Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.61, n.2, p , Pontos críticos de controle de Salmonella spp. no abate de frangos

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Transcrição:

Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.61, n.2, p.326-330, 2009 Pontos críticos de controle de Salmonella spp. no abate de frangos [Critical control points for Salmonella spp. in poultry slaughter] D.A.S. Von Rückert 1, P.S.A. Pinto 2*, B.M. Santos 2, M.A.S. Moreira 2, A.C.A. Rodrigues 3 1 Aluno de pós-graduação - UFV Viçosa, MG 2 Departamento de Veterinária - UFV Av. P.H. Rolfs, s/n 36570-000 Viçosa, MG 3 Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento Viçosa, MG RESUMO Avaliou-se a presença de Salmonella spp. em esfregaços superficiais em 135 carcaças de frangos, coletadas em cinco diferentes fases do abate, utilizando os métodos de microbiologia convencional, reação em cadeia de polimerase (PCR) e imunoanálise. Os três métodos resultaram em tendência semelhante de detecção de Salmonella spp. nas carcaças de frango, ao longo da linha de abate. A maior frequência de Salmonella spp. foi determinada após o chuveiro de lavagem das carcaças, localizado entre a evisceração e o pré-resfriamento. Vinte (14,8%) esfregaços foram determinados pela metodologia convencional, 52 (38,5%) pela PCR e 66 (48,8%) pela imunoanálise. A menor contaminação foi encontrada na saída do pré-resfriamento, com frequências de 3,7%, 0% e 16,7%, respectivamente. Salmonella spp. foi encontrada em todas as fases de abate, mostrando a importância do monitoramento de diferentes pontos críticos de controle eventualmente identificados no abate de frangos. Palavras-chave: Salmonella spp., frango de corte, abate, pontos críticos de controle, APPCC ABSTRACT The presence of Salmonella spp. in superficial swabs collected from 135 chicken carcasses in five different slaugther steps using the conventional microbiology, PCR, and immunoanalysis methods was evaluated. The three methods presented similar tendency to detect Salmonella spp. in the chicken carcasses along the slaugther line. The highest frequency of Salmonella spp. was found after the shower, located between the evisceration and the chiller. Twenty (14.8%) swabes were determined by the conventional methodology, 52 (38.9%) by the PCR, and 66 (48.9%) by the immunoanalysis. The lowest contamination was found after chiller tank, where the frequencies were 5 (3.7%), 0 (0%), and 24 (16.7%), respectively. Salmonella spp. was found in all the slaugther steps. This shows the importance for monitoring different CCP (Control Critical Point) in the poultry slaughterhouses. Keywords: Salmonella spp., poultry, slaughter, critical control point, HACCP INTRODUÇÃO No Brasil, o cenário do mercado da carne de frango modernizou-se graças, principalmente, às exportações, que exigiram melhoras no sistema de controle microbiológico, sobretudo quanto à contaminação por Salmonella spp. Essa bactéria é considerada como um dos patógenos mais frequentes envolvidos em contaminações de alimentos à base de frango (Panisello et al., 2000). Salmonella spp. é também uma bactéria de fundamental importância para a saúde pública pelo fato de representar um dos principais parâmetros, de reconhecimento mundial, para a determinação dos padrões microbiológicos dos alimentos. As aves comerciais constituem um dos mais importantes reservatórios de salmonelas e são Recebido em 20 de fevereiro de 2008 Aceito em 2 de março de 2009 *Autor para correspondência (corresponding author) E-mail: pintopsa@ufv.br

Pontos críticos de controle... responsáveis pela sua introdução na alimentação humana, por meio da contaminação da carne e dos ovos, principalmente por S. enteritidis (Gast, 1997). Durante o abate e o processamento dos frangos, a presença de Salmonella spp., nos intestinos, pele e penas, resulta em contaminação da carne e seus subprodutos (Bryan e Doyle, 1995). Algumas operações de abate como escaldagem, depenagem e evisceração exercem papel fundamental na distribuição microbiana na carcaça de frango durante o processo de abate. Essa última operação está associada à contaminação por microrganismos de origem entérica, como a Salmonella spp. (HACCP..., 1995). O pré-resfriamento é interpretado como uma etapa controvertida quanto à sua participação na composição ou no controle da microbiota da carcaça de frango. Se por um lado, ele pode retardar a multiplicação de bactérias deterioradoras e inibir o crescimento de patógenos, por outro pode atuar na contaminação cruzada das carcaças. Desse modo, medidas preventivas, como o emprego da imersão em água gelada e clorada, sob controle da temperatura, sempre são recomendadas nessa fase do abate (HACCP..., 1995). A Comissão Internacional para Especificações Microbiológicas em Alimentos define como pontos críticos gerais de controle (PCC) para o abate de frangos o escaldamento, a lavagem após a depenagem, a evisceração, a lavagem após a evisceração e o pré-resfriamento (HACCP..., 1995). Para seguir uma política de obtenção de qualidade de produtos de origem animal, o Abastecimento instituiu alguns programas de controle no Brasil. Destacaram-se o do Sistema de Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC) (Portaria..., 1998a), implantado gradativamente nas indústrias de produtos de origem animal sob o regime do Serviço de Inspeção Federal (SIF), do Programa de Redução de Patógenos (Instrução..., 2003b), que contempla a análise laboratorial sistemática de carcaças de frangos e perus in natura, para a pesquisa de Salmonella spp., envolvendo os estabelecimentos de abate de aves registrados no SIF. Paralelamente aos programas mencionados, o SIF realiza, sistematicamente, a supervisão sanitária do abate de frangos nos abatedouros por meio de medição e do registro de vários parâmetros de controle higiênico-sanitário previstos pela Portaria Ministerial n 210 (Portaria..., 1998b). No Brasil, os dados da prevalência e da ecologia microbiana de Salmonella spp. no processo de abate de frangos são dispersos e pouco conclusivos, sobretudo quanto à sua participação em diferentes fases do processo. Assim, o objetivo dessa pesquisa foi avaliar cinco das principais fases do processo de abate de frangos quanto à presença de Salmonella spp. em carcaças e sugerir a adoção de eventuais PCC identificados no estabelecimento estudado. MATERIAL E MÉTODOS A pesquisa foi desenvolvida em um abatedouro de aves, localizado no Estado de Minas Gerais, com capacidade aproximada de abate de 10.000 aves/hora, voltado para os mercados interno e externo, funcionando sob as diretrizes da legislação nacional sobre o controle higiênicosanitário do processo de abate e produção de carne de aves no Brasil (Portaria..., 1998b). Foram selecionadas cinco fases de abate para a pesquisa de Salmonella spp., identificadas pelos pontos de coleta A, B, C, D e E, conforme o fluxograma de abate ilustrado pela Fig. 1. Em cada fase de abate, foram analisadas 27 amostras, em cada estabelecimento, pelo método da microbiologia convencional, das quais 18 o foram também pelo método da reação em cadeia de polimerase (PCR), e destas, 14 pela imunoanálise. Ao final, analisaram-se 135 carcaças. Insensibilização Sangria Escaldagem Depenagem Chuveiro inicial (ponto A) Eventração mecânica (ponto B) Evisceração manual (ponto B) Chuveiro final (ponto C) Pré-resfriamento (ponto D) Gotejamento (ponto E) Figura 1. Fluxograma do abate de frangos e pontos de coleta das amostras. Cada unidade amostral foi composta por dois esfregaços superficiais equivalentes a 50cm 2 da Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.61, n.2, p.326-330, 2009 327

Von Rückert et al. área da carcaça, obtida com o auxílio de esponjas estéreis cúbicas de poliuretano com 4cm de aresta, previamente embebidas em água peptonada tamponada 0,1%. Cada área de coleta foi delimitada por molde estéril com área livre internamente de 25cm 2, utilizados em dois locais diferentes na carcaça: no peito, próximo ao pescoço, e na região dorsal, adjacente à cloaca. Após a coleta, as esponjas foram transferidas em condições assépticas para sacos estéreis tipo Wirl-Parker e acondicionadas em recipientes isotérmicos com gelo até o seu processamento, em um prazo de cerca de uma hora. As amostras foram homogeneizadas em 50mL de água peptonada tamponada a 0,1%, durante um minuto, em homogeneizador peristáltico (Stomacher), para o preparo do homogenato destinado aos ensaios microbiológicos. A pesquisa de Salmonella spp. pelo método microbiológico convencional seguiu a metodologia descrita pela ICMSF (Microorganismos..., 1982), adaptada segundo as recomendações da Instrução Normativa n 62 do MAPA (Instrução..., 2003a). A partir do homogenato obtido anteriormente, 25mL da amostra foram usados para a detecção de Salmonella spp. Pelo método imunoanalítico, a detecção de Salmonella spp. foi realizada por meio do sistema VIDAS 1, seguindo as recomendações do fabricante. Alíquotas de 1mL do caldo de enriquecimento seletivo obtido da análise convencional foram analisadas após sua fervura em banho-maria por 15 minutos. As reações de PCR seguiram a metodologia utilizada por Oliveira et al. (2003). As unidades analíticas foram obtidas a partir do caldo préenriquecido da análise convencional. Como procedimento tradicional de pesquisa de Salmonella spp. em alimentos, procedeu-se à confirmação da presença do gênero da bactéria na carcaça de frangos. Utilizou-se, como controle positivo, uma cepa de S. cholerasuis ATCC 13076 fornecida pela Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro. O DNA presente nas amostras analisadas e nas culturas usadas como controle foi extraído pela técnica do fenol-clorofórmio. Os pares de oligonucleotídeos 2 utilizados na iniciação foram os 139-141, que são específicos para o gene inva de Salmonella spp., nas sequências 5 -GTGAAATTATCGCCACGTTCGGGCAA-3 (forward) e 5 -TCATCGCACCGTCAAAGGAACC- 3 (reverse) e produto da amplificação de 284pb. RESULTADOS E DISCUSSÃO A detecção de Salmonella spp. na carcaça de frangos pelos três métodos apresentou uma tendência semelhante ao longo da linha de abate (Tab. 1). Os resultados da detecção de Salmonella spp. mostraram uma tendência de aumento das frequências de detecção de contaminação até o ponto D, representado pela fase posicionada após o chuveiro de lavagem final. Exceção foi observada para as amostras coletadas no ponto C, após a evisceração manual, analisadas pelo sistema imunoanalítico. E este foi um resultado isolado, que necessita de melhor elucidação em outras pesquisas. Estes resultados assemelham-se aos de Lahellec e Colin (1985), que utilizaram o método convencional, e detectaram a mesma tendência de contaminação, ao longo da linha de abate. A alta frequência de Salmonella spp. encontrada no ponto D difere da encontrada por May (1974), que afirmou que a lavagem final, correspondente ao ponto D, reduz a contagem microbiana em frangos. Também se argumenta, na literatura, que as aves chegam ao abatedouro com bactérias firmemente aderidas à pele e que essas, inclusive salmonelas, não são facilmente removidas por um único enxágue com água (Thomas e McMeekin, 1982; Lillard, 1988). Assim, a eficiência dos jatos com pressão e direcionamento adequados determinará a sua capacidade de descontaminação das carcaças. Após a evisceração e a inspeção, as carcaças normalmente são lavadas a fim de diminuir a contaminação que ocorre durante essas operações. Como a contaminação microbiana, com o tempo, torna-se mais firmemente ligada à pele, a lavagem também deve ocorrer tão rapidamente quanto possível e abranger tanto a cavidade abdominal quanto a superfície externa da carcaça (HACCP..., 1995). 1 Biolab Merieux - São Paulo, Brasil. 2 Invitrogen - São Paulo, Brasil. 328 Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.61, n.2, p.326-330, 2009

Pontos críticos de controle... Tabela 1. Frequência de detecção de Salmonella spp. em carcaças de frangos em diferentes fases de abate por método de análise Fase de abate Método Convencional PCR Imunoanálise A 1/27 5/18 4/14 B 2/27 6/18 4/14 C 3/27 6/18 2/14 D 4/27 7/18 6/14 E 1/27 3/18 0/14 Total 11/135 27/90 16/70 Fases de abate: A: Antes do chuveiro de higienização, após a depenagem; B: após o chuveiro de higienização; C: após a evisceração manual; D: após o chuveiro de lavagem final; E: na saída do préresfriamento. A introdução de sistemas mecânicos para a evisceração diminui a difusão da contaminação por parte dos operadores, mas, a menos que estejam funcionando perfeitamente, a ruptura mecânica dos intestinos pode resultar em grande contaminação por microrganismos entéricos (HACCP..., 1995). Na presente pesquisa, esse fator também pode ter contribuído para a maior frequência de Salmonella spp. nos pontos C e D. Um dado importante de se destacar foi a menor frequência de Salmonella spp. no ponto E, que representa amostras coletadas ao final da saída do tanque de pré-resfriamento, independente do método de análise utilizado. O maior número de amostras contaminadas observado nas primeiras fases do abate pode ser atribuído à intensa manipulação, à contaminação cruzada e à provável ineficiência das lavagens intermediárias, conforme destacaram Thomas e McMeekin (1982). O declínio da contaminação no ponto E difere do encontrado por Peric et al. (1971) e Lillard (1990), que verificaram maior contaminação microbiológica após o préresfriamento. A discordância nos resultados, quanto ao perfil de contaminação por Salmonella spp., ao longo da linha de abate, em diferentes fontes bibliográficas, deve-se sobretudo à grande variação de padrões de higiene entre os diferentes estabelecimentos de abate de frangos, que geram amostras muito heterogêneas nos estudos. Segundo Almeida e Silva (1992), em geral, todas as operações de abate podem resultar em contaminação microbiológica cruzada por Salmonella spp., sendo a contaminação intestinal uma fonte mais comum do que a cutânea. Esse comportamento foi observado na presente pesquisa. Pequenas modificações no processo de abate podem representar avanços significativos no controle microbiológico da carcaça de frango. Por exemplo, Almeida e Silva (1992) verificaram que o controle microbiano é mais eficiente quando a concentração de cloro residual é de 2,0mg/L em comparação à de 0,3mg/L; a eficiência também é maior contra enterobactérias, principalmente salmonelas, se comparada à eficiência contra bactérias heterotróficas aeróbias. A propósito, o sistema APPCC recomenda que cada estabelecimento industrial defina seus próprios PCC, de acordo com as características de suas instalações, equipamentos, operações, recursos analíticos disponíveis e custos, definidos para o controle interno da qualidade. Com base nos resultados encontrados, o préresfriamento (ponto E) parece ter sido o único ponto que exerceu controle sobre o indicador Salmonella spp., provavelmente devido às baixas temperaturas da água (4 o C) e da carcaça (5 o C a 10 o C) e pela alta concentração de cloro (3,0 a 4,0mg/mL), que são fortes inibidores bacterianos. Também, por se localizar no final da linha de abate, esse ponto representa uma posição estratégica por controlar eventuais falhas de pontos de controle anteriores, tornando o APPCC mais viável e econômico, descaracterizando, dessa forma, os pontos de controle anteriores como críticos. Essa estratégia é muito valorizada na implantação de um APPCC. CONCLUSÕES A baixa frequência do patógeno encontrada na saída do pré-resfriamento caracterizou-o como Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.61, n.2, p.326-330, 2009 329

Von Rückert et al. um PCC importante na implementação de um eventual plano APPCC no estabelecimento pesquisado. Esse ponto também foi considerado como tal por apresentar uma característica estratégica, a de se localizar no final da linha de abate, o que dispensaria a existência de outros PCC anteriores. Por ser encontrada em todas as fases de abate, Salmonella spp. é importante no monitoramento de diferentes PCC eventualmente identificados no abate de frangos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, P.F.; SILVA, E.N. Estudos sobre o controle e disseminação bacteriana em carcaças de frangos de abatedouros industriais. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.44, p.105-120, 1992. BRYAN, F.L.; DOYLE, M.P. Health Risks and Consequences of Salmonella and Campylobacter jejuni in Raw Poultry. J. Food Prot., v.58, p.326-344, 1995. GAST, R.K. Paratyphoid Infections. In: BARNES, H.J.; BEARD, C.W.; McDOUGALD, L.R. et al. (Ed). Diseases of poultry. 10.ed. Ames: Iowa University Press, 1997. p.97-122. HACCP in microbiological safety and quality, microorganisms in foods. Oxford: Blackwell Scientific, 1995. v.1. INSTRUÇÃO Normativa n 62 de 26/08/2003. Métodos analíticos oficiais para análises microbiológicas para controle de produtos de origem animal e água [do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento]. Diário Oficial da União, 18 set. 2003a. Seção 1, p.14. INSTRUÇÃO Normativa n 70 de 06/10/2003. Programa de redução de patógenos: monitoramento microbiológico e controle de Salmonella spp. em carcaças de frangos e perus [do Abastecimento]. Diário Oficial da União, 10 out. 2003b. Seção 1, p.9. LAHELLEC, C.; COLIN, P. Influence of processing on Salmonella contamination of poultry carcass: Possibilities of improvement. In: INTERNATIONAL SYMPOSIUM ON Salmonella, 1984, New Orleans, LA. Proceedings Kenneth Square, PA: American Association Avian Pathologists, 1985. p.249-256. LILLARD, H.S. Comparision of sampling methods and implications for bacterial decontamination of poultry carcasses by rinsing. J. Food Prot., v.51, p.405-408, 1988. LILLARD, H.S. The impact of commercial processing procedures on the bacterial contamination and cross-contamination of broiler carcasses. J. Food Prot., v.53, p.202-204, 1990. MAY, K.N. Changes in microbial numbers during final washing and chilling of commercially slaughtered broilers. Poult. Sci., v.953, p.1282-1285, 1974. MICROORGANISMOS de los alimentos: Técnicas de análisis microbiológico. 2.ed. Zaragoza, Acribia, 1982. OLIVEIRA, S.D.; RODENBUSCH, C.R.; CE, M.C. et al. Evaluation of selective and nonselective enrichment PCR procedures for Salmonella detection. Lett. Appl. Microbiol., v.36, p.217 221, 2003. PANISELLO, P.J.; ROONEY, R.; QUANTIC, P.C. et al. Application of foodborne disease outbreak data in the development and maintenance of HACCP systems. Int. J. Food Microbiol., v.59, p.221-234, 2000. PERIC, G.A.; ROSSAMNITH, E.; LEISTNER, L. Investigations into the influence of spin chiller cooling on the surface bacterial content of poultry [in Germany]. Die Fleischwirtschaft, v.51, p.216-218, 1971. PORTARIA n o 46 de 10/02/1998. Manual genérico de procedimento para APPCC em indústrias de produtos de origem animal [do Abastecimento]. Diário Oficial da União, 16 mar. 1998a, Seção 1, p.24. PORTARIA n 210, de 10/ 11/1998. Regulamento técnico de inspeção tecnológica e higiênico sanitária de carne de aves [do Abastecimento]. Diário Oficial da União, 26 nov. 1998b, 1998b. Seção 1, p.226. THOMAS, C.J.; McMEEKIN, T.A. Effect of water immersion on the microtopography of the skin of chicken carcasses. J. Sci. Food Agric., v.33, p.549-554, 1982. 330 Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.61, n.2, p.326-330, 2009