O EDUCAR LIBERTADOR DE PAULO FREIRE: CRÍTICA ÀS POSTURAS DITAS REVOLUCIONÁRIAS



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1 O EDUCAR LIBERTADOR DE PAULO FREIRE: CRÍTICA ÀS POSTURAS DITAS REVOLUCIONÁRIAS Rhaissa Marques Botelho Lobo * Resumo: Este texto objetiva refletir sobre o que é o educar liberador para Freire em sua obra Pedagogia do Oprimido, centrando a analise nas questões do quarto e último capítulo do livro A teoria da Ação Antidialógica, onde o autor discute e distingui as verdadeiras posturas revolucionárias, das que se proclamam. Buscando entender assim as resistências que determinados setores da esquerda brasileira nutriram pelo autor e por suas proposições educacionais. E o papel do Intelectual Paulo Freire, diante de valores como educação, liberdade, democracia e principalmente a revolução, na América Latina e no Brasil. E sua relação com o movimento teológico da Libertação. Com intuito de cumprir estes objetivos teremos como referências teóricas proposições que versem sobre a definição de Intelectual, a História Política e o papel deste grupo no processo. Palavras-chave: Paulo Freire; Educar libertador; Teologia da Libertação; Intelectual; Esquerda. Introdução Os homens fazem a sua própria história, mas não a fazem segundo a sua livre vontade, em circunstâncias escolhidas por eles próprios, mas nas circunstâncias imediatamente encontradas, dadas e transmitidas pelo passado. (MARX, 2008, P.207.) * Mestranda em História pela Universidade Federal de Mato Grosso, desenvolve pesquisa sobre a Teologia da Libertação e as trajetórias intelectuais de Frei Betto e Leonardo Boff. Integrante do grupo de Pesquisa História, Religião e Política no mundo contemporâneo desde 2010. Bolsista de Iniciação Cientifica VIC E PIBIC- CNPQ por mais de três anos. No primeiro como Voluntária de Iniciação Cientifica desenvolvi pesquisa sobre o intelectual Leonardo Boff, recortando suas concepções sobre o marxismo e sobre as questões místicasecumênicas. No segundo ano de pesquisa desenvolvi pesquisa sobre a produção intelectual de Frei Betto, mapeando as questões contempladas por este texto. Já no terceiro ano levantei, selecionei e analisei a produção de teses e dissertações sobre esses dois intelectuais e a Teologia da Libertação no Brasil. rh_aissa@hotmail.com

O nosso objetivo aqui é entender que condições são essas do passado citadas por Marx e como Freire reage a elas em Pedagogia do Oprimido, principalmente no quarto capítulo que tem uma caraterística mais voltada à reflexão histórica e como esta reflexão vai fazer com que ele seja alvo de críticas e incompreensão até da esquerda. Pois as circunstâncias do passado influência ações dos sujeitos, mas não as determina, e o que é determinante é como ele reage às circunstâncias que constrói a história. Paulo Reguelus Neves Freire nascido em 1921 no Recife, falace em São Paulo em 1997, é um dos maiores educadores e filósofos brasileiros, reconhecido no mundo inteiro por suas ações e teorias de educação popular. A sua filosofia da educação é expressa em sua tese para o concurso da Universidade do Recife em 1958, onde leciona História e filosofia da Educação, e nos seus trabalhos de alfabetização em comunidades no interior do Nordeste. Freire é o brasileiro com o maior numero de títulos Doutor Honoris Causa, concedidas pelas maiores e mais reconhecidas universidade do mundo (27 universidades ao todo), dentre elas universidades americanas a exemplo de Harvard onde Freire lecionou em 1969, e inglesas. As suas propostas educacionais centra-se na relação pratica- teórica, na luta por uma educação libertadora. Após 16 anos no exilio Freire volta ao Brasil em 1980, leciona na Universidade de Campinas e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. O legado e o projeto de Paulo Freire continuam vivos não só pela enorme quantidade e variedade de obras, mas também por meio de um instituto 1 fundado no inicio dos anos 1990, que leva seu nome e tem ramificações em diversos países do mundo. 2 O educar libertador de Paulo Freire Esse texto pretende mapear e entender o papel do Intelectual Paulo Freire, diante de valores como educação, liberdade, democracia e principalmente a revolução, na América Latina e no Brasil. E sua relação com o movimento teológico da Libertação. Com intuito de cumprir estes objetivos teremos como referências teóricas proposições que versem sobre a definição de Intelectual, a História Política e o papel deste grupo no processo.

Sendo assim o estudo das proposições educacionais e filosóficas apresentadas por Freire em Pedagogia do Oprimido será conduzida pela definição de intelectual de Louis Pinto: O intelectual não é como se afirma com tanta frequência hoje, aquele que teria uma mensagem a transmitir, mas aquele que só abre a boca se perguntando, a cada palavra pronunciada, se não está desmentido o crédito um pouco exorbitante que lhe é conferido, aquele que se surpreende com seu próprio privilégio e que o teme... Intelectual não quem quer, mas unicamente aquele que soube testemunhar por suas obras distanciamento em relação aos preconceitos, às convenções e às conveniências. (1997, p.208.) 3 Já no que concerne a importância e o papel desempenhado pelos intelectuais na História seguirmos as proposições de Jean François Sirinelli: Sobretudo, tentar destrinchar a questão das relações entre as ideologias produzidas ou vinculadas pelos intelectuais e a cultura política de sua época. (SIRINELLI, 2003, p.261.). Pedagogia do Oprimido é o segundo livro do autor lançado em 1968 no Chile onde estava exilado, pois o Brasil estava sob o comando de uma ditadura militar, sistema que varria o continente latino-americano. Entretanto no Brasil o livro só será editado em 1974. O livro que o precedera é Educação como prática da liberdade. A Pedagogia do Oprimido dividese em quatro capítulos: 1- A justificativa de Pedagogia do Oprimido, 2- A concepção Bancária da educação, como instrumento de opressão, seus pressupostos e sua crítica, 3- A dialogicidade essência da educação como prática de liberdade, 4- A teoria da Ação antidialógica. Sendo este último capítulo o maior do livro e o que tem por missão contextualizar o mundo em que Pedagogia do oprimido é concebida. Pois foi um capítulo escrito após a conclusão do livro pelo autor e devido a uma sugestão de Ernani Maria Fiori, que prefacia a edição da obra a qual tenho acesso. É sobre ele que lançaremos mão de algumas reflexões, com intuito de mapear a crítica tanto às posturas autoritárias ou antidiálogicas da direita e principalmente da esquerda que se propõe a fazer revolução, mas não abre mão de posturas autoritárias em troca de outras posturas democráticas ou dialógicas. O Brasil do Período é o melhor exemplo disto, pois a ditadura que se instala no País, em razão aos dois campos ideológicos estarem muito mais preocupados com a vitória de seus projetos políticos do que com uma verdadeira mudança estrutural da sociedade brasileira. Tanto o é

que tanto os militares que tomaram poder, quanto à esquerda que resistiu ao processo se autoproclamavam revolucionários. Diante destas questões penso ser importante mapear a abertura da participação da grande massa do povo brasileiro na vida política do país. 2 O período aqui comtemplado é de intensas transformações no âmbito internacional, estende-se do fim da segunda guerra mundial e polarização do mundo entre bloco comunista e capitalista. Já o âmbito nacional é marcado pelo fim conturbado do regime autoritário de Getúlio Vargas, vivência de um breve período democrático e ascensão de um regime militar ao poder. Estes acontecimentos redimensionam as ações políticas, econômicas e sociais da vida brasileira do período. O movimento queremista (queremos Getúlio) nascido no processo de deposição de Vargas é o marco da entrada política dos trabalhadores aos meandros das discussões política, pois até então estes eram inexistentes neste cenário de discussões. O movimento tem três fazes cada uma com uma especificidade em relação ao papel que Getúlio deveria ocupar no Estado, entretanto o essencial para o movimento e sua análise era o desejo destes em manter os diretos trabalhistas, alcançados durante a era Vargas. Dentro dessa Conjuntura Política de luta, Vargas exerce grande influencia na vida política brasileira, e devido à insensibilidade e erros de análise da União Democrática Nacional (UDN), Eurico Gaspar Dutra (ex- ministro de Vargas) é eleito pelo Partido Social Democrático (PSD), mais próximos aos ideais varguistas do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). O pluralismo partidário e os conflitos são as principais características desse período democrático que se estende até 1964. As Forças Armadas são outro setor da sociedade de vital importância na política do período. Estas primeiro depuseram Getúlio Vargas. Depois quase impediram a posse de Juscelino Kubistchek e por último instalaram um Governo de exceção no Brasil. Os partidos sempre recorriam a ela nos momentos de crise para que estas normalizassem os conflitos e devolvessem o poder aos civis, por serem os partidos frágeis, ecléticos ideologicamente (fora o PCB). O nacionalismo em suas diversas vertentes concentrava-se na esquerda e no centro, e a direita já era de tendência mais acentuada pelo anti-nacionalísmo. A democracia era um valor contornável à medida que podia ser sacrificada em detrimento dos interesses políticos, tanto da esquerda como da direita. A fragilidade das instituições democráticas é latente durante todo este período, mas agravou-se no governo Goulart. 4

Os dois governos Vargas tem com marca o Trabalhismo, o governo Dutra a transição política, o de JK o nacionalismo- desenvolvimentista, a industrialização, a integração do país por meio dos transportes, custando pouca intervenção do estado no meio rural, aumentado a contradições entre campo e cidade, trabalhadores rurais e urbanos e diversas regiões do país. As radicalizações dos discursos da esquerda e da direita, a falta de diálogo com a sociedade no processo de renúncia de Jânio Quadros e da posse de João Goulart culminou no golpe de 1964. Na verdade, porém os Valores democráticos não estruturavam a sociedade Brasileira. As tradições e a cultura política não haviam sido gestadas segundo referências democráticas. Às vésperas de 1964, o golpe estava no ar e podia vir de diferentes partes... Portanto as esquerdas revolucionárias dos anos 1960 e 1970, como de resto da sociedade, inseridas nestas referências e tradições, não tinham a democracia como um valor supremo. A democracia era burguesa, liberal parte de um sistema que se queria derrubar. Após a revolução, o socialismo seria o caminho para se chegar à verdadeira democracia, da maioria, do proletariado. (ROLLEMBERG, 2012, p.47-48.) 5 A efêmera democracia de 1945 a 1964 no Brasil deve-se à fragilidade do ideal democrático para esquerda e direita, à influência da conjuntura socioeconômica externa sobre a interna, a entrada de novos grupos na cena política, exigindo novas demandas e a inabilidade de leituras do contexto. No que concerne à reflexão dessas disputas no âmbito cristão o período da ditadura militar no Brasil é exemplar podendo se perceber o conflito entre a ala conservadora e a progressista da Igreja Católica mais claramente. A ala conservadora apoia o golpe devido a sua política anticomunista; já os setores Progressistas combatem a ditadura como repressor e maquiador dos problemas sociais. À medida que o regime aumenta a repressão, os setores progressistas da eclesiologia se fortalecem estabelecendo-se como base de apoio a movimentos de luta contra o regime autoritário e as desigualdades sociais, tal se dá com as CEBs e outros movimentos com participação de eclesiásticos e leigos que auxiliavam a população mais carente defendendo-a da miséria e da exploração. Segundo Marcelo Ayres Camurça: A orientação que regeu as CEBs foi marcada pelas idéias de Paulo Freire e do movimento de Educação de Base (MEB), de setores progressistas da Igreja nos anos 1960, da participação das camadas populares no processo de sua própria educação (política), através da discussão de seus problemas imediatos, e em seguida, da mobilização para a defesa de seus direitos. (2007, p.396).

6 Diante deste contexto o que Freire questiona é a possibilidade de fazer revolução sem manter uma postura mais que democrática dialógica com o povo, com a massa, pois não pode se falar em revolução sem inserir o povo no processo de forma efetiva, o desrespeito a essa questão não levará a uma revolução, o que acontecerá não é uma revolução que romperá com o antigo e construirá um novo e sim uma mudança nos papéis de opressor e oprimido. Para Paulo Freire o principal caminho de inserção do povo na construção de uma nova sociedade é a educação e a ação cultural, e esta é a crítica à postura antidialógica da esquerda, é o que os motivam a queimar Freire. Além de consultor em vários países latino- americanos e na África, para assuntos educacionais Freire, foi por dez anos consultor do Conselho Mundial de Igrejas na Suíça do departamento de Educação. Segundo Lucilia Delgado e Mauro Passos: De Mero consumidor o leigo passa a sujeito ativo. Sua participação foi ganhando corpo e expressão nas comissões, nas pastorais, nos grupos de reflexão. Com ele, o percurso popular da Igreja latino americana vai ganhando outros contornos e novas formas, buscando abranger a justiça social, uma educação libertadora, a paz e promoção humana. Todos esses temas estão contemplados em Medellín. A necessidade de libertação e a busca de um desenvolvimento que contemplasse todo o continente laçaram raízes e sedimentaram as experiências que vinham sendo feitas em prol das questões sociais e dos direitos básicos da pessoa humana. (2007, p.114). A ideia deste texto surge em decorrência de um relato do intelectual e militante Frei Betto citado abaixo e este relato encontra-se tanto em seu livro o Paraíso Perdido como e em um artigo sobre os 52 anos da revolução Cubana 3, disponibilizado na internet. Descrevo meu trabalho em educação popular e o que significa a concepção metodológica dialética, que se contrapõe à metodologia bancária denunciada por Paulo Freire- e paradoxalmente em voga nos países socialistas. Considero oportuno tocar no nome de Paulo Freire, injustamente queimado em Cuba. Alegavam que suas concepções eram idealistas, à luz da filosofia Cristã e, portanto, inaceitáveis para quem assume a concepção materialista da natureza e da história. Taís Críticas baseavam-se numa leitura superficial de suas primeiras obras, como Educação como prática da Liberdade. Sua evolução Metodológica em Pedagogia do Oprimido e Cartas Guiné- Bissau. Mas os Críticos ignoram essas obras, ainda que seu Método de educação popular e de alfabetização esteja sendo adotado por países recentemente libertados como a Nicarágua. (BETTO, 1993, p.131.)

É sabida por meio do trabalho de historiadores que estudam o período da Ditadura militar no Brasil a relação de alguns grupos vinculados à luta armada na resistência ao regime suas ligações com Cuba, e o papel estratégico ocupado por esse país no apoio logístico aos grupos de esquerda. A partir daí é possível entender a fala de Betto sobre a chegada do nome de Paulo Freire a Cuba. Aqui é essencial entender o que Freire denomina de Educação Bancária e ressaltar sua proposta de Educação Problematizadora. E aí finalmente conceber as suas análises no quarto capítulo de Pedagogia. Estas interpretações acabaram deixando à sombra aspectos centrais da trajetória das esquerdas e dos embates travados pelos movimentos sociais que seguiam esta orientação no período anterior a 1964 e, em particular, dos caminhos que partes das esquerdas vinham tomando pela luta armada. A relação das ligas camponesas com Cuba, por exemplo, traduzida no apoio material, logístico e ideológico, evidencia a definição de uma parte das esquerdas pela luta armada no Brasil, ainda no governo democrático, antes da ditadura civil- militar. Embora consideramos que o golpe e a implantação da ditadura redefinissem o quadro político, é importante perceber que esta possibilidade fazia parte das opções de esquerda e que esta buscava realizá-las antes de 1964. Mesmo que não se trate de uma novidade, as esquerdas tenderam e tendem ainda a deslocar o marco da opção pela luta armada para o pós-1964. (ROLLEMBERG, 2012, p. 48.) 7 Neste texto do fragmento citado acima o autor discute a questão da memória das esquerdas que fizeram parte da luta armada e em nenhum momento é feita referência ao nome e à postura de Paulo Freire, entretanto nos debruçamos sobre ele para entender a esquerda brasileira do período e a relação desta com Cuba. A educação Bancária denunciada por Freire: Na visão Bancária de educação, o saber é uma doação dos que se julgam sábios aos que julgam nada saber. Doação que se funda numa das manifestações instrumentais da ideologia da opressão a absolutização da ignorância, que constitui o que chamamos de alienação da ignorância, segundo a qual esta se encontra sempre no outro. O educador que aliena a ignorância se mantém em posições fixas, invariáveis. Será sempre o que sabe, enquanto os educandos serão sempre os que não sabem. A rigidez destas posições nega a educação e o conhecimento como processo de busca. (FREIRE, 2013, p.81.) Esta concepção de educação não só utilizada pelos governos e instituições de direitas é também muito presente nos governos e movimentos de esquerda, o seu reflexo pode ser visto na postura das organizações de esquerda que pensa que seu papel é dar consciência

aquele que não a tem, entretanto consciência não é algo que se dá e sim que se constrói por meio de ações dialógicas. Nos países socialistas a exemplo de Cuba a educação é feita com base nos grandes manuais. Já a educação Problematizadora ou Libertadora propõe: 8 A educação problematizadora, que não é fixismo reacionária, é futuridade revolucionária. Daí que seja Profética e como tal, esperançosa. Daí que corresponda à condição dos homens como seres históricos e à sua historicidade. Daí que se identifique com eles como seres mais além de si mesmos como projetos como seres que caminham para frente, que olham para frente; como seres a quem o imobilismo ameaça de morte; para quem o olhar para traz não deve ser uma forma de nostálgica de querer voltar, mas um modo de melhor conhecer o que está sendo, para melhor construir o futuro. Daí que se identifiquem com o movimento permanente em que se acham inscritos os homens, como seres que sabem inconclusos; movimento que é histórico e que tem seu ponto de partida, o seu sujeito, o seu objetivo. (FREIRE, 2013, p.102-103.) A educação libertadora propõe ao ser humano olhar para sua condição e a partir dela refletir sobre suas práticas e que como elas podem ajudar a romper o círculo da opressão e não só alterar os papéis sociais. Estas questões relevantes à educação problamatizadora e à educação bancária se encontram discutidas no segundo capítulo da obra. Ao justificar no Primeiro Capítulo a necessidade de aprofundar questões lançadas em Educação como Prática da Liberdade é que nasce Pedagogia do Oprimido que é o problema da humanização e desumanização. O terceiro Capítulo sobre A dialogicidade essência da educação como prática de liberdade onde ele busca compreender o papel da palavra em seus elementos construtivos, pois para Freire não há palavra verdadeira que não seja Práxis, já a palavra inautêntica é aquela que pode se transformar em prática. Este capítulo é o mais metodológico do livro. No sentido de que é o que apresenta às proposições freirianas aplicadas à prática escolar. O capítulo quatro A teoria da Ação antidialógica Freire reapresenta ideias já exposta nos capítulos anteriores no intuito de analisar as teorias da ação Cultural. Começa afirmando que os homens são seres de Práxis e esta é o meio pelo qual é possível promover a transformação, é nesta questão que podemos perceber a principal inspiração de Marx e sua filosofia sobre Freire, pois o diálogo entre teoria e prática é principal marca de seu trabalho. O líder revolucionário não pode ser considerado os homens da reflexão e a massas os homens

que praticam a reflexão dos líderes. O verdadeiro líder revolucionário é aquele que junto à massa realiza reflexão e prática. Assim o oprimido carrega em si o opressor, e o executa em algumas situações junto com o outro e o único modo de romper a opressão é realizar reflexão e prática em conjunto. 9 Estamos convencidos de que o diálogo com as massas populares é uma exigência radical de toda revolução autêntica. Ela é uma revolução por isto. Distingue-se do golpe militar por isto. Dos Golpes seria uma ingenuidade esperar que estabelecessem um diálogo com as massas oprimidas. Deles o que se pode esperar é o engodo para legitimar-se ou a força que reprime. (FREIRE, 2013, p.173.) Esta citação acima deixa claras as marcas deixadas pelo momento histórico em Freire. O diálogo corajoso com as massas é o meio pelo qual se realiza a revolução verdadeira. Os homens antidialógicos dividem para conquistar, por meio de ações repressivas e distorcidas, como as paternalistas. Ao tratar o homem com coisa se comete a necrofilia. A mitologia em torno da liberdade são destrinchados e analisados, por meio de suas introjeções pelas massas. Destacando- se o da caridade, da propriedade privada, se não for preguiçoso conquistará o acesso uma vida melhor, de que o acesso à educação é universal, inferioridade do oprimido diante do opressor. Sendo assim a construção de uma nova sociedade deve guiarse pela construção de uma sociedade de corresponsabilidades, por meio da associação crítica, espontânea e consciente dos oprimidos. A diferenciação entre o líder populista e o revolucionário em Freire é muito clara, o primeiro é aquele que fica intermediando a relação entre as massas e as oligarquias, ele só torna-se revolucionário quando renuncia a este papel e opta pela massa. O exemplo de líder populista trabalhado por Paulo Freire é Getúlio Vargas. Considerações Finais Concluo falando da Invasão Cultural de forma mais consistente. Pois esta é outra característica fundamental da teoria da ação antidialógica. Os invasores impõem a sua visão de mundo aos invadidos condicionando seu contexto cultural aos seus padrões. A exemplo do padrão eurocêntrico impelido à sociedade moderna, ou alguns grupos de esquerda que querem impor o seu modelo de revolução aos outros desrespeitando assim todo a estrutura social do

outro. Enquanto a opressão está baseada no Desamor, à libertação tem como base o Amor ao outro. Concluímos esse texto com a sensação de termos aqui mapeados o contexto histórico e a suas influências sobre Freire e sua obra. Pois além de ser um autor em que teoria e Prática estão aliadas de maneira inseparáveis, este concebe um olhar sensível a questões considerados por muitos como de menor importância, entretanto graça a consistência intelectual são reabilitadas ao seu lugar de direito. E penso que talvez seja isso que mais incomode em seus críticos. 10 REFERÊNCIAS FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 54, ed. Rio do Janeiro: Paz e Terra. 2013. BETTO, Frei. O paraíso Perdido: Nos Bastidores do socialismo. São Paulo: Geração Editorial, (2ª edição, 1993.). CAMURÇA, Marcelo Ayres. A militância de esquerda (cristã) de Leonardo Boff e Frei Betto: da Teologia da Libertação á mística ecológica. IN: FERREIRA, Jorge; REIS, Daniel Aarão (org.). Revolução e Democracia (1964(...)-As esquerdas no Brasil; v.3). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. p.387-408. FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucila de Almeida Neves (org.). O Brasil Republicano- O tempo da Ditadura: regime militar e movimentos sociais em fim do séc. XX. 2. Ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. DELGADO, Lucila de Almeida Neves; PASSOS, Mauro. Catolicismo: Direitos sociais e direitos humanos (1960-1970). IN: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucila de Almeida Neves (org.). O Brasil Republicano- O tempo da Ditadura: regime militar e movimentos sociais em fim do séc. XX. 2. Ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. V.4. p.93-132. ROLLEMBERG, Denise. As esquerdas Revolucionárias e a luta aramada. In FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucila de Almeida Neves (org.). O Brasil Republicano- O tempo da Ditadura: regime militar e movimentos sociais em fim do séc. XX. 2. Ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012. SIRINELLI, Jean François. Os intelectuais. IN: RÉMOND, Rene (org.). Por uma história política. Rio de Janeiro: FGV, 2003.p.231-270. PINTO, Louis. Carta a amigos estrangeiros sobre intelectuais franceses. IN: BOURDIEU, Pierre; MICELI, Sergio. (Org.). LIBER 1. São Paulo. EDUSP, 1997. p.207-211.

11 1 A biografia é realizada por meio de informações do site do instituto Paulo Freire que disponibiliza diversas obras para Download grátis por meio de seu Site: http://www.paulofreire.org/institucional. Acesso em 06 jul. 2013. 2 Realizaremos este mapeamento com o auxílio dos capítulos do volume 3 da coleção o Brasil Republicano. Os textos deste volume estende-se do fim da era Vargas até o Golpe de 1964. 3 BETTO, Frei. Recuerdos de Cuba: à luz dos 52 anos de Revolução. Estud. av., 2011, vol.25, no. 72, p.217-226. Disponível em: <http://www.scielo.br/>. Acesso em: 05 mar. 2011.