Melhora dos limiares de sensibilidade do campo visual após redução da pressão intra-ocular em pacientes com glaucoma: tratamento cirúrgico vs.

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Transcrição:

Melhora dos limiares de sensibilidade do campo visual após redução da pressão intra-ocular em pacientes com glaucoma: tratamento cirúrgico vs. clínico Improvement in glaucomatous visual field thresholds after reduction of intraocular pressure: clinical vs. surgical treatment Leopoldo Magacho 1 Carlos Frederico Queiroz 2 Mariele Medeiros 3 Francisco Eduardo Lima 4 Bernardo Magacho 5 Marcos Ávila 6 RESUMO Objetivo: Comparar a influência do tipo de tratamento em diferentes regiões do campo visual glaucomatoso após redução da pressão intraocular (Pio). Métodos: Pacientes com glaucoma que obtiveram redução da Pio de pelo menos 20% em um período de 2 meses foram retrospectivamente selecionados e divididos em 2 grupos: 1) após trabeculectomia; 2) após tratamento clínico. Índices do campo visual e os limiares de sensibilidade (totais, e divididos de acordo com a gravidade no gráfico do "Pattern Deviation") foram anotados imediatamente antes e após a redução da Pio, comparados entre os grupos, e dentro dos mesmos. Resultados: Trinta e um olhos de 22 pacientes foram incluídos no estudo (15 no grupo 1, e 16 no grupo 2). Ambos os grupos demonstraram alta habilidade na melhora de regiões do campo visual após a redução da Pio. Apenas a porcentagem da redução da Pio (52,3±18,9% e 37,8±15,2% para os grupos 1 e 2, respectivamente, p=0,02) e a porcentagem de melhora nos pontos lesados a 0,5% (186,0±213,3% e 30,1±35,2% para os grupos 1 e 2, respectivamente, p=0,02) foram diferentes entre os grupos, porém sem significância após correção do erro alfa. Conclusão: A redução da Pio acima de 20% pode estar associada à melhora em regiões do campo visual glaucomatoso, independente da modalidade de tratamento. Descritores: Pressão intra-ocular; Glaucoma; Perimetria; Tonometria ocular; Estudos retrospectivos; Resultado de tratamento Trabalho realizado no Centro de Referência em Oftalmologia (CEROF) Universidade Federal de Goiás - UFG - Goiânia (GO) - Brasil. 1 Doutor em Oftalmologia pela Universidade de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP) - Brasil. 2 Ex-fellow do Setor de Glaucoma do CEROF da UFG - Goiânia (GO) - Brasil. 3 Ex-fellow do Setor de Glaucoma do CEROF da UFG - Goiânia (GO) - Brasil. 4 Doutor em Oftalmologia pela Universidade de São Paulo - USP - São Paulo (SP). 5 Residente do CEROF da UFG - Goiânia (GO) - Brasil. 6 Professor Doutor e Chefe do CEROF da UFG - Goiânia (GO) - Brasil. Endereço para correspondência: Leopoldo Magacho. Rua 131, nº 313 - Setor Sul - Goiânia (GO) CEP 74093-200 E-mail: lmagacho@brturbo.com Recebido para publicação em 04.04.2005 Versão revisada recebida em 01.08.2005 Aprovação em 06.11.2005 INTRODUÇÃO O glaucoma é caracterizado por dano progressivo e irreversível ao disco óptico e camada de fibras nervosas da retina (CFNR). A pressão intraocular (Pio) pode ser considerada como o principal fator de risco para o glaucoma (1), e sua redução como o único meio efetivo de tratamento (2), incluindo pacientes com glaucoma de pressão normal (3). Estudos têm demonstrado melhora na CFNR (4-5), no aspecto do disco óptico (6-8) e no campo visual glaucomatoso (8-14) após a redução da Pio após a trabeculectomia. Portanto, é racional sugerir que a redução medicamentosa da Pio também conduziria a uma melhora destas estruturas. O objetivo deste estudo é verificar a influência da modalidade de tratamento nos limiares de sensibilidade do campo visual glaucomatoso após a redução da Pio.

52 Melhora dos limiares de sensibilidade do campo visual após redução da pressão intra-ocular MÉTODOS Este foi um estudo retrospectivo. Os prontuários de todos os pacientes glaucomatosos avaliados por um dos autores (FEL) em um período de 2 meses (janeiro e fevereiro de 2001) com história de redução da Pio em no mínimo 20% foram considerados. Além disso, era necessário pelo menos 3 exames de campo visual anteriores ao tratamento. Os pacientes foram subseqüentemente divididos em dois grupos: redução cirúrgica (RC) e redução medicamentosa (RM) da Pio. Os critérios de inclusão para ambos os grupos foram: pacientes com diagnóstico de glaucoma primário de ângulo aberto (GPAA) (Pio > 21 mmhg, aferida com tonômetro de Goldmann, gonioscopia evidenciando ângulo aberto (15), e neuropatia óptica glaucomatosa, definida como a presença de perda localizada ou global da rima neural, hemorragia de disco óptico ou assimetria escavação/disco > 0,2). Além disso, um defeito glaucomatoso característico no campo visual glaucomatoso (16) precisava estar presente em no mínimo dois exames confiáveis (17) Sita Standard 24-2 (Humphrey Systems, Dublin, CA, EUA) antes da redução da Pio. Olhos afácicos e pseudofácicos e pacientes de ambos os grupos que apresentaram qualquer alteração biomicroscópica ou fundoscópica que pudesse interferir com os exames (opacidades corneanas, cataratas significantes (18), alterações maculares, etc) foram excluídos. Apenas pacientes com trabeculectomia primária simples (sem facectomia associada) foram incluídos. O procedimento foi executado por um único e experiente cirurgião (FEL) com base limbo, retalho escleral triangular e mitomicina C 0,5 mg/ml por 3 minutos. Os pacientes cirúrgicos foram excluídos se houvesse qualquer complicação, como hipotonia (definida no presente estudo como Pio < 6 mmhg em qualquer avaliação pós-operatória), perda vítrea, descolamento de retina ou coróide. No grupo RC os pacientes foram excluídos caso a pressão alvo não tenha sido atingida sem auxílio medicamentoso. No grupo RM todas as drogas foram consideradas, com exceção à pilocarpina. Os dados foram analisados pelo software SPSS (SPSS Inc, Chicago, IL, EUA) versão 10.1. Dois campos visuais consecutivos, o último antes da redução da Pio e o primeiro após, com intervalo de não mais que 6 meses do tratamento foram incluídos na análise. Os índices globais do campo visual "Mean Deviation" (MD) e "Pattern Standard Deviation" (PSD) e os valores dos limiares (médias) no gráfico do "Pattern Deviation" (PD) foram comparados entre os grupos. Além disso, em uma segunda análise, foi realizado subdivisões, considerando os pontos do gráfico PD como: normal (melhor que 5% no PD), alterado (todos os pontos alterados 5%), pontos de 2% e 5%, pontos de 1% e 0,5% e apenas pontos de 0,5% (médias dos valores de cada subgrupo) para testar se havia alguma diferença na melhora do campo visual de acordo com a severidade do campo visual. A análise dos grupos foi feita ponto-aponto tendo como base as regiões lesadas no campo visual antes da redução da Pio. Dessa forma, esses pontos eram mantidos naquele subgrupo, independentemente da sua classificação estatística após a redução da Pio, tornando a análise mais fidedigna. Isso ocorreu porque um determinado ponto poderia melhorar ou piorar após tratamento, saindo do seu grupo inicial. O teste de Komogorov-Smirnov foi utilizado para se testar a normalidade das amostras (distribuição Gaussiana ou não). Os grupos foram comparados com o teste t de Student independente. A porcentagem da melhora para todos os valores foi comparada pelo mesmo teste. O teste T pareado foi usado para comparar os índices do campo visual entre os grupos. Finalmente, a correlação de Pearson foi utilizada para testar a correlação entre a porcentagem da redução da Pio e a porcentagem da melhora do campo visual nos grupos. A correção do erro alfa foi realizada segundo o modelo proposto por Cross e Chaffin (19). Dessa forma, valores de p menores que 0,0125 foram considerados significantes para os cálculos entre os grupos e p<0,02 para cálculos dentro dos grupos. Nos dados categóricos, p<0,05 foi considerado como estatisticamente significativo. Ao se considerar o erro alfa acima, a diferença das médias a ser detectada de 1, bem como o seu desvio padrão, o poder do teste foi de 60% para os cálculos entre grupos e de 63% dentro dos mesmos. RESULTADOS Trinta e um olhos de 22 pacientes foram incluídos no estudo (15 no grupo RC e 16 no grupo RM). Não houve exclusão de qualquer paciente no grupo cirúrgico. A idade média do grupo RM (66,7±11,8 anos) foi significativamente maior do que o grupo RC (57,9±8,7 anos, p=0,02). Os dados do campo visual, com as comparações entre os grupos antes e depois da redução da Pio estão dispostos na tabela 1. Ambos os grupos demonstraram melhora em vários parâmetros do campo visual após a redução da Pio (Tabela 2). Comparando os grupos em relação à porcentagem da redução dos índices globais do campo visual, e a porcentagem da melhora dos pontos do PD, apenas a redução da Pio e a melhora dos pontos 0,5% mostraram inicialmente diferença estatística, o que não aconteceu após correção do erro alfa (Tabela 3). A correlação de Pearson mostrou que apenas a porcentagem de melhora nos pontos 1% e 0,5% foram estatisticamente correlacionadas com a porcentagem de redução da Pio no grupo RC (r=0,772, p=0,01). Nenhuma variável foi correlacionada com a redução da Pio no grupo RM (Tabela 4). DISCUSSÃO Apesar do reconhecimento de que a Pio é apenas um fator de risco para o glaucoma, sua redução ainda é considerada essencial no controle da doença. Estudos têm demonstrado melhora dos tecidos oculares após a redução da Pio em pacientes com glaucoma e em diferentes regiões do campo visual (4-14,20-21). É importante enfatizar, entretanto, que todos os estudos foram baseados na trabeculectomia como o método

Melhora dos limiares de sensibilidade do campo visual após redução da pressão intra-ocular 53 Tabela 1. Dados do campo visual em ambos os grupos Grupo* Antes da redução da Pio P* Após a redução da Pio P* MD (db) RC -8,9±09,1 0,1-7,8±09,3 0,3 RM -4,9±03,8-4,9±04,2 PSD (db) RC 5,2±03,2 0,4 4,2±02,6 0,9 RM 4,5±02,6 4,1±02,7 Pio (mmhg) RC 26,2±08,1 0,1 11,3±02,9 0,2 RM 21,6±07,1 12,5±01,8 Todos os pontos lesados (db) RC 16,1±09,7 0,4 20,1±10,2 0,7 RM 18,3±04,6 21,1±05,4 Pontos sem lesão (db) RC 21,6±08,5 0,1 21,9±08,8 0,2 RM 25,1±02,1 24,5±02,7 Pontos lesados a 2 e 5% (db) RC 16,8±08,3 0,2 20,1±09,9 0,4 RM 19,6±03,9 22,4±05,1 Pontos lesados a 1 e 0,5% (db) RC 13,5±08,8 0,1 17,7±10,6 0,4 RM 18,3±06,1 20,5±07,1 Pontos lesados a 0,5% (db) RC 12,0±10,0 0,5 18,7±08,2 0,9 RM 14,3±06,5 18,4±08,6 Tempo em meses entre o RC 1,3±00,6 <0,001 4,6±00,8 0,6 campo visual e a redução da Pio RM 3,5±01,8 4,5±00,9 * Teste t de Student Independente Tabela 2. Comparação das variáveis do campo visual após a redução da Pio nos grupos RC* RM* MD (db) 0,002 0,9 PSD (db) 0,06 0,2 Pio (db) <0,001 0,001 Todos os pontos lesados (db) 0,003 0,004 Pontos sem lesão (db) 0,4 0,07 Pontos lesados a 2 e 5% (db) <0,001 0,006 Pontos lesados a 1 e 0,5% (db) 0,001 0,1 Pontos lesados a 0,5% (db) 0,04 0,02 * Teste de t pareado de redução da Pio. Entretanto, este procedimento cirúrgico não é empregado em todo paciente com glaucoma que necessita controle da Pio. A redução medicamentosa da Pio é provavelmente o método mais utilizado. Portanto, torna-se fundamental avaliar sua influência nos tecidos que são lesados no glaucoma. Em nosso estudo, os resultados dos campos visuais foram estatisticamente similares entre os grupos. Conseqüentemente, acreditamos que estamos simplesmente comparando ambos os grupos em relação à modalidade de tratamento e também segundo a redução da Pio, estatisticamente diferente entre os grupos (Tabela 3). A melhora no campo visual após trabeculectomia (média de redução da Pio: 47,5% nos campos que demonstram melhora contra 40,0% naqueles sem melhora, p=0,7) é maior nas regiões com os menores níveis de sensibilidade antes da redução da Pio (13). Esses autores também postularam que os subgrupos com os melhores níveis de sensibilidade estão associados com células ganglionares predominantemente sadias, e conseqüentemente a probabilidade de melhora é menor. No presente estudo, a redução da Pio de 52,3±18,9% no grupo RC e 37,8±15,2% no grupo RM foi associada com a melhora nos pontos do campo visual com dano prévio (Tabela 2, p=0,03 e p=0,04, respectivamente), entretanto não significativo após a correção alfa. Somando-se a isto, ambos os grupos demonstraram melhora em regiões do campo visual com diferentes níveis de sensibilidade (Tabela 2). Entretanto, Salim et al. tinham categorizado os campos visuais de acordo com os pontos com sensibilidade maiores (25%), menores (25%) e intermediários (50%) (13). É possível existir campos visuais severos em que os níveis mais altos de sensibilidade estão classificados como 1% ou 0,5%. Além disso, é possível a existência de campos visuais iniciais em que os níveis menores que 25% estariam danificados, em média, a 5%. Portanto, uma classificação de limiares que utiliza o mapa de probabilidade do Humphrey, como utilizado no presente estudo, ilustraria uma idéia mais precisa do dano real às células ganglionares. Além disso, é possível que diferentes métodos de análise de progressão do campo visual pudessem gerar resultados variados, como já demonstrado anteriormente (22). Dessa forma, a análise ponto-a-ponto tendo como base a manutenção original dos pontos no campo visual lesado antes da redução da Pio exclui essa possível fonte de viés. Em um estudo clínico multicêntrico randomizado (Collaborative Initial Glaucoma Treatment Study) avaliou a longo prazo pacientes submetidos à redução da Pio pela trabeculectomia ou tratamento clínico e os comparou (23). O campo visual não diferenciou muito do início do tratamento. Apesar da maior perda de campo visual inicial do grupo cirúrgico (principalmente pelo surgimento ou piora da catarata), essa diferença não foi encontrada após cerca de 5 anos de acompanhamento. É possível que a forma de análise de progressão do campo

54 Melhora dos limiares de sensibilidade do campo visual após redução da pressão intra-ocular Tabela 3. Comparação da porcentagem de melhora dos limiares de sensibilidade em diferentes áreas do campo visual Porcentagem de: Grupo (%) p* Redução da Pio RC 52,3±018,9 0,02 RM 37,8±015,2 Redução no MD RC 25,1±025,3 0,1 RM 8,7±037,6 Redução no PSD RC 10,5±035,6 0,9 RM 9,2±024,7 Melhora em todos os pontos lesados RC 40,8±044,1 0,07 RM 16,1±019,6 Melhora em todos os pontos estatisticamente normais RC 1,99±007,1 0,05 RM -2,5±005,0 Melhora nos pontos lesados a 2% e 5% RC 19,9±012,2 0,3 RM 14,2±016,9 Melhora nos pontos lesados a 1% e 0,5% RC 46,1±050,3 0,2 RM 19,1±044,4 Melhora nos pontos lesados a 0,5% RC 186,0±213,3 0,02 RM 30,1±035,2 Considerando a média dos valores; * Teste t de Student Independente Tabela 4. Correlação entre a porcentagem de redução da pressão intra-ocular e a porcentagem de melhora de áreas do campo visual com diferentes limiares de sensibilidade Correlação Porcentagem de: Grupo de Pearson p Redução no MD RC 0,124 0,6 RM -0,153 0,5 Redução no PSD RC -0,123 0,6 RM 0,352 0,1 Melhora em todos RC 0,408 0,1 os pontos lesados RM -0,186 0,4 Melhora em todos os pontos RC 0,110 0,6 estatisticamente normais RM -0,308 0,2 Melhora nos pontos RC 0,369 0,2 lesados a 2% e 5% RM -0,111 0,6 Melhora nos pontos RC 0,772 0,01 lesados a 1% e 0,5% RM 0,301 0,3 Considerando a média dos valores visual, como comentado anteriormente, seja responsável por essas diferenças em relação ao presente estudo. No presente estudo, ambos os grupos mostraram melhora em pontos do campo visual com diferentes limiares de sensibilidade (Tabela 2). A única exceção foram os pontos lesados a 1% e 0,5% no grupo RM. Uma possível explicação está relacionada com o n da amostra estudada, diminuindo o poder do teste. Na média, todos os pontos mostraram uma melhora significante dos limiares de sensibilidade após a trabeculectomia. Acreditamos que a falta de diferença estatística está relacionada com o tamanho da amostra do teste. A melhora foi melhor verificada nos pontos mais lesados (1% e 0,5%), os únicos que tiveram alta correlação com a redução da Pio no grupo RC (r=0,772, p=0,01). Possivelmente amostras maiores esclareceriam a real importância da porcentagem da redução da Pio na redução dos limiares do campo visual em pacientes glaucomatosos. Um outro fator de confusão pode estar relacionado ao uso de medicações, já que, freqüentemente após a cirurgia, o paciente utiliza uma quantidade menor de medicações antiglaucomatosas. Os efeitos colaterais destas medicações, em particular a pilocarpina, podem ser responsáveis por visão borrada e redução de sensibilidade do campo visual (24). Entretanto, usuários de pilocarpina foram excluídos da análise, e outras medicações geralmente não reduzem o tamanho pupilar. Além disso, a própria trabeculectomia pode ter efeito na sensibilidade do campo visual. Uma possível formação de catarata após a trabeculectomia pode ser responsável por alterações nos limiares do campo visual. Apesar de termos utilizado o "Pattern Deviation" em nossa análise, que pode filtrar a influência da catarata no campo visual, a influência da opacidade de meios pode influenciar outros parâmetros avaliados, como o MD (17). Outra limitação do estudo foi a restrição da análise a apenas dois campos visuais por paciente. Flutuações em longo prazo e efeito aprendizado podem também influenciar os limiares do campo visual. Uma análise comparativa de vários campos visuais poderia limitar este tipo de viés. CONCLUSÃO Pode-se concluir que a redução da Pio pode estar associada à melhora dos limiares alterados do campo visual, independente da modalidade do tratamento. Maiores níveis de redução da Pio pode estar relacionado à melhora nos pontos com menores níveis de sensibilidade em pacientes com glaucoma. Estudos prospectivos com uma amostra maior são necessários para se confirmar os resultados aqui encontrados. ABSTRACT Purpose: To verify the influence of modality of treatment in regions of the glaucomatous visual field after reduction of

Melhora dos limiares de sensibilidade do campo visual após redução da pressão intra-ocular 55 intraocular pressure (IOP). Methods: Glaucoma patients that had undergone a reduction of IOP of at least 20% in a period of 2 months were retrospectively selected and divided into 2 groups: 1) after trabeculectomy; 2) after clinical treatment. Visual field global indices and thresholds (average, divided according to the severity based on the Pattern Deviation plot) were compared before and after IOP reduction. Results: Thirty-one eyes of 22 patients were selected (15 in group 1, and 16 in group 2). Both groups showed good ability regarding improvement of different regions of the visual field after IOP reduction. Only the percentage of reduction of IOP (52.3±18.9% and 37.8±15.2% for groups 1 and 2, respectively, p=0.02) and the percentage of improvement in the points damaged at p<0.5% (186.0±213.3% and 30.1±35.2% for groups 1 and 2, respectively, p=0.02) were different, but not statistically significant after alpha error correction between groups. Conclusion: The reduction of IOP above 20% may be associated with improvement in regions of the glaucomatous visual field, regardless of treatment modality. Keywords: Intraocular pressure; Glaucoma; Perimetry; Tonometry, ocular; Retrospective studies; Treatment outcome REFERÊNCIAS 1. Sommer A, Tielsch JM, Katz J, Quigley HA, Gottsch JD, Javitt J, Singh K. Relationship between intraocular pressure and primary open angle glaucoma among white and black Americans. The Baltimore Eye Survey. Arch Ophthalmol. 1991;109(8):1090-5. 2. The Advanced Glaucoma Intervention Study (AGIS): 7. 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