MORFOLOGIA DO PORTUGUÊS I AULA 6/7 Flexão e Derivação Profa. Dra. Márcia Santos Duarte de Oliveira FFFLCH-DLCV/ USP marcia.oliveira@usp.br
Os Tópicos desta Aula Vamos iniciar nossos estudos sobre Flexão e Derivação. Esteja atento para as referências bibliográficas no Plano de Curso do Mês de Setembro Aulas 7/8, disponíveis no Sistema MOODLE Objetivamos distinguir: (i) os processos de flexão e derivação; (ii) raiz, radical e tema (ainda dentro do processo de análise mórfica).
O Léxico Basílio, Margarida. 2004. Formação e Classes de Palavras no Português do Brasil. São Paulo: Contexto. O léxico é tradicionalmente definido como o conjunto de palavras de uma língua. Na lexicologia clássica, o estudo do léxico tem por objetivo o maior conhecimento possível das características e propriedades de cada palavra, no presente e no passado. [...] Basílio (2004: introdução) Na aula 1 dissemos que, no tocante aos estudos do léxico, estaríamos olhando para os processos de formação de classes de palavras de nossa língua. Aos processos produtivos de formação de palavras e suas funções, chamamos morfologia derivacional. No entanto, antes de nos determos especificamente na derivação, é preciso explicitar as diferenças entre flexão e derivação e, ainda, explicitar processos de flexão.
Duas Grandes Subáreas: Flexão e Derivação Em nossos estudos vamos reconhecer duas grandes subáreas: flexão e derivação. Passemos a uma rápida consideração sobre distinções entre a morfologia flexional e derivacional. Observe primeiramente dois exemplos distintivos: 1. Flexão vítima s 2. Derivação social [ismo] socialismo
Flexão Rosa, Maria Carlota. 2000. Introdução à Morfologia. São Paulo: Contexto. Morfologia flexional é aquela relevante para a sintaxe Rosa (2000: 124) Veja um exemplo a seguir: (1)a. O teste foi muito fácil b. Os teste-s foram muito fáceis Enfocando as palavras teste/testes, verifica-se que o sufixo s PLURAL de teste-s tem claro envolvimento com outras palavras na sentença. Observe ainda as palavras de Anderson (1985: 162), traduzido): [...] A flexão, mais que ser a propriedade específica de um item lexical individual, marca tipicamente categorias que são aplicáveis (ao menos potencialmente) a qualquer item em uma dada classe de palavras. [...] Anderson, S. R. (1985). Inflection morhology. In: Shopen, T. (org.). Language typology and syntatic description grammatical categories and the lexicon. Cambridge: University Press, pp. 150-201. Vol. III.
Afixos Flexionais Uma maneira pela qual as línguas costumam marcar processos gramaticais de flexão é por meio de afixos; os afixos flexionais sinalizam relações gramaticais, tais como: NÚMERO, TEMPO, POSSE, CASO; eles nunca mudam a classe gramatical das bases em que estão atados. Nos referimos a bases, porque precisamos detalhar sobre os diferentes tipos de base: raiz, radical, tema Na flexão, as palavras constituem um simples paradigma, como se exemplifica a seguir em inglês.
Continua... Na flexão, as palavras constituem um simples paradigma, como se vê abaixo em inglês: (1) walk caminhar, 1s, PRESENTE (I walk with Cleo) eu caminho com Cleo walk-s caminhar, 3s, PRESENTE ela caminha comigo walk-ed caminhar, 1s, PASSADO nós caminhamos ontem (She walks with me) (We walked yesterday) Em (1), o lexema WALK está flexionado em categorias de TEMPO, NÚMERO e PESSOA, formando um dos paradigmas verbais desta língua. LEXEMA: grosso modo, o elemento que guarda o conteúdo da série o semantema.
Continua... Uma das características do afixo flexional é a de poder distinguir um conjunto de relações gramaticais que refletem a posição que a palavra ocupa em uma estrutura oracional. Este é o caso típico de línguas que marcam a categoria CASO. Em línguas que marcam CASO em sua morfossintaxe, os nomes carregam relações gramaticais ou semânticas que os ligam ao resto da sentença. Idiomas como alemão, russo, latim, basco, finlandês, turco exibem um elaborado sistema de caso envolvendo tipicamente cerca de três a seis formas distintas; algumas vezes uma dúzia ou mais. Tratase de um interessante fenômeno de flexão nos nomes.
Continua... Bikol (Filipinas) - Givón (1984: 62) (1) nag-ta ó ang-laláke ning-líbro sa-babáye ACT- dar Nom-homem Ac-livro Dat-mulher O homem deu um livro para a mulher Abreviaturas: Ac caso acusativo (nome com função de objeto direto); Nom caso nominativo (nome com função de sujeito); Dat caso dativo (nome com função de objeto indireto). ACT (?) (não informado pelo autor). GIVÓN. T. 1984. Syntax: a functional-typological introduction. Amsterdam: Benjamins. Vol. I.
Derivação A morfologia derivacional, diferentemente da flexional, não é guiada por aspectos sintáticos. O processo morfológico de derivação nas línguas tem sido apontado na literatura como idiossincrático e irregular, pertencendo, portanto, ao léxico. Veja as palavras de Bickford & Daly (1996: 8, traduzido): [...] O significado de uma palavra composta, ou de uma palavra contendo um afixo derivacional, não é frequentemente predito a partir do significado dos morfemas naquela palavra. Visto que o significado não pode ser predito somente por regras, ele deve ser fornecido por uma entrada lexical separada. [...] Bickford, J. A. & Daly, J. (1996). A course in basic grammatical analysis. 3 rd. preliminary edition. North Dakota: Summer Institute of Linguistics.
Afixos Derivacionais Os afixos derivacionais mudam a classe gramatical das bases em que eles são atados. Isto implica, portanto, na formação de um novo lexema. Observe um exemplo em inglês Bickford & Daly (1996) (4)a. NOME la y n line linha b. ADJETIVO [ l ni ] r linear linear c. VERBO [ ntr [ l ni ] r ] ] a y z interlinearize interlinearizar
Continua... No entanto, afixos derivacionais podem ainda criar novos lexemas, sem contudo implicar em mudança de classe gramatical. Veja o exemplo abaixo em português: (1) a. moral b. amoral c. imoral As palavras em (1) pertencem a mesma categoria morfossintática: nome. No entanto, não se pode dizer que estas palavras sejam flexões de um mesmo lexema MORAL.
Diferenças entre Flexão e Derivação 1. Obrigatoriedade Esta é uma propriedade da flexão, mas não da derivação. Observe o exemplo (1): (1) a. Os alunos são estudiosos b. *As alunos são estudiosas No entanto, observe o exemplo (2) em inglês não é obrigatório que todo SUJEITO tenha que conter um sufixo nominalizador -er: (2) a. The farmer is in the barn o fazendeiro está no celeiro The teacher is in the barn o professor está no celeiro
Continua... 2. Produtividade Produtividade (ou generalidade) é outra propriedade que frequentemente distingue flexão de derivação. O processo de derivação costuma ser esporádico, já o de flexão automaticamente aplicável a todas as formas de um paradigma apropriado. Uma boa ilustração desta propriedade encontra-se no sistema verbal de muitas línguas. Cada lexema verbal em português, por exemplo, pode ser flexionado em categorias de PESSOA, NÚMERO, TEMPO, ASPECTO e MODO.
Continua... Exemplificando produtividade em português: (1) PULAR pul-ei pula-va pula-ra pula-ria ANDAR and-ei anda-va anda-ra anda-ria VIAJAR viaj-ei viaja-va viaja-ra viaja-ria BRINCAR brinqu-ei brinca-va brinca-ra brica-ria
Continua... No entanto, a produtividade é muito restrita na derivação: (1) a. moral b. normal c. geral a-moral a-normal * a-geral i-moral * i-normal * i-geral
Continua... Podemos ainda depreender ainda outras diferenças entre flexão e derivação: critério paradigmático aplica-se aos processos de flexão, mas é pouco aplicável aos de derivação; Paradigma: diferentes formas de uma mesma palavra que demonstram, geralmente, categorias gramaticais. A derivação agrupa palavras no máximo em pares, como feliz/felizmente, mas nunca em conjuntos maiores como exemplificamos no slide 15.
Continua... Tipo de significado o tipo de significado básico da flexão é significado gramatical. O tipo de significado básico da derivação é significado lexical ; Mudança de categoria sintática é um critério próprio da derivação, não ocorrendo nos processos de flexão.
Diferenciando Bases Vamos diferenciar os termos: raiz, radical e tema. Comecemos por raiz e radical. Os conceitos de raiz e de radical estão relacionados às distinções entre morfologia flexional e morfologia derivacional. Observe: (1) a. legal b. i-legal c. i-lega-is
Continua... RADICAL i lega -is prefixo raiz sufixo derivacional flexional Observe que o radical é formado pela raiz mais um afixo derivacional. Fiquemos com isso por ora.