04/07 IDENTIDADE IDEAL VERSUS CORRUPÇÃO EM PROPAGANDA POLÍTICA Regiane Bellay (Universidade Estadual de Maringá mestranda em Letras)

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Gustavo Grandini BASTOS * Fernanda Correa Silveira GALLI **

Transcrição:

04/07 IDENTIDADE IDEAL VERSUS CORRUPÇÃO EM PROPAGANDA POLÍTICA Regiane Bellay (Universidade Estadual de Maringá mestranda em Letras) Introdução Para sustentar o discurso da honestidade, na Venezuela, um candidato chamado Alfonso Hernández fez propaganda política, utilizando uma foto sua sem roupas. Para Possenti (2009a), o domínio dos instrumentos necessários para avaliar certos aspectos da linguagem dos candidatos sem preconceitos é raro entre intelectuais. Esse artigo objetiva analisar a propaganda em questão sem julgamento de valor, seja quanto ao tipo de linguagem utilizada, seja quanto ao posicionamento total analisado no discurso, em que o acontecimento político nessa propaganda política traz o dilema da corrupção e da honestidade à memória social, à mítica e à histórica. Nora (1995) afirma que a história, a qual trata do passado, surge quando a época abordada não mais vive. Para Gregolin (2000), há três formas de olhar o passado: a memória mítica, a memória social e a memória constituída pelo historiador. Orlandi (2001) não separa o sujeito dos sentidos, da identidade, ao tratar do discurso. Para Orlandi (2005), as palavras fazem parte do discurso, efeito de sentidos entre locutores, que se delineia ao relacionar-se com outros, pois há dizeres que se alojam na memória. A ideologia materializa-se no discurso. Com isso, produz seus efeitos. Ao estudar-se o discurso, explicitam-se as relações entre linguagem e ideologia. A identidade do sujeito se dá ideologicamente, através da inscrição desse em uma formação discursiva, não havendo a existência de um sem o outro. Desse modo, há a ilusão de que o dizer origina-se pelo sujeito, pois o próprio sujeito é resultado de um processo. Para Ducrot (s/d, apud Possenti, 2009b), o sujeito sabe o que diz, faz manobras e é tático. De Certeau (1990, apud Possenti, 2009b) afirma o sujeito como usuário e não como consumidor. Segundo Possenti (2009b), a memória é um conjunto de representações dos acontecimentos, em termos de evento. Os slogans retomam-se, pois são construtos de enunciados correntes. Especialmente, os slogans políticos são retomados ao veicularem-se a campanhas eleitorais anteriores.

Segundo Revel (2005), para Foucault os acontecimentos são repetidos por nós, sem que se tenha ideia disso. A população é objeto da governamentalidade. O controle social se dá por uma série de poderes. O corpo constitui-se como objeto e alvo do poder. Para governar a cidade é preciso o adequado cuidado de si, sendo mais útil o mais obediente na sociedade. Os operadores materiais do poder são as técnicas, as estratégias e as formas de assujeitamento. A estética da existência é um gesto político, pois é uma prática ética de produção de subjetividade e é assujeitada e resistente. A maneira pela qual cada um constitui a si mesmo como sujeito moral do código constitui a ética. As diferenciações, o objetivo, os instrumentais, as formas de institucionalização e o grau de racionalização do poder são essenciais para a análise desse. A subjetivação é um processo pelo qual se obtém a constituição de um sujeito. Segundo Gregolin (2007), a investigação de Foucault percorreu várias direções, buscando as seguintes compreensões: transformação histórica dos saberes; as articulações entre os saberes e os poderes; e a construção histórica das subjetividades. O sujeito é objeto de pesquisa de Foucault como objeto de saber, de poder ou de construção identitária. A constituição do saber é tratada pela análise dos discursos que constituem objetos desse saber. O homem é sujeito do saber e é um acontecimento. O enunciado é inserido na rede da História, que o constitui e o determina simultaneamente, sendo que nem tudo pode ser dito, uma ordem do discurso regula o que pode ser dito. A interdição determina palavras proibidas, revelando a ligação do discurso com o desejo e o poder. Os enunciados pertencem a uma única formação discursiva, sendo o discurso um conjunto de enunciados. O ritual, as sociedades de discurso, as doutrinas e as apropriações sociais fazem parte das regras que cercam os sujeitos ao pronunciarem um discurso. Todos os sistemas de sujeição e de controle dos discursos são interligados. Desse modo, as lutas sociais têm como objetivo principal exercer uma forma de poder na vida cotidiana, pois essas lutas encontram-se na busca da identidade. Para Foucault (1998), existem tipos de acontecimentos diferentes. Com isso, o alcance, a amplitude cronológica e a capacidade de produzir efeitos não têm o mesmo efeito. A história deve ser analisada segundo a inteligibilidade das lutas, das estratégias, das táticas. O sujeito deve ser analisado na história, mas sem que esse seja transcendente em relação ao campo de acontecimentos, com sua identidade vazia perseguida ao longo da história. Quanto à ideologia, o autor afirma que é necessário ver a produção de efeitos de verdade historicamente, no interior dos discursos, os quais não são nem verdadeiros e nem falsos em si. O poder permeia, produz coisas, induz ao prazer, forma

saber, produz discurso, fazendo com que esse se mantenha e seja aceito. A verdade não existe fora do poder ou sem poder, sendo produzida pelas coerções do mundo, onde regulamentos de poder são produzidos. Portanto, a verdade tem cinco características: centrada na forma do discurso científico e nas instituições que o produzem; submetida à economia e à política; objeto de difusão e de consumo; controlada por aparelhos econômicos e políticos; objeto de debate político e de confronto social. Identidade política Na Venezuela, um candidato chamado Alfonso Hernandez fez propaganda política, utilizando uma foto sua sem roupas, tampando os órgãos genitais com suas mãos, e com a seguinte inscrição ao lado: Sr. Gobernador y Sr. Alcalde: Maracaibo Oeste los desnuda (disponível em: <http://www.colunistas.ig.com.br>). Logo abaixo apresentou o símbolo do partido Abriendo Caminos e seu nome. Do lado oposto a sua foto, colocou uma foto de Maracaibo com a inscrição Alcaide de Maracaibo, nomeando a cidade com o nome do político administrador dessa, demonstrando que ele, Alfonso, estando nu, não tinha nada para esconder, mas o Alcaide (o prefeito) teria do que se envergonhar, através da cidade que apresentava péssimas condições. Por remeter ao discurso de convivência social, o político apresenta-se com as mãos tampando seus órgãos genitais, já que diz na propaganda que não tem nada para esconder, mas não mostra o que por convenção não se mostraria em um outdoor. Com base nesse discurso do uso de roupas, o político Alfonso Hernández tira suas roupas para mostrar que não tem nada a esconder e que o povo de Maracaibo está pelado ou sem a administração adequada, o que remete ao discurso do pobre que não tem condições de adquirir bens, como roupas e outros, e ao discurso da trapaça, de que se escondem objetos em roupas para roubar, seja em jogos ou não, remetendo ao outro político que não fez nenhuma propaganda mostrando que não tinha nada para esconder, do modo como Alfonso se propôs realizar. Essa propaganda foi construída com base no modelo de propaganda que divulga o modelo de corpo ideal, sendo que, nesse caso, não apresenta um modelo de identidade física padrão, mas apresenta o modelo de honestidade que constitui uma característica essencial para o governo de uma cidade, representada pelo corpo nu. A honestidade, por

sua vez, está ligada ao que é bom ou belo. A beleza, nesse caso, indica o que o outro político tem de feio, que é a desonestidade, observada na situação de Maracaibo. Quando o discurso da propaganda política afirma a honestidade, dialoga com a memória social, histórica e mítica da corrupção, porque retoma o que não constitui uma identidade ideal para a política. A foto que ilustra a situação precária da cidade relaciona-se com a questão da corrupção no campo político, pois os que recebem os cargos para cuidar desse lugar deixam-no em péssimas condições. Como Possenti (2009a) afirma a retomada de slogans em campanhas políticas, Alfonso faz uso do discurso da honestidade com base no que não foi cumprido pelo partido do político que havia assumido a cidade, como resultado da campanha política anterior. Segundo o que Revel (2005) aborda sobre a teoria de Foucault, a propaganda em questão aponta para a governabilidade desejada pelo político para com a cidade, corpo alvo do poder, ao mesmo tempo em que esse é governado pelos discursos de poder, sendo também corpo alvo do poder, no que esse precisa demonstrar diante dos outros partidos, colocando-se como sujeito ideal para atuar no cargo desejado. O político usa de estratégias do discurso para colocar-se como o mais útil, o mais obediente aos princípios do discurso político da honestidade. Para tanto, coloca-se como detentor do poder ao mesmo tempo em que é dominado pelo poder social que o impede de dizer o que quiser da forma que quiser, exemplo disso são os órgãos genitais tampados pelo poder da censura agindo sobre esse, o que, segundo Orlandi (2005), demonstra que esse sujeito é resultado de um processo dos discursos que se relacionam com o presente e com o passado. Com isso, a verdade divulgada sobre a afirmação da honestidade de Alfonso e a desonestidade, que envolve os políticos citados por esse, ao ser observada, segundo o que Foucault (1998) propõe, está fundada na forma de discurso científico e nas instituições que a produzem. Ao mostrar uma foto da cidade como consequência da administração criticada e como produto do partido concorrente, constrói-se parte do debate político no confronto social, o que é complementado por todo o discurso presente na propaganda. Conclusão

Portanto, a identidade da honestidade pode ser observada na constituição da propaganda política de Alfonso, a qual divulga a honestidade desse candidato a prefeito versus a corrupção, a incapacidade de governar do partido criticado por ele. Nessa propaganda, o corpo, objeto de desejo, que é a cidade, passa pela governabilidade do discurso político, o qual também é corpo de desejo do poder, sendo limitado no que pode ou não dizer. Referências FOUCAULT, M. Microfísica do poder. 13. ed., Rio de Janeiro: Edições Graal, 1998. p. 1-14. GREGOLIN, M. R. Foucault e Pêcheux na Análise do Discurso: Diálogos e Duelos. São Carlos: Editora Claraluz, 2007. 3 edição. GREGOLIN, M. R. Recitações de mitos: a História na lente da mídia. In: GREGOLIN, M. R. (Org.). Filigranas do discurso: as vozes da história. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2000, p. 19-34. NORA, P. O retorno do fato. In: LE GOFF, J; NORA, P. História: novos problemas. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1995, p.179-193. ORLANDI, E. P. Análise de Discurso: princípios e procedimentos. Campinas: Pontes, 6ª ed., 2005. ORLANDI, E. P. Discurso e Texto : formulação e circulação dos sentidos. Campinas: Pontes, 2001. POSSENTI, S. Língua na mídia. São Paulo: Parábola Editorial, 2009a. POSSENTI, S. Questões para analistas do discurso. São Paulo: Parábola Editorial, 2009b, p. 127 140. REVEL, J. Foucault: conceitos essenciais. São Carlos: Claraluz, 2005. PROPAGANDA política. [S.l.: s.n.], Disponível em: <http://www.colunistas. ig.com.br>. Acesso em: 24 maio 2009.