P.º CP 100/2008 SJC-CT- Apresentação por telecópia extravio consequências. PARECER Relatório 1.., solicitador, vem junto do Sector de Acção Inspectiva e Disciplinar do IRN, I.P. solicitar que na apresentação dos registos cancelamento de inscrição de usufruto e conversão em definitivo de registo provisório de hipoteca voluntária que versam sobre o prédio n.º./19890406, da freguesia de. seja considerada a data de 12/11/2008. 1.1. Invoca, para o efeito, que, em 12/11/2008, enviou por telecópia a requisição e os documentos relativos aos registos atrás referidos, e que, não tendo recebido os comprovativos das apresentações, solicitou, por telecópia enviada à Conservatória competente, em 14/11/2008, a remessa dos mesmos. 1.2. Depois de ter sido informado de que não tinham sido recebidos os pedidos de registo, veio o interessado expor o assunto ao SAID, primeiro por e-mail, de 17/11/2008, de que deu conhecimento à Conservatória 1, e, depois, por carta, de 20/01/2009, dando conta de toda a correspondência enviada à Conservatória e juntando cópia do relatório de envio emitido pelo seu aparelho de telecópia, do qual consta o número de fax do serviço destinatário, a data e a hora do envio, e o sinal de Ok, indicativo do envio sem anomalias. 2. Instada a pronunciar-se, veio a Sra. Conservadora informar que não foram recebidos quaisquer registos por telecópia no dia 12/11/2008 e que se mostra inverosímil o extravio na Conservatória das 26 folhas que o Sr. Solicitador afirma ter enviado, pelo que a única explicação que encontra para o não recebimento do registo por telecópia assenta no facto de, no mesmo dia 12/11/2008, ter havido 1 Na sequência do conhecimento da exposição enviada ao SAID, da qual constavam a requisição de registo e os documentos respectivos, e, certamente, para evitar maior prejuízo ao interessado, a conservatória procedeu à anotação dos pedidos no diário, considerando, para o efeito, a data e a hora daquele conhecimento, recebido por telecópia em 17/11/2008. 1
uma substituição do equipamento de fax e, com isso, poder ter ocorrido qualquer problema técnico. *** Considerando a pretensão do interessado, no sentido de que os pedidos de registo ingressem na ficha com a data de 12/11/2008, por ser aquela que corresponde à data do envio, vem a questão submetida à apreciação do Conselho Técnico, em sessão conjunta com o sector do registo comercial, para emissão de parecer ou deliberação. Pronúncia 1. Em face do disposto nos artigos 41.º-B e 41.º-C, n.º 2, do CRP, introduzidos pelo Decreto-Lei n.º116/2008, de 4 de Julho, o pedido de registo predial efectuado por advogados, câmaras de comércio e indústria, notários e solicitadores pode ser enviado por telecópia, nos termos de portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça. 1.1. Dos termos da realização do pedido de registo predial por telecópia regulamentados pela Portaria n.º 621/2008, de 18 de Julho, destacam-se, pela sua especialidade, o dever de indicação da conformidade dos documentos transmitidos com o respectivo original, as formalidades de identificação do utilizador, designadamente a aposição da assinatura e do carimbo do advogado, notário, solicitador ou representante da câmara de comércio e indústria que subscreve o pedido, as regras para prova do pagamento das quantias devidas e o dever de manutenção em arquivo dos originais do requerimento e dos documentos transmitidos (artigo 6.º). 1.2. Sendo que, após o recebimento do pedido pelo serviço de registo, seguir-se-ão os termos legalmente previstos para o processo de registo, de onde resulta que a apresentação que tenha sido recebida na conservatória por meio de telecópia e que não deva ser rejeitada, nos termos do disposto no artigo 66.º do CRP, deverá ser anotada no diário pela ordem fixada no artigo 60.º, n.º3, do CRP e dará lugar à 2
emissão do comprovativo previsto no artigo 64.º do CRP, do qual devem constar a identificação do apresentante, o número de ordem, a data e a hora da apresentação, o facto, os documentos e as quantias entregues. 2. Pode acontecer, todavia, que o pedido de registo por telecópia não chegue a dar entrada na Conservatória, por falha técnica ou inoperacionalidade do equipamento ou por quaisquer outros incidentes de fiabilidade do sistema, assim como se pode perspectivar uma anomalia no fluxo de transmissão que não permita a coincidência entre a data e hora de envio e a data e hora da recepção, frustrando-se, deste modo, a expectativa de consecução do pedido ou da prioridade pretendida pelo interessado. 2.1. Faltam, no entanto, normas legais que prevejam estas hipóteses ou que directamente apontem a solução para os problemas daí decorrentes, pelo que, no caso em apreço, podendo estar em causa uma inoperacionalidade momentânea do equipamento, importa sobretudo pôr em relevo os princípios enformadores do registo predial, e apurar em que medida poderão os mesmos articular-se com a confiança do interessado na existência de condições técnicas para a utilização efectiva das tecnologias na sua relação com os serviços. 2.1.1. Como resulta do artigo 1.º do CRP, o registo predial destina-se a dar publicidade à situação jurídica dos prédios, tendo em vista a segurança do comércio jurídico imobiliário, e é precisamente em torno deste escopo essencial de segurança jurídica que gravitam os demais princípios que compõem o nosso sistema de registo e, concretamente, todas as regras legais relativas ao exercício da instância, ao processo de registo, à sua feitura e aos seus efeitos. 2.1.2. Assim, os pedidos de registo devem ser cronologicamente ordenados, mediante anotação no diário, em suporte informático, existente nos serviços de registo (artigos 22.º, alínea a), 60.º, 61.º e 63.º, do CRP), recebendo a inscrição, averbamento ou anotação respectiva a data e a hora da apresentação (artigo 77.º do CRP), a qual fixará a prioridade do registo: o direito inscrito em primeiro lugar prevalece sobre os que se lhe seguirem relativamente aos mesmos bens, por ordem da data dos registos e, dentro da mesma data, pela ordem temporal das apresentações correspondentes (artigo 6.º, n.º1, do CRP). 3
2.1.3. A consecução daquele desiderato de segurança jurídica, que, por um lado, se traduz na definição do direito prevalecente, na relação com os demais relativamente ao mesmo prédio (artigo 6.º do CRP), e, por outro, não concebe a «incerteza» sobre a situação jurídica do prédio definida pelo registo 2, demanda, portanto, a formulação de regras claras e precisas e, sempre que possível, uma actuação pautada pela imaleabilidade da decisão e desligada de critérios de equidade ou de oportunidade ditados pelo caso concreto 3. 2.1.4. Donde, sob pena de falência da eficácia do sistema do registo predial (e comercial), não se pode admitir que o processo de registo não oficioso tenha início em data anterior à do recebimento do respectivo pedido, pois só a partir deste momento se conhece a pretensão do interessado e sobre ela se pode fixar a prioridade registral, no confronto com outros direitos sobre o mesmo objecto, e prestar informação a terceiros. 2 Tal como se refere nos Processos nº R.P. 317/2002 DSJ-CT, publicado no BRN 4/2004, II caderno, e nº R.P. 357/2003 DSJ-CT, publicado no BRN 10/2004, II caderno, a propósito da vigência do registo provisório e do direito de recorrer, respectivamente, o registo predial tem de estar preparado para responder categoricamente em cada momento à pergunta sobre se determinado registo provisório está ou não já caducado, ou à pergunta sobre se está ou não já caducado o direito de impugnar determinado despacho de recusa de registo, assim como deve estar preparado, acrescentamos agora, para responder, sem hesitações, à questão de saber quais os pedidos de registo que se acham pendentes sobre determinado prédio e a ordem respectiva. Atribuir à apresentação a data do envio, em vez da data do recebimento ou, no caso de telecópia recebida após a hora de encerramento ao público, da data do dia seguinte, seria inviabilizar aquela resposta (como se saberia que pedidos de registo andariam a circular por via postal ou se encontrariam em fluxo de transmissão através de um aparelho de fax ou de um ambiente informático?) e tirar sentido e eficácia ao sistema de registo. 3 Obviamente, depois do recebimento do pedido de registo, quaisquer omissões ou lapsos cometidos no desenvolvimento do correspondente processo que sejam imputáveis à Conservatória, designadamente, em matéria de anotação no diário, hão-de ser reparados em benefício do apresentante, pois aqui, porque já existe um concreto processo de registo, iniciado justamente com a apresentação (recebimento do pedido), e, portanto, já se «conhece», ou não se deve «ignorar», a existência do correspondente pedido, a consideração das falhas cometidas não é de molde a bulir com a concepção do sistema, antes se destinará a repor o seu regular funcionamento, fazendo prevalecer o interesse daquele que prioritariamente procurou garantir nas tábuas uma determinada posição para o seu direito (cfr. o parecer proferido no Proc. n.º 17/92 R.P.4, publicado no BRN 2/2002, II Caderno). 4
2.1.5. Cremos, por isso, que reportar a data da apresentação do registo a momento anterior ao da entrada ou recebimento do pedido seria comprometer a confiança ou a fé pública visada com a publicidade registral e imputar na esfera dos terceiros, que entretanto tenham entrado em contacto com o registo, quer no âmbito da instância de registo quer através da obtenção dos seus meios de prova, os riscos do uso das tecnologias na relação entre os interessados e a Administração. 2.2. Ao acolher as tecnologias como vias de transmissão do pedido de registo, o legislador terá, certamente, ponderado os riscos que as mesmas podem acarretar, e, no que concerne ao uso da telecópia, dado estar em causa um mecanismo de transmissão de um documento escrito por meio de impulsos eléctricos através da rede telefónica, terá equacionado a sua falta de eficiência, vista na perspectiva das falhas técnicas, do não recebimento, e de outras ocorrências excepcionais e imprevisíveis na sua utilização. 2.2.1. Contudo, não vemos declarada na letra da lei a intenção legislativa de modificar a estrutura do sistema de registo predial, ou sequer, de consentir o sacrifício dos princípios e regras registrais que garantem a eficácia do mesmo em beneficio da confiança dos interessados no funcionamento dos meios técnicos colocados ao seu dispor no relacionamento com os serviços 4. 2.2.2. A diversificação das modalidades do pedido de registo implica a dotação de cada serviço dos meios técnicos e materiais que permitam a eficácia da medida, mas, a nosso ver, não determina que não devam ficar a cargo do interessado os riscos inerentes à opção por uma modalidade do pedido que, pela sua natureza, 4 Ainda que se pudesse considerar que a apresentação ocorre com o envio e não com o recebimento do pedido na Conservatória, e já vimos que não pode, sempre ficaria por solucionar o problema do conteúdo, posto que, em caso de extravio, dificilmente se lograria provar os termos do pedido e dos documentos enviados. Neste caso, restaria sempre a repetição do acto e, eventualmente, a alegação e prova do justo impedimento no cumprimento de qualquer prazo de natureza processual que pudesse estar em causa, como, por exemplo, o prazo para cumprimento da obrigação de registar. 5
não possa garantir a chegada ao poder do destinatário, ou do seu conhecimento, na data perspectivada 5. Conclusão 6 Pelo exposto, entendemos que, no caso em apreço, o pedido de registo só pode ser atendido a partir do momento da sua entrada na Conservatória, pois só no momento do seu recebimento se considera feita a apresentação e se tem por iniciado o processo de registo 7. 2009. Parecer aprovado em sessão do Conselho Técnico de 27 de Fevereiro de Maria Madalena Rodrigues Teixeira, relatora, Maria Eugénia Cruz Pires dos Reis Moreira, Luís Manuel Nunes Martins, Isabel Ferreira Quelhas Geraldes, António Manuel Fernandes Lopes, João Guimarães Gomes Bastos, Ana Viriato Sommer Ribeiro, Carlos Manuel Santana Vidigal, José Ascenso Nunes da Maia. 5 Perante as modalidades do pedido colocadas ao dispor dos interessados, só a estes cabe ponderar da valia de cada uma delas no exercício do acesso ao registo e, nomeadamente, do encargo que podem representar, por exemplo, as perdas ou extravios postais e os incidentes técnicos que pontualmente possam ocorrer no funcionamento do equipamento de telecópia ou no meio informático, na certeza de que, seja qual for a via escolhida, o pedido de registo não pode produzir efeitos enquanto não chegar à esfera de conhecimento do seu destinatário. 6 Cingimo-nos aqui às questões de direito, procurando analisar o problema a que se refere a exposição feita ao SAID na perspectiva do funcionamento do sistema de registo predial, sem curar de recolher quaisquer elementos documentais, ou de outra natureza, que infirmem o relatório de envio ou confirmem a informação de extravio, posto que nos parece não ser esta a sede própria, nem ser este o órgão competente para o efeito. 7 Faz-se notar que, no caso em apreço, não haverá, do ponto de vista tabular, qualquer prejuízo para o interessado, dada a natureza dos registos em causa (conversão de registo provisório, apresentado em 2008/10/27, e cancelamento de inscrição de usufruto por renúncia) e posto que entre a data de 12/11/2008 (data de envio alegada nos autos) e a data da anotação da apresentação dos registos em causa (17/11/2008, na sequência do recebimento do conhecimento da exposição ao SAID) não foram apresentados quaisquer registos sobre o mesmo prédio (cfr. a ficha de registo junta ao processo). 6
Este parecer foi homologado pelo Exmo. Senhor Presidente em 17.03.2009. 7