Os experimentos prismáticos de Goethe

Documentos relacionados
Princípios de Composição: Teoria da Cor. Prof. Edmilson José da Silva

Professora Cristina Cardoso 8º Ano- EDUCAÇÃO VISUAL Escola Básica e Secundária D. Martinho Vaz de Castelo Branco

Sem luz não existe cor

Física Legal.NET - O seu site de Física na Internet

Estudo da cor [breve síntese]

Astrofísica Geral. Tema 04: Luz. Alexandre Zabot

A Dispersão da Luz e as Séries Espectrais

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Astrofísica Geral. Tema 04: Luz

Gerenciamento da Cor em Sistemas Digitais. Hermes Renato PUCSP 2018

Cores. Misturando apenas essas três cores, em proporções e intensidades variadas, podemos obter todas as outras, mesmo as que não estão no

3 - Um objeto de 1,8 m de altura foi colocado diante de uma câmara escura de orifício conforme o esquema a seguir.

Colégio Técnico Educáre Curso Técnico de Design de Interiores. Modulo 1 - CORES NOS AMBIENTES TEORIA DAS CORES. Professora Arq.

Conceitos Básicos de Óptica Geométrica

CONCEITOS BÁSICOS DE ÓPTICA GEOMÉTRICA

Espectros de radiação descontínuos e a composição do Universo. Espectros de emissão e de absorção

Círculo cromático. Parâmetros da cor, esfera e estrela J. Itten. Aula 2 - Jade Piaia

Teoria das Cores MODULO III DESIGNER GRÁFICO. Suélen Dayane Martins. Professora

COLORINDO SEUS SONHOS...

A FÍSICA ONTEM E HOJE

CONCEITOS GERAIS 01. LUZ. c = km/s. c = velocidade da luz no vácuo. Onda eletromagnética. Energia radiante

TEORIA DAS CORES. Aula 10. TECNOLOGIA EM ANÁLISE E DESENVOLVIMENTO DE SISTEMAS PROJETO DE INTERFACE COM O USUÁRIO Marcelo Henrique dos Santos

A Luz-Cor EDUCAÇÃO VISUAL 8º ANO

ESPECTROSCOPIA Newton realiza experimentos em ó<ca. Luz separada por um prisma.

Fís. Monitor: João Carlos

Percepção das cores. Bruno Nascimento Ferreira

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

CORES CONHEÇA SUA COLORAÇÃO PESSOAL

Cores. Profa. Dra. Rúbia Gomes Morato Prof. Dr. Reinaldo Paul Pérez Machado

Princípios da Óptica Geométrica

Curso de Bacharelado em Design de Moda. Cor aplicada ao Design Claudia Albert Aula 1

Física 3 Óptica Geométrica Livro 1 Aula 01

Apostila de Física 33 Introdução à Óptica Geométrica

Astronomia do século XIX: o surgimento da espectroscopia.

HOSPITAL ANÁLISE DE CORES

O OCEANO - SISTEMA FÍSICO E RESERVATÓRIO DE ENERGIA. A Terra no Espaço

O Espectroscópio de Rede de Difração Fundamentos e Aplicações

UNIVERSIDADE BRAZ CUBAS - Tecnologia em Óptica e Optometria Óptica Oftálmica aula 3

Material protegido pelas leis de direito autoral Proibida qualquer tipo de divulgação sem à devida autorização ou citada a fonte de forma correta.

NOTAS AULAS DE FÍSICA ÓPTICA 05/2015

GILBERTO BERCOVICI CONSULTA projeto de iniciativa popular (PLC Nº 36/2004), PARECER

Professor Gerson Witte Artes - EMI Informática. As Cores. Professor Gerson Witte EMI Informática Artes I

Estímulo Visual Luz Física da cor, visão humana e círculo cromático

Título: ARTE E VERDADE EM HEIDEGGER

a) 0,49 m b) 1,0 m c) 1,5 m d) 3,0 m e) 5,0 m

Plano de Ensino. Seção 1. Caracterização complementar da turma/disciplina. Turma/Disciplina: História da Filosofia Moderna /2

PROF. DANILO PRINCÍPIOS DA ÓTICA GEOMÉTRICA TERCEIRO ANO 13/02/2016 FOLHA 03

A NATUREZA DA LUZ. c=3x10 Fig. 1.1 Sir Isaac Newton PROF. TONHO

Luz & Radiação. Roberto Ortiz EACH USP

Pantone 1375 C TEORIA DAS CORES. Prof Djavan Loureiro

Luz e Visão. Prof. César Bastos

ÓPTICA GEOMÉTRICA 9º ANO E.F. Professor Gustavo H.

Prof. a Graciela Campos

Esta figura ilustra o fenômeno óptico da

Sumário. Espectros, Radiação e Energia

IntroduÄÅo a teoria da cor Material desenvolvido e organizado pelo professor AndrÉ Furtado Material elaborado para a disciplina de Projeto Visual 3

Apostila 2. Capítulo 9. Refração. Página 321. Gnomo

APOSTILA DE ARTES VISUAIS 7º

CLASSIFICAÇÃO DA CORES

Óptica. Aula 11 - Interação da Luz e a Matéria.

Sensoriamento Remoto Aplicado à Geografia. Prof. Dr. Reinaldo Paul Pérez Machado

ROTEIRO DE RECUPERAÇÃO DE FÍSICA 9º ANO 3 BIM

CARACTERÍSTICAS DA LUZ

ÓPTICA GEOMÉTRICA PAULO SÉRGIO

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Proposta de seminário realizado por Chiara Pasqualin

Caderno 1 Frente 2 Módulos 13 a 16. Profº Almir Batista

A cor exerce múltiplas ações: impressionar, expressar e a de construir Uma imagem. A cor vista: impressiona ; a cor sentida : provoca emoções.

Aula 6 Interferência. Física 4 Ref. Halliday Volume4. Profa. Keli F. Seidel

Daltonismo. Daltonismo. Daltonismo

Aula 2 Efeitos do meio nas observações (atmosfera terrestre, meio interplanetário e meio interestelar)

Forma de energia radiante capaz de sensibilizar nossos órgãos visuais. Compreende a região do espectro eletromagnético do vermelho até o violeta.

A LUZ PRECIOSO BEM PARA OS ASTRÔNOMOS

A Ciência Moderna: Séc XVII a Séc XIX. Prof. Carlos Alexandre Wuensche

c= m/s Aula 9 Ótica Por Leonardo Alfonso Schmitt.

UAIg UNIVERSIDADE DO ALGARVE

Sala de Estudos FÍSICA - Lucas 2 trimestre Ensino Médio 1º ano classe: Prof.LUCAS Nome: nº ÓPTICA GEOMÉTRICA REFRAÇÃO

1863/64 Na Faculdade de juristas da Universidade Zurique Faculdade Heidelberg Faculdade da

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Elementos de linguagem: A cor

PROCESSAMENTO DE IMAGENS COLORIDAS

A Química no Refrigerante. José Guerchon Andrea Rosane da Silva Camila Welikson

CIÊNCIAS DA NATUREZA E SUAS TECNOLOGIAS

Copiright de todos artigos, textos, desenhos e lições. A reprodução parcial ou total desta aula só é permitida através de autorização por escrito de

Cor.doc Página 1 de 5 Teoria das Cores

Isaac Newton ( )

Física B Extensivo V. 1

PROPOSTA DE GUIÃO PARA UMA PROVA

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

1-A figura 1 a seguir mostra um feixe de luz incidindo sobre uma parede de vidro que separa o ar da água.

Refração da luz. Prof.: Luiz Felipe. Ciências da Natureza Física

Manual de identidade da marca. Introdução O logo Elementos-chave Aplicação. Utilização da Marca

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FILOSOFIA DA UFSCAR OFERTA DE DISCIPLINAS - 2º SEMESTRE DE 2014 DISCIPLINA/DOCENTE HORÁRIO CRÉDITOS LOCAL INÍCIO/TÉRMINO

1 ENTRADA DE NOMES PARA AUTORES PESSOAIS

Aula 3 - Ondas Eletromagnéticas

Ondas Eletromagnéticas

O que vamos estudar? O que é a Via Láctea? Sua estrutura Suas componentes

Aplicação da fluorescência molecular e da colorimetria para discriminar espécies madeireiras

Transcrição:

Criação/Cor

Os experimentos prismáticos de Goethe FRED JORDAN Para o estudioso da cor, os experimentos propostos por Goethe são imprescindíveis. Por isso, o primeiro objetivo deste ensaio e do encarte anexo é induzi-lo a fazer esses experimentos: deixar de lado as teorias e ter uma vivência pessoal do processo prismático. O segundo, recomendar uma bibliografia dos abrangentes e profundos estudos de Goethe sobre cor, a tão desconhecida " Farbenlehre". Os experimentos com os dois lados complementares do Espectro são a entrada principal não só para os estudos goethianos, mas para todo e qualquer estudo da cor. Não é preciso equipamento especial. É preciso, sim, um máximo de tranqüilidade e um mínimo de intenção. Enfim, é preciso fazer boa fenomenologia... A título de iniciação, observe sem prisma a ilustração acima. Seria uma estrela, ou melhor, a imagem de uma estrela?

Pois esta ilustração pode muito bem representar o famoso experimento de Newton, com o pequeno orifício na veneziana (sem frestas). Todos se lembram desse orifício, por onde entrava a luz no quarto escuro. Poucos têm em mente a participação da veneziana escura que, afinal, definia o orifício claro. Um século após Newton, Goethe demonstra que o Espectro tem a ver com o todo, formado pelo orifício e veneziana. Tem a ver, precisamente, com o limite entre dois valores, Claro e Escuro, pois é nesta área limítrofe que se formam as cores prismáticas. Olhando a imagem da estrela, agora através do prisma, você percebe que o movimento de refração não projeta a luz, mas, sim, a imagem da luz. Não projeta somente o valor claro, mas também o valor escuro. O prisma projeta a Imagem como um todo. E a imagem formada por um pequeno ponto claro num campo escuro produz o conhecido Espectro que costuma ilustrar os livros. Goethe, no entanto, demonstra que se trata de apenas um lado, ou seja, de apenas uma das imagens complementares do Espectro. Para conhecer a outra imagem, você tem de inverter o Claro-Escuro! Deixe a luz plena entrar no quarto. Na vidraça transparente afixe um pequeno cartão opaco. Em vez de um ponto claro em campo escuro, você tem agora um ponto escuro em campo claro... e pode observar aquele lado do Espectro que não costuma ilustrar os livros. Nesta oportunidade, veja (sempre pelo prisma) o que acontece, se você tirar o cartão da janela, preenchendo todo o campo de visão com "claridade" indiferenciada. Para muitas pessoas parece ser penoso, se não impossível, aceitar o Escuro como força atuante, e não apenas como decréscimo ou ausência de luz. Contudo, elas aceitam, por exemplo, o frio, como presença atuante, e não como "ausência de calor"... Geralmente se diz que sem luz não há Cor. Melhor seria dizer: sem Imagem não há Cor. Luz e Imagem são duas coisas diferentes. A Luz, enquanto energia invisível, existe independente da Imagem. A Imagem é que depende da presença da Luz e da Matéria. É fundamental lembrar que, para nós, o mundo não existe visualmente a partir somente da Luz, mas, sim, a partir da interação entre Luz e Matéria em todas as suas temperaturas, densidades, transparências. Essa interação é que forma o Claro-Escuro, ou seja, a imagem visual do nosso mundo. E o Claro-Escuro, por sua vez, quando observado através de matéria semitransparente, revela as cores prismáticas. Goethe chama a

matéria mediadora, entre observador e Imagem o prisma, por exemplo de Meio turvo," das triibe Mittel". Mas não adianta só ler essas coisas. Tudo isso tem de ser experimentado, vivenciado freqüentemente, procurando-se, aos poucos, internalizar Conhecimento, Percepção, Sensibilidade. A propósito, você pode sempre assistir à Fantasia Cromática em Dois Movimentos, simplesmente olhando o céu: o Espaço interestelar é o Escuro; o Sol representa o Claro. A Atmosfera é a Matéria semitransparente, ou seja, o Prisma. Um dos Movimentos aparece ao fim da noite, no lado oposto ao sol nascente. A turvação atmosférica entre o observador e o espaço escuro é levemente iluminada, atuando como Claro à frente do Escuro. Inicialmente essa turvação torna-se Violeta, clareando para Azul. O Movimento complementar aparece à tarde. A turvação atmosférica entre o observador e o Sol atua como Escuro à frente do Claro, tornando-se amarelada. Ao pôr-do-sol, o Amarelo se intensifica até o Vermelho. Claro sobre Escuro, Escuro sobre Claro você vai reencontrar esses dois movimentos geradores do fenômeno prismático nas ilustrações do encarte anexo. Lembram-me o final do Fausto II: "Alles Vergangliche ist nur ein Gleichnis." Fenômenos são parábolas.

Bibliografia recomendada BJERKE, André. - Nene Beiträge zu Goethes Farbenlehre: L Teil, Goethe contra Newton. Stuttgart: Freies Geistesleben, 1961. DER FARBENKREIS: Beiträge zu einer goetheanistischen Farbenlehre. - Stuttgart: Freies Geistesleben. - (Publicação anual, desde 1981, do Goethe-Farbenstudio am Goetheanum, Dornach, Suíça. Colab. Proskauer, Ott, Rebholz.) GOETHE, Johann Wolfgang von, (1749-1832). - Farbenlehre. - Einleit. und Kommentare Rudolf Steiner; Hrsg. Gerhard Ott, Heinrich O. Proskauer. Stuttgart: Freies Geistesleben, 1984. (Contém os estudos sobre cor, completos, em 5 volumes, baseados na Ed. Kürschner, 1883-1897. Veja trad, inglesa e francesa)., Theory of Colours. Transl. and notes Charles Lock Eastlake, publ. by John Murray, 1840; introd. Deane B. Judd, 1970. - Cambridge: M.I.T., 1970., Traite des Couleurs. - Introd. et notes Rudolf Steiner; textes choisis et presentes Paul-Henri Bideau; trad. Henriette Bideau. 3e éd. revue. Paris: Triades, 1986. HEBING, Julius, (1891-1973). - Welt, Farbe und Mensch: Studien und Übungen zur Farbenlehre und Einführung in das Malen. - Beitrag Fritz Weitmann ; Hrsg. Hildegard Berthold-Andrae. - Stuttgart: Freies Geistesleben, 1983. LAND, Edwin H. - Experiments in Color Vision. - New York: Scientific American, May 1959. (Land inventou o processo Polaroid). LÜTKEHAÜS, Ludger (Organ.) - Arthur Schopenhauer: Der Briefwechsel mit Goethe und andere Dokumente zur Farbenlehre. - Zurich: Haffmans, 1992. MATIHAEI, Rupprecht. - Goethes Farbenlehre ausgewählt und erläutert. - Ravensburg: Otto Maier, 1987. - (Seleção de aprox. metade do texto original, comentada). NEWTON, Isaac, (1643-1727). - Opticks: or a treatise of the reflections, refractions, inflections and colours of Light. Forword Albert Einstein; introd. Edmund Whittaker; preface Bernard Cohen. - New York: Dover, 1952. - (Baseada na 4 a ed. Innys, Londres, 1730). PROSKAUER, Heinrich O. - Zum Studium von Goethes Farbenlehre. - Basel: Zbinden, 1968. RUNGE, Philip Otto, (1777-1810). - Die Farbenkugel und andere Schriften zur Farbenlehre. - Stuttgart: Freies Geistesleben, 1963.

(O pintor Runge correspondeu-se com Goethe. Pósfacio de J. Hebing). STEINER, Rudolf, (1861-1925). - Das Wesen der Farben: 3 Varträge, Dornach 1921, 9 Vorträge als Ergänzangen 1914-1924. Dornach: Rudolf-Steiner Verlag, 1980. (Steiner editou a obra científica de Goethe para a Ed. Kürschner, e parte dela para a Sophien-Ausgabe. Veja trad, francesa)., Nature des couleurs: 12 conférences 1914-1924. Trad. Henriette Bideau. Geneve: Ed. Anthroposophiques Remandes, 1978. Resumo O ensaio pretende estimular a realização de experimentos prismáticos com recursos muito simples e, com isso, facilitar o acesso aos fundamentais estudos de Goethe sobre cor, a " Farbenlehre". O encarte anexo contém fotos de um processo prismático complementar, produzido por Imagens-Modelo em Claro-Escuro neutro. Contém ainda fotos de imagens prismáticas produzidas por Imagens-Modelo em cores. Palavras-chave: espectro complementar da cor; experimentos prismáticos; estudos sobre cor; Goethe; Farbenlebre. Fred Jordán é designer gráfico e consultor para comunicação visual.