Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação

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Assim, as incompatibilidades estão previstas no artº 77º do E.O.A. e os impedimentos no artº 78º do E.O.A.

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Transcrição:

Sumário 1. A recolha prevista no n.º 1 do art.º 8 da Lei 5/2008 de 12 de fevereiro pressupõe a existência de uma investigação concreta e que, perante a ponderação dos interesses em confronto, a autoridade judiciária conclua pela necessidade da sua realização, que deve ser fundamentada, ou seja, que o direito à privacidade e liberdade do arguido deve ceder perante o interesse público da investigação, situação que nada tem a ver com a recolha prevista no n.º 2 do art.º 8 da Lei 5/2008, depois do trânsito em julgado da condenação. 2. Aquele art. 8º nº2 não permite que, em caso de recusa, o condenado possa ser forçado à recolha das amostras aí referidas; se essa fosse a intenção do legislador tê-lo ia dito, como o disse no n.º 1 daquele preceito. Proc. 8/10.8GATVR-A.E1 Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: 1. No Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real de Santo António correm termos os autos de Processo Comum Colectivo n.º 8/10.8GATVR, nos quais foi decidido, por despacho de 14.07.2011, na sequência da recusa do arguido em permitir a recolha de amostra de material biológico para determinação de perfil de ADM, que a sua recusa era legítima e, consequentemente, que o mesmo não pode ser compelido a permitir tal recolha. 2. Recorreu o Ministério Público, concluindo a motivação do recurso com as seguintes conclusões: 1

a) O condenado não se pode eximir à recolha de amostras biológicas para efeitos de inserção na base de dados de perfis de ADN, quando determinada nos termos do disposto nos art.ºs 8 n.º 2 e 18 n.º 3 da Lei 5/2008, de 12.02. b) Na verdade, o referido diploma legal prevê distintos regimes de recolha de amostras de ADN para inserção dos respectivos perfis na base de dados que também instituiu. c) No que tange à recolha de amostras determinadas em sentença ou acórdão a condenado em pena concreta de prisão igual ou superior a 3 anos, ainda que substituída, a mesma é obrigatória, não podendo o arguido recursar-se, porquanto o comando legislativo impõe somente que haja ordem do Juiz nesse sentido tal interpretação da norma extrai-se do elemento literal, histórico e sistemático, porquanto o diploma em questão criou um regime distinto do postulado no art.º 172 do CPP, que depende apenas de despacho judicial que a determine, determinação esta passível de execução coerciva. d) Assim, a interpretação efectuada no despacho recorrido é contrária ao disposto nos art.ºs 8 n.º 2 e 18 n.º 2 da Lei 5/2008, de 12.02, devendo as referidas normas ser interpretadas no sentido que postulamos. e) Deve revogar-se o despacho recorrido e substituir-se por outro que ordene a recolha coerciva de amostras de ADN ao condenado G..I. Y. 3. O arguido não respondeu e o Ministério Público junto deste tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. 4. Cumprido o disposto no art.º 417 n.º 2 do CPP e colhidos os vistos legais, cumpre decidir, em conferência (art.º 419 n.º 3 al.ª b) do Código de Processo Penal), a questão suscitada única - nas conclusões da motivação do recurso, conclusões que enquanto resumo da motivação - delimitam o âmbito do recurso e, por isso, as questões sobre as quais este tribunal deve debruçar-se. 2

Feitas estas considerações, uma única questão vem colocada pelo recorrente à apreciação deste tribunal: é a de saber se, tendo o tribunal ordenado a recolha de amostra biológica para determinação do perfil de ADN de arguido condenado por acórdão transitado em julgado, e tendo este recusado submeter-se à recolha, pode ser compelido a permitir a recolha de tal amostra. --- 5. Factos relevantes para a decisão a) Por acórdão condenatório de 11.01.2011, transitado em julgado, proferido nos autos acima identificados, foi decidido, além do mais: - Condenar o arguido G. pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21 n.º 1 do DL 15/93, de 22.01, na pena de quatro anos e seis meses de prisão; determinar que se proceda à recolha de ADN do arguido após trânsito em julgado (nos termos do art.º 8 n.º 2 da Lei 5/2008, de 12.02). b) Em 7 de Junho de 2011 não foi possível proceder à recolha de amostra de material biológico ao arguido, nos termos ordenados, por este ter declarado que se recusa a deixar efectuar a colheita. c) Consta do despacho recorrido: A lei que criou a base de dados para fins de investigação (Lei 5/2008, de 12 de Fevereiro) não previu a admissibilidade da recusa do condenado em fornecer a dita amostra para subtracção do ADN, ao invés do que acontece com o CPP, onde se prevê a admissibilidade de coercibilidade para obtenção dessa amostra. Essa era uma opção que o legislador deveria tomar de modo claro, como o fez no âmbito do CPP, em obediência ao princípio da legalidade e ao disposto nos art.ºs 18, 32 e 35 da CRP. Não o tendo feito, não pode o arguido ser forçado a submeter-se a tal recolha. --- 3

6. Cumpre, pois, conhecer da questão suscitada O tribunal ordenou, no final do acórdão condenatório, que se procedesse à recolha de ADN do arguido, após trânsito em julgado (nos termos do art.º 8 n.º 2 da Lei 5/2008, de 12.02). Dispõe este preceito: 1. A recolha de amostras em processo crime é realizada a pedido do arguido, ou ordenada, oficiosamente ou a requerimento, por despacho do juiz a partir da constituição de arguido, ao abrigo do disposto no art.º 172 do Código de Processo Penal. 2. Quando não se tenha procedido à recolha de amostras nos termos do número anterior, é ordenada, mediante despacho do juiz de julgamento, e após trânsito em julgado, a recolha de amostras em condenado por crime doloso com pena de prisão igual ou superior a 3 anos, ainda que esta tenha sido substituída. A recolha de amostras prevista no n.º 1 nada tem a ver com a prevista no n.º 2, pois que aquela obedece ao estabelecido na lei processual penal, onde se estabelece, designadamente, que o arguido pode ser compelido por decisão da autoridade judiciária competente, que ponderará a necessidade da sua realização, tendo em conta o direito à integridade pessoal e à reserva da intimidade do visado (art.º 154 n.º 2 do CPP, ex vi art.º 172 n.º 2 do mesmo diploma) enquanto nesta se estabelece que a recolha de amostras (quando não tenha sido efectuada nos termos do número anterior) é ordenada pelo juiz do julgamento. Em lado nenhum se descortina que esta última recolha, ordenada mediante despacho do juiz de julgamento, uma vez verificados os requisitos previstos no n.º 2 do art.º 8 da mencionada lei, possa ser forçada, em caso de recusa do arguido/condenado. E se a lei não o disse, porque razão há-de o tribunal presumir que essa foi intenção do legislador? Não se vê. Em primeiro lugar porque a recolha prevista no n.º 1 pressupõe a existência de uma investigação concreta e que, perante a ponderação dos interesses em confronto, a autoridade 4

judiciária conclua pela necessidade da sua realização, que deve ser fundamentada, ou seja, que o direito à privacidade e liberdade do arguido deve ceder perante o interesse público da investigação, situação que nada tem a ver com a recolha prevista no n.º 2 do art.º 8 da Lei 5/2008, depois do trânsito em julgado da condenação. Depois, não pode esquecer-se que estamos no âmbito de matéria restritiva de direitos fundamentais do cidadão direito à liberdade e integridade física (vide art.ºs 27 e 25 n.º 1 da CRP) e que tais direitos apenas podem ser restringidos nos termos e condições previstas na lei (e nem a lei processual penal nem a Lei 5/2008 prevêem que o arguido possa ser compelido pela força e privando-o da liberdade à recolha de tais amostras), ou seja, tratando-se de um regime de excepção, tal restrição teria que resultar claramente da lei (note-se que a recolha forçada de tais mostras, contra a vontade do arguido, atentaria claramente contra a liberdade do arguido, entendia esta - como escreve o Ministério Público no parecer que emitiu nos autos, citando Gomes Canotilho e Vital Moreira, in CRP Anotada, 2.ª edição revista e ampliada, vol. I, 198 - o direito à liberdade física, à liberdade de movimentos, ou seja, direito a não ser detido, aprisionado, ou de qualquer modo fisicamente confinado a um determinado espaço, ou impedido de se movimentar ). E não resultando expressamente da lei seja do seu elemento literal (tal interpretação não tem no texto da lei o mínio de correspondência nem se infere do facto de tal decisão ser ordenada pelo Juiz), seja dos seus elementos histórico e sistemático que essa foi a intenção do legislador (e note-se que o intérprete deve presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, como expressamente se dispõe no art.º 9 n.º 3 do Código Civil), não pode aceitar-se que o art.º 8 n.º 2 da Lei 5/2008 permita que, em caso de recusa, o condenado possa ser forçado à recolha das amostras aí referidas; se essa fosse a intenção do legislador tê-lo ia dito, como o disse no n.º 1 daquele preceito, onde se exige uma ponderação dos interesses em presença, até pelas 5

dúvidas suscitadas quanto a tal questão pela Comissão Nacional de Protecção da Dados no parecer n.º 18/2007, de 13.04.2007, a propósito do citado art.º 8, onde expressamente se escreveu que a admissibilidade da coercibilidade para obtenção dessa amostra ou o sancionamento com pena ou ónus é uma opção que deve ser feita pelo legislador de modo totalmente claro o princípio da legalidade vigente no domínio dos direitos fundamentais e no domínio do Direito Penal e Processual Penal, princípio consagrado no n.º 3 do art.º 3 do Projecto, em todas as suas vertentes, reclama a consagração em lei dos limites da actuação coerciva dos poderes públicos na obtenção da amostra para recolha do ADN Parece à CNPD que não deve ser admissível a coercibilidade física, nem a coercibilidade sancionatória, para obrigar o arguido a permitir a recolha de amostra para efeitos de obter o perfil de ADN, tudo em respeito à dignidade da pessoa humana, à liberdade e integridade individual, em obediência também ao princípio da presunção de inocência e ao princípio do privilégio contra a auto-incriminação. Consequentemente, a interpretação de tal preceito no sentido que a recolha de amostras aí estabelecida pode ser forçada, em caso de recusa do condenado, violaria até pelo automatismo dessa decisão, que dispensa a ponderação da necessidade da recolha de tais amostras e princípio da proporcionalidade e os direitos fundamentais da liberdade e integridade física do arguido, pelo que também por isso o tribunal não poderia deixar de recusar a submissão do arguido, pela força, à recolha das amostras supra referidas. Apenas duas notas finais. - Não releva para o caso nem permite conclusão contrária o art.º 10 da lei 5/2008, pois que aí apenas se estabelecem os procedimentos a adoptar na recolha de amostras as recolhas permitidas - nada referindo quanto à obrigatoriedade da recolha ou quanto às consequências da recusa do condenado em permitir tal recolha; 6

- Não relevam também e não permitem conclusão contrária por um lado, a Deliberação n.º 3191/2008, do IML, que regulamenta o perfil da Base de Dados de Perfis de ADN, pois que aí, no que aqui importa considerar, apenas se estabelece como são recolhidas as amostras, o que nada tem a ver com a recusa do condenado em permitir a recolha das mesmas, por outro, o modelo de formulários utilizados pelo IML, pois que estes nada permitem concluir quanto às consequências da recusa do condenado em permitir a recolha de amostras e não são, por si, elemento de interpretação da norma, pois que tais formulários apenas permitem perceber os procedimentos utilizados pelo IML na recolha de amostras, sem que daí se possa inferir o que quer que seja quanto às consequências da recusa do condenado em permitir tal recolha. Improcede, por isso, o recurso. --- 6. Assim, em face do que se deixa exposto, acordam os Juízes que compõem a 1.ª Secção Criminal deste tribunal em negar provimento ao recurso e, em consequência, manter o despacho recorrido. --- Sem tributação. (Este texto foi por mim, relator, elaborado e integralmente revisto antes de assinado) Évora, 13 / 12 / 2011 (Alberto João Borges) (Maria Fernanda Pereira Palma) 7

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