CARTA DE RISCO DE EROSÃO LINEAR DE ÁREA DEGRADADA POR VOÇOROCA, MUNICÍPIO DE RANCHARIA, SÃO PAULO, BRASIL. ALYSON BUENO FRANCISCO 1 JOSÉ TADEU GARCIA TOMMASELLI 2 RESUMO: A elaboração de cartas de risco contribui para a identificação e prognóstico dos processos erosivos lineares. Este trabalho apresenta uma carta de risco de erosão linear elaborada com base em dados topográficos e de cobertura de vegetação de uma área degradada pela voçoroca do córrego do Grito, localizada no município de Rancharia, Estado de São Paulo, Brasil. Os dados topográficos são originários de levantamentos de campo com o uso de receptores GNSS e equipamentos topográficos. As classes de cobertura de vegetação foram identificadas pela interpretação de imagem de sistema sensor orbital GeoEye pelo método dos pontos. A carta de risco de erosão linear foi gerada no aplicativo Surfer através de função aritmética dos dados georreferenciados de declividades e de cobertura de vegetação. A carta de risco de erosão linear visa contribuir para o planejamento público municipal na delimitação das áreas restritas à ocupação urbana. PALAVRAS-CHAVE: voçoroca, erosão linear, carta de risco. ABSTRACT: The development of risk maps helps at identification and prognosis of linear erosion processes. This work presents a linear erosion risk map drawn from topographic data and vegetation coverage of an area degraded by shout stream gully, located in the municipality of Rancharia, State of São Paulo, Brazil. The topographic data was originated from field surveys with the use of GNSS receivers and topographical equipment. The vegetation cover classes have been identified by interpretation of orbital sensor system image by GeoEye method of points. By means of Surfer software it was generated the linear erosion risk map through arithmetic function of geo-referenced data derived from terrain slope and vegetation coverage. The linear erosion risk map aims to contribute to the public municipal planning to delimit areas restricted to urban occupation. KEY-WORDS: gully, linear erosion, risk map. 1. INTRODUÇÃO A erosão dos solos tornou-se um problema ambiental e social, principalmente em periferias de cidades do interior de Estado de São Paulo, pelo desenvolvimento de voçorocas. 1 Mestre em Geografia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Campus de Presidente Prudente. Doutorando em Geografia e bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo. 2 Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo. Professor Assistente Doutor do Departamento de Geografia da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Campus de Presidente Prudente. http://viiisimposiogeografiafisica.uchilefau.cl/ 341
Historicamente, as voçorocas se desenvolveram no Planalto Ocidental Paulista após intensos desmatamentos entre as décadas de 1930 e 1950 com a introdução de cultivos agrícolas sem o emprego de práticas conservacionistas, como foi o caso do cultivo do algodão nas décadas de 1940 a 1960, que exauriu os solos com texturas de franco arenosas a arenosas. Para Iwasa e Pradini (1980, apud OLIVEIRA et al., 2005, p. 373): [...] a idade da maior parte das boçorocas de São Paulo e Noroeste do Paraná pode ser estimada em torno de 40 anos, coincidindo com o ápice da fase de colonização da área. A partir da década de 1960, com a expansão das áreas urbanas, com a ocupação de áreas de vertentes e fundos de vale e pela ausência de macrodrenagem urbana que direcionasse de forma adequada as águas pluviais das vias urbanas para os canais fluviais receptores, ocorreu o desenvolvimento de voçorocas de cabeceiras de drenagem com erosões remontantes em inúmeras cidades do interior paulista (ALMEIDA FILHO, 2008). Em relação à gênese das voçorocas, Rossato et al. (2008, p. 245) afirmam que: [...] as voçorocas podem ser originadas pelo aprofundamento e alargamento de ravinas, ou erosão causada por escoamento subsuperficial, o qual dá origem a dutos (pipes). São relativamente permanentes nas encostas. Têm paredes laterais íngremes, em geral fundos chato, ocorrendo fluxo de água no seu interior durante os períodos chuvosos. Ao aprofundarem seus canais, as voçorocas atingem o lençol freático. Constituem um processo de erosão acelerada e de instabilidade nas paisagens. De acordo com Guerra (2005, p. 34): [...] as voçorocas são formas resultantes de processos erosivos acelerados que evoluem no tempo e no espaço. Em decorrência do risco da evolução das voçorocas, principalmente em periferias de áreas urbanas, torna-se necessária a elaboração de mapeamentos e de informação sobre estas voçorocas. A partir dos avanços recentes nos sistemas de informações geográficas e levantamentos topográficos com dados obtidos por sistemas de posicionamento global (Global Navigation Satellite System), que permitiram maiores precisões nos dados georreferenciados, foi possível a obtenção de dados em escalas topográficas nas metodologias de monitoramento dos processos erosivos lineares. Estes dados topográficos, ao serem associados aos sistemas de informações geográficas, permitem a geração de mapeamentos e diagnósticos mais detalhados destes processos erosivos lineares (FRANCISCO, 2012). Neste contexto de avanços das metodologias de monitoramento dos processos erosivos lineares ocorre uma necessidade eminente por estudos sobre as erosões urbanas, sendo a região do Oeste do Estado de São Paulo uma das mais afetadas em território brasileiro. No caso do município de Rancharia, Oliveira (1994) apresentou um estudo sobre as voçorocas urbanas e mostrou que a voçoroca do córrego do Grito é responsável pela produção de sedimentos e formação de depósitos tecnogênicos nesta microbacia. O mapa da figura 01 mostra a localização da voçoroca. 342
Figura 01. Mapa de localização da voçoroca do Córrego do Grito, município de Rancharia, Estado de São Paulo. Após a implantação de obras de controle de erosão urbana, com estruturas de macrodrenagem, por volta do ano de 2000, ocorreu a estabilização da erosão remontante na voçoroca do Córrego do Grito. No entanto, a prática da pecuária na área de uso rural do perímetro urbano e ausência de práticas conservacionistas - terraceamento em curvas de nível, principalmente - induziram a formação de ravinamentos laterais na voçoroca e contribuíram com o alargamento desta forma erosiva. Em alguns trechos a voçoroca chega a possuir 60 m de largura e 12 m de profundidade, sendo aproximadamente 380 m de comprimento e uma área de aproximadamente 15.000 m² (dados de julho de 2014). A figura 02 mostra um modelo digital de elevação do terreno da voçoroca. 343
Figura 02. Representação altimétrica da voçoroca do Córrego do Grito, município de Rancharia-SP. Diante das condições de risco apresentadas pelo desenvolvimento da voçoroca do Córrego do Grito, o objetivo deste trabalho é apresentar uma carta de risco de erosão linear para subsidiar as políticas necessárias para o controle da erosão urbana e o zoneamento urbano a fim de evitar a ocupação em áreas de risco. 2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Para a elaboração da carta de risco de erosão linear foram elaboradas duas bases de dados georreferenciados de declividades topográficas e de cobertura de vegetação. Os dados topográficos de uma área degradada pelo voçorocamento na periferia da cidade de Rancharia foram obtidos com base em levantamentos de campo, realizados em julho de 2014. Os dados sobre a cobertura de vegetação foram obtidos com base na interpretação de imagem de sistema sensor orbital. Os levantamentos planialtimétricos de campo foram realizados com o uso de receptores geodésicos GNSS (Global Navigation Satellite System) e estação total topográfica. Com base nos dados topográficos obtidos após o pós-processamento foi gerado um modelo digital de elevação (Digital Elevation Model) e no aplicativo Surfer, através da rotina Terrain Slope, foi gerada a carta clinográfica (declividades) conforme os graus de inclinação do terreno. 344
Para a elaboração da carta de cobertura de vegetação foi empregado o método dos pontos (MANTOVANI; MARTINS, 1990) com base na coleta de amostras de pontos georreferenciados pela interpretação de imagem de sistema de sensor orbital GeoEye (Digital Globe Corporation) datada de maio de 2010. A interpretação da imagem ocorreu com base na identificação das classes de cobertura de vegetação, com a imagem georreferenciada no aplicativo Quantum GIS. Os atributos estabelecidos para cada classe estão apresentados na tabela 01. Tabela 01. Classes de cobertura de vegetação. Classes de vegetação Atributos Solo exposto 00 Gramíneas e/ou pastagem 05 Vegetais arbustivos 10 Vegetais arbóreos dispersos 15 Vegetais arbóreos densos 20 A partir de uma planilha com os pontos identificados pelas coordenadas e seus atributos foi gerada a carta de cobertura vegetal no aplicativo Surfer. Para a geração da carta de risco de erosão linear foi realizado o cruzamento dos dados georreferenciados de declividades e de cobertura de vegetação através de uma matriz com função: f(a * B). Esta matriz foi gerada através da rotina Grid Math do aplicativo Surfer. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Sobre a topografia da área degradada pelo voçorocamento, nota-se a presença de declividades próximas aos 50º de inclinação nas rupturas de declive da cabeceira da voçoroca, No interior da voçoroca é notada a presença de declividades abaixo de 10º, caracterizando a morfologia de fundo plano, com o perfil transversal da voçoroca similar ao formato de U pelas paredes íngremes. Em relação às condições de cobertura vegetal, na área degradada ocorre a presença de cobertura densa na cabeceira da voçoroca e de vegetação arbustiva no interior da mesma, principalmente favorecida pela presença de umidade do fundo de vale. A manutenção da vegetação na cabeceira da voçoroca favoreceu o controle da erosão remontante, sendo esta manutenção da vegetação garantida pelas obras de macrodrenagem e controle da erosão urbana pela estabilidade do solo. 345
A figura 03 mostra a carta de risco de erosão linear com base nos dados espaciais de declividades e classes de coberturas de vegetação. Nota-se a presença de setores com alto risco num trecho a montante e em trechos nos ravinamentos da margem esquerda da voçoroca. Figura 03. Carta de risco de erosão linear. A figura 04 mostra alguns detalhes dos setores com alto risco de erosão linear. É fundamental observar o estado geral de grande potencial de perda de solos em toda a extensão da voçoroca. 346
Figura 04. Setores da voçoroca com alto risco de erosão linear. 347
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A elaboração de bases cartográficas através da topografia de campo, com emprego do sistema GNSS e de informações geográficas através de imagens de sistemas sensores orbitais com resoluções espaciais em grandes escalas, favorece o estudo dos processos erosivos lineares. Em decorrência dos riscos apresentados pelos processos erosivos, principalmente nas periferias urbanas, as informações geográficas e o monitoramento desses processos contribuem para a elaboração de prognósticos a fim de delimitar as áreas de risco e evitar a ocupação urbana nestas áreas. A carta de risco de erosão linear pode ser utilizada como subsídio ao planejamento público municipal para delimitar as áreas restritas à ocupação urbana e delinear as necessidades por obras de macrodrenagem em prol do controle da erosão urbana. Agradecimentos Os autores agradecem à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pelos recursos disponibilizados para publicação e apresentação deste trabalho a partir da bolsa de doutorado concedida a Alyson Bueno Francisco (Processo nº 2013/05664-4). 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA FILHO, G.S. (2008) Processos erosivos urbanos. In: POLETO, C. (Ed.) Ambiente e sedimentos. pp. 39-63, Porto Alegre, Rio Grande do Sul: Associação Brasileira de Recursos Hídricos. FRANCISCO, A.B. (2012) Estimativa de taxas de erosão linear através de levantamento por posicionamento global e densidade do solo. Revista Brasileira de Geografia Física, Recife, 05(1), pp. 1035-1045. GUERRA, A.J.T. (2005) Experimentos e monitoramentos em erosão dos solos. Revista do Departamento de Geografia, São Paulo, 16 (1), pp.32-37. MANTOVANI, W.; MARTINS, F. R. (1990) O método de pontos. Acta Botanica Brasilica, 2(4), pp. 95-122. OLIVEIRA, A.M.S. (1994) Depósitos tecnogênicos e assoreamento de reservatórios: exemplo do reservatório de Capivara, Rio Paranapanema, SP/PR. Tese de Doutorado em Geografia Física, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 211 pp. OLIVEIRA, A.M.S.; BRANNSTROM, C.; NOLASCO, M.C.; PEDOGGIA, A.U.G.; PEIXOTO, M.N.O.; COLTRINARI, L. (2005) Tecnógeno: registros da ação geológica do homem. In: OLIVEIRA, A.M.S.; OLIVEIRA, P.E.; SUGUIO, K.; SOUZA, C.R.G. (Ed.) Quaternário do Brasil. Ribeirão Preto: Holos, pp. 363-377. 348
ROSSATO, M.S.; BELLANCA, E.T.; FACHINELLO, A.; CÂNDIDO, L.A.; SUERTEGARAY, D.M.A. (2003) Terra: feições ilustradas. Porto Alegre: Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. 349