XIII Congresso Brasileiro de Engenharia de Pesca (21-25/09/2003) Porto Seguro/BA. 25 ESTRATÉGIAS DE UTILIZAÇÃO DE AMBIENTES AQUÁTICOS EM COMUNIDADES RIBEIRINHAS DO MÉDIO RIO SOLIMÕES Renato Soares Cardoso 1 ; Antônio José Inhamuns da Silva 2 ; Márcia Melo Ramos + ; Henrique dos Santos Pereira Ø Project PIATAM, developed for the Universidade Federal do Amazonas in set with institutions of education and research, has as objective, to develop evaluation and relieve studies of potential damages that could be caused by the transport of oil and gas in the stretch enters the city of Coari and Manaus. In this context, the agricultural producers living of the margin of the rivers in question include themselves. The majority of environments inhabited for them are of várzea, who are adjacent areas to the river and that frequently are flooded by the rise of the level of its waters. These communities in result of possible accidents in the transport oil and gas, can suffer with the actual damages for exactly, having this in sight, the present work aimed at to identify to standards of use of aquatic environments for the inhabitants of these communities, identifying its main strategies of use of the aquatic environment. Leaving of information supplied for the Capitania dos Portos of the State of Amazon, of the analysis of images of satellites and cartographic maps, had been selected five communities, located next the stretches to the Solimões River that present difficulties to the navigation. To leave of this, information about fisheries had been collected bimonthly, through of questionnaires with information that had turned on the captured species, local of fisheries, gear, period of capture and destination of the production. The collected data had been submitted the descriptive statistics, for calculation of average, standard deviation and frequency of occurrence. Were applied 56 questionnaires in the familiar units, being collected about 483 information about fisheries, with a total of 44 species of fish cited as captured. Five were the most exploited in the communities, tucunaré (Cichla spp), curimatã (Prochilodus nigricans), carás (some Geophagos), s (Myleus, Mylenidae) and (Pseudoplatystoma fasciatum). A total of seven fisheries environments were identified for the communities at the period of drought, being distinguished it bigger use of the environments river and lake. During the full, they had more identified to six environments, being the lake used in way generalized in all the communities. Sell of product of fisheries was observed for four of the five studied communities. The community of Santa Luzia is the only one of the studied ones not to present commercialization. 1 Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Secretaria de Pós-Graduação da CPBA. Avenida André Araújo, 2936. Petrópolis, 69011-970. Manaus Amazonas. E-mail: rsconpisci@yahoo.com.br Universidade Federal do Amazonas - UFAM/FCA 2 Av. Gal Rodrigo Otávio J. Ramos, 3000, Campus Universitário, 69070-000. Manaus-Amazonas. E-mail: asilva@ufam.edu.br Mestrando INPA. Bolsista CNPq. Professor Adjunto, Faculdade de Ciências Agrárias DEPESCA. Universidade Federal do Amazonas. + Acadêmica de Engenharia de Pesca Universidade Federal do Amazonas. Ø Professor Adjunto, Faculdade de Ciências Agrárias DCFDA. Universidade Federal do Amazonas.
XIII Congresso Brasileiro de Engenharia de Pesca (21-25/09/2003) Porto Seguro/BA. 26 INTRODUÇÃO No Estado do Amazonas, a exploração petrolífera está localizada no município de Coari. O transporte deste produto é feito exclusivamente por via fluvial, utilizando-se navios e barcaças, estando estes suscetíveis a acidentes em vários trechos de risco à navegação. No caso de derramamento de petróleo no rio Solimões, principal curso utilizado no transporte, as populações ribeirinhas que ocupam as áreas das margens e das planícies de inundação desse rio e de seus afluentes estão entre as mais vulneráveis. O Projeto PIATAM, desenvolvido pela Universidade Federal do Amazonas em conjunto com instituições de ensino e pesquisa, tem como objetivo, desenvolver estudos de avaliação e mitigação de potenciais danos que poderão ser causados pelo transporte de petróleo e gás no trecho compreendido entre o município de Coari e Manaus. Neste contexto, incluem-se os produtores rurais moradores das margens dos rios e que são comumente denominados de ribeirinhos, estes na maioria das vezes estão agregados em comunidades (Fraxe, 2000). Devido ao seu local de moradia, seu modo de vida e seus meios de produção estão intimamente ligados à subida e descida do nível dos rios. Este fenômeno natural, particularmente na região, corresponde a um ciclo anual com quatro períodos distintos denominados: vazante, seca, enchente e cheia. A maioria dos ambientes habitados é de várzea, que são áreas adjacentes ao rio e que são freqüentemente alagadas ou não pela subida dos mesmos na Amazônia. Tendo em vista esta proximidade, e a vulnerabilidade dos mesmos a eventuais sinistros em conseqüência do transporte de petróleo nessa região, o presente trabalho visou identificar padrões e estratégias de uso dos ambientes aquáticos, para a prática da pesca pelos moradores das comunidades localizadas neste trecho, visando a utilização destes resultados para a elaboração de planos de contingência. MATERIAL E MÉTODOS Partindo de informações fornecidas pela Capitania dos Portos do Estado do Amazonas, da análise de imagens de satélites e mapas cartográficos, foram previamente selecionadas cinco comunidades, localizadas próximas a trechos do rio Solimões que apresentam dificuldades à navegação e podem ser potenciais locais de ocorrência de acidentes envolvendo navios transportadores de petróleo e gás natural. Essas comunidades também foram representativas da maioria dos ambientes terrestres e aquáticos existentes no trecho citado. Área de estudo Compreendeu o trecho do rio Solimões e ambientes adjacentes, por onde é efetuado o transporte de petróleo e gás natural. Das cinco comunidades selecionadas (Tabela 01), quatro delas estão localizadas na calha principal do rio Solimões (áreas de várzea), apenas a comunidade de Santa Luzia tem seus ambientes inteiramente em terra firme, localizada no lago de Coari, próxima a um ponto do gasoduto denominado P14.
XIII Congresso Brasileiro de Engenharia de Pesca (21-25/09/2003) Porto Seguro/BA. 27 Tabela 01: Localização geográfica das comunidades estudadas. Nº Comunidades Localidades Município Latitude Longitude 01 Santa Luzia Lago de Coari Coari 04º 11 60 S 63º 42 33 W 02 Esperança II Costa Santa Rosa Coari 03º 96 79 S 63º 14 89 W 03 Matrinxã Paraná do Matrinxã Codajás 03º 46 41 S 62º 21 56 W 04 Bom Jesus Paraná do Iauara Manacapuru 03º 36 41 S 61º 17 57 W 05 N. S. das Graças Costa do Pesqueiro Manacapuru 03º 20 32 S 60º 35 46 W Coleta das informações As informações foram coletadas bimestralmente, a partir de excursões às localidades escolhidas. Uma sondagem das características gerais das comunidades foi efetuada por intermédio de entrevistas em grupo, com lideranças locais, seguindo um roteiro de perguntas preestabelecido com questões que versaram sobre as espécies capturadas, locais de pesca, apetrechos utilizados, época de captura e destino da produção. Análise estatística Os dados coletados foram armazenados em planilha eletrônica e submetidos à estatística descritiva, para cálculo de média, desvio padrão e freqüência de ocorrência. RESULTADOS E DISCUSSÃO As coletas dos dados foram efetuadas entre os meses de abril de 2002 e fevereiro de 2003, sendo realizadas um total de seis excursões. Foram aplicados 56 questionários nas unidades familiares sendo, 11 em Santa Luzia, 07 em Esperança II, 07 em Matrinxã, 14 em Bom Jesus e 12 em Nossa Senhora das Graças. capturadas Foram coletadas cerca de 483 informações sobre o componente pesca durante o estudo, com um total de 44 espécies de peixes citadas como capturadas. Destas, destacaram-se de maneira geral cinco como as mais explotadas nas comunidades amostradas, sendo tucunaré (Cichla spp), curimatã (Prochilodus nigricans), carás (vários Geophagos), s (Myleus e Mylenidae) e o (Pseudoplatystoma fasciatum), respectivamente. A comunidade de Nossa Senhora das Graças, foi a que apresentou o maior número de espécies capturadas, perfazendo um total de 37 espécies de peixes. Para Bom Jesus, Esperança II, Matrinxã e Santa Luzia foram descritas 28, 25, 22 e 20 espécies respectivamente. As espécies de maior importância para as comunidades estão representadas nas Figuras 01, 02, 03, 04 e 05. Em geral, as comunidades não diferiram na quantidade de espécies capturadas. A maior captura em Nossa Senhora das Graças deveu-se exclusivamente a maior exploração desta comunidade nas espécies de peixes lisos, o que aumentou consideravelmente o número final de espécies capturadas. Em especial, isso é decorrente da proximidade desta comunidade com a sede do município de Manacapuru, segundo maior porto de desembarque do Estado do Amazonas, pois este pescado pode ser comercializado tanto nos locais de compra existente na comunidade quanto diretamente nos frigoríficos localizados em Manacapuru, no mesmo dia
XIII Congresso Brasileiro de Engenharia de Pesca (21-25/09/2003) Porto Seguro/BA. 28 em que é capturado. Esta condição não foi observada nas demais comunidades em estudo, onde o pescado é armazenado para posterior comercialização. Uma das características das pescarias amazônicas é o seu direcionamento a várias e não somente uma espécie (Petrere Jr, 1989), isso é reforçado pelas freqüências encontradas nas comunidades, visto que nenhuma espécie sobrepujou a outra em termos de captura, fato encontrado também por Batista et al. (1998) e Freitas e Batista (1999) quando analisaram pescarias realizadas por comunidades da Amazônia Central. Pelo contrário, o esforço foi distribuído entre as espécies, resultado encontrado também por Ramos et al. (2003) quando analisaram as pescarias em comunidades da mesma área. 8,00 7,00 6,00 4,00 3,00 2,00 1,00 curimatã tucunaré ruelo matrinxã pescada barba-chata sardinha jaraqui dourado Figura 01: de peixes capturadas na comunidade de Nossa Senhora das Graças (Costa do Pesqueiro, Manacapuru/AM). 1 9,00 8,00 7,00 6,00 4,00 3,00 2,00 1,00 caparari aruanã tambaqui tucunaré bandeira pirarucu sardinha bodó Figura 02: de peixes capturados na comunidade de Bom Jesus (Paraná do Iauara, Manacapuru/AM).
XIII Congresso Brasileiro de Engenharia de Pesca (21-25/09/2003) Porto Seguro/BA. 29 9,00 8,00 7,00 6,00 4,00 3,00 2,00 1,00 curimatã jaú dourado pirarara jaraqui matrinxã caparari pirapitinga Figura 03: Freqüência de espécies capturadas na comunidade de Esperança II (Costa de Santa Rosa, Coari/AM). 8,00 7,00 6,00 4,00 3,00 2,00 1,00 curimatã dourado caparari tucunaré aruanã filhote pirarara pirapitinga Figura 04: de peixes capturados na comunidade de Matrinxã (Paraná do Matrinxã, Codajás/AM). 2 2 1 1 carás tucunaré jaraqui pescada traíra acará-açu aruanã matrinxã cuiu jandia Figura 05: Freqüência de espécies capturadas na comunidade Santa Luzia (Lago de Coari, Coari/AM).
XIII Congresso Brasileiro de Engenharia de Pesca (21-25/09/2003) Porto Seguro/BA. 30 Ambientes de captura Os ambientes de pesca utilizados pelos comunitários foram analisados para as duas fases do ciclo hidrológico (cheia e seca), visando identificar padrões de uso destes pelos moradores das comunidades rurais. Para a época de seca, identificou-se um total de sete ambientes de uso para as comunidades de estudo (Figura 06), destacando-se a maior utilização do rio e lago para as pescarias. Esse resultado corrobora em parte com o encontrado por Freitas e Batista (1999) que apresentaram o uso do lago com maior freqüência durante o ano todo para comunidades ribeirinhas do mesmo trecho em estudo. Bom Jesus (Paraná do Iauara) é a comunidade que utiliza um maior número de ambientes (seis) e Esperança II é a que utiliza apenas dois ambientes de captura. A tendência no caso do uso desses ambientes na época de seca é para um acentuado crescimento do uso do rio, isso devido a chamada pesca de piracema que acontece quando os cardumes de peixes, especificamente os reofílicos estão subindo os rios para a desova ou alimentação. A comunidade de Santa Luzia não registrou isso, obviamente por não ter acesso a este ambiente, então todo o esforço é voltado para as capturas efetuadas no lago e igarapés. Freqüência 100% 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% SLB* EII* M* BJ*- NSG* rio ressaca poço da praia paraná lago igarapé igapó Comunidades SLB: Santa Luzia do Buiuçuzinho; EII: Esperança II; M: Matrinxã; BJ: Bom Jesus; NSG: Nossa Senhora das Graças. Figura 06: Freqüência de ambientes de pesca utilizados nas comunidades amostradas durante a época de seca. No tocante ao uso dos ambientes na cheia, identificaram-se seis (Figura 07), sendo o lago ambiente mais utilizado de maneira generalizada em todas as comunidades, mas com padrões quanto à intensidade de uso diferindo de comunidade para comunidade. Em todas as comunidades, observou-se a diminuição do uso do ambiente rio para essa época em relação ao uso durante a seca, padrão não seguido para a comunidade Esperança II, que ao contrário aumentou o esforço de captura para esse ambiente.
XIII Congresso Brasileiro de Engenharia de Pesca (21-25/09/2003) Porto Seguro/BA. 31 100% Freqüência 80% 60% 40% 20% rio ressaca paraná lago igarapé igapó 0% SLB* EII* M* BJ* NSG* Comunidades SLB: Santa Luzia do Buiuçuzinho; EII: Esperança II; M: Matrinxã; PI: Paraná do Iauara; CP: Costa do Pesqueiro. Figura 07: Freqüência de ambientes de pesca utilizados nas comunidades amostradas durante a época de cheia. Destino da produção As espécies de pescado mais capturadas nas comunidades foram analisadas quanto a comercialização da produção. A venda de pescado foi observada para quatro das cinco comunidades estudadas (Tabela 02). A comunidade de Santa Luzia, foi a única das estudadas a não apresentar comercialização do pescado capturado. Tabela 02 Destino das espécies de peixes capturadas nas comunidades estudadas. Comunidades Santa Luzia Esperança II Matrinxã Bom Jesus N.S. das Graças Destino da captura Nº C 1 V 1 C V C V C V C V 01 Carás 100 0 0 100 0 100 0 100 25 75 02 Curimatã - - 50 50 0 100 56 44 12 88 03 Jaraqui 100 0 50 50 - - 100 0 25 75 04 Pacus 100 0 50 50 50 50 83 17 14 86 05 Pirarara - - 0 100 0 100 0 100 25 75 06 Pirarucu - - 0 100 0 100 0 100 100 0 07 Ruelo - - - - 33 67 33 67 60 40 08 Sardinha 100 0 100 0 - - 100 0 0 100 09 Surubim 100 0 0 100 0 100 50 50 14 86 10 Tambaqui 100 0 50 50 0 100 40 60 - - 11 Tucunarés 100 0 50 50 0 100 29 71 43 57 1: C = comercialização; V = venda.
XIII Congresso Brasileiro de Engenharia de Pesca (21-25/09/2003) Porto Seguro/BA. 32 Dentre aquelas que comercializaram, destaque para as comunidades de Matrinxã, Esperança II e Bom Jesus, que comercializaram 82% das espécies observadas. Nas comunidades onde a atividade pesqueira é utilizada como geradora de renda para os comunitários, não se distingue a venda dos peixes lisos dos peixes de escama, sendo ambas de igual importância, somente diferindo da época em que são efetuadas. Peixes lisos foram capturados em maior escala na época da seca e os peixes de escama durante o ano todo. CONCLUSÕES Nesta pesquisa comprovou-se a importância da atividade pesqueira às comunidades ribeirinhas das margens dos cursos de água envolvidos no transporte de petróleo e gás no Estado do Amazonas, como estratégia para fixação e sobrevivência dos seus habitantes em núcleos sociais e áreas de produção. AGRADECIMENTOS Os autores gostariam de agradecer ao CNPq pela cessão da bolsa DTI e ao CTPETRO pela oportunidade de realização deste projeto, e de forma muito especial aos comunitários que fizeram parte deste estudo, pela cessão das informações de maneira altruísta típica dos moradores das comunidades rurais Amazonenses. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS. BATISTA, V. S.; INHAMUNS, A. J.; FREITAS, C. E. C.; FREIRE-BRASIL, D. Characterization of fishery on the river communities in the low-solimões/high-amazon region. Fisheries Management and Ecology, V. 5, p. 419-435, 1998. FRAXE, T. Homens anfíbios: etnografia de um campesinato das águas. São Paulo: ANNABLUME, 2000. 192 p. FREITAS, C. E. C.; BATISTA, V. S. A pesca e as populações ribeirinhas da Amazônia Central. Brazilian Journal of Ecology, V. 01 p. 32-36, 1999. PETRERE Jr, M. River fisheries in Brazil: a review. Regulated Rivers: Research and Management, V. 4 p. 1-16, 1989. RAMOS, M. M.; CARDOSO, R. S.; SILVA, A.J. I; FREITAS, C. E. C. A pesca de subsistência nas comunidades de várzea do médio-baixo Solimões. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ICTIOLOGIA, XV. São Paulo, 2003. Anais..., CD ROOM