7 lições para ler e escrever Aula 3 Proposta de Exercicio dar orientações: Escolher 2 sambas que conversem entre si e transforme as músicas num texto. Mas e os sambas? A gente vai colocar as letras? Como vimos, a disputa entre Wilson Batista e Noel Rosa começa em 1933 e segue, com um samba de cada um deles por ano, até 1936, quando os dois compõem juntos o samba Deixa de ser Convencida, e apenas um ano antes de Noel morrer. A disputa entre os dois grandes sambistas foi acompanhada pelos ouvintes de rádio de então, com o fervor das torcidas de futebol. Deixa de ser Convencida tem letra de Noel Rosa sobre a melodia que Wilson Batista fez para mais um samba desta disputa, Terra de Cego. Conta a história que Wilson Batista mostrou o samba a Noel, que gostou muito da melodia e perguntou ao rival se podia pôr outra letra na música. Wilson Batista topou e a letra foi feita, como uma crítica a uma ex-namorada de Wilson Batista! Foi essa parceria que encerrou a disputa entre os dois sambistas. Na página do Instituto Moreira Salles você pode encontrar uma produção, um programa de rádio, em que todos os sambas desta deliciosa polêmica são apresentados, da forma como foram reunidos em um disco que homenageia, justamente, os dois grandes sambistas e suas obras para o duelo que ocorreu entre eles. http://ims.uol.com.br/radio/d1098 Para seu exercício, você deve escolher dois sambas de um mesmo ano, um de Wilson Batista e outro de Noel Rosa, ou seja, dois sambas que conversam entre si.
Exercício 1 Leia a letra dos sambas e analise seu conteúdo cuidadosamente. Faça também uma análise comparativa, localizando precisamente os momentos de intertextualidade, ou seja, os versos e palavras que funcionam como uma conversa, que se assemelham a um diálogo entre os sambas. Se você tiver dúvidas sobre como fazer isso, deixamos aqui, como exemplo, o exercício feito com os dois primeiros sambas, aqueles que apresentamos no vídeo. LENÇO NO PESCOÇO - 1933 Meu chapéu do lado Tamanco arrastando Lenço no pescoço Navalha no bolso Eu passo gingando Provoco e desafio Eu tenho orgulho Em ser tão vadio Meu chapéu do lado... Sei que eles falam Deste meu proceder Eu vejo quem trabalha Andar no miserê Eu sou vadio Porque tive inclinação Eu me lembro, era criança Tirava samba-canção Comigo não Eu quero ver quem tem razão RAPAZ FOLGADO - 1933 (Noel Rosa) Deixa de arrastar o teu tamanco... Pois tamanco nunca foi sandália E tira do pescoço o lenço branco, Compra sapato e gravata, Joga fora essa navalha Que te atrapalha. Com chapéu do lado deste rata... Da polícia quero que escapes Fazendo samba-canção, (Eu) Já te dei papel e lápis Arranja um amor e um violão. Malandro é palavra derrotista... Que só serve pra tirar Todo o valor do sambista. Proponho ao povo civilizado Não te chamar de malandro E sim de rapaz folgado. Meu chapéu do lado... E ele toca E você canta E eu não dou Ai, meu chapéu do lado...
MOCINHO DA VILA - 1934 Você, que é mocinho da Vila, Fala muito em violão, Barracão e outras coisas mais. Se não quiser perder o nome, Cuide do seu microfone, E deixe quem é malandro em paz. Injusto é seu comentário, Fala de malandro quem é otário, Mas falando não se faz. Eu, de lenço no pescoço, Desacato E também tenho o meu cartaz FEITIÇO DA VILA - 1934 (Noel Rosa - Oswaldo Gogliano [Vadico]) Quem nasce lá na Vila Nem sequer vacila Ao abraçar o samba Que faz dançar os galhos Do arvoredo E faz a lua nascer mais cedo! Lá em Vila Isabel Quem é bacharel Não tem medo de bamba São Paulo dá café, Minas dá leite E a Vila Isabel dá samba! A Vila tem um feitiço sem farofa Sem vela e sem vintém Que nos faz bem... Tendo nome de Princesa Transformou o samba Num feitiço decente Que prende a gente... O sol da Vila é triste Samba não assiste Porque a gente implora: Sol, pelo amor de Deus, Não venha agora Que as morenas vão logo embora! Eu sei por onde passo Sei tudo que faço Paixão não me aniquila... Mas tenho que dizer: Modéstia à parte, Meus senhores, eu sou da Vila!
CONVERSA FIADA - 1935 É conversa fiada Dizerem que o samba Na Vila tem feitiço. Eu fui ver pra crer E não vi nada disso. A Vila é tranqüila, Porém é preciso cuidado: Antes de irem dormir, Dêem duas voltas no cadeado. Eu fui lá na Vila ver o arvoredo se mexer E conhecer o berço dos folgados. A lua nessa noite demorou tanto, Assassinaram-me um samba. Veio daí o meu pranto. PALPITE INFELIZ - 1935 (Noel Rosa) Meu Deus do céu, que palpite infeliz! Salve Estácio, Salgueiro, Mangueira, Oswaldo Cruz e Matriz Que sempre souberam muito bem Que a Vila não quer abafar ninguém, Só quer mostrar que faz samba também. Fazer poema lá na Vila é um brinquedo, Ao som do samba dança até o arvoredo. Eu já chamei você pra ver, Você não viu porque não quis Meu Deus do céu, que palpite infeliz! Salve Estácio, Salgueiro, Mangueira, Oswaldo Cruz e Matriz Que sempre souberam muito bem Que a Vila não quer abafar ninguém, Só quer mostrar que faz samba também. A Vila é uma cidade independente Que tira samba mas não quer tirar patente. Pra que ligar a quem não sabe Aonde tem o seu nariz?
FRANKENSTEIN DA VILA - 1936 Boa impressão nunca se tem Quando se encontra um certo alguém, Que até parece o Frankenstein. Mas, como diz o rifão, Por uma cara feia, Perde-se um bom coração. Entre os feios estás na primeira fila, Eu te batizo Fantasma da Vila. Essa indireta é contigo, E depois não vás dizer Que eu não sei o que digo. (Sou teu amigo) DEIXA DE SER CONVENCIDA - 1936 (Noel Rosa - Wilson Batista) Deixa de ser convencida Todos sabem qual é Teu velho modo de vida. És uma perfeita artista, eu bem sei, Também fui do trapézio, Até salto mortal No arame eu já dei. (Muita medalha eu ganhei!) E no picadeiro desta vida Serei o domador, Serás a fera abatida. Conheço muito bem acrobacia Por isso não faço fé Em amor, em amor de parceria. TERRA DE CEGO - 1936 BPerde a mania de bamba Todos sabem qual é O teu diploma no samba. És o abafa da Vila, eu bem sei, Mas na terra de cego Quem tem um olho é rei. Pra não terminar a discussão Não deves apelar Para um barulho na mão. Em versos podes bem desabafar Pois não fica bonito Um bacharel brigar.
Exercício 2 O prólogo de Memórias Póstumas de Brás Cubas tem muitos outros casos de intertextualidade, além daquele primeiro (Stendhal e os cem leitores) que citamos no vídeo. Machado faz referências a dois outros autores que você provavelmente não conhece, mas pode descobrir quem são. Releia o prólogo e descubra o nome dos autores e o que eles escreveram. Procure desvendar a referência de Machado de Assis. Sobre o que ele está falando quando cita estes autores em particular? Depois de sua pesquisa, tudo isso deve ser respondido e explicado em um texto. Como você já notou, a intertextualidade é um recurso que o autor usa para ampliar os temas de que ele trata em seus textos, mas depende imensamente dos conhecimentos do leitor, ou seja, o recurso só pode cumprir sua função se o leitor souber sobre o quê fala o autor! PRÓLOGO Que Stendhal confessasse haver escrito um de seus livros para cem leitores, coisa é que admira e consterna. O que não admira, nem provavelmente consternará é se este outro livro não tiver os cem leitores de Stendhal, nem cinqüenta, nem vinte e, quando muito, dez. Dez? Talvez cinco. Trata-se, na verdade, de uma obra difusa, na qual eu, Brás Cubas, se adotei a forma livre de um Sterne, ou de um Xavier de Maistre, não sei se lhe meti algumas rabugens de pessimismo. Pode ser. Obra de finado. Escrevi-a com a pena da galhofa e a tinta da melancolia, e não é difícil antever o que poderá sair desse conúbio. Acresce que a gente grave achará no livro umas aparências de puro romance, ao passo que a gente frívola não achará nele o seu romance usual; ei-lo aí fica privado da estima dos graves e do amor dos frívolos, que são as duas colunas máximas da opinião. Mas eu ainda espero angariar as simpatias da opinião, e o primeiro remédio é fugir a um prólogo explícito e longo. O melhor prólogo é o que contém menos coisas, ou o que as diz de um jeito obscuro e truncado. Conseguintemente, evito contar o processo extraordinário que empreguei na composição destas Memórias, trabalhadas cá no outro mundo. Seria curioso, mas nimiamente extenso, e aliás desnecessário ao entendimento da obra. A obra em si mesma é tudo: se te agradar, fino leitor, pago-me da tarefa; se te não agradar, pago-te com um piparote, e adeus. Brás Cubas.
Exercício 3 A intertextualidade é certamente um dos elementos mais comuns e fáceis de identificar. Ela está presente nas paródias (aqueles textos que são feitos como uma ironia ou versão humorística de outros textos), por isso é muito comum que as charges façam uso desse recurso. Veja a charge abaixo, que faz referência ao poema de Gonçalves Dias. Escreva um pequeno texto explicando de que forma a intertextualidade provoca, nesta charge o efeito de humor esperado. Em seu texto, procure explicar claramente que parte do texto se refere ao poema propriamente dito e que parte do texto sofre a atualização que produz o efeito de humor. Explique também de que forma esta atualização e intertextualidade constituem uma crítica à sociedade atual, explicitando que aspecto de nossas vidas cotidianas está sendo criticado aqui e sua opinião a esse respeito. CANÇÃO DO EXÍLIO Gonçalves Dias Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá; As aves, que aqui gorjeiam, Não gorjeiam como lá. Nosso céu tem mais estrelas, Nossas várzeas têm mais flores, Nossos bosques têm mais vida, Nossa vida mais amores. Em cismar, sozinho, à noite, Mais prazer encontro eu lá; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá. Minha terra tem primores, Que tais não encontro eu cá; Em cismar - sozinho, à noite, Mais prazer encontro eu lá; Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá. Não permita Deus que eu morra, Sem que volte para lá; Sem que desfrute os primores Que não encontro por cá; Sem qu inda aviste as palmeiras, Onde canta o Sabiá.