Libreto de José Maria Vieira Mendes, a partir do conto homónimo de Sophia de Mello Breyner Andresen

Documentos relacionados
Escola Secundária de Santa Maria da Feira Português 2º Ciclo. Português. Guião de Leitura da Obra. O Rapaz de Bronze. Sophia de Mello Breyner Andresen

1- No início do primeiro capítulo, o narrador descreve-nos o jardim Que adjectivo o narrador usa para caracterizar o referido jardim?

O RAPAZ DE BRONZE ANÁLISE DA OBRA. Sophia de Mello Andersen

Ana Simões Ema Sá Barros Joana Faria Silvina Fidalgo Português

jardineiro se ia embora com o cesto cheio de gladíolos cortados, o gladíolo olhou para si

Índice: As flores pag. 1. O Gladíolo.pag. 6. Florinda.pag.15. A Festa...pag.24

A primavera voltou. LÍNGUA PORTUGUESA. Compreensão da leitura

Altos da Serra - Capítulo Altos da Serra. Novela de Fernando de Oliveira. Escrita por Fernando de Oliveira. Personagens deste Capítulo

Autora: Sophia de Mello Breyner Andresen. Ilustrador: Júlio Resende. Nome: Data:

CALENDÁRIO 2014 EXTERNATO DAS ESCRAVAS DO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS

) ) .,. MEB- 50 ANOS ";.. QUANTO AFETO, QUANTA ALEGRIA RENOVADA EM CADA ENCONTRO... VIVA A VIDA! " MARIA ALICE ~ )

É Quase Natal. Andam todos a brincar A correr, a saltar na floresta Mas não há tempo a perder Têm de preparar a festa

Os três filhos entram no Labirinto e seguem o percurso da mãe através do sangue.

Fotonovela Fundamentos da Educação. Por Bruna, Cícera, Elizama, Juliana Trapanotto, Loredanna, Raquel Rosa, Raquel Mateus e Renata.

Jean-Yves Garneau. O rações da noite. antes de dormir EDITORA AVE-MARIA

Altos da Serra - Capítulo Altos da Serra. Novela de Fernando de Oliveira. Escrita por Fernando de Oliveira. Personagens deste Capítulo

A Conversa de Lucila. (No escuro ouve-se o bater de asas. A luz vai lentamente iluminando o quarto de Lucila, o anjo está pousado em uma mesa.

2º 3 º ciclos

SEGUE-ME! ESTOU CONTIGO NA GENEROSIDADE!

2ª FEIRA 19 de novembro

A minha vida sempre foi imaginar. Queria ter um irmãozinho para brincar...

A minha vida sempre foi imaginar. Queria ter um irmãozinho para brincar...

Na escola do Carlinhos, na hora do recreio, aconteceu algo muito interessante! Vamos ver o que houve? Lá no pátio...

A Procura. de Kelly Furlanetto Soares

MONÓLOGO MAIS UMA PÁGINA. Por Ana Luísa Ricardo Orlândia, SP 2012

Eu Quero Apenas. (Marcus) Eu quero apenas olhar os campos. Eu quero apenas cantar meu canto. (Rogério) Eu só não quero cantar sozinho

Espalhando Alegria no Natal

No princípio Deus criou o céu e a terra

MÃE, QUANDO EU CRESCER...

MAIS UM DIA. Tom: B. Intro: B9. Nasce mais um dia F# Nasce com o sol E Vejo a primeira luz. Vejo alem do olhar. G#m7

2ª FEIRA 12 DE MARÇO

2) resistencia (andré galiano) ella mis recuerdos de ella y no regreso más. gira su hermosa vida y vuelve a su lugar resistencia siempre va a estar

A alga que queria ser flor

Piadas com Dez Mil Anos

Hinos em quaternário usando as posições A, D e E

Ilustrações de Luís Valente

HINÁRIO SANTA MISSA. Mestre Irineu Raimundo Irineu Serra SENHOR AMADO

Uma cara bonita. 1. Zoe está zangada. livros e do seu trabalho. Mas depois do trabalho gosta de atuar em peças de teatro com os Newport

É tão fácil dizer que saem dos olhos das mulheres andorinhas verdes (Crítica à poesia das imagens aos cachos. Como de costume, autocrítica)

Real Brazilian Conversations #37 Premium PDF Guide Brazilian Portuguese Podcast, by RLP reallylearnportuguese.com

HINÁRIO SANTA MISSA. Mestre Irineu. Raimundo Irineu Serra 1. Tema 2012: Flora Brasileira Glória da Manhã

Tens alguma bagagem? Sim, tenho a minha mochila e um saco grande. Bom, eu fico com o saco e tu ficas com a mochila. Está bem?

Material Didáctico O Rapaz de Bronze A comissão organizadora da Festa das Flores

Santa Missa. Mestre Raimundo Irineu Serra

Aninha era uma menina muito medrosa, que tinha medo de tudo. Uma manhã a mãe dela acordou-lhe Aninha.Mas a mãe de Aninha nunca acordava ela.

Colégio Santa Dorotéia

MARINHEIROS 01.REMA CANOA REMA CANOA, MARINHEIRO REMA CANOA, DEVAGAR BIS ESSA CANOA SÓ FOI FEITA PRA MARTIM PARA ANGOLA 02.

O começo da história

Sou eu quem vivo esta é minha vida Prazer este

À FLOR DA OESIA. Rosany Pereira

01. SENHOR AMADO (GERMANO GUILHERME) PARA OS TEMPOS QUE ESTAVAS NO MUNDO

FINAL PÁSCOA Opção 01

Poemas de um Fantasma. Fantasma Souza

VÍDEO (terminar o vídeo ao minuto 4:23)

2ª FEIRA 19 de novembro

42ª Assembleia. Diocesana de Pastoral

01. Luz de Jah Letra: André Augusto Apoliano Música:André Augusto Apoliano/André Paula Portela

Seminário de Crianças e Intermediários - Março/2018 Tema: Certamente Cedo Venho Lista de louvores a serem cantados:

Protocolos Experimentais

Sérgio Mendes. Margarida e o lobo. Ilustrações de Ângela Vieira

25 de Abril Quase como um Conto de Fadas. Texto: CONCEIÇÃO LOPES Ilustrações: CARLOS BARRADAS

Daniel Duarte. 1 a edição

PORTUGUESE CHRISTMAS CAROLS. PORTUGAL Escola Secundária Quinta das Palmeiras

Malaquias - Ah, sim!? Quais? Tomás Olha, vou ter cadernos e canetas muito mais bonitas do que as da Mimi... daquela marca que ela costuma comprar. Mal

Seus Escritos no Site da Magrià a Antonio Márcio Uma rosa para a minha Rosa

Ah, que maravilha! disse a mãe, quando eu lhe mostrei o recado que trouxe da escola. Um museu num castelo histórico! Vai ser interessante.

Material de Palestra O que é Deus? Palestra 011

Carlota pintava de pintinhas os sonhos que tinha ao acordar. Todas as manhãs, à sua mãe dizia: só mais um bocadinho, que estou a sonhar. A mãe saía.

Alberto Caeiro O Pastor Amoroso

2 TU-AFETIVIDADE E SEXUALIDADE. Meus primeiros amores. Na construção do amor

Arte e Poesia. Uma flor. Uma flor perde cheiro e beleza Foi amor com certeza!

Por vontade expressa da autora, a presente edição não segue a grafia do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa

- Daniel Maia-Pinto Rodrigues - A PRÓXIMA COR

CECÍLIA MEIRELLES CIRANDA CULTURAL 2º ANO A/2011 CIRANDA CULTURAL_POEMAS

ABCECSP ASSOCIAÇÃO BENFICENTE CENTRO ESPÍRITA CABOCLO SETE PEDREIRAS

1 Biblioteca Escolar Ana Saldanha

Academia do Palácio Real para a Preparação de Princesas Perfeitas

2ª FEIRA 12 DE MARÇO

MILTON GURAN - São 14 de fevereiro em Bohicon, estamos com o senhor Papa Rodriguez Giganta. O senhor é Rodriguez também?

Priscila está passando um final de semana na casa da vovó! Um ensinamento importante aconteceu. Qual será? Vamos ver? Lá no parquinho...

O QUE DÁ SENTIDO À VIDA: ME ENTREGAR AO TEU AMOR QUERO ME RENDER E ME RASGAR DE TANTO ADORAR

Bárbara uma mulher de 25 anos, queria atrasar o livro de uma escritora famosa chamada Natália, Bárbara queria contar uns segredos bombásticos antes

Concurso de Quadras Populares 2017

Pentecostes Atos

Minha inspiração. A Poesia harmoniza o seu dia

SER SANTO É DEIXAR PASSAR A LUZ GENTIL DE DEUS. (Papa Francisco)

Amarelinho splash não tinha forma. Nem mesmo a forma de uma gema de ovo quando ai! se espalha desastradamente pelo chão da cozinha.

ALEGRIA. Oração Avé-Maria Nossa Senhora Auxiliadora rogai por nós. Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Bom dia!

OBRAS COMPLETAS DE FERNANDO PESSOA III ALBERTO CAEIRO. 12. a EDIÇÃO EDITORIAL NOVA ATIÇA LISBOA

2ª FEIRA 12 DE MARÇO

DE AMOR TENHO VIVIDO. IlustraçÕes De ana Prata

1º CICLO. Não temas Receber Jesus!

CONHECE DEUS NA SUA ESSÊNCIA O AMOR

Portuguese as a foreign language TEST

LISTA DE RECUPERAÇÃO DE LINGUAGENS 7º ANO CARLA

BONS Dias. Ano Pastoral Educativo Colégio de Nossa Senhora do Alto. Com Maria Desperta a. Luz. que há em TI

16. ORGIA Embebeda-se e, por fim, queima a taberna. E todos pela estrada fora dançam.

Trecho antecipado para divulgação. Venda proibida.

Transcrição:

O DE BRONZE Libreto de José Maria Vieira Mendes, a partir do conto homónimo de Sophia de Mello Breyner Andresen Prólogo Houve um tempo em que criança julguei ter à noite das flores, árvores e fontes escutado o meu nome: Florinda. Mas assim que p la manhã falou o galo e adormeci o meu pai, jardineiro no dia deste jardim, disse-me ser mentira o que ouvi, uma história sonhada p los meus olhos infantis. No meu quarto fechei-me então e com o tempo esqueci o meu nome: Flo...? Hoje volto a abrir a porta do quarto onde tanto tempo me prendi e a pisar as folhas e entre os ramos vejo a lua, estrelas e céu. Esforçando-me para recordar quem fui a ti te peço, jardim na noite ou noite no jardim: dá-me de volta a carne que já tive faz andar o sangue que em mim secou devolve-me o nome que perdi. Diz-me, fonte, diz-me, tronco, diz-me, flor deste jardim é verdade o nome que em criança ouvi. Não vem resposta. Movem-se as sombras como vultos docemente entre a folhagem. Nada acorda o silêncio. Só o vento passa pesado e quente. DE BRONZE Quem vem lá que mal se vê mais escura que a noite e calada que o vento diz palavras que se partem como no ar o sabão. O corpo já de mulher mas de vidro o seu aspecto mais criança que a criança acabada de nascer. Estaca o passo se não queres desfazer-te com o próximo que arriscares e responde-me quem és tu que assim pisas o luar branco dos caminhos. Oh oiço! Oiço vivamente quem vive pois só quem vive se pode ouvir!

DE BRONZE O teu nome? Sou coisa sem nome. reconhecendo-a: Florinda! Florinda é o teu nome. Florinda, lembras-te de mim? Com memória mentirosa, Rapaz de Bronze. Há memória verdadeira? Sempre todos me disseram ser mentira o que então vi. Mentira é o que antes se viu não o que agora se vê. Mentira é o que disso hoje se diz não o que então se ouviu. Vou mostrar-te o que em criança viveste para que recuperes o nome que perdeste. Oh estátua de bronze, rei na noite do jardim como podem os meus olhos ver em ti vida se a vida em mim não vêem. Escura e transparente noite faz acordar as magnólias as tílias e os plátanos as glicínias os fetos e as bétulas e os buxos as papoilas as camélias as tulipas e begónias as orquídeas e os nardos e os cravos e o trigo Que todos chamem por ti, Florinda, filha de jardineiro. Florinda fui eu, meu pai jardineiro. Fica Florinda e olha o Gladíolo que no dia que já não recordas aqui nasceu. Vê e escuta para que a mentira volte hoje a ser verdade.

1. O Gladíolo No dia em que neste jardim nasci eu, o mais mundano dos gladíolos, colhia o jardineiro para uma festa outros gladíolos que diziam: - Vamos para uma festa!, e sorriam. Por isso as minhas primeiras palavras ao nascer foram: - Que inveja! E depois, ao olhar para mim, disse as segundas: - Sou um bonito gladíolo! E só então, ao olhar em volta, acabei por dizer: - Bom dia Bom dia, bom dia, bem-vindo! Que sorte eu ser gladíolo. Que sorte eu ser bonito! Hão-de pôr-me numa jarra para todos me admirarem e ao começar da festa em meu redor vão dançar. Qu ridas recentes amigas desde já eu me despeço que amanhã, com certeza, serei colhido Bom dia e adeus então, Gladíolo. E assim tendo cantado e falado vejo a senhora dona da casa que vem zangada, roxa e acelerada. SENHORA (diz:) Quero colhas não que onde mais jardineiro este vou gladíolos ano farta de em todas as estou festas gladíolos só gladíolos há gladíolos não quero mais gladíolos nas minhas festas. O quê? SENHORA (diz:) Não quero jardineiro que mais gladíolos colhas este ano farta estou de gladíolos em todas as festas onde vou há só gladíolos não quero mais gladíolos nas minhas festas.

Que tristeza. Que pouca sorte. Que raaaiva! 2. O Gladíolo e o Rapaz de Bronze DE BRONZE Olá, Gladíolo, então ainda não te colheram? Não posso ser colhido. Pediram-me para ficar não fosse o mundo deixar de girar. Aaah. Faço falta no jardim. Sou fundamental. Sou in-con-tor-nável. E vieste espreitar a festa? Vim, mas daqui vejo pouco. Pede ao vento que te leve para os ramos do carvalho. Sopra o vento. Aaah! Que luxo! Que elegância! Que riqueza! Quem são? Pessoas. Como se chamam? Não têm nome.

Tão bonitas E tão ricas Como sabes? Os vestidos! Se assim fosse o mais rico era eu com tanto bronze na pele. E não és? Não tenho um tusto. Oh. Pensativo: Quero dar uma festa. Posso? Uma festa? Uma festa de flores igual às festas das pessoas. Vou dar uma festa à noite aqui mesmo no jardim. Nós não fazemos festas. Não somos homens, não precisamos de nos divertir. Ninguém me colheu, Rapaz de Bronze, e eu quero ir a uma festa. resmungando: Uma festa uma festa uma festa... impositivo: Uma festa uma festa uma festa uma festa! Eu quero uma festa! Faz a festa! Obrigado! Obrigado! Obrigado! Tenho muito que fazer, muitos muitos afazeres.

Preciso de uma comissão! Vento! Vento! Tenho pressa! Já ao fundo: Comissão organizadora! 3. A Comissão organizadora do grande baile de flores Gladíolo, Rosa, Cravo, Orquídea, Begónia, Tulipa, Rapaz de Bronze DE BRONZE Junta-se a Comissão organizadora do grande baile de flores, constituída por: O Gladíolo. A Rosa. O Cravo. A Orquídea. A Begónia. A Tulipa. E, a presidir, o Rapaz de Bronze! Boas noites! Boa noite! A Tulipa? Está atrasada. Sempre atrasada. Mas vem sempre. ORQUÍDEA protestando: Vamos começar! BEGÓNIA Está na hora! Falta a Tulipa. Não podemos. Exige-se organização! BEGÓNIA Forma e certidão! ORQUÍDEA

Assim não! Uma anarquia! BEGÓNIA Uma imperfeição! Aí vem ela! chegando: Desculpem. Fiquei à espera do vento Comecemos. Primeiro ponto: famílias a convidar. Eu tenho uma lista de quarenta famílias. Da minha trinta e seis constam. Não se convidam todas as flores. Só as mais bonitas. As mais célebres. As de melhor qualidade. Há flores que não são bem flores. Todas as flores são flores. Eu sou o rei do jardim. Quero que sejam convidadas todas as flores! Aprovado! Assunto encerrado. Segundo ponto: local da festa. ORQUÍDEA Na estufa. É quente e abafado.

No roseiral. No ténis. Eu tenho uma ideia: na Clareira dos Plátanos. Aprovado! Assunto encerrado. Quarto ponto- Terceiro! Perdão, terceiro: a orquestra. BEGÓNIA Rãs. Cucos Pica-paus. ORQUÍDEA Rouxinóis. Melros, moscardos, sapos-tambores. O melhor será cantarem todos. Aprovado! Assunto encerrado. Quarto ponto: a decoração da sala. Não é uma sala. Perdão, da clareira.

DE BRONZE As árvores e estrelas não precisam de enfeites. Eu tenho uma ideia: pirilampos à roda do lago. Aprovado! ORQUÍDEA E na jarra de pedra? Não pode ficar vazia, é feio uma jarra vazia. Ah! Ah! BEGÓNIA Ah! Ah! Ah! Na jarra, põem-se flores. Flores somos nós! É de flores esta festa não de pessoas! Tanta organização... Eu tenho uma ideia: Se as pessoas nas suas festas põem flores nas jarras, as flores nas suas põem nas jarras pessoas. Hem? Pomos na jarra uma pessoa. Uma pessoa que seja como uma flor.

Não há nenhuma. A dona da casa. Parece uma corça. BEGÓNIA O dono então. Parece um peru. ORQUÍDEA E a filha da dona? Parece de plástico. Eu conheço uma pessoa que é como uma flor. Quem? Florinda, a filha do jardineiro. Florinda Bravo! Bravo! Queremos a Florinda. Bravo! Bravo! Aprovado! Florinda! Florinda! 4. A Festa Chamaram-me. Tenho de ir. DE BRONZE Chamaram-te para ficar. Faz-se tarde. Devagar, Florinda, que devagar poisa a noite.

A noite é o lençol dos mortos. É de noite que se vive. À noite fala quem de dia se cala. Se de noite é que se vive então o que é o dia? O dia esconde a noite como a luz o escuro ou a voz o silêncio. Tenho medo. Ouve-se um rouxinol. O que é? É o rouxinol da noite. Chama por ti, Florinda. Tenho medo. Do teu nome? Do nome que querias voltar a ouvir? entrando agitado: Vai começar a festa! Uma festa? Uma festa. Vem, Florinda. A festa é aqui, e o teu lugar ali na jarra de pedra. Porquê ali? Porque pareces uma flor, bela Florinda, flor das flores

sorri. Perdeu o medo e coloca-se na jarra de pedra. Vai começar a festa! Vai começar a festa! Começa a festa. Entram as flores: as rosas, os cravos, os malmequeres, os narcisos, os lírios, as papoilas, os miosótis, os girassóis, as camélias, as urzes, as margaridas, os amores-perfeitos, as glicínias, as orquídeas, as begónias e o Gladíolo. A noite é o dia das coisas é o dia das flores, das plantas e estátuas. De dia, imóveis e presos de noite, dançamos livres. Dança noite em meu redor. As estrelas! Dancem flores! Uma festa, todas as noites uma festa e outra! A Tulipa? A Tulipa chega atrasada. Como sempre. Vem bela, alta e direita com o seu vestido amarelo, liso e brilhante. Aqui! A Tulipa! Vem bonita e atrasada. Nunca vi festa assim! Tudo aqui é diferente. As flores estão vivas: caminham, falam e dançam. E eu sou uma flor. Florinda! Florinda! Poiso a minha cabeça na noite e as minhas mãos são frescas e perfumadas.

A noite é o dia das coisas é o dia das flores, das plantas e estátuas. De dia, imóveis e presos de noite, dançamos livres. A festa continua até se ouvir cantar o galo. 5. O fim da noite DE BRONZE O canto do galo anuncia o fim da noite. Fogem as flores, elas fogem A festa... Cantou o galo, vai nascer o dia. As flores voltam para os canteiros. E tu, Florinda... adormecendo: Eu durmo... Já durmo. e Já dorme Florinda nos braços de bronze pelo parque escuro a clarear. Da terra nasce a madrugada. Já dorme Florinda no seu canteiro já dorme, já dorme Florinda na noite. DE BRONZE Florinda, lembras-te de mim? dormindo: Lembro, lembro-me de mim.