RESUMO / SUMMARY / RÉSUMÉ «Saúde e Imigrantes: As representações e as práticas sobre a saúde e a doença na comunidade cabo-verdiana em Lisboa» Autor: Bárbara Bäckström; Professora Auxiliar da Universidade Aberta (Departamento de Ciências Sociais e Políticas); e-mail: barbarab@univ-ab.pt. Palavra-Chave: saúde, imigrantes, cultura, desigualdades sociais RESUMO Este trabalho de investigação constitui uma aproximação sociológica no âmbito da saúde internacional e no contexto da sociologia da saúde, em particular da saúde dos imigrantes, relativamente às suas representações e práticas de saúde e de doença. O objecto de investigação centra-se na análise das questões sobre a saúde e a doença dos imigrantes a partir de uma perspectiva sociológica. O estudo teve como principal objectivo compreender - através de relatos pessoais - a forma como os indivíduos entendem a saúde e a doença no campo das representações sociais de saúde e analisar os seus comportamentos em termos das suas práticas de saúde e de doença. Pretendeu-se estabelecer uma análise comparativa dos dados de forma a fazer sobressair semelhanças e/ou divergências das representações e das práticas de saúde e de doença dos entrevistados. A nossa intenção era verificar se elas se deviam a factores socioeconómicos, a factores culturais e de identidade étnica, ou à combinação de ambos. No plano teórico, o trabalho aqui apresentado enquadra-se em várias áreas das Ciências Sociais, (sociologia da saúde, sociologia das migrações e antropologia da saúde). A hipótese geral centrava-se na ideia de que as representações e as práticas de saúde e de doença destes imigrantes se inscreviam num quadro particular onde apareciam interferências do carácter cultural e da pertença étnica. Estas dimensões podiam no entanto, variar consoante os contextos socioeconómicos. A hipótese pressupunha que os imigrantes apresentariam perfis distintos no que se refere à autoavaliação e percepção do estado de saúde, às representações, crenças e atitudes face à saúde e à doença, às experiências e comportamentos, aos estilos de vida e às práticas de saúde e percursos de doença. O estudo foi efectuado junto de uma amostra de 40 indivíduos cabo-verdianos da primeira geração em Portugal, mais precisamente os que residem na região de Lisboa,
a qual para efeitos de análise foi dividida em diferentes grupos: grupo social (grupo popular e grupo de elite), geração (mais jovens e mais velhos) e género (homens e mulheres), (20 pessoas em cada grupo). Optámos por uma metodologia qualitativa através da realização de entrevistas semiestruturadas para recolha da informação. O tratamento dos dados consistiu na análise de conteúdo temática das entrevistas e na identificação de diferenças e semelhanças entre e intra cada um dos subgrupos. A análise dos resultados comprova a existência de diferenças entre os grupos sociais relativamente às representações e práticas de saúde e de doença. Elas foram determinadas mais pelos factores socioeconómicos do que pelos aspectos culturais e de etnicidade. Essas diferenças fizeram também sobressair dois tipos de visão: uma cosmopolita e outra existencial. Na primeira estamos perante uma visão mais articulada ao mundo e que se relaciona com as ideias expressas pelo grupo de elite e na segunda uma visão existencial, mais ligada às condições materiais de existência e que corresponde às representações feitas pelo grupo popular. Foi demonstrado que os indivíduos mais velhos do grupo popular encaravam a saúde e a doença de forma semelhante ao modelo biomédico, enquanto os do grupo de elite iam mais ao encontro do modelo bio-psico-social. As representações de saúde e de doença traduziram-se em definições que foram desde o orgânico ao social. O primeiro correspondia ao discurso do grupo popular que restringia mais a saúde a aspectos fisiológicos e o segundo ao do grupo de elite, que encarava a saúde e a doença enquanto fenómenos mais globais e externos aos indivíduos. Também se evidenciou, quando da análise dos dados, ao nível dos subgrupos de género e geração no seio do mesmo grupo social, que as diferenças eram menos evidentes entre eles do que as que encontrámos quando comparámos os subgrupos separadamente por grupos sociais distintos. Quanto ao grupo estudado, apesar da heterogeneidade verificada entre os seus membros, particularmente no que se refere aos factores socioeconómicos, observou-se que existia um aspecto unificador decorrente das suas heranças culturais. Em geral, os indivíduos sobrevalorizaram a sua identidade étnica e a cultura de origem comum. A pertença a grupos sociais diferentes, mas a uma mesma cultura e identidade, dá origem a uma partilha do sentimento de pertença cultural, mas não a comportamentos e práticas idênticos. Pretende-se, por fim, contribuir para o conhecimento dos imigrantes enquanto cidadãos e indicar a necessidade de reajustar as estruturas de saúde às transformações multiculturais, que neste momento são vividas a rápidos ritmos de mudança.
SUMMARY The present research consists in a sociological approach, in the field of international health and in the context of sociology of health, most particularly, the health of the immigrants, regarding their representations and practices of health and illness. The object of investigation focuses on the analysis of the immigrants health and illness issues from a sociological perspective. The study aims at understanding, through their personal reports, the way individuals perceive and define their health and illness, at the level of their social representations about health and at analysing their behaviour in terms of health and illness regarding their practices. It was intended to establish a comparative analysis of the collected data, with the purpose of highlighting the similarities and/or divergences in the health and illness representations and practices of the interviewed population. It was further our intention to assess whether those could be explained by socio-economic factors or by other factors, such as culture and ethnic identity, or a combination of these. Theoretically, the study under consideration falls within various fields of the Social Sciences (sociology of health, sociology of migrations and anthropology of health). The general hypothesis of investigation focused on the idea that these immigrants representations and practices concerning health and illness were inscribed in a specific framework where the cultural character and the ethnic identity interfered. These dimensions could, however, differ, depending on the socio-economic contexts. The hypothesis implied that the immigrants presented different profiles in what concerns their perception and self rated health status, the representations, beliefs and attitudes regarding health and illness, the experiences and behaviours, life-styles, health practices and illness processes. The study was undertaken with a sample of 40 «first generation» Cape Verdeans living in Portugal, more precisely those residing in the Metropolitan area of Lisbon. For the purpose of analysis, this sample was divided into distinct groups of 20 persons in each group: social (popular and elite), generation (younger and older) and gender (men and women). We choose a qualitative methodology, by conducting semi-structured interviews for the collection of information. The handling and processing of the data
consisted in the thematic analysis of the contents of the interviews and in the identification of divergences and similarities between and within each sub group. The analysis of the results confirms the existence of differences between the social groups in what concerns the health and illness representations and practices. They were more determined by the socio-economic factors than by the cultural and ethnic aspects. Those differences have also highlighted two types of vision: a cosmopolitan vision and an existential vision. The first one is a vision more articulated to the world, related to the ideas expressed by the elite group, while the second one is an existential vision, more conditioned by the material conditions of existence, corresponding to the representations made by the popular group. It was demonstrated that the older persons in the popular group considered health and illness very similarly to the biomedical model, while the persons in the elite group were closer to the bio-psycho-social model. The representations of health and illness were translated into definitions ranging from the organic to the social. The first one corresponded to the speech of the popular group who restricted health mostly to physiological aspects, and the second to the elite group, who looked at health and illness as more global phenomena, external to the individuals. It also became clear, through the analysis of the data, at the level of the subgroups of gender and generation, within the same social group, that the differences between them were less evident than those which were observed when we compared the sub groups, separately, in different social groups. In spite of the heterogeneity found among the members of the studied group, in particular, those concerning the socio-economic differences, we could notice the existence of a unifying aspect, resulting from their cultural heritage. The immigrants, in general, overvalued their ethnic identity and the common culture of origin. Although belonging to different social groups, the existence of a common culture and ethnic identity, gives origin to a shared feeling of cultural belonging, but not to similar behaviours and practices This research, finally, expects to contribute to the achievement of a better knowledge of the immigrants as citizens and to indicate the need to readjust the health structures to the multicultural transformations presently occurring with a fast rhythm of change.
RÉSUMÉ Notre recherche constitue une approche sociologique dans le cadre de la santé internationale et dans le contexte de la sociologie de la santé, notamment la santé des immigrants en ce qui concerne les représentations et les pratiques de santé et de maladie. L objet de ce travail est centré dans l analyse des questions sur la maladie et la santé des immigrants, en partant d une perspective sociologique. Cette étude a eu comme principal objectif de comprendre à travers des récits personnels la façon dont les individus envisagent et définissent la santé et la maladie dans les représentations sociales qu ils s en font, ainsi que d analyser leurs comportements et leurs pratiques en termes de santé et maladie. On s est employé à établir une analyse comparative des données, de façon à faire ressortir les ressemblances et /ou les écarts apparaissant dans les représentations et les pratiques de santé et de maladie des personnes interviewées. Notre intention était de vérifier si ces ressemblances et /ou ces écarts étaient dus à des facteurs socioéconomiques ou à des facteurs culturels et d identité ethnique ou à la combinaison des deux. Dans un plan théorique, cette recherche se situe dans cadre des Sciences Sociales (sociologie de la santé, sociologie des migrations et anthropologie de la santé). L hypothèse générale de la recherche présupposait que les représentations et les pratiques de santé et de maladie de ces immigrants s inscrivaient dans un cadre où des interférences culturelles de leur appartenance ethnique apparaissaient. Ces dimensions pouvaient, cependant, varier selon les contextes socioéconomiques. L hypothèse présumait que les immigrants présenteraient des profils différents en ce qui concerne l autoévaluation et la perception de l état de santé, les représentations, les croyances et les attitudes face à la santé et à la maladie, ainsi que les expériences et les comportements, les styles de vie, les pratiques de santé et les parcours de maladie. Cette étude a été réalisée auprès d un échantillon de 40 capverdiens de la «première génération» au Portugal, résidant dans la région de Lisbonne ; cet échantillon a été divisé, à cet effet, en groupes différents, de 20 personnes chacun: social (groupe populaire et groupe d élite), génération (plus jeunes et plus âgés) et genre (hommes et femmes). Dans la récolte de l information nous avons adopté une méthodologie qualitative et réalisé des entretiens semi dirigés. Le traitement des données a consisté
dans l analyse de contenu thématique des entrevues et dans l identification des différences et ressemblances entre et intra chaque sous- groupe. L analyse des résultats démontre l existence de différences entre les groupes sociaux en ce qui concerne les représentations et les pratiques de santé et de maladie. Celles-là ont été déterminées plus par des facteurs socioéconomiques que par des aspects culturels et de ethnicité. Ces différences ont fait ressortir deux types de vision dont une vision cosmopolite et une vision existentielle. La première est une vision plutôt articulée au monde, ayant des rapports avec les idées exprimées par le groupe d élite, tandis que la deuxième est une vision existentielle, plus liée aux conditions matérielles de l existence correspondant aux représentations du groupe populaire. On a pu démontrer que l idée que les individus les plus âgés du groupe populaire se faisaient de la santé et de la maladie ressemblait au modèle biomédical tandis que les individus du groupe d élite étaient plus proches du modèle biopsychosocial. Ces représentations de la santé et de la maladie se sont traduites en définitions qui se sont étendues de l organique jusqu au social. Le premier correspondrait au discours du groupe populaire qui réduisait la santé plutôt à des aspects physiologiques alors que le deuxième considérait la santé et la maladie comme des phénomènes plus globaux et extérieurs à l individu. L analyse des données a montré que les différences étaient moins évidentes au niveau des sous-groupes de genre et de génération au sein du même groupe social que celles qui ont été observées lors que nous avons comparé séparément les sousgroupes de groupes sociaux différents. Quant au groupe étudié, malgré l hétérogénéité vérifiée entre ses membres, spécialement dans les facteurs socioéconomiques, on a pu remarquer l existence d un aspect qui les unit, dont leur héritage culturel est à l origine. En général les individus ont beaucoup valorisé leur identité ethnique et leur origine culturelle commune. L appartenance à des groupes sociaux différents mais à une même culture et identité est à l origine du partage du sentiment d appartenance culturelle mais pas à des comportements et pratiques identiques. En somme, on voudrait bien contribuer à faire connaître les immigrants en tant que citoyens et indiquer la nécessité de réajuster les structures de santé aux transformations multiculturelles, qui, en ce moment, sont de plus en plus vécues à des rythmes de changement rapides.