PECULIARIDADES DA AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO DE CHAVES

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Transcrição:

PECULIARIDADES DA AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO DE CHAVES Nelson Yoshiaki Kato 1 RESUMO: O presente artigo aborda, sob a ótica jurisprudencial pátria, algumas peculiaridades da ação de consignação de chaves. Visa esclarecer que tal demanda é uma modalidade de consignação em pagamento, ante a injusta recusa do locador em receber as chaves do imóvel locado, cuja continuidade do contrato deixou de ser interessante ao locatário. Busca, ainda, ponderar que, conforme legislações infraconstitucionais que disciplinam a matéria, o locatário, independentemente da natureza do contrato, tem o direito de rescindi-lo, devolvendo-se o imóvel mediante a entrega das respectivas chaves. Daí decorre que, por não ser tido como justo, o potestativo condicionamento do seu recebimento ao cumprimento de todas as pendências locatícias, tais como o pagamento dos aluguéis em aberto e a devolução do imóvel no mesmo estado em fora locado, não tem idoneidade de obstar o êxito da ação consignatória de chaves para efeito de reconhecimento do fim do contrato de locação, o que não significa a extinção de eventuais dívidas locatícias pendentes na ocasião, as quais poderão ser exigidas pelo ex-locador em ação própria, assegurando-se ao ex-locatário a ampla defesa e o contraditório. PALAVRAS-CHAVE: Direito processual civil. Ação de consignação de chaves. Modalidade de ação de consignação em pagamento. Direito de rescisão do contrato pelo locatário. Oponibilidade de condição potestativa por parte do locador. Recusa injusta. Procedência da ação de consignação de chaves, sem fulminação de eventuais dívidas locatícias pendentes. 1 Procurador do Município de Diadema/SP. E-mail do autor: katolegal@aasp.org.br

2 1 Introdução O presente trabalho tem por escopo analisar, no campo jurisprudencial assentado junto ao Superior Tribunal de Justiça, as particularidades atinentes à ação de consignação de chaves ajuizada nos casos em que o locador, por simples intuito de prolongamento das obrigações contratuais, se recusa, injustificadamente a receber as chaves do imóvel objeto da locação. Assim, abordar-se-á que a ação de consignação de chaves, por não ter rito próprio, se vale do procedimento especificado para a ação de consignação em pagamento da qual é espécie. No mais, explanar-se-á que a específica vigente lei do inquilinato, que dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos e os procedimentos a elas, regulamenta as formalidades a serem observadas por parte do locatário para fim de exercício do direito de rescisão contratual, tanto para a locação por tempo determinado, quanto para a locação por tempo indeterminado. Ponderar-se-á ainda que, o argumento do locador de que deixou de receber as chaves do imóvel locado, ante a existência de aluguéis pendentes de pagamento ou a necessidade de realização de reformas por mau estado de conservação, se revela injustificado, caracterizando-se uma condição potestativa por sujeitar um direito do inquilino à única vontade do proprietário do imóvel, pelo que não obstaculiza o acolhimento do pedido de consignação de chaves, findando-se a relação locatícia. Ao final, neste estudo, será adotada a conclusão de que a pendência de dívidas locatícias de qualquer natureza não tem o condão de acarretar a rejeição da ação consignatória de chaves, mas que eventuais inadimplementos contratuais por parte do ex-locatário não serão tidos como extintos, o que viabiliza o manejo de ação própria pelo ex-locador para efeito de ressarcimento de todos os prejuízos por ele experimentados até a data da extinção da relação locatícia, que se verifica com o depósito das chaves em juízo.

3 2 Peculiaridades da ação de consignação de chaves Para melhor contextualização do tema aqui explorado, convém pontuar que o Art. 335 da Lei nº 10.406/02 (Código Civil), estatui, assim, as hipóteses autorizadoras do manejo de ação de consignação em pagamento: Art. 335. A consignação tem lugar: I - se o credor não puder, ou, sem justa causa, recusar receber o pagamento, ou dar quitação na devida forma; II - se o credor não for, nem mandar receber a coisa no lugar, tempo e condição devidos; III - se o credor for incapaz de receber, for desconhecido, declarado ausente, ou residir em lugar incerto ou de acesso perigoso ou difícil; IV - se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente receber o objeto do pagamento; V - se pender litígio sobre o objeto do pagamento. Trata-se, então, de um instrumento ao qual se socorre o devedor quando houver dúvida quanto ao valor ou ao credor, bem como quando o credor recusa-se, de forma injustificada, a receber o pagamento, como nos casos aqui estudados. Por seu turno, o Art. 539 da Lei nº 13.105/15 (Novo Código de Processo Civil), introduz, assim, o procedimento da ação de consignação em pagamento: Art. 539. Nos casos previstos em lei, poderá o devedor ou terceiro requerer, com efeito de pagamento, a consignação da quantia ou da coisa devida.

4 Em complementação, os incisos do Art. 542 e do Art. 544, assim, respectivamente, disciplinam referido procedimento especial quanto aos formuláveis pedidos e às alegáveis matérias de defesa: Art. 542. Na petição inicial, o autor requererá: I - o depósito da quantia ou da coisa devida, a ser efetivado no prazo de 5 (cinco) dias contados do deferimento, ressalvada a hipótese do art. 539, 3º; II - a citação do réu para levantar o depósito ou oferecer contestação. Art. 544. Na contestação, o réu poderá alegar que: I - não houve recusa ou mora em receber a quantia ou a coisa devida; II - foi justa a recusa; III - o depósito não se efetuou no prazo ou no lugar do pagamento; IV - o depósito não é integral. Outrossim, no que aqui interessa, o Art. 546 do mesmo diploma legal, estabelece, assim, o efeito extintivo da obrigação objeto da ação consignatória: Art. 546. Julgado procedente o pedido, o juiz declarará extinta a obrigação e condenará o réu ao pagamento de custas e honorários advocatícios. Parágrafo único. Proceder-se-á do mesmo modo se o credor receber e der quitação. De outra banda, o Art. 4º da Lei 8.245/91 (Lei do Inquilinato), regulamenta, assim, as condições necessárias ao exercício do direito do locatário de rescindir um contrato celebrado por tempo determinado:

5 Art. 4º Durante o prazo estipulado para a duração do contrato, não poderá o locador reaver o imóvel alugado. Com exceção ao que estipula o 2º do art. 54-A, o locatário, todavia, poderá devolvê-lo, pagando a multa pactuada, proporcional ao período de cumprimento do contrato, ou, na sua falta, a que for judicialmente estipulada. Nessa hipótese, o locatário tem o direito assegurado de desconstituir o contrato locatício ao término do prazo estipulado ou mediante pagamento de específica multa. Ademais, o Art. 6º da mesma legislação, em complemento, assegura, assim, ao locatário, a qualquer tempo, a devolução do imóvel locado por tempo indeterminado: Art. 6º O locatário poderá denunciar a locação por prazo indeterminado mediante aviso por escrito ao locador, com antecedência mínima de trinta dias. Nesse caso, o locatário tem o direito de findar o contrato mediante simples notificação escrita do locador, com a observância do prazo mínimo legalmente previsto. Logo, uma vez vencido o prazo contratual ou cumpridas as formalidades legais, o inquilino, não mais tendo interesse de permanecer no imóvel, passa a ter o direito de rescindir o contrato de locação, devolvendo-se o imóvel mediante a entrega das respectivas chaves. O locador, por seu turno, não pode condicionar o recebimento das chaves ao pagamento integral das dívidas locatícias pendentes ou à realização de reformas dos danos causados ao imóvel por mau uso, com o intuito de compelir o locatário a continuar vinculado às obrigações contratuais, por configurar condição potestativa. Tal recusa autoriza a propositura da cabível ação de consignação de chaves, sendo que por ser tida como injusta, não tem o condão de obstaculizar o

6 acolhimento do pedido, extinguindo-se a relação locatícia, o que, no entanto, não impede o ex-locador de buscar, pelas vias próprias, eventuais débitos em aberto até a data da rescisão contratual ou a reforma do imóvel ao mesmo estado em que se encontrava por ocasião da celebração do contrato. Tal linha de raciocínio vem sendo, há vários anos, adotada e reverberada na remansosa jurisprudência formada junto ao egrégio Superior Tribunal de Justiça pátrio. A propósito, a título de exemplificação, cabe colacionar o entender adotado pelo eminente ministro-relator Arnaldo Esteves Lima, por ocasião da apreciação do Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 853.350-SP (2006/0284154-5), no dia 18 de dezembro de 2007, em que, após ter fundamentado que findo o prazo estipulado no contrato de locação e ausente o interesse do locatário em permanecer no imóvel locado, tem ele o direito de devolvê-lo ao locador, cuja resistência autorizará o manejo de ação de consignação, ressalvando-se que o locatário não fica exonerado da responsabilidade pelos eventuais danos causados ao imóvel decorrentes de sua má utilização, que poderá ser exigida por meio da competente ação de perdas e danos, julgou o processo, cujo pronunciamento assim foi ementado: DIREITO CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO RECEBIDO COMO AGRAVO REGIMENTAL. FUNGIBILIDADE RECURSAL. POSSIBILIDADE. LOCAÇÃO. DENUNCIAÇÃO DO CONTRATO APÓS VENCIMENTO DO PRAZO ORIGINALMENTE PACTUADO. ART. 6º DA LEI 8.245/91. NOTIFICAÇÃO REALIZADA ANTES DO FIM DO CONTRATO. IRRELEVÂNCIA. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO DE ENTREGA DAS CHAVES. EXISTÊNCIA DE DANOS. COBRANÇA EM DEMANDA PRÓPRIA. PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO RECEBIDO COM AGRAVO REGIMENTAL, AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. A Lei 8.245/91, em seu art. 6º, caput, condiciona o direito assegurado ao locatário de rescindir o contrato locatício à notificação do locador com antecedência mínima de 30 dias, cuja injusta recusa viabiliza a utilização da ação consignatória de entrega das chaves.

7 2. É irrelevante o fato de a notificação do locador ter sido realizada antes do final do prazo originalmente pactuado, tendo em vista que o locatário buscava devolver o imóvel após o fim do contrato de locação. 3. Findo o prazo estipulado no contrato de locação e ausente o interesse do locatário em permanecer no imóvel locado, tem ele o direito de devolvê-lo ao locador, cuja resistência autorizará o manejo de ação de consignação. 4. A entrega das chaves do imóvel ao locador não exonera o locatário pelos eventuais danos causados ao imóvel, decorrentes de sua má utilização, cuja indenização poderá ser exigida por meio da competente ação de perdas e danos. 5. Pedido de reconsideração recebido como agravo regimental, ao qual se nega provimento. No mesmo diapasão, a tese acolhida pelo notável ministro-relator Adilson Vieira Macabu ao apreciar, no dia 31 de maio de 2011, o Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 1.169.227-PE (2009/0119840-1), em que, após fundamentar derradeiramente ser firme a jurisprudência daquela Corte no sentido de que o locatário tem direito a devolver o imóvel findo o prazo de locação, caracterizando-se como condição potestativa a exigência do locador em receber o imóvel somente após a realização de reforma, com a ressalva da discussão de eventual prejuízo em ação própria, julgou o feito, sendo que o respectivo acórdão recebeu a seguinte ementa: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. LOCAÇÃO. SÚMULA 284/STF. ENCARGOS CONTRATUAIS. PEDIDO ESPECÍFICO. DECISUM DA ORIGEM. LIMITES DA CAUSA. RECEBIMENTO DO IMÓVEL APÓS REFORMA. CONDIÇÃO POTESTATIVA. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA PELOS SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. 1. Não se divisa, nas razões deste regimental, argumentos aptos a modificar o decisum agravado, razão pela qual deve ser mantido. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.

8 No mesmo sentir, o pensamento eleito pelo sábio ministro-relator Massami Uyeda ao analisar, no dia 20 de novembro de 2012, o Agravo Regimental no Recurso Especial nº 926.652-ES (2007/0031249-0), em que, após ponderar que aquela Corte perfilha o posicionamento no sentido de que eventual ressarcimento relativo à prejuízos ocorridos no imóvel arrendado, decorrentes de sua má utilização, deve ser perseguido em ação própria, não constituindo justificativa idônea para impedir a extinção contratual verificada pelo decurso do prazo contratual, bem como para obstar a entrega do imóvel, assim, representado pela entrega das chaves, julgou a causa, cuja decisão restou, assim, ementada: AGRAVO REGIMENTAL - RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO DE CHAVES - CONTRATO DE ARRENDAMENTO - RECUSA DA ARRENDATÁRIA FUNDADA NA PRETENSÃO DE OBTER RESSARCIMENTO DE ALEGADOS PREJUÍZOS - JUSTIFICATIVA INIDÔNEA PARA IMPEDIR A EXTINÇÃO CONTRATUAL VERIFICADA PELO DECURSO DO PRAZO RECURSAL - PRETENSÃO A SER ADUZIDA EM AÇÃO PRÓPRIA - PRECEDENTES - RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO. I - As Instâncias ordinárias adotaram entendimento que converge com o posicionamento perfilhado por esta a. Corte, no sentido de que eventual ressarcimento relativo à prejuízos ocorridos no imóvel arrendado, decorrentes de sua má utilização, deve ser perseguido em ação própria, não constituindo justificativa idônea para impedir a extinção contratual verificada pelo decurso do prazo contratual, bem como para obstar a entrega do imóvel, assim representado pela entrega das chaves; II - Agravo regimental improvido. 3 Conclusão O Código Civil estatui as hipóteses em que o devedor está autorizado a se valer da ação de consignação, inclusive nos casos em que o credor se recusa a receber o pagamento ou a coisa devida.

9 De outra banda, o Código de Processo Civil disciplina, de forma expressa, o procedimento atinente à ação de consignação em pagamento, rito aplicável à ação de consignação de chaves, posto ser esta espécie daquela, sendo que o credor-réu, em sua defesa, pode alegar que a sua recusa é justa. Por seu turno a Lei do Inquilinato estabelece que um contrato de locação de imóvel pode ser celebrado por prazo determinado ou indeterminado, sendo que, independentemente da natureza, tal legislação de regência da matéria, assegura ao locatário o direito de rescindir a relação locatícia mediante a devolução do objeto; ato simbolizado pela entrega das respectivas chaves. Para viabilização do exercício do direito de extinguir um contrato locatício por tempo determinado, exige-se, legalmente, apenas o vencimento do prazo acordado ou, se no curso da vigência, o pagamento de específica multa pactual ou, eventualmente, judicial. Já para concretização do direito de rescisão de um contrato por tempo indeterminado, imprescindível, nos moldes legais, somente a notificação do locador com antecedência mínima de 30 (trinta) dias. Logo, findo o prazo estipulado no contrato de locação ou cumpridas as exigências legais consistentes no pagamento de específica multa ou na antecipada notificação do locador, o locatário passa a ter o direito de rescindir a relação locatícia, devolvendo-se o imóvel locado, sendo que o oferecimento de resistência por parte do locador autoriza o ajuizamento da cabível ação de consignação de chaves. O locador, por seu turno, para efeito de justificar o não o recebimento do imóvel locado, poderá lastrear a sua defesa na necessidade de pagamento de aluguéis em aberto ou de realização de reparos no imóvel mal conservado, mas, conforme remansosa jurisprudência formada junto ao Superior Tribunal de Justiça, tais argumentos têm sido considerados como recusas injustas, por configurarem inadmissíveis condições potestativas.

10 Assim, referidos argumentos sustentados pelo locador-réu, não constituem óbices ao acolhimento do pedido de consignação de chaves formulado pelo locatário-autor, autorizando-se, então, a extinção do contrato de locação e, consequentemente, a devolução do imóvel representada pela entrega das respectivas chaves, o que não significa desoneração do ex-locatário pelas eventuais obrigações decorrentes do contrato de locação pendentes até a data do término da relação locatícia, as quais poderão ser exigidas em ação própria a ser ajuizada pelo ex-locador. REFERÊNCIAS BRASIL. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 853.350-SP (2006/0284154-5) STJ T5 Quinta Turma - Relator: Ministro Arnaldo Esteves Lima j.18/12/2007. Disponível em: http://www.stj.jus.br/scon/jurisprudencia/toc.jsp?processo=853350&&b=acor&the saurus=juridico&p=true. Acesso em 17/06/2017. BRASIL. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 1.169.227-PE (2009/0119840-1) STJ T5 Quinta Turma - Relator: Ministro Adilson Vieira Macabu j.31/05/2011. Disponível em: http://www.stj.jus.br/scon/jurisprudencia/toc.jsp?processo=1169227&&b=acor&th esaurus=juridico&p=true. Acesso em 17/06/2017. BRASIL. Agravo Regimental no Recurso Especial nº 926.652-ES (2007/0031249-0) STJ Relator: Ministro Massami Uyeda j.20/11/2012. Disponível em: http://www.stj.jus.br/scon/jurisprudencia/toc.jsp?processo=926652&&b=acor&the saurus=juridico&p=true. Acesso em 17/06/2017. BRASIL. Lei nº 8.245, 18 de outubro de 1991. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8245.htm. Acesso em 17/06/2017. BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de junho de 2002. Disponível em: https: //www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406. Acesso em 17/06/2017. BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em 17/06/2017.