DOAÇÃO E TRANSPLANTE DE ÓRGÃOS: aspectos éticos e legais 1. ORGAN DONATION AND TRANSPLANTATION: ethical and legal aspects 1



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Transcrição:

DOAÇÃO E TRANSPLANTE DE ÓRGÃOS: aspectos éticos e legais 1 ORGAN DONATION AND TRANSPLANTATION: ethical and legal aspects 1 Vanessa Costa de Melo 2 Gyl Dayara Alves de Carvalho 3 Odinélia Batista Arantes Lima 4 Aurilene Cartaxo de Arruda 5 RESUMO: O transplante é um procedimento cirúrgico que consiste na substituição de um órgão ou tecido doente de um receptor por outro órgão ou tecido saudável, de um doador vivo ou morto. A doação e o transplante de órgãos tornam-se complexas na medida em que envolvem aspectos éticos, religiosos, sociais e legais com os quais aqueles que os defendem têm de se deparar. O objetivo do estudo é analisar os aspectos éticos e legais norteadores da doação e transplante de órgãos. Trata-se de um estudo bibliográfico consubstanciado na literatura pertinente, realizado em bibliotecas de Instituições de Ensino Superior, públicas e privadas do município de João Pessoa PB no período fevereiro a maio de 2012, utilizando como descritores: transplante, doação de órgãos e legislação. A legislação brasileira acerca da doação e do transplante de órgãos passou por uma série de modificações desde a sua criação, colocando atualmente a família como principal responsável por este processo. Por isso, é de fundamental importância o preparo do profissional da saúde envolvido no processo para que possa comunicar-se com as famílias, desmistificando os fatores de recusa, esclarecendo a população acerca da morte encefálica e, principalmente, conscientizando as pessoas acerca da importância deste ato de solidariedade. PALAVRAS-CHAVE: Transplante, Doação de órgão, Legislação. ABSTRACT: The transplant is a surgical procedure that involves replacing a diseased organ or tissue of a receiver by another body or healthy tissue from a living donor or deceased. The donation and organ transplantation become complex in that involve ethical, religious, social and legal issues with which those who defend them have to be faced. The aim of this study is to analyze the ethical and legal issues guiding the donation and organ transplantation. It is embodied in a bibliographic literature held in libraries, higher education institutions, public and private in the city of João Pessoa - PB in the period from February to May 2012, using as descriptors: transplantation, organ donation and legislation. Brazilian law about the donation and organ transplantation has undergone several modifications since its inception, currently putting the family as primarily responsible for this process. It is therefore very important to prepare the health professional involved in the process so you can communicate with families, demystifying the refusal factors, explaining the population about brain death, and especially raising awareness about the importance of this act of solidarity. KEYWORDS: Transplantation, Organ donation, Legislation. 1 Trabalho submetido ao 15º Congresso Brasileiro dos Conselhos de Enfermagem (CBCENF). Eixo Temático Ética e legislação em enfermagem. 2 Discente do Curso de Bacharelado e Licenciatura em Enfermagem da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). E-mail: nessaenfermagem@yahoo.com.br 3 Discente do Curso de Bacharelado e Licenciatura em Enfermagem da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). E-mail: gyl_dayara@hotmail.com 4 Discente do Curso de Bacharelado e Licenciatura em Enfermagem da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). E-mail: odinelia.arantes@hotmail.com 5 Enfermeira. Mestre em Enfermagem. Docente do Departamento de Enfermagem Clínica (DENC) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). E-mail: aurilene_cartaxo@hotmail.com

INTRODUÇÃO De acordo com dados do Ministério da Saúde, nos últimos anos ocorreu um aumento significativo no número de transplantes de órgãos em quase todos os estados brasileiros, situando o Brasil entre os países que mais realizam transplante no mundo, com um índice de captação anual de órgãos de aproximadamente seis doadores por milhão de habitantes (1). O transplante é um procedimento cirúrgico que consiste na substituição de um órgão ou tecido de uma pessoa doente (receptor) por outro órgão ou tecido saudável, de uma pessoa viva ou morta (doador). Além disso, requer uma avaliação completa do paciente e de cuidados intensivos durante e depois da cirurgia, correspondendo muitas vezes à derradeira esperança de cura para pessoas com incapacidades orgânicas terminais e que não obtiveram sucesso com outros tratamentos (2). No entanto, o índice de captação anual de órgãos no Brasil ainda é insuficiente quando comparado ao de países mais desenvolvidos, que alcançam números superiores a 22 doadores por milhão. Este entrave se encontra fortemente vinculado à desinformação do meio médico e à população em geral, visto que muitos profissionais da área da saúde desconhecem a legislação vigente sobre doação e transplante de órgãos (3). O nascimento, a vida e a morte dos seres humanos são processos cada vez mais passíveis de intervenção pelo próprio homem. Todavia, ao mesmo tempo em que a ciência traz essa possibilidade de intervenção, a ética vem para servir como elemento definidor no que diz respeito à necessidade de se interferir (4). Aliado a isto, encontra-se a polêmica que gira em torno deste tema na sociedade civil e científica. A idéia de prolongar a vida humana ou de minimizar o sofrimento das pessoas, oferecendo uma possível melhoria em sua qualidade de vida é uma premissa que guia o comportamento dos profissionais da área da saúde que lidam com estes casos e daqueles que têm à sua volta pessoas com problemas que as impedem de usufruir normalmente da vida ou que determinam sua morte prematura. Assim, a questão da doação e do transplante de órgãos torna-se complexa na medida em que envolve aspectos éticos, religiosos e sociais com os quais aqueles que o defendem têm de se deparar, além das questões legais que envolvem o assunto (5). No Brasil, a doação de órgãos é regulamentada pela LEI Nº 9.434 de 04 de fevereiro de 1997 e pela LEI Nº 10.211 de 23 de março de 2001, que abordam as especificidades para a doação de órgãos no caso de doador vivo ou falecido (6,7). Nesse sentido, a negativa da família em consentir na doação de órgãos se constitui como principal entrave na efetivação dos transplantes, e geralmente decorre de questões culturais e psicológicas. Mesmo com o diagnóstico de morte encefálica e sua irreversibilidade, as famílias não

compreendem a idéia da cessação das funções do cérebro em um ser aparentemente vivo, pois o familiar acredita que a morte resume-se à parada da função cardiorrespiratória (8). Contudo, a orientação é um fator decisivo na obtenção do consentimento por parte da família, e cabe aos profissionais de saúde contribuir e humanizar este processo, sendo o profissional enfermeiro muitas vezes destacado por sua maior interação com a família (9). Tendo em vista a polêmica existente em torno deste tema, questiona-se quais são os aspectos éticos e legais que regem a doação e o transplante de órgãos no Brasil. O interesse pelo desenvolvimento desta pesquisa surgiu a partir das discussões existentes sobre esta temática entre a sociedade civil e científica. E por perceber a importância da doação e do transplante de órgãos para aqueles pacientes que não obtiveram sucesso com outros tratamentos. Diante do exposto, este estudo tem o objetivo de analisar os aspectos éticos e legais norteadores da doação e transplante de órgãos. MATERIAL E MÉTODO Trata-se de um estudo bibliográfico consubstanciado na literatura pertinente, desenvolvido com base em material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos e tem como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito (10). A pesquisa foi realizada em bibliotecas de Instituições de Ensino Superior, públicas e privadas do município de João Pessoa PB, utilizando como descritores: transplante, doação de órgãos e legislação. As informações utilizadas foram de dados obtidos através de livros, revistas científicas, sites indexados, Código de Ética dos profissionais de enfermagem; coletados no período fevereiro a maio de 2012 em fontes especializadas na temática em estudo. Inicialmente foi realizada uma leitura exploratória, em seguida fez-se uma leitura analítica, a qual é realizada com base nos textos selecionados a fim de ordenar e sumariar as informações contidas nas fontes, de forma que possibilitem a obtenção de respostas ao problema de pesquisa; e posteriormente uma leitura interpretativa, que possibilitou elaborar o corpo do estudo. REVISÃO DA LITERATURA No Brasil, a doação e o transplante de órgãos constituem um processo que se divide em detecção, avaliação e manutenção do potencial doador, diagnóstico de morte encefálica, consentimento familiar ou ausência de negativa, documentação de morte encefálica, remoção e

distribuição de órgãos e tecidos, transplante e acompanhamento de resultados. Este processo, visto também como uma terapêutica para aqueles pacientes cujos tratamentos anteriores não surtiram o efeito desejado, depende da colaboração da sociedade para ser aplicado e se desenvolver efetivamente (11). A legislação brasileira referente aos transplantes de órgãos e tecidos humanos apresentou uma série de mudanças ao longo dos anos. Nesse sentido, a primeira lei sobre atividades de transplantação no país foi a Lei n.º 5.479 de agosto de 1968, mas nunca chegou a ser regulamentada. Nessa primeira lei, o princípio era o da doação consentida, e seu artigo 3º dispunha que a permissão para a retirada e transplante de tecidos, órgãos e partes de cadáver para finalidade terapêutica e científica se daria mediante manifestação expressa da vontade do doador; manifestação da vontade, através de instrumento público, em caso de doadores relativamente incapazes e de analfabetos; autorização escrita do cônjuge, e sucessivamente, de descendentes, ascendentes e colaterais, ou das corporações religiosas ou civis responsáveis pelo destino dos despojos; ou ainda, na falta de responsáveis pelo cadáver, a retirada somente poderia ser feita com a autorização do Diretor da Instituição onde ocorresse o óbito, sendo ainda necessária esta autorização nas condições dos itens anteriores (12). Em 18 de novembro de 1992 foi criada a Lei 8.489, que também definia a doação como consentida. Em seu artigo 3, incisos I e II exigia, para que fossem realizados os transplantes: autorização em vida pelo doador através de documento particular ou público; ou o consentimento do conjugue a fim de que se proceda a retirada de órgãos e tecidos com finalidade terapêutica. Esta lei ainda incorporou o conceito de morte encefálica e a restrição das possibilidades de emprego de doadores vivos (13). No que tange a Lei 9.434, esta dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento e dá outras providências. Tendo sido aprovada em 04 de fevereiro de 1997, refere em seu artigo 3º que o diagnóstico de morte encefálica deverá ser feito por dois médicos, os quais não façam parte da equipe de remoção. Também vale salientar que, de acordo com o parágrafo 3º do mesmo artigo, é permitida a constatação da morte encefálica por um médico de confiança da família (6). A lei em questão, no seu artigo 4º, afirma que: a retirada de tecidos, órgãos e partes após a morte, poderá ser efetuada, independentemente de consentimento expresso da família se, em vida, o falecido a isso não tiver manifestado sua objeção. O parágrafo 1º define que a manifestação de objeção será reconhecida por meio da expressão não doador de órgãos e tecidos, constante em Carteira de Identidade Civil e Carteira Nacional de Habilitação (6).

A Lei 10.211 de 23 de março de 2001 altera dispositivos da Lei n o 9.434, de 4 de fevereiro de 1997, que dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento, sendo substituída a doação presumida pelo consentimento informado do desejo de ser doador: (...)a retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoas falecidas, para transplante ou outra finalidade terapêutica, depende da autorização de qualquer um de seus parentes maiores, na linha reta ou colateral, até segundo grau inclusive, ou do cônjuge, firmada em documento subscrito por duas testemunhas presentes à certificação de morte. (7) Com esta nova lei, a doação de órgãos no Brasil passou a depender, exclusivamente, da autorização da família do doador. Neste contexto, pesquisas apontam que o conhecimento limitado do conceito de morte encefálica, o desconhecimento do desejo do potencial doador, a religiosidade, a demora na liberação do corpo e o medo da comercialização de órgãos são os grandes responsáveis pela recusa dos familiares de potenciais doadores para a doação de órgãos e tecidos (14). Quanto aos aspectos éticos, aceita-se como preceito a não discriminação de doadores e receptores quanto ao sexo, raça e religião, por parte dos enfermeiros. Os artigos 15, 17 e 18 do Código de Ética dos profissionais de Enfermagem cita que é dever do enfermeiro prestar assistência de enfermagem sem discriminação fornecendo as informações adequadas e respeitando os direitos da pessoa ou de seu representante legal, na tomada de decisões sobre sua saúde e bem-estar (15). De acordo com a portaria nº 1262, de 16 de junho de 2006 todos os hospitais com mais de oitenta leitos devem estabelecer sua comissão intra-hospitalar de transplante, que não deve ser composta por pessoas da equipe de transplante ou retirada de órgãos, nem aquelas que tenham participado do diagnóstico de morte encefálica (16). O Conselho Federal de Medicina dispõe ainda que a morte encefálica deverá ser consequência de processo irreversível e de causa conhecida; e nos traz os parâmetros clínicos a serem observados para constatação de morte encefálica: coma aperceptivo com ausência de atividade motora supra espinal e apneia (17). Após o diagnóstico de morte encefálica, o médico que presta assistência ao paciente comunica a família, explicando acerca do que esta significa e esclarecendo as dúvidas que possam surgir. Sendo assim, é muito importante que a pessoa comunique à sua família sobre o desejo de ser um doador, para que a mesma autorize a doação no momento oportuno (18). A família é o principal elemento para que esse processo ocorra de forma clara e efetiva, uma vez que um familiar bem informado é capaz de promover discussão com amigos e outros familiares, o que representa por si só um mecanismo facilitador da doação (8).

CONSIDERAÇÕES FINAIS Denota-se que no Brasil, apesar do aumento no número de transplantes e doação de órgãos, ainda existe uma enorme diferença entre a lista de espera e o número de doadores. Isto decorre principalmente de fatores religiosos, educacionais, culturais, de diagnóstico médico e de critérios utilizados para distribuição de órgãos. Diante do exposto, uma vez que as leis que dispõem sobre a doação e transplante de órgãos no Brasil colocam a família como principal responsável por este processo, é de fundamental importância o preparo profissional para a comunicação do enfermeiro com as famílias, desmistificando os fatores de recusa; bem como a sua participação no esclarecimento acerca da morte encefálica, tendo em vista a importância que o transplante e a doação de órgãos possuem como salvadores de vidas humanas. Nesse contexto, este estudo possibilitou uma reflexão acerca da temática, visto que se trata de um tema de suma relevância que orienta a atuação de estudantes e profissionais da área da saúde. REFERÊNCIAS 1. Ministério da Saúde [homepage na Internet]. Produção de transplantes de 2001 a 2006 [acesso em 15 fev 2012]. Disponível em: http://www.saude.gov.br. 2. Martin C. [homepage na Internet]. Doações e transplantes de órgãos [acesso em 15 fev 2012]. Disponível em: http://www.almacarioca.net. 3. Galvão FHF, Caires RA, Azevedo-Neto RS, Mory EK, Figueira ERR, Otsuzi TS, et al. Conhecimento e opinião de estudantes de medicina sobre doação e transplante de órgãos. Rev Assoc Med Bras. 2007;53(5):401-6. 4. Silveira PVP, Silva AA, Oliveira ACS, Alves AJ, Quaresemin CR, Dias CM, et al. Aspectos éticos da legislação de transplante e doação de órgãos no Brasil. Rev Bioét. 2009;17(1):61-75. 5. Darcanchy MV. [homepage na Internet]. Doação presumida no transplante de órgãos como medida de inclusão social [acesso em 16 fev 2012]. Disponível em: http://www.academus.pro.br. 6. Brasil. Lei n. 9.434 de 04 de fevereiro de 1997. Regulamenta a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 26 jun. 1986. Seção 1; p. 9.273-75. 7. Brasil. Lei n. 10.211 de 23 de março de 2001. Altera dispositivos da Lei n 9.434/97. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 24 mar. 2001. Seção 1; p. 10. 8. Moraes EL, Massarollo MCKB. Recusa de doação de órgãos e tecidos para transplante relatados por familiares de potenciais doadores. Acta Paul Enferm. 2009;22(2):131-5.

9. Mattia AL, Rocha AM, Freitas Filho JPA, Barbosa MH, Rodrigues MB, Oliveira MG. Análise das dificuldades no processo de doação de órgãos: uma revisão integrativa da literatura. Rev Bioethikos. 2010;4(1):66-74. 10. Gil AC. Como elaborar um projeto de pesquisa. 4ª ed. São Paulo: Atlas; 2002. 11. Cicolo EA, Roza BA, Schirmer J. Doação e transplante de órgãos: produção científica da enfermagem brasileira. Rev Bras Enferm. 2010;63(2):274-8. 12. Brasil. Lei n. 5.479 de 10 de agosto de 1968. Dispõe sobre a retirada e transplante de tecidos, órgãos e partes de cadáver para finalidade terapêutica e científica e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 11 ago. 1968. Seção 1; p. 7177. 13. Brasil. Lei n. 8.489 de 18 de novembro de 1992. Dispõe sobre a retirada e transplante de tecidos, órgãos e partes do corpo humano, com fins terapêuticos e científicos e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 20 nov. 1992. Seção 1; p. 16074. 14. Dalbem GG, Caregnato RCA. Doação de órgãos e tecidos para transplante: recusa das famílias. Texto Contexto Enferm. 2010; 19(4):728-35. 15. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução n. 311 de 08 de fevereiro de 2007. Aprova a reformulação do Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem. Rio de Janeiro 2007. 16. Brasil. Portaria n. 1.262 de 16 de Junho de 2006. Aprova o Regulamento Técnico para estabelecer as atribuições, deveres e indicadores de eficiência e do potencial de doação de órgãos e tecidos relativos às Comissões Intra-hospitalares de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 16 jun. 2006. Seção 1; p. 41. 17. Brasil. Conselho Federal de Medicina. Resolução n. 1.480 de 08 de Agosto de 1997. Dispõe sobre a constatação e documentação de morte encefálica e retirada de órgãos. Rio de Janeiro 1997. 18. Rech TH, Rodrigues Filho EM. Entrevista familiar e consentimento. Rev Bras Ter Intensiva. 2007;19(1):85-89.