Napoleão Bonaparte MANUAL DO LÍDER Aforismos escolhidos e prefaciados por Jles Bertat Tradção de Jlia da Rosa Simões www.lpm.com.br L&PM POCKET
O LÍDER 17
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Amo o poder, mas é como artista qe o amo. Amo-o como m músico ama se violino para dele tirar sons, acordes e harmonias. Um exército não é nada sem m cérebro. A atitde de m general amado vale mais do qe o mais belo discrso. A frieza é a maior qalidade de m homem destinado a comandar. A presença do general é indispensável: ele é o cérebro, a essência de m exército. Não foi o exército romano qe conqisto a Gália, mas César*; não foi o exército cartaginês qe fez o exército repblicano tremer às portas de Roma, mas Aníbal.** * Júlio César (100-44 a.c.): o famoso general romano conqistador da Gália, qe se tornaria cônsl e ditador. (N.T.) ** Aníbal (247-183 a.c.): grande general cartaginês, considerado por algns o criador da estratégia militar. (N.T.) 19
Nada é mais importante, na gerra, do qe a nidade de comando; assim, qando se combate ma única potência, deve-se ter m único exército agindo nma única linha de frente e sendo condzido por m único chefe. Um ma general vale mais do qe dois bons.* Realizei a campanha sem consltar ningém: e nada teria feito de bom se precisasse me conciliar com a maneira de ver de otra pessoa. Se me impserem entraves de todo tipo; se e precisar informar aos comissários do governo sobre todos os mes passos; se eles tiverem o direito de alterar minha movimentação, de retirar-me o enviar-me tropas, nada mais esperem de bom. Se os senhores enfraqecerem ses recrsos dividindo sas forças; se romperem na Itália a nidade do pensamento militar: digo-lhes com pesar qe terão perdido a mais bela ocasião de impor leis à Itália. É preciso estar bastante alheio à marcha do gênio para acreditar qe ele se deixa esmagar pelas formas. As formas foram feitas para a mediocridade; é * Qando disse essa frase, Napoleão estava à frente do exército da Itália, e fora informado pelo Diretório de qe se comando passaria a ser dividido com o general Kellerman. Bonaparte nega-se a obedecer, acreditando firmemente qe m exército é mais bem comandado por ma única inteligência, mesmo qe inferior, do qe por das inteligências speriores, mas contrastantes. (N.T.) 20
bom qe esta só possa se mover dentro de m círclo das regras. O talento alça voo, não importa qantos entraves o cerqem. A primeira qalidade de m generalíssimo* é ter ma cabeça fria qe receba impressões exatas dos objetos, qe nnca se exalte, não se deixe deslmbrar e embriagar por boas o más notícias; as sensações scessivas o simltâneas qe recebe ao longo de m dia se ordenam e ocpam apenas o jsto espaço qe merecem ocpar. Infeliz do general qe vai para o campo de batalha com m sistema preestabelecido! A inteligência tem ses direitos acima dos da força; a força em si não é nada sem a inteligência. Nos tempos heroicos, o general era o homem mais forte; nos tempos civilizados, o general é o mais inteligente dos bravos. Aqele qe não vê o campo de batalha com olhos impassíveis faz homens morrerem intilmente. * Generalíssimo (général en chef, em francês): o general encarregado do comando geral e spremo dos exércitos, qe tem sob sas ordens os demais generais. (N.T.) 21
A glória e a honra das armas são o primeiro dever a ser considerado por m general qe combate: a salvação e a preservação dos homens são apenas secndárias; mas é também na adácia e na obstinação do general qe se encontram a salvação e a preservação dos homens. Um generalíssimo nnca deve dar descanso aos vencedores, nem aos vencidos. Na gerra, o chefe é o único a entender a importância de certas coisas; e ele pode sozinho, por sa vontade e sas lzes speriores, vencer e sperar todas as dificldades. A maioria dos homens, inclsive dos grandes homens, só sabe osar pela metade. O espírito de m bom general deveria se assemelhar, pela limpidez, ao vidro de ma lneta de batalha. Um general deve ser charlatão. 22
Não existem grandes ações scessivas qe sejam obras do acaso e da sorte; elas sempre decorrem do cálclo e do gênio. Raramente vemos os grandes homens fracassarem em sas empresas mais perigosas. Vejam Alexandre*, César, Aníbal, o grande Gstavo** e otros: eles sempre têm êxito. Será porqe têm sorte qe se tornam grandes homens? Não, mas porqe, sendo grandes homens, soberam controlar a sorte. Qando estdamos as instâncias de ses scessos, ficamos srpresos de ver qe eles fizeram de tdo para obtê-los. Todos os grandes capitães da Antigidade e aqeles qe, mais tarde, dignamente segiram ses passos só fizeram grandes coisas ao se conformarem às regras e aos princípios natrais da arte, isto é, pela exatidão dos cálclos e pela relação racional dos meios com sas conseqências, dos esforços com os obstáclos. Qe homem não gostaria de ser apnhalado, desde qe tivesse sido César? Um pálido clarão de sa glória compensaria amplamente ma morte prematra. * Alexandre Magno (356-323 a.c): rei da Macedônia e da Pérsia, grande tático e conqistador de territórios, bem como líder de homens. (N.T.) ** Gstavo Adolfo, o Grande, o Leão do Norte (1594-1632): rei da Sécia, responsável por importantes avanços na arte da gerra, como o so de artilharia móvel. (N.T.) 23
Em geral, a melhor maneira de me lovar é fazer coisas qe inspirem sentimentos heroicos à nação, à jventde, ao exército. Chegei tarde demais, Decrès*: não há mais nada de grande a ser feito... Sim, concordo, minha carreira é admirável, trilhei m belo caminho; mas qe diferença com a Antigidade! Veja Alexandre: ao conqistar a Ásia e annciar-se aos povos como o filho de Júpiter, todo o Oriente com exceção de Olímpia**, qe sabia de tdo, com exceção de Aristóteles e de algns pedantes de Atenas acredito nele. Qanto a mim, se me declarasse filho do Pai eterno e annciasse qe Lhe renderia graças enqanto tal, não haveria ma vendedora de peixe qe não me vaiasse à minha passagem. O povo é esclarecido demais hoje em dia; não há mais nada de grande a ser feito. Não existe homem mais covarde do qe e ao elaborar m plano militar; exagero todos os possíveis perigos e males nas circnstâncias dadas; fico nma agitação insportável. O qe não me impede de parecer sereno às pessoas qe me cercam; so como ma mlher qe dá à lz. Mas qando ma decisão * Denis Decrès (1761-1820): contra-almirante qe acompanho Napoleão na expedição ao Egito e qe mais tarde seria nomeado por ele ministro da Marinha. (N.T.) ** Olímpia do Épiro: mãe de Alexandre Magno. (N.T.) 24
é tomada, tdo é esqecido, a não ser o qe pode fazê-la ter êxito. A direção dos assntos militares é apenas metade do trabalho de m general; estabelecer e garantir comnicações é m dos objetivos mais importantes. Garanta rapidamente sas comnicações. Não são tropas o qe lhe falta, mas a maneira de reni-las e de agir com vigor. A velocidade, na gerra, é metade do scesso. Na gerra, vemos nossos males e não vemos os do inimigo; é preciso demonstrar confiança. Poderei ser acsado de temeridade: jamais de lentidão. Em Waterloo, tdo de errado apenas depois de tdo ter dado certo. Não tenha ma linha, mas mantenha todas as sas tropas renidas e agrpadas ao redor de Gênova, enqanto ses depósitos são mantidos em Savona. Esses 25
são os três princípios militares; ao agir assim, você combaterá cinqenta mil homens com trinta mil. Os princípios de César foram os mesmos qe os de Aníbal: manter as forças renidas, não ser vlnerável em ponto algm, dirigir-se com rapidez a pontos importantes, confiar em meios morais, na reptação de sas armas, no temor inspirado e também nos meios políticos para manter fiéis os aliados e obedientes os povos conqistados. Na gerra, é preciso ideias simples e definidas. De tanto dissertar, de ser espiritoso, de fazer reniões, acontecerá o qe acontece em todos os séclos qando se sege tal caminho: acabam-se tomando as piores decisões, qe, qase sempre, na gerra, são as mais covardes, o, se preferirem, as mais prdentes. A verdadeira sabedoria, para m general, está na determinação enérgica. Qando qeremos travar ma batalha, é regra geral renir todas as sas forças, não negligenciar nenhma; m batalhão, às vezes, decide ma etapa. 26