1 PRECIPITADOS EM AÇOS RÁPIDOS E EM AÇOS INOXIDÁVEIS PARA VÁLVULAS DE MOTORES 1 Marcos Domingos Xavier 2 RESUMO Avaliação qualitativa das fases presentes em aços rápidos e em aços inoxidáveis aplicáveis em válvulas de motores. O interesse maior refere-se aos carbonetos, fortes influentes nas propriedades mecânicas destes materiais. Diversas composições de aços inoxidáveis e de aços rápidos com seus respectivos diagramas de fases e precipitados são discutidos. Palavras-chave: Aço rápido. Aço inoxidável. Válvula de motores. 1 Monografia : carbonetos em aços rápidos e em aços inoxidáveis para válvulas de motores - São Paulo, SP Outubro de 2009 2 Engenheiro Metalurgista, M.Sc, Doutorando do Departamento de Metalurgia e Materiais da Escola Politécnica da USP; Técnico de Ensino do SENAI CFP 1.19, Coordenador do Curso Superior de Tecnologia em Processos Metalúrgicos da Faculdade de Tecnologia Nadir Dias de Figueiredo
2 I - AÇOS RÁPIDOS Os aços rápidos são essencialmente ligas quaternárias Fe-W-Cr-C podendo conter também molibdênio, cobalto e vanádio, conforme ilustrado na tabela 1 (1). São aplicados em ferramentas de corte; bicos de bombas injetoras de motor, serras e matrizes para extrusão e estampagem. TABELA 1: COMPOSIÇÃO QUÍMICA DOS AÇOS RÁPIDOS (% PESO) (1) MARCA ELEMENTO QUÍMICO VILLARES C Cr W Mo V Co VWM 2 0,89 4,20 6,20 4,90 1,80 ----- VK5 E 0,92 4,15 6,30 5,00 1,85 4,80 VWM 2 0,89 4,20 6,20 4,90 1,80 ----- VWM 7 1,00 3,80 1,80 8,70 2,00 ----- VKM 42 1,10 3,75 1,50 9,50 1,15 8,00 SINTER 1,28 4,20 6,30 5,00 3,10 ----- 23 SINTER 1,29 4,20 6,30 5,00 3,10 8,40 30 SINTER 60 2,30 4,20 6,50 7,00 6,50 10,50 A composição chamada 18-4-1 é muito usada, tendo 18 % W, 4 % Cr e 1 % V em peso. Estes aços geralmente são submetidos a um tratamento de austenitização a alta temperatura para produzir-se uma estrutura constituída de austenita e carbonetos. Com a têmpera, esta transforma-se em martensita altamente ligada ( 58 a 80 % ), carbonetos não dissolvidos do tipo ( MoW) 6 C e V 4 C 3, junto com austenita retida altamente ligada (15 a 30 % ). O aço encontra-se em estado de elevadas tensões internas, sendo muito instável, duro e frágil ao impacto. Depois de temperada, a liga é revenida para obter-se uma mistura de martensita revenida e carbonetos; o processo é complicado porque a martensita e a austenita retida sofrem transformações diferentes (2). O revenido, sem prejudicar a dureza, alivia as tensões, corrige a instabilidade e a excessiva fragilidade do material. Além disto, pela complexidade da estrutura destes aços no estado temperado ocorrem durante este tratamento térmico algumas transformações estruturais incomuns e que não se verificam no aços carbono ou
3 com baixos teores de elementos de liga. Basicamennte, é feito um duplo revenimento na faixa de 500 a 550 o C para conduzir ao endurecimento secundário, sendo o primeiro aplicado para transformar a autenita retida e o segundo para conduzir à precipitação de carbonetos. Portanto, os carbonetos formados nestas ligas elevam a resistência mecânica destas ligas, adequando-as ao uso (2). As relações de equilíbrio a baixa temperatura podem ser observadas na figura 1, devida a Golschmidt (3). Nesta, o tetraedro representa a constituição de ligas a uma temperatura suficientemente baixa para que se forme a fase σ do sistema binário ferro-cromo. As quatro faces do tetraedro representam os quatro cortes dos sistemas ternários formados pelos constituintes na temperatura em questão, enquanto as seis arestas representam os sistemas binários. O diagrama é esquemático e apresentase com escalas aproximadas de porcentagens atômicas; despreza-se a influência dos pequenos teores de vanádio. Figura 1: Modelo isotérmico do sistema quaternário Fe-Cr-W-C para temperatura baixa (3)
4 As composições dos aços rápidos comerciais estão junto ao vértice correspondente ao ferro no tetraedro da figura 1; o ponto assinalado corresponde ao aço 18-4-1. Há considerável solubilidade sólida do cromo no ferrita,mas o tungstênio é pouco solúvel. A fase cementita dissolve muito cromo e pouco tungstênio, mas não aparece nos aços rápidos. A fase η é (Fe 3 W 3 C-Fe 4 W 2 C) ou a fase ternária M 6 C do sistema Fe-W-C. Ela dissolve grande quantidade de cromo, o que é mostrado pelo retângulo negro sobre a face (Fe-W-C) do tetraedro e pela sua extensão para o interior. A presença de tantos elementos em solução sólida na fase η ou M 6 C provoca um pequeno desvio na simetria cúbica. A fase chamada κ é a fase ternária (FeW) 23 C 6 ; é completamente isomorfa à fase binária Cr 23 C 6 e a faixa retangular sombreada mostra que as duas se confundem. A fase ξ' é a fase Fe 2 W do sistema ferrotungstênio. No estado temperado, o aço rápido 18-4-1 é constituído quase que inteiramente de martensita, austenita retida e carboneto M 6 C. O trabalho de White e Honeycombe (1;4), com microscopia eletrônica e difração de elétrons, revelou a presença em contorno de grão de um precipitado muito fino de carboneto MC (principalmente VC), que escapou à observação em muitos trabalhos anteriores. A afinidade do vanádio pelo carbono é, assim, tão grande que mesmo na concentração de 1 % forma o carboneto estável VC. Alguns autores consideraram que o aço rápido 18-4 -1, quando bem revenido - em geral a 500-550 o C - contém além de ferrita ( martensita revenida ) e austenita, também o carboneto M 6 C; Goldschmidt (1;4) mostrou que geralmente aparece certa quantidade do carboneto M 23 C 6, o que foi confirmado por White e Honeycombe, para os quais o M 23 C 6 é formado por decomposição da austenita retida. Parece que as lacunas presentes no material temperado facilitam a difusão que leva à precipitação; mostrou-se que a precipitação do carboneto M 23 C 6 é completada antes do início do processo de endurecimento secundário que ocorre no revenido e, nestas condições, considera-se a dureza secundária como resultado da precipitação coerente de carbonetos de elementos de liga como VC ou Mo 2 C (quando o aço contém também molibdênio).
5 A composição 18-4-1 está próxima a um limite de campo de fase no modelo quaternário; embora o M 6 C seja o carboneto predominante, pequenas variações de composição ou tratamento térmico introduzem o M 23 C 6 e, com teor crescente de vanádio, o carboneto do tipo MC. Quando só há M 6 C quase todo o tungstênio está nesta fase, enquanto que o vanádio distribui-se entre carboneto e matriz na relação 10 : 7 aproximadamente. O cromo dissolve-se mais na ferrita que no carboneto, ficando numa relação de 2 : 1; apenas cerca de um décimo do ferro está presente no carboneto. Uma quantidade de carbono fica na austenita enquanto esta permanece retida, mas, logo que se transforma, resta pouco carbono na matriz. A estrutura dos aços rápidos 9-4-2 foi estudada por Malkiewicz, Bojarski e Foryst (1;5). Nestes aços a maior proporção de vanádio resulta no aparecimento de carbonetos MC (principalmente VC) ao lado de M 6 C no material temperado. No aço recozido também há M 7 C 3 presente, fato que é compreensível pela observação da figura 1. A composição da matriz é quase a mesma, tanto nos aços 18-4-1 como nos 9-4-2, seja no estado recozido ou temperado. II - AÇOS INOXIDÁVEIS Os aços para válvulas de motores de combustão interna, formam um grupo independente de aços inoxidáveis ou refratários. São basicamente, ligas Fe-Cr-Ni- Mn-C, conforme tabela 2 (1). Podem ser classificados pela microestrutura metalográfica em martensíticos e austeníticos. Apresentam em temperaturas elevadas, boas características de resistência mecânica e de resistência ao ataque corrosivo dos gases de combustão dos motores. Além disso, possuem boa resistência ao desgaste e aos choques térmicos e mecânicos. Estas características são obtidas pela combinação da composição química, considerando inclusive adições de silício; nitrogênio; etc, com a realização de tratamentos térmicos adequados.
6 TABELA 2: COMPOSIÇAO QUÍMICA DE AÇOS PARA VÁLVULAS DE MOTORES DE COMBUSTÃO INTERNA (1) MARCA ELEMENTO QUÍMICO VILLARES C Mn Cr Ni OUTROS VV-20 0,20 1,30 21,00 11,50 Si = 1,00; N = 0,17 VV-33 0,33 3,25 23,00 8,00 Si = 0,75; N = 0,30 VV-45 0,45 0,40 8,50 ---- Si = 3,30 VV-53 0,53 9,00 21,00 4,00 N = 0,42 VV-54 0,50 9,00 21,00 4,25 W = 1,15; Nb = 2,15; N = 0,50 VV-56 0,55 8,00 20,00 2,20 N = 0,30 VV-80 0,80 0,40 19,50 1,20 Si = 2,10 VV-422 0,22 0,75 1,75 0,75 W + 1,00; Mo = 1,00; V = 0,25 A precipitação é importante como mecanismo de endurecimento dos aços inox austeníticos VV 20; VV-33; VV-53; VV-54; VV-56, aplicáveis em válvulas de motores de combustão interna. A literatura não traz estudos detalhados das fases formadas nestes aços, tal como foi feito com os aços rápidos usando um diagrama quaternário. Assim, diagramas ternários Fe-Cr-C; Fe-Ni-C e Fe-Mn-C; Fe-Nb-C e Fe- Mo-C serão aqui utilizados (6) na busca de tal intento. SISTEMAS TERNÁRIOS Fe M C a) M = Nb Este sistema ternário envolve os carbonetos muito estáveis com estrutura cristalina do tipo NaCl; a forma geral das relações de equilíbrio a temperaturas baixas pode ser compreendida com o auxílio da figura 2(a). A fase intermediária rica em ferro do sistema binário Fe-M é Fe a M b e varia de um sistema para outro. O carboneto equiatômico MC tem composição ligeiramente variável e pode ser chamado M c C d. Este é tão estável que entra em equilíbrio com a ferrita; o diagrama mostra campos de duas fases ( α + Cm ), ( Cm + M c C d ), ( α + M c C d ) e ( Fe a M b + M c C d ) separados por campos extensos de três fases ( α + Cm + MC ) e ( α + MC + Fe a M b ). A menos que a proporção de M ou C seja muito baixa, o carboneto M c C d presente nas ligas ricas em ferro. está b) M = Cr
7 As relações de equilíbrio a temperaturas baixas estão na figura 2(b). Com porcentagens crescentes de cromo, o carboneto M 7 C 3 é o primeiro dos carbonetos de cromo a aparecer, logo depois do campo ( α + Cm ); mais adiante aparece o carboneto M 23 C 6. As composições de todas as fases encontradas nas ligas Fe-Cr-C ricas em ferro são, portanto, variáveis; a partição do cromo entre ferrita, cementita e carboneto de cromo é muito sensível e sofre os efeitos do tratamento térmico usado. Este sistema tem interesse como um componente ternário das importantes ligas Fe + Cr + Mo (W) + C (aços rápidos) e das ligas Fe + Cr + Mn (Ni) + C (aços para válvulas de motores de combustão interna). c) M = Mo, W As relações de equilíbrio a temperaturas baixas estão na figura 2(c). embora os carbonetos hexagonais de molibdênio e tungstênio sejam muito estáveis, não entram em equilíbrio com a ferrita devido à intervenção dos carbonetos ternários M 23 C 6 e M 6 C. Estes sistemas ternários são de interesse para os aços rápidos, baseados no sistema Fe-Cr-W-C, tal como citado anteriormente. d) M = Ni Nos sistemas Fe-Ni-C o equilíbrio estável envolve grafita, mas os aços contém cementita metaestável, que pode dissolver um pouco de níquel. As relações de equilíbrio estão mostradas na figura 2(d); as ligas comerciais em uso tem estrutura γ pura, ( α + Cm ), ou ( α + γ ), ( γ + Cm ). e) M = Mn As relações de equilíbrio a temperaturas baixas estão na figura 2(e). O diagrama mostra a grande solubilidade sólida do manganês na cementita. Para ligas ricas em ferro é necessário considerar-se apenas as relações entre α, γ e ( Fe Mn ) 3 C.
8 Figura 2: Algumas relações de fases nos sistemas Fe-M-C a temperaturas baixas (4).
9 PRECIPITATED IN FAST AND STEEL STAINLESS STEEL ENGINE VALVE Marcos Domingos Xavier ABSTRACT Qualitative assessment of the phases present in high speed steels and stainless steels applied in engine valves. The main interest refers to carbides, strong influence on the mechanical properties of these materials. Several compositions of stainless steels and high speed steels with their respective phase diagrams are discussed and precipitates. Keywords: High-speed steel. Stainless steel. Valve engines.
10 III - REFERÊNCIAS (1) Catálogos de Produtos da VILLARES METALS SA - Abril de 1999. (2) CHIAVERINI, V. Tratamentos térmicos dos aços para ferramentas e matrizes. In:. Tratamentos térmicos das ligas ferrosas. São Paulo: ABM, 1987. (3) HUME-ROTHERY, W. Estrutura dos aços ligados. In:. Estrutura das ligas de ferro. São Paulo: Edgard Blucher, 1968. (4) WHITE, C. H.; HONEYCOMBE, W. K.. J. Iron Steel Inst., v.21, n.197, 1961. (5) MALKIEWICZ, T.; BOJARSKI, Z.; FORYST, J. J. Iron Steel Inst., v.25, n.193, 1959. (6) BAIN, E. C.; PAXTON, H. W. Alloyng elements in steel. 2. ed. ASM, 1968.