil e no Exterior. 6. Conclusão. Referências. 1 INTRODUÇÃO É comum associar a preferência dos consumidores à qualidade, à eficiência ou ao custo dos produtos oferecidos, passando desapercebido o design, que é um importante fator de diferenciação. Cada vez mais, o consumidor, quando faz sua escolha, leva em consideração o design dos produtos. Assim, um produto ou uma embalagem visualmente diferenciados e atrativos podem trazer uma vantagem competitiva significativa sobre os concorrentes. Da mesma maneira que produtos tecnologicamente inovadores ou com novas funcionalidades podem vir a ser objeto de proteção por patente, esta diferenciação ou inovação no design do produto ou da embalagem pode também ser protegida por meio de um registro de desenho industrial. O registro industrial protege a forma ornamental plástica de um produto, seja ele um objeto tridimensional, seja um conjunto de linhas e cores bidimensional. Para que esse ornamento possa ser protegido, é necessário que ele apresente um resultado visual novo e original, de maneira que o produto ornamentado possa ser fabricado em escala industrial e não seja apenas uma mera obra de arte. No entanto, disso decorre uma grande dúvida: a proteção conferida pela patente de desenho industrial pode ser cumulativa com a do direito do autor sobre a inserção estética que lhe dá origem? Para responder a essa pergunta, deve-se ter em mente que o desenho industrial nada mais é do que a junção da técnica com a estética, ou seja, uma obra de arte aplicada, a qual pode servir de tipo de fabricação industrial. A dicotomia entre os direitos da Propriedade Industrial e os Direitos do Autor traz aos juristas a incerteza no enquadramento de certas obras, levando o aplicador a pecar por excesso, ampliando a proteção das obras, de modo a criar restrições ao avanço tecnológico, ou a pecar por escassez, negando ao autor o legítimo direito de sua criação.

3 Essa matéria não está pacificada e o entendimento sobre ela varia, seja no campo legislativo, seja na orientação jurisprudencial, fazendo surgir posicionamentos extremistas, como o dos franceses que, ao defender a teoria da unidade da arte, outorga um direito de autor a toda e qualquer criação de forma. No Brasil, há grande necessidade de se firmar um posicionamento a respeito da proteção ao desenho industrial, visando-se à proteção do autor desse tipo de obra, pois a incerteza produz os mais díspares posicionamentos frente aos avanços tecnológicos. Portanto, o objetivo do presente trabalho é analisar as condições em que o direito autoral poderá ser chamado em garantia aos desenhos industriais. Para julgar se a proteção deve incidir unicamente no campo da indústria ou, se cumulativamente, deve merecer a guarida mais ampla do direito do autor, partindo do pressuposto que a obra é nova e original. 2 UM BREVE REFERENCIAL HISTÓRICO DO SURGIMENTO DOS DESENHOS INDUSTRIAIS Desde os primórdios da humanidade, sempre existiu a tendência ao embelezamento dos objetos de utilidade prática, especialmente na fabricação das armas e utensílios, obviamente, que de modo rudimentar. Estudos comprovam que os povos primitivos tentavam embelezar os objetos de uso prático, por meio do acabamento, ou por meio de ornamentação acessória. 3 Foi assim que começaram a surgir os desenhos industriais. O objeto, além de realizar sua finalidade, deve também, agradar. Conforme afirma João da Gama Cerqueira: É o mesmo princípio que domina as indústrias artísticas e a arte decorativa, cujo fim essencial é produzir objetos que agradem à vista. 4 Sabe-se que os povos da antiguidade criavam objetos de luxos e não, simplesmente, adornavam os objetos de uso prático. Mas foi na Renascença que as artes atingiram o apogeu, passando por inúmeras transformações, de acordo com as necessidades de cada época e do cotidiano, até atingirem o seu 3 CERQUEIRA, João da Gama. Tratado da propriedade industrial. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1982. v. 1. p. 637. 4 Ibid., p. 637.

4 estado atual, ou seja, a criação artística nos domínios da indústria, com a finalidade de agradar o gosto do consumidor. 5 De fato, foi somente com o surgimento da indústria que se estabeleceu a diferença entre as obras de arte e os produtos de arte industrial, entre eles os desenhos industriais. Até então, o artesão criava os objetos úteis e ao mesmo tempo os reproduzia, por não haver uma indústria propriamente dita. 6 Com o surgimento da indústria, as funções de criação, produção e venda, que até então estavam reunidas no modo de fabricação artesanal ou pré-industrial, se diferenciaram e estabeleceram. 7 Assim, o objeto chamado hoje de desenho industrial não surgiu bruscamente, mas sim progressivamente, a partir da revolução industrial. 8 No século XX, o desenho industrial passou a ser considerado um bem econômico, de natureza patrimonial, sendo admitido nos ordenamentos jurídicos voltados à propriedade industrial. 9 A primeira proteção dos desenhos industriais data da época da Revolução Francesa e visava a proteger os direitos dos autores de criações artísticas e industriais que se encontravam ameaçados pelo regime da liberdade do comércio, da indústria e pelo incentivo à livre concorrência. Surgiu, assim, a necessidade de substituir os antigos regulamentos corporativos por leis especiais. 10 Em 1806, na França, foi implantada uma norma para as indústrias de tecido de Lyon, que mais tarde foi estendida para outras localidades e também para as industrias. O dito regulamento visava a proteger e a conservar os desenhos industriais. 11 Com as transformações que ocorreram ao longo do tempo e com a expansão das indústrias, as leis de proteção aos desenhos industriais passaram a defender, pouco a pouco, o direito do autor contra a usurpação e contrafação de suas criações. As mudanças ocorridas, ao longo da história 5 CERQUEIRA, 1982 p. 638. 6 Ibid., p. 638. 7 SCHULMANN, Denis. O desenho industrial. São Paulo: Papirus, 1994. p. 13. 8 Ibid., p. 13 9 BARROS, Carla Eugenia Caldas. Manual de Direito da Propriedade Intelectual. Aracaju: Evocati, 2007. p. 393. 10 CERQUEIRA, 1982, p. 639. 11 Ibid., p. 639-40.

5 determinaram o progresso da legislação especial dos desenhos industriais. 12 No Brasil, até 1934, os desenhos industriais não gozavam de proteção, exceto quando apresentavam caráter acentuadamente artístico, sendo então protegidos pelo Código Civil da época. 13 Foi somente a partir de 1934 que surgiram leis regulamentando os desenhos industriais. 14 Atualmente, os legisladores de todas as partes do mundo preocupamse com a proteção dos desenhos industriais devido à crescente eliminação de barreiras aduaneiras, que liberam diariamente um grande volume de mercadorias. 15 Com o advento da atual Lei de Propriedade Industrial (Lei 9.279/1996), a proteção aos desenhos industriais, amparados até então pelo registro da patente, passou a ser considerada uma categoria própria, com um registro especial, visando a acelerar o processo. 16 3 DESENHO INDUSTRIAL 3.1 CONCEITO O conceito de desenho industrial deve ser entendido como um determinado objeto ou coisa que tenha uma finalidade útil e não apenas, como define a Lei de Propriedade Industrial, que sirva como um adorno, enfeite ou ordenamento, devendo a forma seguir a função. 17 No entanto, é importante ressaltar que o registro de desenho industrial protege a configuração externa do objeto e não o funcionamento do mesmo. 18 Segundo o conceito clássico, o desenho industrial ou design, 19 como é 12 CERQUEIRA, 1982, p. 640-1. 13 Decreto 24.507, de 29-6-1034, que aprova o regulamento para a concessão de patente de desenho industrial, para o registro do nome comercial e do título de estabelecimento e para a repressão da concorrência desleal. 14 CERQUEIRA, 1982, p. 641. 15 BARROS, 2007, p. 393. 16 GARCIA, Germana Fonseca Crespo. Desenho industrial e indicações geográficas na ótica da lei de propriedade industrial brasileira. Disponível em: <http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs2/index.php/ dint/article/viewfile/6859/6636>. Acesso em: 28 fev. 2009. 17 INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL (INPI). O que é desenho industrial. Disponível em: <http://www.inpi.gov.br/menu-esquerdo/desenho/pasta_oquee>. Acesso em: 31 mar. 2009. 18 FARIA, Adriana Xavier de. O desenho industrial e os direitos de propriedade intelectual. Revista da ABPI, n. 87, p. 11-26, mar./abr. 2007. 19 DI BLASI JUNIOR, Clésio Gabriel; GARCIA, Mario Augusto Soerensen; MENDES, Paulo

6 conhecido internacionalmente, é um bem imaterial que expressa a criatividade do homem e que se exterioriza pela forma, ou pela disposição de linhas e cores, de um objeto suscetível à utilização industrial. 20 Outrossim, de acordo com Código de Propriedade Industrial em seu artigo 95, o desenho industrial nada mais é do que a forma plástica ornamental de um objeto ou conjunto ornamental de linhas e cores que possa ser aplicado a um produto, proporcionando resultado visual novo e original na sua configuração externa e que possa servir de tipo de fabricação industrial. 21 O desenho industrial não pode ser confundido com nenhum outro, devendo trazer uma configuração nova e específica do produto, mesmo que suas partes já sejam conhecidas. 22 Carla Eugenia Calda Barros afirma que o desenho industrial é, em princípio, a concepção funcional-estética de um produto, passível de ser reproduzido industrialmente em série. A estética está relacionada com a imagem final do produto que é oferecida ao consumidor, enquanto que a funcionalidade está relacionada com a aplicação e a eficiência. 23 Denis Borges Barbosa define que: Se a criação é técnica, teremos uma hipótese de patente de invenção ou de modelo industrial. Se a criação é puramente estética, sem aplicação a produto industrial, poder-se-á ter a proteção pelo Direito Autoral; tendo-se uma obra de arte aplicada, com a qualificação de poder servir de tipo de fabricação industrial, estamos no domínio do desenho industrial. 24 3.2 REQUISITOS PARA REGISTRABILIDADE O Registro de Desenho Industrial é um título de propriedade temporária sobre um desenho industrial, outorgado pelo Estado aos autores ou a outras pessoas físicas ou jurídicas, detentoras dos direitos sobre a criação, regido Parente Marques. A propriedade industrial: os sistemas de marcas, patentes e desenhos industriais a partir da Lei n 9.279, de 14 de maio de 1996. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 97. 20 Segundo o conceito clássico, o desenho industrial é um bem imaterial que constitui um meio de expressão da criatividade do homem e que se exterioriza pela forma, ou pela disposição de linhas e cores, de um objeto suscetível de utilização industrial (DI BLASI JUNIOR; GARCIA; MENDES, 2000, p. 97). 21 Artigo 95 da Lei 9.279/1996, (BRASIL. Presidência da República. Casa Civil - Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei n. 9.279, de 14 de maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial. Brasília, Diário Oficial da União, 15 maio 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/l9279.htm>. Acesso em: 20 fev. 2009). 22 DI BLASI JUNIOR; GARCIA; MENDES, op. cit., p. 27. 23 BARROS, 2007, p. 393-4. 24 BARBOSA, Denis Borges. Uma introdução à propriedade intelectual. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 577.

7 pela Lei da Propriedade Industrial. 25 Para efeito de registro, o desenho industrial deve contemplar os requisitos da originalidade e da novidade, objetivamente considerados, enquanto que as obras protegidas pelo direito do autor têm como único requisito a originalidade. O que vem a ser um desenho industrial novo? Segundo o artigo 96 da Lei de Propriedade Industrial, é aquele que não é compreendido no estado da técnica, ou seja, aquele que não se insere entre os conhecidos pelo povo, desde que antes da data do depósito do pedido. 26 Para aferição da novidade, o conteúdo completo do pedido de patente ou de registro depositado no Brasil e ainda não publicado, será incluído no estado da técnica a partir da data do depósito ou da prioridade reivindicada, desde que venha a ser publicado. 27 Tal dispositivo tem o objetivo de impedir que dois registros sejam concedidos a objetos idênticos, pois pode ocorrer o pedido de dois registros de desenhos industriais, sem que o primeiro tenha sido registrado. Por essa razão, o dia e a hora do depósito sempre ficam registrados, na petição inicial do pedido, por meio de carimbos dos relógios das recepções das delegacias e representações do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), para determinar quem fica com o privilégio, independente da origem ética e moral do depositante. 28 Não incluem o estado da técnica, os desenhos industriais divulgados: a) por iniciativa do autor, durante os 180 dias a contar da data do depósito ou da reivindicação de prioridade; b) por iniciativa do INPI, através da publicação oficial do pedido sem consentimento do autor, mas com base nas informações por ele fornecidas ou atos por ele praticados; c) por iniciativa de terceiros, sustentando informações obtidas junto ao autor, direta ou indiretamente, ou por atos por ele praticados. 29 25 INFORME FEDERAL ASSESSORIA DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL LTDA. Desenhos industriais. 2009. Disponível em: <http://www.informefederal.com.br/desenho_industrial.php>. Acesso em: 28 fev. 2009. 26 BARROS, 2007, p. 396. 27 Art. 96, 1 e 2 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, 1996). 28 CUNHA, Frederico Carlos da. A proteção legal do desing. Rio de Janeiro: Lucerna, 2000. p. 38. 29 Art. 96, 3 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, op. cit.).

8 Pode-se, também, definir a novidade, em sentido subjetivo, como sendo um novo conhecimento para o próprio sujeito, enquanto que em sentido objetivo, representa um novo conhecimento para toda a coletividade. 30 Na verdade, a novidade tem um caráter especial e relativo, pois como afirma Newton Silveira, a novidade consiste não na forma abstratamente considerada, mas na forma efetivamente utilizada como modelo. 31 Lembra ainda o autor: A novidade de um modelo ou desenho pode consistir na composição do conjunto, mesmo que suas partes sejam conhecidas. Segundo Pouillet, tais criações quando não despertam nenhum sentimento estético, satisfazendo apenas ao gosto da moda, somente podem ser protegidas pela lei de desenhos e modelos, caso contrário entram no domínio da propriedade artística. 32 A originalidade é outro requisito para obtenção do registro do desenho industrial. Segundo o artigo 97 da Lei de Propriedade Industrial, o desenho industrial é original quando possuir uma configuração distintiva, diferente de outros objetos anteriores, podendo o resultado visual ser decorrente de elementos já conhecidos. Também são revestidos de originalidade os objetos ou padrões que possuam aspectos próprios, exprimam nova tendência de linguagem formal, ou que apresentem características peculiares e singulares. 33 Segundo Newton Silveira, em sentido subjetivo a originalidade se refere à esfera pessoal do autor, enquanto que em sentido objetivo, é a criação ainda desconhecida como situação de fato. 34 Diz Newton Silveira: [...] a originalidade é condição tanto para a proteção das invenções, quanto das obras artísticas, podendo-se dizer que nas obras de arte a originalidade se refere à forma considerada em si mesma, enquanto que para os modelos e desenhos industriais a forma em si pode não ser original, desde que o seja a sua aplicação, isto é, a originalidade neste caso consistiria na associação original de uma determinada forma a um determinado produto industrial. 35 Sendo assim, o desenho proposto não pode ser confundido com 30 SILVEIRA, Newton, A propriedade intelectual e a nova lei de propriedade industrial. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 9. 31 SILVEIRA, Newton. Direito de autor no desenho industrial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1982. p. 65. 32 Ibid., p. 65. 33 INFORME FEDERAL ASSESSORIA DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL LTDA., 2009. 34 SILVEIRA, 1996, p. 9. 35 Id., 1982, p. 80.

9 objetos conhecidos quando comparados. 36 Quando um desenho industrial tem como objeto unicamente a novidade de aplicação, possuindo assim uma originalidade relativa, não merece a proteção da Lei do Direito do Autor. 37 No entanto, quando sua originalidade é absoluta, isto é, aquela em que a forma prepondera e se individualiza por si mesma entre as demais, 38 essa merece a proteção dos direitos autorais, independente de qualquer registro, pois decorre do próprio ato da criação. Por conseguinte, completa Carla Eugênia Caldas Barros: [...] nos casos de desenhos industriais que se revelam com originalidade absoluta, devido às formas que lhe são exclusivas, independente de suas aplicabilidades, há a hipótese de duplo direito de propriedade intelectual. Isso, quando se aplicam, a um só tempo, o direito do autor, que encontra fundamento no ato da criação em si, e o direito da propriedade industrial, condicionando a sua industriosidade e decorrente de pedido de registro do desenho formalizado junto ao INPI. 39 A lei não exige que o autor crie obra absolutamente nova ou original, ou seja, formas completamente desconhecidas e inéditas, efeitos novos e estilos completamente desconhecidos. 40 Deve-se tomar cuidado para evitar confusão entre os requisitos, originalidade e novidade, que frequentemente acontece. A novidade de um desenho industrial é puramente legal, o que pode variar de uma lei para a outra. Segundo João da Gama Cerqueira: O desenho pode ser novo em si e novo segundo a Lei. Analisando sob o primeiro aspecto, teríamos a novidade intrínseca do desenho ou modelo, que se aproxima do conceito de originalidade, embora não se identifique. Sob o segundo aspecto, teríamos a novidade extrínseca, cujo critério nos é dado exclusivamente pela lei positiva. 41 O desenho industrial é fruto da inspiração do próprio autor e será considerado original quando não for uma mera cópia ou imitação de outro objeto. O terceiro requisito do desenho industrial é tratado no artigo 95 da Lei de Propriedade Industrial, a saber, servir de tipo de fabricação industrial. Além desses requisitos relativos supracitados, Newton Silveira afirma 36 DANNEMANN, SIEMSEN, BIGLER & IPANEMA MOREIRA. Comentários à lei da propriedade industrial e correlatos. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 199. 37 SILVEIRA, 1996, p. 10. 38 BARROS, 2007, p. 399. 39 Ibid., p. 398. 40 CERQUEIRA, 1982, p. 663. 41 Ibid., p. 663.

10 que a lei estabelece um requisito absoluto (artigo 100, II, da Lei de Propriedade Industrial), a saber: a forma necessária, comum ou vulgar, do objeto é aquela determinada essencialmente por considerações técnicas funcionais. 42 3.3 DESENHOS EXCLUÍDOS DA PROTEÇÃO LEGAL O artigo 98 da Lei de Propriedade Industrial exclui da proteção por registro de desenho industrial qualquer obra de caráter puramente artístico; ou nas palavras do autor Newton Silveira: caso determinada criação de forma tenha caráter puramente artístico, não poderá ser objeto de uma patente de modelo ou desenho industrial [...]. Por outro lado, se carecer de valor artístico, não poderá ser tutelada pela Lei do direito do autor. 43 A Lei brasileira não admite, também, o registro de desenhos industriais que sejam contrários à moral e aos bons costumes, bem como o ofensivo à honra e à imagem das pessoas ou atente contra liberdade de consciência, crença, culto religioso ou ideia e sentimentos dignos de respeito e veneração ou, ainda, aquela determinada essencialmente por considerações técnicas ou funcionais. 44 Os desenhos contrários a moral e aos bons costumes são aqueles que contrariam o entendimento de moral e bom costume da maioria da sociedade. Como exemplo, Carla Eugenia Calda Barros cita os objetos eróticos, que servem para práticas contrárias às concepções morais e aos bons costumes de grande parcela da sociedade. 45 No entanto, Denis Borges Barbosa lembra que, no caso de ofensa à moral e aos bons costumes, estes não são suscetíveis de apropriação por serem, como diz Pontes de Miranda, extra commercium. 46 Os desenhos ofensivos à honra e à imagem das pessoas ou que atentem contra a liberdade de consciência, crença, culto religioso ou ideia e sentimentos dignos de respeito e veneração, preservam as disposições constitucionais relativos à dignidade da pessoa humana e aos indivíduos. 47 Em se tratando da vedação de registro da forma necessária, comum ou 42 SILVEIRA, 1996, p. 57. 43 SILVEIRA, Newton. Direito de autor no desenho industrial. 2003. Disponível em: <http://www.newmarc.com.br/novo/index.asp?p=artigos.asp>. Acesso em: 1 mar. 2009. 44 Artigo 100, I e II da Lei n 9.279/96 (BRASIL, 19 96). 45 BARROS, 2007, pág. 401. 46 BARBOSA, 2003, p. 580. 47 BARROS, op. cit., p. 401.

11 vulgar, nas palavras de Denis Borges Barbosa: [...] indicam, aparentemente, mais uma vez o requisito de novidade ou, talvez, o de originalidade. A forma necessária, comum ou vulgar já estará no estado da técnica, ou carecerá da distintividade própria à proteção. Não há, aí, requisito novo para a proteção. De outro lado, evidencia-se aqui uma vez mais a indispensabilidade do elemento ornamental: a forma necessária é aquela imposta pelos requisitos técnicos, e não será nunca ornamental. 48 Complementando, o aporte de Newton Silveira: [...] a forma tecnicamente necessária de um objeto é aquela que se acha indissoluvelmente ligada à sua função técnica, de modo que outra forma não possa atender à mesma finalidade. Assim, o que importa não é que a forma represente utilidade apenas, mas que tal efeito técnico só possa ser obtido por meio daquela determinada forma. Nessa hipótese, mesmo que tal forma seja dotada de efeito estético, não poderá ser objeto da tutela do direito de autor, porque esta estaria interferindo no campo da técnica. Desde que uma forma não se constitua em forma tecnicamente necessária, poderá ser protegida pela lei de direitos autorais, subordinando-se aos seus próprios requisitos bem como poderá também ser protegida como modelo industrial, sujeita ao requisito de caráter industrial. Se a forma for nova e puder servir de tipo de fabricação de um produto industrial, se enquadra no conceito do art. 11 do Código da Propriedade Industrial. Destine-se ou não a ser multiplicada, uma nova forma (não tecnicamente necessária) poderá ser protegida pela lei de direitos de autor, desde que atenda aos seus próprios requisitos, isto é, possua originalidade e caráter expressivo, o que se traduz em valor artístico. 49 3.4 FORMALIDADES PARA REGISTRO Além do próprio autor, terceiros com autorização deste poderão depositar o pedido de desenho industrial, ou seja, basta ter legitimidade sobre o objeto de criação que poderá ser realizado o depósito (artigo 94 da Lei 9.279/96). 50 Os requisitos para o pedido de registro de um desenho industrial encontram-se elencados no artigo 101 da Lei 9.270/96. São eles: requerimento, quando for o caso, relatório descritivo e reivindicações, desenhos ou fotografias, campo de aplicação do objeto e, enfim, o comprovante de pagamento de retribuição do depósito. Todos estes documentos deverão estar escritos em língua portuguesa. Depois de entregue ao INPI, essa documentação deve passar por um exame formal. Gize-se, os registros de desenho industrial são concedidos sem o exame prévio quanto à novidade e à originalidade, ou seja, não há um exame prévio do mérito, pois os registros sempre são concedidos desde que não 48 BARBOSA, 2003, p. 581. 49 SILVEIRA, 1982, p. 100. 50 FARIA, 2007, p 17.

12 incorram em nenhuma das proibições legais do artigo 100 da Lei de Propriedade Industrial (item 3.3). Isso acontece, porque presume-se que o depositante, pessoa jurídica ou física, é legítimo no direito de pleitear o privilégio, tendo em vista o caráter constitutivo do registro. 51 Segundo Frederique Carlos da Cunha: De fato, não existem vantagens de se requerer um exame de mérito, porque um parecer favorável emitido após este exame em nada vai influenciar na validade do privilégio, apenas vai manter a concessão, não tornando o registro mais forte. E tanto os titulares dos registros não vislumbraram vantagens que o número de pedidos desse exame é mínimo, praticamente desprezível. O principal levantamento apontou para uma incidência de cinco casos nos primeiros 1.000 pedidos processados, e entre esses cinco casos, dois deles tiveram suas petições não conhecidas por não terem sido apresentadas pelo titular do registro. Durante o ano de 1999, dos 8.492 pedidos examinados, só procedemos 12 exames de mérito, ou seja, 0,14% do total, o que pode ser considerado desprezível. 52 Todavia, isso não exclui a possibilidade de, em qualquer tempo, o titular do desenho industrial requerer um exame de mérito que irá avaliar os aspectos relativos à novidade e à originalidade. E, uma vez requerido, deverá o INPI emitir um parecer de mérito que, caso se posicione pela ausência de um dos requisitos exigíveis, implicará a nulidade do registro, instaurado de ofício. 53 A afirmação dita por Frederique Carlos da Cunha deve ser entendida com restrições, uma vez que o exame de mérito, no qual se discute a prevalência do direito conferido pelo título de registro de um desenho industrial em face de um terceiro infrator, é extremamente útil e recomendável no caso de uma ação judicial. Obviamente, deverá o exame de mérito satisfazer o interesse das partes. 54 Na falta da documentação acima referida, existindo dados suficientes do depositante, desenho industrial e autor, o pedido deverá ser entregue ao INPI, mediante um recibo, devendo o depositante cumprir, no prazo de cinco dias, as exigências que forem estabelecidas pelo órgão, sob pena de o pedido ser considerado inexistente. 55 Cumprida as exigências, o depósito será considerado efetuado na data da apresentação do pedido 56, exceto se o objeto não 51 BARROS, 2007, p. 408. 52 CUNHA, 2000, p. 67. 53 Art. 111, único da Lei n 9.279/96 (BRASIL, 199 6). 54 FARIA, 2007, p. 19. 55 Caput, artigo 103 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, op. cit.). 56 Ato Normativo (INPI) n 161/2002, 4.4.2 (BRASIL. Ministério do Desenvolvimento, Indústria e

13 corresponder àquele já apresentado, hipótese esta em que a data será a do cumprimento das exigências. 57 O INPI estabelece que o relatório descritivo, as reivindicações e os desenhos ou fotografias deverão ser entregues em quatro vias, admitindo o acréscimo de duas, acompanhadas de um envelope endereçado e selado, para que posteriormente sejam restituídas ao depositante depois de autenticadas, via correio. 58 Quando os objetos forem tridimensionais, os desenhos e as fotos deverão ser em perspectiva, revelando vistas frontal, lateral, superior e inferior, devendo ser clara e em escala que permita a sua redução, preservando-se os detalhes. 59 Em relação à necessidade de relatório descritivo, este será exigido quando se verificar variantes configurativas, nomeação de desenhos e necessidade de explicações sobre o objeto e seu campo de aplicação. 60 O campo de aplicação deverá constar no requerimento, se o título do desenho industrial ou os registros atinentes no relatório descritivo forem insuficientes para a identificação e a compreensão do objeto ou, tratando-se de padrões ornamentais, à identificação dos produtos em que eles se aplicam. 61 Segundo o artigo 104 da Lei de Propriedade Industrial, o pedido de registro de desenho industrial deverá limitar-se a um único objeto, permitindo uma pluralidade de variações, de até, no máximo, vinte, desde que se destinem a um único propósito e guardem entre si características distintivas preponderantes. Caso não seja atendida esta previsão, o depositante será notificando, para que, no prazo de 60 dias, divida o pedido, que ficará definitivamente arquivado. 62 O desenho industrial deverá apresentar clara e suficientemente o Comércio Exterior Instituto Nacional da Propriedade Industrial. Ato Normativo 161/2002. Dispõe sobre a aplicação da Lei de Propriedade Industrial em relação aos registros de desenho industrial. 10 jun. 2002. Disponível em: <http://www.inpi.gov.br/menuesquerdo/desenho/pasta_legislacao-new-version/ato_161_02_html>. Acesso em: 25 fev. 2009). 57 BARROS, 2007, p. 404. 58 Ato Normativo (INPI) n 161/2002, 4.2. Diz o ato normativo que os desenhos e as fotografias deverão ser apresentados [...] sem assinaturas ou rubricas, em papel flexível, resistente, branco, liso, não brilhante, com dimensões de 297 mm x 210 mm (modelo DIN A-4), utilizado somente em uma face, sem estar amassado, rasgado ou dobrado (BRASIL, 2002). 59 BARROS, 2007, p. 405. 60 Ato Normativo (INPI) n 161/2002, 11.1.1 (BRASIL, 2002). 61 Ato Normativo (INPI) n 161/2002, 11.3.1(BRASIL, op. cit.). 62 Ato Normativo (INPI) n 161/2002, 7.1 (BRASIL, op. cit.).

14 objeto e suas variações, de modo que consiga possibilitar a sua reprodução por técnico no assunto. 63 O processamento do pedido é simples e breve, pois a lei de desenho industrial visa a celeridade do processo. Uma vez recepcionado o pedido pelo INPI, deverá desde logo ser publicado e concedido, depois de ter passado pelo exame formal (desenhos não registráveis, item 3.3; contenha as peças exigíveis - requerimento, relatórios descritíveis e reivindicações, desenhos ou fotografias, campo de aplicação do objeto e, enfim, o comprovante de pagamento de retribuição do depósito -; e, por fim, refira-se a um único objeto com, no máximo, vinte variações). O depositante pode requer sigilo do depósito por até 180 dias a contar da data do depósito. O pedido pode ser retirado no prazo de 90 dias, contados da mesma data. Caso o depósito não gere efeitos, será priorizado o depósito imediatamente posterior. Caso o pedido não seja retirado no prazo de 180 dias, o processo tramitará normalmente. 64 Realizado o registro, este produzirá efeitos após sua publicação, que sempre acontecerá independentemente da decisão final, seja ela concessão, indeferimento ou arquivamento definitivo e após a imediata expedição do certificado do registro. É importante salientar que a propriedade do desenho industrial adquire-se mediante o registro validamente concedido. 65 No caso de concessão, o registro de desenho industrial tem validade durante dez anos contados da data do depósito, prorrogáveis por mais três períodos sucessivos de cinco anos, até atingir o prazo máximo de 25 anos contados da data do depósito. As prorrogações devem ser pedidas no último ano de vigência do registro ou até 180 dias após o vencimento do registro, mediante pagamento de uma retribuição adicional. 66 Enquanto vigorar o registro, o titular tem o direito de impedir que terceiros utilizem o desenho, sem seu consentimento ou contribuam para que outros o façam. O desenho industrial poderá ser utilizado por terceiros desde que o mesmo seja usado para fins experimentais, direcionados a estudo e pesquisas tecnológicas ou científicas. Dessa prerrogativa também se excluí os 63 BARBOSA, 2003, p. 582. 64 Art. 105 e 1 do art. 106 da Lei n 9.279/96 (BR ASIL, 1996). 65 Art. 109 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, op. cit.). 66 Art. 108 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, op. cit.).

15 atos praticados por terceiros desautorizados, de caráter privado sem propósito comercial, mas desde que não cause prejuízos ao titular do desenho industrial. E, por fim, esta regra não se aplica quando o desenho industrial for colocado no mercado por terceiro autorizado pelo próprio titular. Este direito é semelhante ao direito concedido aos titulares de patentes e seus limites respectivos. Para tal conteúdo, prescreve o acordo sobre os Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual (Trade Related Aspects of Intellectual Property Rights - TRIPs): Art. 26-1 - O titular de um desenho industrial protegido terá o direito de impedir terceiros, sem sua autorização, de fazer, vender ou importar artigos que ostentem ou incorporem um desenho que constitua uma cópia, ou seja substancialmente uma cópia, do desenho protegido, quando esses atos sejam realizados com fins comerciais. No entanto, à pessoa que, de boa fé, antes da data do depósito ou da prioridade do pedido de registro explorava seu objeto no País, será assegurado o direito de continuar a exploração, sem ônus, na forma e condição anteriores, 67 desde que o direito seja cedido juntamente com o negócio ou empresa, ou parte deste, que tenha relação direta com o objeto de exploração do registro, por alienação ou arrendamento. Mas caso a pessoa tenha tido conhecimento do objeto do registro antes dos 180 dias que precederam a data do depósito, não gozará deste direito de continuar a exploração, desde que tenha sido depositado no prazo de seis meses, contados da divulgação. 68 É importante esclarecer que a proteção do desenho industrial refere-se ao seu caráter ornamental e não ao caráter funcional do desenho. Segundo Denis Borges Barbosa: Assim, ainda que as imagens e especificações do desenho indiquem um produto inteiro, a propriedade não abrange a utilidade industrial do produto, mas só a feição estética. Quando comparando produtos para apuração de eventual contrafação, a consulta ao estado da técnica e a avaliação das diferenças de cada um dos produtos contrastantes em face daquela é um método logicamente indicado. 69 A Lei de Propriedade Industrial, em seu artigo 187, tipifica como crime a fabricação de produto que incorpore desenho industrial registrado, ou imitação substancial que possa induzir em erro ou confusão, sem a devida autorização. Para Denis Borges Barbosa: 67 Art. 110 caput e 1 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, 1996). 68 Art. 110, 2 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, op. cit.). 69 BARBOSA, 2003, p. 583.

16 [...] a reprodução completa se presume violação, enquanto que - para se considerar a existência de violação penal no caso de simples imitação, há que se comprovar a confusão real ou potencial, levandose em conta, neste último caso, o consumidor a que se destina o produto contendo o design. 70 Essa lei, em seu artigo 188, considera crime contra o registro de desenho industrial quem exporta, vende, expõe ou oferece à venda, quem tem em estoque, oculta ou recebe, para utilização com fins econômicos, objeto que incorpore ilicitamente desenho industrial registrado, ou imitação substancial que possa induzir erro ou confusão, não se resumindo apenas à imagem ou à forma. Com a densidade de sempre, diz João da Gama Cerqueira: A lei pune não apenas a reprodução integral do desenho ou modelo patenteado, isto é, a sua cópia servil, mas, ainda, a reprodução parcial, desde que tenha por objeto seus elementos característicos. A reprodução parcial pode consistir, também, na imitação do desenho ou modelo patenteado [...] As condições elementares dos crimes contra os desenhos e modelos industriais são as mesmas dos crimes contra os privilégios de invenção, de que tratamos anteriormente: a) existência de uma patente válida; e b) um fato material que constitua ofensa ao direito do concessionário da patente. No caso de reprodução, pouco importa o meio ou processo empregado pelo infrator. Não excluem também o crime as diferenças mais ou menos numerosas entre o desenho ou modelo legítimo e o contrafeito, destinando-se essas diferenças, quase sempre, a mascarar a contrafação. Do mesmo modo, não constitui condição essencial do crime a possibilidade de confusão entre o desenho ou modelo contrafeito e o patenteado, se bem que essa circunstância concorra para melhor caracterização do delito. 71 No entanto, José Carlos Tinoco Soares lembra que "desde que haja a possibilidade de indução a erro ou confusão, quer seja pela reprodução integral, parcial, quer pela imitação do desenho industrial registrado, o crime se realiza e se consuma." 72 Independentemente da esfera criminal, o prejudicado poderá ingressar com ações na esfera cível no que considerar cabível. As ações de indenização no cível, por violação de registro, encontram-se amparadas nos artigos 207 a 210 da Lei de Propriedade Industrial. Inclusive, há a previsão de concessão de liminar para sustação da violação ou do ato. A indenização será calculada com base nos benefícios que o prejudicado teria obtido se a violação não tivesse ocorrido, e a previsão legal, para o pagamento de lucros cessantes, será 70 BARBOSA, 2003, p. 583. 71 CERQUEIRA, 1982, 711 et seq. 72 SOARES, José Carlos Tinoco Soares. Tratado da propriedade industrial: patentes e seus sucedâneos. São Paulo: Jurídica Brasileira, 1998. p. 280.

17 estabelecida. O prazo, para a ação de indenização, prescreve em cinco anos. 73 3.5 NULIDADE DO REGISTRO Embora não caiba recurso da concessão do registro do desenho industrial, a lei prevê a nulidade do registro por via administrativa (artigos 113 a 117 da Lei de Propriedade Industrial) ou por via judicial (artigo 118, também, da Lei de Propriedade Industrial). Além dessas formas de nulidade de registro, o verdadeiro criador do desenho industrial, poderá requerer adjudicação do registro que lhe foi negado injustamente pelo INPI, propondo ação reivindicatória do registro na esfera judicial. 74 O prazo, para a instauração do processo, pela via administrativa, é de cinco anos contados da data do registro, sendo devidamente provocado por requerimento de terceiro legitimado, exceto em decorrência de exame de mérito quando não observados os requisitos definidos nos artigos 95 a 98 da Lei de Propriedade Industrial, o qual poderá ser feito em qualquer momento, ou podendo ser instaurado de ofício. 75 Tanto o requerimento de terceiro legitimado, quanto a instauração do processo de ofício, se feito no prazo de 60 dias da concessão do registro, suspenderá os efeitos da concessão. 76 Conforme o artigo 114 da Lei de Propriedade Industrial, depois de devidamente publicada a decisão instauradora do processo administrativo, será intimado o titular do registro de desenho industrial para se manifestar no prazo de 60 dias. Decorrido esse prazo, o INPI deverá emitir um parecer, independentemente de ter havido manifestação do titular do registro. Após o parecer do INPI, deverão as partes ser intimadas para se manifestarem num prazo igual de 60 dias. 77 Decorrido o prazo, o processo será decidido pelo Presidente do INPI, havendo ou não manifestação das partes, pondo fim à instância administrativa. 78 Ainda que extinto o registro, o processo de nulidade 73 Art. 225 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, 1996). 74 SILVEIRA, 1996, p. 52. 75 Art.113, 1 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, 1996). 76 Art. 113, 2 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, op. cit.). 77 Art. 115 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, op. cit.). 78 Art. 116 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, 1996).

18 continuará. 79 Em relação à ação judicial de nulidade, esta poderá ser proposta a qualquer tempo da vigência do registro pelo INPI ou por qualquer outra pessoa com legítimo interesse 80, podendo a nulidade do registro ser arguida a qualquer tempo como matéria de defesa. 81 Atendido os requisitos do processo, o juiz, preventiva ou incidentalmente, poderá suspender os efeitos do registro do desenho industrial. 82 A Justiça Estadual é competente para julgar a ação de nulidade de registro de desenho industrial e quando não proposta pelo INPI, este intervirá no feito, tendo o réu 60 dias para apresentação da contestação. Após o trânsito em julgado, a decisão da ação de nulidade será publicada para a ciência de terceiros. 83 3.6 EXTINÇÃO DO REGISTRO O registro do desenho industrial se extinguirá quando expirar o decurso do prazo de vigência, seja pela renúncia de seu titular, ressalvados os direitos de terceiros; pela falta de pagamento pela retribuição prevista; ou pela ausência de procurador devidamente qualificado e domiciliado no país, com poderes para representá-la administrativa e judicialmente, inclusive para receber citações, no caso de titular domiciliado no exterior. 84 O registro de desenho industrial depois de extinto passa a ser de uso comum, podendo ser explorado livremente. Ao ser concedido o registro sobre um desenho industrial, o titular passa a exercer um monopólio sobre o mesmo. No entanto, esse monopólio é limitado, podendo atingir o prazo máximo de 25 anos, ou seja, 10 anos prorrogados por três vezes consecutivas de 5 anos. Ao fim deste prazo, extingue-se o registro, por omissão do titular quanto a sua prorrogação ou por não serem mais possíveis prorrogações. 85 No caso da renúncia, que é um ato de vontade do titular do registro por não possuir mais interesse no objeto registrado, não se admite o prejuízo de 79 Art. 117 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, op. cit.). 80 Art. 56 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, op. cit.). 81 Art. 56, 1 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, op. cit.). 82 Art. 56, 2 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, op. cit.). 83 Art. 57 da Lei n 9.279/96 (BRASIL, op. cit.). 84 LOBO, Thomaz Thedim. Introducão à nova de lei de propriedade insdutrial. São Paulo: Atlas, 1997. p. 71. 85 BARROS, 2007, p. 411.

19 direito e interesses de terceiros, como é o caso do cessionário ou licenciado devidamente regularizado pelo INPI. Nesse sentido, no caso de haver terceiro interessado, é necessária a anuência do titular para que ocorra a renúncia. 86 4 A DUPLA PROTEÇÃO E SEUS DESDOBRAMENTOS A regulamentação da proteção dos desenhos e modelos industriais tem sido há muito tempo objeto de nítida controvérsia. Isso já perdura há vários anos em vários lugares do mundo, inclusive no Brasil. A questão da proteção aos modelos e aos desenhos industriais surgiu inicialmente na França ainda na fase das corporações de ofício. Os autores franceses entendem que os modelos e os desenhos industriais devem ficar sujeitos às mesmas leis que regulam a propriedade artística e literária, teoria esta denominada de unidade da arte. 87 Muitos destes autores são influenciados por Pouillet em seu radical ponto de vista: Hoje nós pensamos, portanto, como nós pensávamos já no momento da primeira edição desta obra, que a melhor lei a ser elaborada em matéria de desenhos e modelos industriais seria de assimilar, pura e simplesmente, o desenho industrial no desenho artístico e os incluir sob uma mesma proteção. 88 (tradução nossa). Ao defender a unidade de proteção dos desenhos e modelos industriais, Pouillet explica a dificuldade de definir claramente a sua natureza e suas características: Isso que se colocou na cabeça de separar duas coisas, feitas por se aliar e se unir, a arte e a indústria, e que se sonhou em estabelecer entre elas uma linha de demarcação. É para se tentar uma distinção impossível, é para querer admitir a existência do desenho industrial ao lado e fora do desenho artístico, é para ter sonhado em separar o que a natureza própria das coisas uniu ao ponto de misturar, é por isso que o legislador francês, de forma apaixonada, mas sem lógica, não pode, durante mais de 60 anos, levar a um bom resultado os desenhos e modelos industriais. 89 (tradução nossa). Da mesma forma, Achiles Fournier mostra-se contrário à distinção entre a arte propriamente dita e a arte industrial e também considera arbitrária e impossível a separação da arte e dos produtos das indústrias. Segundo 86 BARROS, 2007, p. 411. 87 CERQUEIRA, 1982, p. 642. 88 Nous pensons donc aujord hui, comme nous le pensions déjá lors de la prémière édition de cet ouvrage, que la meilleure loi à faire em matière de dessins et modèles de fabrique serait d assimiler, purement et simplement, le dessin de fabrique au dessin artistique et de les confrondre dans une même protection (POUILLET apud CERQUEIRA, op. cit., p. 642). 89 Nous pensons donc aujord hui, comme nous le pensions déjá lors de la prémière édition de cet ouvrage, que la meilleure loi à faire em matière de dessins et modèles de fabrique serait d assimiler, purement et simplement, le dessin de fabrique au dessin artistique et de les confrondre dans une même protection (POUILLET apud CERQUEIRA, op. cit., p. 642).

20 Achiles Fournier a separação da obra de arte e do modelo industrial é juridicamente intraduzível (tradução nossa). 90 João da Gama Cerqueira vai de encontro a esta ideia, argumentando como é interessante notar que justamente sob o aspecto jurídico é que se torna mais fácil a distinção entre as criações artísticas e os produtos da arte industrial, sendo mais complexa a questão sob o ponto de vista exclusivamente artístico. 91 Pouillet era completamente contra a possibilidade de o juiz tornar-se um crítico da arte e entendia que a Lei do Direito do Autor deveria tutelar todo desenho original e toda a forma nova, sem levar em conta o seu destino, a qualidade de seu autor ou qualquer julgamento de valor estético por parte do juiz. 92 Não obstante, João da Gama Cerqueira afirma que não deixam de ter razão os autores que defendem a unidade de proteção legal dos desenhos e dos modelos industriais, pois nem sempre é fácil a distinção entre os desenhos e os modelos industriais das obras puramente artísticas, como demonstra o grande número de critérios propostos na doutrina para estabelecer esta diferenciação. 93 Nenhum prejuízo resulta da distinção entre as obras de arte dos desenhos e modelos industriais, quando submetidos a regimes diferentes, no que diz respeito à proteção dos direitos do autor, pois se o desenho ou o modelo industrial possuir um predicado artístico, o autor sempre terá a proteção da Lei do Direito do Autor ou da Lei da Propriedade Industrial. Dependendo do interesse que se visa a resguardar existe a dupla proteção das leis. No entanto, nem sempre é possível conferir valor artístico aos desenhos e aos modelos industriais, sendo que em alguns casos estes são destituídos de cunho de obras de arte. 94 João da Gama Cerqueira entende que os defensores da unidade da arte e da proteção legal situaram mal o problema, colocando-o fora de seus 90 La séparation de L ouvre d art et du modèle d industrie est juridiquement intraduisible (FOURNIER apud CERQUEIRA, 1982, p. 643). 91 Ibid., p. 643. 92 POUILLET apud SILVEIRA, 1982, p. 110. 93 CERQUEIRA, 1982, p. 646. 94 Ibid., p. 647.

21 termos. 95 A questão não é de separar a arte da indústria, mas sim distingui-las. Segundo o autor: Os desenhos e modelos industriais realizam a síntese da arte e da indústria, que não se separam, mas também não se confundem. Se as artes industriais reclamam pela sua natureza artística, se seus produtos se caracterizam pela aplicação da arte à indústria, o que traduz na expressão artes aplicadas, é claro que não se podem separar duas idéias. Daí não se segue, porém, que não se deva distinguir a indústria da arte, que ambas se confundam num mesmo conceito. 96 Não é o papel do juiz, nem das autoridades administrativas incumbidas da concessão dos privilégios dos desenhos e modelos industriais, resolver as questões estéticas, muito menos determinar onde começa a beleza, como dizem os escritores que defendem a unidade de proteção. Essas autoridades não deverão se basear em critérios abstratos, fundados na filosofia da arte ou nos princípios da estética, mas sim guiar-se por critérios positivos. Como diz João da Gama Cerqueira, fornecidos pela própria lei ou indicados na doutrina, que permitam verificar, em cada caso, os característicos que distinguem os desenhos e modelos industriais. 97 Os autores franceses, seduzidos pela unidade da arte, colocaram mal a questão, quando essa foi trazida para o campo do direito. Deixaram-se simplesmente empolgar com a defesa de princípios. Os argumentos por eles usados seriam incontestáveis se tratassem de provar que os desenhos e os modelos industriais são dignos de proteção legal, sem levar em consideração os valores artísticos. A proteção dos desenhos e dos modelos industriais não deve assimilarse singelamente às obras de arte. Isso se opõe à própria natureza dessas criações e ao fim a que se destinam. De acordo com João da Gama Cerqueira, há uma diferença essencial entre as criações das belas-artes e as produções da arte industrial. Para o autor isso é algo inegável, uma vez que a segunda é considerada subsidiária da primeira, sendo aquela considerada mais como gênero industrial do que como gênero arte. 98 A finalidade das artes industriais é a produção artística de objetos 95 CERQUEIRA, 1982, p. 647. 96 Ibid., p. 648. 97 Ibid., p. 648. 98 Ibid., p. 649.