Latusa digital ano 2 N 19 outubro de 2005



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Transcrição:

Latusa digital ano 2 N 19 outubro de 2005 Sinthoma e fantasia fundamental no caso do homem dos ratos * Cleide Maschietto Doris Rangel Diogo ** O Homem dos ratos 1 é um caso de neurose muito comentado, o que possibilita pensar como nele se articulam sinthoma e fantasia fundamental. Pode-se dizer que nesta análise ocorreu apenas uma ultrapassagem da fantasia ou houve também a construção de um sinthoma? Há uma discussão sobre o que é o sinthoma, escrito com th, e sua relação com o sintoma, tal como estabelecido por Freud 2. O sinthoma seria algo inédito que se alcança somente no fim de uma análise ou seria também alguma produção, uma nomeação, a partir da circunscrição de um gozo opaco, durante o percurso de uma análise ou mesmo antes desta? Neste último caso, ou seja, quando o sinthoma não fica restrito ao fim de uma análise, um sintoma seria também um sinthoma. * Este trabalho é resultado de discussões que tiveram lugar na Oficina Sinthoma e fantasia, coordenada por Stella Jimenez e Angela Bernardes, como atividade preparatória das XVI Jornadas Clínicas da EBP-Rio, Sinthoma, corpo e laço social. ** Cleide Maschietto e Doris Diogo correspondentes da Escola Brasileira de Psicanálise, Seção Rio de Janeiro (EBP-RJ). 1 FREUD, S. Notas sobre um caso de neurose obsessiva (1909). Em: Obras completas. Rio de Janeiro: Imago, 1980, vol. X. 2 FREUD, S. Inibições, sintoma e angústia (1925 [1927]). Em: Obras completas. Rio de Janeiro: Imago, 1980, vol. XX. 1

Stella Jimenez3 aponta, a este respeito, a conjunção e a disjunção entre sintoma e sinthoma no Seminário 23: o sinthoma 4, onde Lacan, ao escrever sintoma, faz também referência ao conceito de sinthoma com todas as suas implicações, além de se referir ao sinthoma como quarto elo, mesmo quando escrito sem th. Citando o Curso de Orientação Lacaniana de 2004-2005 de Jacques-Alain Miller 5, Stella afirma que não se trata de substituição de um conceito por outro, mas sim de que o sinthoma estaria presente no sintoma da mesma maneira que a letra está presente no significante, sendo, portanto, em sua essência, irredutível ao significante. O trabalho analítico visaria possibilitar essa diferenciação, levá-lo a ponto do analisando inventar para si um sinthoma. Haveria, no entanto, uma diferença entre o sintoma/sinthoma do neurótico, entre o Nome-do-Pai, como quarto elo, e sinthoma de fim de análise, já que este último é efeito de um trabalho de redução que implica mais do que uma separação entre o sujeito dividido, ($) e o objeto a. Mas esta diferença não impede que se fale de sinthoma para indicar uma construção anterior à análise, conforme apontam Angela Bernardes e Stella Jimenez em Latusa n 10: Na neurose, o Nome-do-Pai e/ou sinthoma está presente, senão desde o início, pelo menos a partir da resolução do Édipo ou, no mais tardar, a partir do início da puberdade. 6 Na análise, devido à orientação do real, uma ultrapassagem pode se dar no ponto em que a construção da fantasia pode ir além da identificação e tocar o 3 JIMENEZ, S. Sinthoma e fantasia fundamental. Em: Latusa digital, nº 12. Rio de Janeiro: EBP-Rio, março de 2005. 4 LACAN, J. Le Séminaire, Livre XXIII: Le Sinthome. Paris: Éditions du Seuil, 1999, aula de 11/5/1976. 5 MILLER, J.-A. Curso de Orientação Lacaniana 2004-2005, Pièces detachées, aula de 15/12/2004. Inédito. 6 BERNARDES, A e Jimenez, S. Sinthoma e fantasia fundamental. Em: Latusa, n 10, Sinthoma, corpo e laço social. Rio de Janeiro: EBP-Rio, outubro de 2005. 2

gozo, ponto em que o sujeito estaria na posição do objeto a, e no qual a fantasia pode vir a se reduzir à pulsão. 7 Retomando nossa questão: no caso do Homem dos ratos, pode-se falar em fantasia ou em sinthoma, a partir do trabalho de análise? Em uma releitura deste caso, destacamos o significante criminoso no relato de Freud. Esse significante remete a um vaticínio do pai, ainda que sob a forma de uma dúvida: Ou este menino vai ser um grande homem ou um grande criminoso, quando na infância, sob efeito da raiva após uma surra, o filho chamou-o como: Seu lâmpada! Seu toalha! Seu prato! 8. Isto é, quando ele, menino, degradou o pai, nomeando-o como um objeto. Comentando sobre o poder da blasfêmia, ele assinala que esta faz decair o significante supremo, eminente, pai. O blasfemador faz esse significante decair na categoria do objeto, ele como que identifica o logos com seu efeito metonímico e o faz descer um degrau. Trata-se de fazer o Outro descer à categoria do objeto e de destruí-lo. 9 O paciente destacou que o significante criminoso, que assinala o vaticínio paterno, retornou em uma lembrança despertada quando morre uma tia, dezoito meses após a morte de seu pai. Momento a partir do qual, ele passou a se atribuir culpa por uma atitude de negligência por ocasião da morte de seu pai. O vaticínio do pai lhe oferecia dois destinos: ser um grande homem ou ser um criminoso. Ele escolheu identificar-se a criminoso, significante que veio recobrir parte de suas obsessões, portanto, seu sintoma. Isso ficou no âmago do seu embaraço como sujeito, nos pensamentos e atos compulsivos, nos quais ligava o desejo de ver mulher nua ao medo e o desejo de que o pai 7 MILLER, J.-A. Los signos del goce. Buenos Aires: Paidós, 1999, p. 246. 8 FREUD, S. Notas sobre um caso de neurose obsessiva (1909). Op. cit., p. 208. 9 LACAN, J. O seminário, livro 5: as formações do inconsciente (1957-1958). Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1990, pp. 482-483. 3

deveria morrer. Em um segundo tempo, criminoso surge também no relato do Capitão sobre o suplício com os ratos, já que este era aplicado como castigo aos criminosos. Freud assinala 10 que o próprio paciente aponta este incidente da infância como relevante, afirmando que isso teria provocado uma mudança em seu caráter: ele se tornara covarde, por medo da sua própria violência durante uma reação de raiva. Portanto, criminoso se destaca como s(a), isto é, como sintoma, já que se refere ao retorno do mandato do supereu, presente nas dúvidas e compulsões. Qual seria o status de rato? Rato pode ser situado nos registros do Real, do Simbólico e do Imaginário. No Simbólico, rato se presentifica no deslizamento significante da cadeia associativa: raten-ratten (ratos-prestações); heiraten (casar); spielratte (rato de jogo). No Imaginário, rato aparece na cena do suplício relatada pelo capitão e comentada pelo paciente. No Real, rato nomeia algo do gozo do Outro, indizível, mas expresso inclusive na face do paciente, gozo apreendido por Freud como uma face de horror ao prazer todo seu do qual ele mesmo não estava ciente. 11 Freud teria circunscrito o objeto rato, ligado tanto à crueldade do castigo aplicado a criminosos e relatado pelo capitão, como à crueldade do paciente, já que este estendeu o castigo, por meio da associação, a seu pai e à dama. A crueldade tanto é atribuída ao Outro como é um pensamento do sujeito, que, ao relatá-la, dá um passo no sentido de vir a admiti-la como algo que lhe diz respeito, na direção de uma retificação subjetiva no trabalho de análise. Com isso, Freud teria tocado algo do real, do gozo da fantasia do sujeito. A crueldade, como manifestação do supereu, reaparece em outro momento da análise, quando o paciente associa Freud a um assassino, o que exigiu deste 10 FREUD, S. Notas sobre um caso de neurose obsessiva (1909). Op. cit., p. p. 208. 11 Idem, ibidem, p. 171. 4

uma manobra da transferência para lidar com o que poderia vir a se tornar um obstáculo ao tratamento. No texto O estranho, Freud retoma um ponto deste caso clínico, quando o paciente relata uma experiência vivida como estranha, em que ele se refere à morte de um sujeito em um quarto de hotel, contíguo ao dele, duas semanas após ter proferido seu desagrado por este senhor ter ocupado o quarto de sua preferência. Na ocasião, disse: Quero que ele caia morto por causa disso. 12 Freud utiliza este exemplo para apontar o sinistro, para desenvolver a idéia de que na experiência de estranheza é de algo familiar que se trata, o que retorna sob a forma de compulsão à repetição. E nada mais familiar a este paciente do que este pensamento/desejo de onipotência, de que ele poderia causar a morte do outro, o que estava presente também em seu desejo/medo da morte do pai. Isto tem relevância no caso, visto que indica a posição de Senhor da morte à qual o paciente estava fixado, já que este tipo de pensamento (desejo de morte) fazia parte do núcleo de sua fantasia. Este tipo de experiência revela um certo encontro com o real, sob a forma de compulsão à repetição, que retorna como gozo, uma experiência real, no dizer de Freud. 13 Destaca-se, no caso, uma questão em relação à função paterna traduzida por um amor/ódio eterno ao pai, uma vez que ele não podia desejar sua dama sob outra condição que não fosse através de um gozo singular que alcançasse a ela e, ao mesmo tempo, ao pai no outro mundo. Se ele olhasse mulheres nuas, a punição com ratos seria infligida ao pai e à dama. A lei do amor, que Lacan nomeia père-version, é a lei advinda do pai como portador da castração. Seu pai foi designado por ele: spielratte (rato de jogo). Este significante ligado a heinratten (casar), endereça ao sujeito duas dívidas paternas: uma de jogo, nunca paga, e outra de amor, à mulher pobre. Ele, no entanto, nem se casa, 12 Idem, p. 298. 13 Idem, p. 299. 5

nem paga sua própria dívida com a mulher do Correio. Quanto a tomar uma mulher como objeto de seu desejo, ele prefere o indecidível. Ao tomar para si, como herança, a dívida do pai, ele mantém o gozo necessário para sustentar o impossível do desejo obsessivo. Em Subversão do sujeito 14, Lacan afirma que o sujeito é o objeto de sua fantasia. Neste caso, rato é a nomeação do objeto anal. Ele é o rato. Neste sentido, rato nomeia este sujeito, sendo um signo do gozo por ele manifestado. A fantasia, no caso do Homem dos ratos seria: Penetra-se uma criança pelo ânus, com ratos/fezes. Considerando o caso do Homem dos ratos, o sujeito podia dispor da fantasia, como realidade psíquica já constituída, antes da análise, mas por outro lado, foi preciso essa nomeação do gozo, rato, a partir da construção da fantasia na análise, para inscrever o que, até então, se manifestava como real, apontando para a construção de algo novo, um nome, Homem dos ratos, uma forma de situar o Outro e o objeto a, portanto, uma outra forma de laço social, que possibilitou sua saída do tratamento. Assim, nesse caso clínico, rato tanto indica o objeto da fantasia, a, como aponta o sinthoma, um misto de sintoma e fantasia. No entanto, não se pode dizer que esta construção do sinthoma, a partir do ciframento do gozo através do significante rato, tenha o mesmo status que um sinthoma de fim de análise, seja porque essa nomeação lhe foi atribuída por Freud, e não pelo próprio sujeito, seja porque um sinthoma de fim de análise requer uma construção inédita, algo diferente de uma nomeação do gozo da fantasia. Para concluir, poderíamos situar no grafo do desejo alguns elementos desta análise: poderíamos escrever criminoso em s(a), que aparece sob a forma das 14 LACAN, J. Subversão do sujeito e dialética do desejo no inconsciente freudiano (1966). Em: Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar editor, 1998, p. 832. 6

suas dúvidas/dívidas e dos atos compulsivos, Senhor da morte como I(A) e rato, como objeto a da fantasia. E como matema da fantasia: Penetra-se uma criança pelo ânus com um rato. 7