I RELATÓRIO: MARIA CRISTINA AMARAL POTENZA, devidamente qualificada, propôs reclamação trabalhista em face de ITAÚ UNIBANCO S/A, embasando suas pretensões a partir dos fundamentos fáticos e jurídicos contidos na inicial. A reclamada apresentou contestação e documentos. Determinou-se a produção de perícia ambiental. Os litigantes foram interrogados e as testemunhas foram ouvidas. Sem mais provas. Rejeitadas as tentativas de conciliação. Razões finais remissivas. Vieram os autos conclusos. II FUNDAMENTAÇÃO: PRESCRIÇÃO QUINQUENAL: Atento à data de admissão e de propositura da demanda, consideram-se prescritas, nos termos do art. 7º, XXIX, da CF/88, as parcelas condenatórias surgidas antes de 14/07/2009, o que não alcança as pretensões de depósitos do FGTS sobre parcelas efetivamente recebidas, cuja prescrição é trintenária (Lei n 8036/90, artigo 23, 5 c/c Súmula n 362 do E. TST). Desse modo, ficam extintas, com resolução do mérito, nos termos do art. 269, IV, do CPC, as pretensões condenatórias anteriores a 22/07/2009, exceto as pretensões de depósitos do FGTS sobre parcelas efetivamente recebidas. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE: Primeiramente, esclareça-se que a matéria em exame é de caráter técnico e o Perito nomeado é auxiliar da mais absoluta confiança deste Juízo, estando, ainda, legal e tecnicamente habilitado para a realização do encargo que lhe foi atribuído. Sabe-se que a apuração de periculosidade depende de conhecimentos específicos acerca do tema, sendo inafastável a colaboração de um especialista na área respectiva para que forneça ao Juízo os esclarecimentos necessários ao julgamento da lide. A questão envolvendo o pedido de adicional de periculosidade encontra-se no laudo técnico oficial, no qual foi feita uma análise das condições de trabalho a que estava submetido o obreiro, considerando-se as atividades exercidas e local de trabalho e, consequentemente, contém todos os dados necessários à boa resolução dos pedidos pertinentes. Em seu laudo, o Sr. Perito concluiu que Há caracterização da periculosidade (fl. 186). Ressalte-se que, na avaliação da periculosidade, foi considerado o labor no prédio CTO. E, na fundamentação do laudo, o experto informou que Considerando que, até março/2014, o tanque de armazenagem de óleo diesel de 3.000 litros estava localizado em recinto interno de edificação, acima da capacidade máxima permitida e não estando enterrado sob o mesmo teto onde estão situadas as demais dependências onde a Reclamante se ativava, conclui-se que todo o prédio era considerado área de risco pela Legislação (NR-16).. De acordo com os itens 20.2.7 e 20.2.3 da NR-20, os tanques de óleo diesel devem
ser enterrados. No entanto, a NR 20 da Portaria 3.214/78, que regulamenta as operações com inflamáveis e combustíveis no ambiente de trabalho, inclusive disciplinando o armazenamento de líquidos inflamáveis no interior de edifícios, sofreu alteração em razão da Portaria 308/2012, publicada no DOU de 06/03/2012, permitindo a instalação, no interior dos prédios, de tanques de superfície com até 3.000 litros para armazenagem de óleo diesel destinado à alimentação de motores utilizados para a geração de energia elétrica em situações de emergência, limite este não observado pelo ilustre perito na elaboração de seu laudo. Registre-se que não se trata aqui de aplicação de normas no tempo, pois cabe ao MTE, a partir de estudos técnicos, especificar as condições fáticas que impliquem risco acentuado ao trabalhador em razão do contato com inflamáveis. Se atualmente o risco acentuado somente existe caso o limite de armazenamento de inflamáveis de cada tanque seja superior a 3000 litros, indubitável que, à época do contrato, também não havia justificativa que tornasse o ambiente de trabalho perigoso. Ao que parece, o conservadorismo inicial do MTE esteve fundado na ausência de estudo técnico atual, completo e adequado, não podendo o empregador ser punido pela omissão estatal. Diante da nova regulamentação, as conclusões do perito deixam de ter embasamento fático e jurídico. Como consequência, INDEFIRO os pedidos de adicional de periculosidade e seus reflexos. PEDIDOS EMBASADOS NA JORNADA: Em primeiro lugar, ressalto que é incontroversa a validade das marcações constantes nos controles de jornada da reclamada, conforme reconhecido pela própria na petição inicial. Portanto, há presunção de que todo o trabalho extraordinário foi devidamente registrado e as horas extras pagas. Logo, consiste a controvérsia na verificação se o cargo exercido pela reclamante era de confinação ou não, o que vai influenciar no direito ao pagamento da 7ª e 8ª horas trabalhadas como extra e, ainda, nos critérios para apuração do valor do salário-hora. Nesses termos, a reclamante pretende que se aplique o limite de jornada estabelecido no caput do art. 224 da CLT. Já a reclamada defende que a autora exercia cargo de confiança, nos moldes do art. 224, 8º, da CLT. Passo à análise. Em primeiro lugar, insta destacar que, para o deslinde da causa, desnecessária a nomenclatura do cargo, pois o determinante é investigar as reais atribuições e o respectivo enquadramento como sendo de confiança, nos termos do art. 224, 2º, da CLT, ou não. Nesse sentido, a inteligência do inciso I da Súmula 102 do C.TST, segundo o qual, a configuração ou não do exercício de função de confiança a que se refere o art. 224, 2º, da CLT, depende da provas das reais atribuições do empregado. No caso dos autos, a instrução probatória deixou claro que a reclamada enquadrou a reclamante, de modo equivocado, nos termos do art. 224, 2º, da CLT, notadamente porque não se verifica a existência de fidúcia especial, tampouco de posição de destaque da reclamante perante seus pares, o que me permite concluir que ela não exercia funções de gerência, fiscalização, chefia ou equivalentes. Na verdade, as testemunhas ouvidas prestaram informações consonantes e esclareceram que a reclamante, como ocupante do cargo de Analista de Sistemas Pleno,
ativava-se na fase de documentação dos sistemas, realizando funções eminentemente técnicas e sem qualquer poder efetivo de decisão, pois não trabalhava no ambiente de rede de produção, não estabelecia o tempo de execução de projetos, tampouco poderia fixar os respectivos orçamentos. A corroborar com isso, a testemunha da reclamada destacou que, quando a reclamante teve acesso a outra fase do sistema (fase de produção), tal acesso tinha sido liberado a todos os analistas do banco (pleno, sênior e júnior) e tão somente para verificação de erros na execução do sistema. Também ficou esclarecido que a autora integrava uma equipe com 7 a 8 analistas, sem qualquer posição de destaque, visto que não tinha poderes para organizar o trabalho e nem para cobrar de outros funcionários o cumprimento de metas e melhor desempenho. Além disso, demonstrado que a autora não tinha acesso a informações sigilosas ou privativas dos clientes, pois os dados eram remetidos à autora já mascarados, o que impedia a identificação dos usuários de bens e serviços do banco reclamado. A esse respeito, a testemunha da reclamante até relata que a autora já teve acesso a ambiente de produção, porém sem acesso às informações financeiras ou específicas dos clientes. Conforme se vê, é patente que a autora não tinha a autonomia que a defesa pretendeu lhe imputar. Em função de todo o exposto, comprovado que a reclamante não exercia cargo de confiança, tampouco fidúcia diferenciada daquela concedida aos bancários comuns, a sua jornada é aquela fixada no art. 224, caput, da CLT, de 6 horas diárias e 30 semanais, sendo vedado o trabalho aos sábados, fazendo jus, pois, à percepção da 7ª e 8ª horas. Portanto, DEFIRO à autora o pagamento de diferenças de horas extras, com adicional de 50%, considerando-se como tais aquelas que ultrapassarem o limite diário de 6 horas ou semanal de 30 horas, com base nos horários registrados nos controles de jornada, e apurando o valor do salário-hora pelo divisor 150 (Súmula 124, I, b, do C. TST), a evolução salarial e a globalidade salarial (Súmula 264 do C. TST). Por fim, importante registrar que inviável a compensação ou dedução da gratificação de função paga com as horas extras deferidas, pois aquela é paga para remunerar a maior responsabilidade das atribuições da reclamante. Aplica-se a Súmula nº. 109 do C. TST. Autoriza-se a dedução de todos os valores comprovadamente pagos a título de horas extra, se comprovado documentalmente nos autos. Em razão da habitualidade e natureza salarial, as diferenças de horas extras devem ser incorporadas ao salário, para efeito de reflexos em férias mais 1/3, 13º salários, FGTS mais 40% e RSR, sendo que neste último deverão ser incluídos os sábados e feriados (parágrafo 1º da cláusula oitava dos instrumentos coletivos). O percentual a ser aplicado no RSR é de 42,85% porque o instrumento normativo inclui o sábado como dia de repouso remunerado. SOBREAVISO: Nos termos do art. 244, 2º, da CLT, o regime de sobreaviso ocorre quando o empregado, fora de sua jornada ordinária, tem limitada a sua liberdade de locomoção em razão do trabalho. Importante destacar que, considerando a novel redação do art. 6º, par. único, da CLT, houve mudança no entendimento até então vigorante para possibilitar o deferimento de horas de sobreaviso para aqueles trabalhadores que, mesmo com liberdade de locomoção reduzida, estejam à disposição de seu empregador em regime de plantão,
podendo ser acionados a qualquer momento por meio de instrumento telemático. Portanto, desnecessário que o trabalhador tenha que aguardar o chamado em casa, bastando que a disponibilidade restrinja a sua liberdade de locomoção. Nesse sentido, a súmula 428 do TST. As provas testemunhais, de forma uníssona, apontaram que havia rodízios semanais entres os analistas, iniciando-se no término de uma jornada de trabalho até o início da subsequente. Ainda, confirmaram que o analista escalado para o plantão recebia um celular funcional e um notebook para esse fim. Contudo, destaque-se que há manifestação da reclamante de ter participado do regime de plantões apenas nos períodos de 2009 a 2010 e de 2011 a abril de 2012. Quanto ao regime de escalas propriamente dito, levando em conta que os plantões eram semanais e que na equipe de trabalho da reclamante trabalhavam 8 a 10 analistas, presumo que a autora era escalada para o rodízio 1 semana a cada 2 meses. Assim, DEFIRO o pedido de pagamento de horas de sobreaviso à razão de 1/3 da hora normal trabalhada, observando-se os horários de término e início da jornada constantes nos controles de ponto, durante 1 semana a cada 2 meses, nos períodos de 2009 a 2010 e de 2011 a abril de 2012. As horas de sobreaviso devem ser apuradas de acordo com os parâmetros estabelecidos no tópico acima (pedidos embasados na jornada), conforme limitação temporal fixada acima. Em razão da habitualidade e natureza salarial, as horas de sobreaviso devem ser incorporadas ao salário para efeito de reflexos sobre aviso-prévio, férias com 1/3, 13º salários, RSR e FGTS e multa de 40%, cujas diferenças ficam desde já deferidas. O percentual a ser aplicado no RSR é de 42,85% porque o 1º da cláusula 8ª inclui o sábado como dia de repouso remunerado. JUSTIÇA GRATUITA: A reclamante requereu o deferimento da justiça gratuita por não poder arcar com as despesas processuais, sem prejuízo de sua mantença e de sua família. A assistência judiciária gratuita é o benefício concedido ao necessitado de, gratuitamente, movimentar o processo e utilizar os serviços profissionais de advogado e dos demais auxiliares da Justiça, inclusive os peritos. A assistência judiciária é gênero e a justiça gratuita a espécie. Esta é a isenção de emolumentos dos serventuários, custas e taxas, conforme lição de Valentim Carrion, em nota ao art. 790-B, da CLT. Assim, tendo a parte autora requerido o benefício ao argumento de que não tem condições financeiras de arcar com eventuais despesas do processo, sem prejuízo do sustento próprio e da família, na forma do art. 5º, LXXIV, da CF e das Leis 1060/50, 5584/70 e 10.537/02, que deu nova redação ao art. 790, 3º, da CLT, formou-se uma presunção de veracidade em sua declaração, cabendo ao reclamado elidi-la. Ressalte-se que a autora pleiteia o deferimento da justiça gratuita, cujo pressuposto, na forma do art. 790, 3º da CLT, é a percepção de salário igual ou inferior ao mínimo legal ou declaração de pobreza. Não se está tratando de assistência judiciária, cujo benefício é o deferimento de honorários advocatícios, hipótese em que seria necessária a presença do corpo jurídico do respectivo sindicato. De qualquer forma, o art. 790, 3º da CLT não limita,
tampouco impede a contratação pelo obreiro de advogado particular para patrocinar sua causa. Basta a situação de miserabilidade para a concessão do benefício. A reclamada não demonstrou fatos capazes de quebrar a presunção estatuída na forma acima, por isso DEFIRO O BENEFÍCIO. HONORÁRIOS DE ADVOGADOS: De acordo com entendimento consubstanciado nas Súmulas 219 e 329, do C. TST e orientação Jurisprudencial n. 305 da SDI-I do C. TST, só cabe honorários advocatícios se houver benefício da justiça gratuita e assistência por sindicato. No caso dos autos o reclamante não está assistido por sindicato, mas sim por advogado particular. O art. 14 da Lei 5584/70 rege a matéria na justiça do trabalho, razão pela qual inaplicável o art. 404 do CC/02, que trata da indenização pelas despesas com advogado. INDEFIRO o pedido de honorários de advogados. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ: O preposto da reclamada tentou induzir o Juízo ao negar que fossem fornecidos telefone celular e notebook para funcionários escalados nos plantões, o que contraria frontalmente as informações prestadas de forma unânime pelas testemunhas ouvidas. Tal conduta se enquadra nos termos do art. 17, I e II, do CPC, e, como consequência, aplico-lhe a multa por litigância de má-fé no percentual de 1% do valor da condenação. III CONCLUSÃO: Ante o exposto, resolve este Juízo: 1. Pronunciar a prescrição das parcelas condenatórias surgidas antes de 14/07/2009, extinguindo-as, com resolução do mérito, nos termos do art. 269, IV, do CPC, o que não alcança a pretensão de depósitos do FGTS sobre parcelas efetivamente recebidas, cuja prescrição é trintenária (Lei n 8036/90, artigo 23, 5 c/c Súmula n 362 do E. TST); 2. Julgar PROCEDENTES EM PARTE os pedidos formulados por MARIA CRISTINA AMARAL POTENZA em face de ITAU UNIBANCO S/A para condenar a reclamada a pagar à reclamante, após o transito em julgado, acrescidas de juros e correção monetária, as seguintes parcelas, conforme fundamentação supra: a. Diferenças de horas extras, com adicional de 50%, considerando-se como tais aquelas que ultrapassarem o limite diário de 6 horas ou semanal de 30 horas; b. Horas de sobreaviso à razão de 1/3 da hora normal trabalhada, observando-se os horários de término e início da jornada constantes nos controles de ponto, durante 1 semana a cada 2 meses, nos períodos de 2009 a 2010 e de 2011 a abril de 2012; c. Reflexos das diferenças das horas extras e do sobreaviso em aviso-prévio, férias mais 1/3, 13º salários, FGTS mais 40% e RSR, sendo que neste último deverão ser incluídos os sábados e feriados (parágrafo 1º da cláusula oitava dos instrumentos coletivos). O percentual a ser aplicado no
RSR é de 42,85% porque o instrumento normativo inclui o sábado como dia de repouso remunerado; d. Multa por litigância de má-fé no percentual de 1% do valor da condenação. Defere-se à reclamante o benefício da justiça gratuita. Os valores serão apurados em liquidação, observando-se os parâmetros contidos na fundamentação supra, parte integrante desta decisão. A correção monetária observará os termos da súmula 381 do TST. Sobre a importância corrigida incidirá juros de mora de 1% ao mês, pro rata, devidos desde o ajuizamento da demanda nos termos do art. 883 da CLT. A correção monetária da indenização observará os termos da súmula 439 do TST. As contribuições previdenciárias, incidentes na forma prevista no art. 28 da Lei nº 8.212/91, deverão ser recolhidas pela reclamada, ficando, de logo, autorizada a abater dos créditos do reclamante a sua quota-parte, sob pena de execução. O imposto de renda será quantificado observando-se os termos da súmula 368 do TST, excluindo-se os juros de mora de sua base de cálculo ante a sua natureza indenizatória (art. 404 do CC/02), autorizando-se o abatimento da cota do autor sobre seus créditos. Custas, pela reclamada, de R$500,00, calculadas sobre o valor da condenação de R$25.000,00, arbitrado provisoriamente. Intimem-se as partes. São Paulo, 22 de setembro de 2015. Henry Cavalcanti de Souza Macêdo Juiz do Trabalho