Profissionais da Saúde: impactos psicossociais após acidente ocupacional com material potencialmente contaminado

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Transcrição:

150 Profissionais da Saúde: impactos psicossociais após acidente ocupacional com material potencialmente contaminado Iris Ricardo Rossin - Doutor em Medicina (Faculdade de Medicina da USP Ribeirão Preto), Médico Assistente Departamento de Clínica Médica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Docente do Curso de Medicina do Centro Universitário Estácio de Ribeirão Preto. Resumo O reconhecimento de que a elevada incidência de exposições ocupacionais com risco de contaminação torna tal problema uma questão de saúde pública e faz com que o estudo da ocorrência destas exposições ocupacionais a materiais potencialmente infectantes seja extrema importância para a adoção de medidas efetivas, para minimizar efeitos sobre a vida pessoal e social dos trabalhadores da saúde. Baseado na experiência profissional e na atuação como médico infectologista que atende acidentes ocupacionais, posso afirmar que tanto as dimensões subjetivas quanto objetivas implicadas nestes eventos devem ser consideradas para uma melhor atuação dos profissionais da saúde. A prevenção das exposições ocupacionais exige análise das fontes de dados para que se possa indicar com exatidão os dados epidemiológicos que permitam atuação direta, como o perfil dos profissionais acometidos, quais questões além das técnicas estão envolvidas, sendo necessário considerar dimensões subjetivas implicadas nestes eventos, além dos meios pelo qual a exposição ocorre. Este estudo busca avaliar implicações psicossociais relacionadas à experiência da ocorrência de exposições ocupacionais a materiais potencialmente infectantes. Será realizado levantamento bibliográfico das principais fontes de dados sobre o assunto, visando compilação dos conhecimentos já existentes. Sendo assim poderá se sugerir alterações nos elementos referentes à organização do trabalho apontando as mudanças necessárias para a melhor adaptação das políticas de saúde e segurança do trabalhador incluindo apoio e suporte psicológico para enfrentamento das dificuldades cotidianas. Palavras-chave: Distúrbios Emocionais, Acidente de trabalho, HIV, Hepatite B e C Introdução O trabalho está inserido nas relações humanas o cientificismo tem guiado a padronização de condutas nesta área mas muitos aspectos humanos tem sido esquecidos. Os trabalhadores da área da saúde estão constantemente expostos ao risco de contaminação durante suas atividades regulares no ambiente de trabalho, seja qual for o nível de complexidade em que estejam envolvidos. Durante os cuidados dispensados aos pacientes infectados, os profissionais de saúde entram em contato com diferentes fluidos corporais, em especial, o sangue, o qual é a principal fonte de transmissão de importantes patógenos. A incidência destes episódios torna

151 tal problema uma questão de saúde pública, causas e consequências da ocorrência destes acidentes ultrapassam questões técnicas sendo necessário considerar dimensões subjetivas implicadas nestes eventos. A procura dos profissionais de segurança e de recursos humanos pelas avaliações psicológicas com a finalidade de verificar o perfil de trabalhadores com propensão a sofrerem acidentes de trabalho tem crescido muito nos últimos tempos. 1. Risco ocupacional Com o advento da aids, no início dos anos 80 do século passado, a comunidade científica passou a dar importância à possibilidade de infecção através de exposição ocupacional (ANONIMOUS 1984) e diversos foram as publicações sobre o tema (Rissi, Machado & Figueiredo, 2005). Dentre os patógenos que possuem uma maior importância do ponto de vista epidemiológico e que são suscetíveis de transmissão através de exposição acidental a material biológico potencialmente contaminado (MBPC) estão o vírus da imunodeficiência humana (HIV), o vírus da hepatite B (HBV) e o vírus da hepatite C (HCV) (CARDO, 1997). A forma de transmissão ocupacional faz-se pelo contato com sangue sendo o acidente perfuro cortante o de maior risco. Pode-se oferecer profilaxia pós-exposição ocupacional contra o HIV e HBV, mas não há disponibilidade no caso do HCV (BRASIL, 2013). As conseqüências da exposição ocupacional à MBPC não se reduzem à possibilidade de infecções, mas incluem dimensões psicossociais, como o impacto do acidente, a espera de resultados dos testes sorológicos realizados, significados atribuídos à profilaxia., medicamentosa (CORSER, 2015), aspectos pessoais devem ser considerados (MARZIALE & NYSHIMURA, 2004). Os acidentes ocupacionais e o uso de medicamentos pode provocar desconforto e extrapolar aspectos relacionados ao trabalho (CARVALHO, 2008). Nesse sentido, a necessidade da negociação da vida sexual se coloca como outro obstáculo a ser transposto pelo profissional, uma vez que, geralmente, o uso do preservativo não é uma prática usual em relacionamentos estáveis (RISSI, 2005). Nesse sentido, o profissional deverá ser orientado, durante o período de acompanhamento, para adotar medidas para prevenir a transmissão sexual (utilizando preservativos), evitar a doação de sangue/órgãos, gravidez e aleitamento materno (MACHADO, 2006).

152 Não são raros os casos de recusa de atendimento e discriminação, na assistência aos pacientes. Evidentemente, uma vez que fazem parte desta sociedade, não seria de se esperar que entre os profissionais de saúde os comportamentos fossem radicalmente diferentes dos demais. Além disto, a alta taxa de letalidade, apesar do coquetel (grupo de medicamentos com a capacidade de destruição do vírus HIV), leva o profissional a deparar-se freqüentemente com a morte. O próprio fato de ainda não existir cura para AIDS (OSÓRIO, MACHADO & MINAYO-GOMES 2008). Considerações Finais Diversos estudos demonstram que além dos aspectos fisiológicos realacionados aos acidentes com material biológico potencialmente contaminado encontrados na revisão mostram que emergiram duas conseqüências do acidente com MBPC: a primeira delas diz respeito às conseqüências fisiológicas e a segunda conseqüência apontada diz respeito aos aspectos psicossociais (alterações do cotidiano, risco de contaminação, expectativas dos exames, reações frente à notícia, revolta, suporte familiar e reavaliação da profissão). Tais dados deixam evidentes que a exposição ocupacional à material biológico potencialmente contaminado tem repercussão na vida social e familiar, configurando uma aproximação entre contextos. O espaço social e pessoal, particular, é invadido de forma desorganizadora pelo impacto do acidente. Identificamos a necessidade de realização de treinamentos, cursos, entre outros instrumentos de educação, reforçando os diferentes riscos envolvidos nos acidentes com materiais biológicos, além da importância da utilização adequada das medidas preventivas incluindo as precauções padrão. As dimensões psicossociais do acidente se mostram como de um processo dinâmico e complexo que envolve a precarização do trabalho hospitalar, as repercussões psicossociais pósacidente no trabalho e na família e sua associação com o HIV/AIDS e as reações psicossomáticas pós-profilaxia. As consequências psicossociais do acidente biopsicossociais afetam não só os profissionais envolvidos no acidente, mas também as pessoas do seu convívio íntimo. A experiência subjetiva dos atores sociais frente ao acidente está intrinsecamente associada às representações que eles fazem da possibilidade de contaminação. As pessoas do convívio íntimo dos profissionais de saúde apresentam padrões morais e preconceitos semelhantes ao da sociedade em geral e esses aspectos emergem no momento do acidente e durante o período de

153 tratamento. A não existência de cura e a associação da aids com a morte aumentam o sentimento de impotência e sofrimento após o acidente. A experiência de passar por um acidente ocupacional envolvendo material biológico potencialmente contaminado é algo extremamente individual e, provavelmente, cada profissional enquanto indivíduo adotará comportamentos e condutas diferenciadas considerando-se um mesmo tipo de acidente nas mesmas condições. O significado do acidente para cada profissional está diretamente associado aos conceitos, valores, princípios de vida e conhecimentos do indivíduo sobre o assunto, ou seja, de acordo com sua percepção de todo contexto relacionado ao acidente. As vivências do trabalhador em seu ambiente de trabalho repercutem em seu contexto social e doméstico, exercendo influência na qualidade de suas relações e interferindo em sua vida como um todo. Além disso, revelar o acidente é assumir para si e para os outros os riscos ao qual o profissional está exposto em seu dia a dia, dessa forma ele recai indiretamente sobre toda a família (LUNARDI & MAZZILI, 2016). A convivência cotidiana com ambiente insalubre ou de risco, pode diminuir a percepção das pessoas sobre a necessidade de adotar medidas preventivas para a sua própria segurança. Percebe-se a necessidade de realização de treinamentos, cursos, entre outros instrumentos de educação, reforçando os diferentes riscos envolvidos nos acidentes com materiais biológicos, além da importância da utilização adequada das medidas preventivas incluindo as precauções padrão. Além disso, recomendamos a estruturação e/ ou ampliação de um programa voltado para uma melhor assistência à saúde do trabalhador como um todo, incluindo um programa de imunização dos profissionais de saúde segundo a natureza das atividades exercidas pelos profissionais. Referências ANONIMOUS, Needlesticks Transmission of HTLV-III from a patient infected in Africa. Lancet, 8416-2: 1376-7, 1984 BRASIL, Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde, Coordenação Nacional de DST e aids. Manual de condutas: Recomendações para atendimento e acompanhamento de exposição ocupacional a material biológico: HIV e Hepatites B e C, 2013. CAVALCANTE NJF, PEREIRA NA. Saúde ocupacional. In: Fernandes AT, Fernandes MOV, Ribeiro, N Filho. Infecção Hospitalar e suas Interfaces na Área da Saúde. São Paulo (SP): Atheneu. p. 1287-99. 2000

154 CARDO,D.M.Patógenos veiculados pelo sangue. In: E.A.C. Rodrigues (org). Infecções Hospitalares: prevenção e controle. São Paulo: Sarvier, p. 341-51.2007 CARVALHO, V.G., MACIEL, D.N.,. & TRINDADE, D.M. Perfil de aderência ao controle/seguimento após acidente com material biológico em um hospital universitário. Revista HCPA, v.22 (Supl), p.254. 2008 CORSER,W.D. Occupational exposure of health care workers to bloodborne pathogens: a proposal for a systemic intervention approach. Am Assoc Occup Health Nurses ; 46 (5): 246-52. 2015 LUNARDI FILHO, W.D. & MAZZILI, C. O processo de trabalho na área de enfermagem: uma abordagem psicanalítica. Revista de Administração,São Paulo, v. 31, n. 3, p. 63-71. 2016 MACHADO, A.A. Fatores relacionados à adesão em trabalhadores da área da saúde que sofreram acidente ocupacional com risco biológico. 162f. Tese de Livre Docência. Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto.(2006) MARZIALLE MHP, NISHIMURA KYN, FERREIRA MM. Riscos de contaminação ocasionados por acidentes de trabalho com material perfurocortante entre trabalhadores de enfermagem. Rev Lat-am Enfermagem 12(1): 36-42, 2004 RISSI, M.R.R., MACHADO, A.A. & FIGUEIREDO, M.A.C. (2005). Health care workers and Aids: A differential study about beliefs and affects associated with the experience of accidental exposure to blood. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, vol.21, n.1, p.283-291. 2005 OSORIO, C., MACHADO, J.M.H. & MINAYO-GOMES, C. Proposição de um método de análise coletiva dos acidentes de trabalho no hospital. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v.21, n.2. p.517-24. 2008