CUSTEIO BASEADO EM ATIVIDADES PARA AMBIENTES PRODUTIVOS INSTÁVEIS: O CASO DA CONSTRUÇÃO CIVIL

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Transcrição:

CUSTEIO BASEADO EM ATIVIDADES PARA AMBIENTES PRODUTIVOS INSTÁVEIS: O CASO DA CONSTRUÇÃO CIVIL Paulo Renato Colpo Marchesan, MSc Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil - NORIE/UFRGS Av. Osvaldo Aranha, 99 3 o andar - Porto Alegre RS - prmarchesan@iname.com Carlos Torres Formoso, PhD - Professor NORIE/UFRGS Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil - NORIE/UFRGS Av. Osvaldo Aranha, 99 3 o andar - Porto Alegre RS - formoso@vortex.ufrgs.br ABSTRACT One of the challenges with applying ABC to real world situations consists in the recognition that every production process are variable in some degree. Indeed, production process are composed of individual activities that are variable by nature. Additionally, the process itself may have a high degree of variability, meaning that certain activities may or may not be performed. In order to accommodate ABC concepts to such production environments, a specific cost allocation structure should be considered. This paper presents an adapted activity-based costing model. The model includes a cost allocation structure designed specifically for turbulent production environments such as those found in the construction industry. A numerical example is provided to illustrate the data collection and analysis process. Some results of real world applications in which the proposed model were successfully implemented are also presented. The main conclusions of this research work are that the adoption of ABC concepts in turbulent production environments demands the translation and adaptation of such concepts in order to create a manageable cost system The study also indicated that the cost information provided by the proposed model makes the production processes more transparent; helps to identify production inefficiencies; and supports the decision making. KEYWORDS Activity-Based Costing, Turbulent production environments, Waste reduction 1. INTRODUÇÃO Nos últimos trinta anos, uma sucessão de acontecimentos vem transformando radicalmente o ambiente de negócios e a organização interna de alguns setores industriais. Para se manterem no mercado, as organizações têm sido forçadas a aumentar a diversificação e a qualidade dos seus produtos, além de reduzir seus custos de produção. Mais do que nunca, são necessárias, hoje, informações de custo que facilitem o planejamento e controle da produção, estimulem a produtividade e auxiliem no processo de melhoria contínua (Johnson & Kaplan, 1987, Bonelli et al., 1994; Brimson, 1996). Nesse novo contexto, os sistemas tradicionais de custeio, desenvolvidos no início do século XX, tornaram-se incapazes de atender às necessidades gerenciais emergentes (Berliner & Brimson, 1988). Segundo Ploss (1990), além de obsoletos, esses sistemas tornaram-se extremamente perigosos, pois não apenas deixam de fornecer informações

relevantes, como também desviam a atenção dos gerentes de fatores essenciais ao bom desempenho da produção. Nas últimas décadas, algumas alternativas à contabilidade tradicional têm sido desenvolvidas com o objetivo de recuperar a relevância das informações de custo. Dentre essas alternativas, destaca-se o Custeio Baseado em Atividades (ABC - Activity-Based Costing). O ABC, ao contrário dos métodos convencionais, baseia-se na premissa de que os recursos são consumidos por atividades e que estas, por sua vez, são consumidas pelos produtos. Mais do que uma nova forma de calcular o custo dos produtos, o custeio baseado em atividade fornece um mecanismo conceitual capaz de entender a origem dos custos e, dessa forma, dar transparência aos processos de produção (Brimson, 1996; Kaplan & Cooper, 1998). Entretanto, apesar de sua relevância e potencialidade, o ABC apresenta algumas desvantagens em relação aos métodos tradicionais. A principal delas é que o método exige um volume de dados maior do aquele necessário nos ditos sistemas tradicionais (Kaplan & Cooper, 1998). Um nível de detalhamento excessivo pode, em alguns casos, resultar em um volume de dados gigantesco, tornando difícil e trabalhosa a operação do sistema. De fato, o detalhamento excessivo constitui-se na principal causa de fracasso na implantação de sistemas ABC (Krieger, 1997; Cokins, 1999). Esse problema pode ser ainda mais sério quando se consideram processos de produção complexos e instáveis, como aqueles observados no ambiente produtivo da construção civil. Nesses processos, além da variabilidade inerente às atividades executadas, a própria configuração dos processos é variável, o que significa dizer que algumas atividades dos processos de produção podem ou não se repetir. Nesses casos, a aplicação direta de um modelo de custeio por atividades (Kaplan & Cooper, 1998) pode resultar não apenas em um grande número de atividades, mas também em um grande número de atividades com pequeno custo associado, tornando o sistema, ao mesmo tempo, de difícil manutenção e de pouca relevância gerencial. 2. ESTRUTURA DE ALOCAÇÃO DE CUSTOS Nesse estudo, tomando por base o modelo proposto no ABC, sugere-se uma nova estrutura de alocação de custos (figura 1), adaptada às particularidades de ambientes produtivos turbulentos como o da construção civil, com o objetivo de possibilitar a aplicação dos conceitos ABC em tais ambientes. De acordo com essa estrutura, as atividades são desdobradas em tarefas e operações. São as operações que, conceitualmente, consomem os recursos e permitem descrever e analisar os processos de produção. No entanto, no caso da construção civil, alguns recursos como a mão-de-obra própria e as equipes empreitadas são tradicionalmente alocados às tarefas. Nesses casos, o rastreamento do custo das operações ocorre corrente acima, i.e., das tarefas para as operações. Diferentemente da estrutura clássica do ABC, um conjunto limitado de operações genéricas é empregado para descrever e parametrizar os processos de produção. De fato, um dos maiores desafios à aplicação do modelo proposto em situações reais reside justamente na definição de um conjunto adequado de operações. Nesse sentido, dois aspectos devem ser observados: primeiramente, a diferença conceitual entre processo e operação; e em segundo lugar, a diferença entre as operações executadas em processos de preparação e pós-ajuste, processos essenciais e processos auxiliares (Shingo, 1996). Embora todos esses processos sejam constituídos pelas mesmas atividades - transformação, inspeção, transporte e espera (figura 2) - a natureza e o propósito das operações de produção diferem sensivelmente em cada um deles.

$ Recursos (1) $ Recursos (2)... $ Recursos (n) Atividades Operação (1) Operação (2)... Operação (n)... Tarefa Tarefa Tarefa (1) (2) (n) Materiais diretos Objetos de custo: Zonas ou partes do produto edificação Figura 1: Modelo de alocação de custos adaptado do ABC. Neste estudo, processos essenciais foram definidos como aqueles processos que resultam na adição ou na fabricação de um elemento permanente do produto (edificação) especificado pelo cliente. Os outros dois tipos de processo - auxiliares e de preparação e pós-ajuste - envolvem, por sua vez, atividades que apoiam os processos essenciais, mas que não resultam, diretamente, na incorporação de elementos definitivos ao produto final. Considerando-se novamente o exemplo da construção civil, tarefas como a construção de fôrmas de madeira, apesar de inerentes à tecnologia convencional de fabricação de estruturas de concreto armado, não adicionam elementos permanentes às edificações e, portanto, não adicionam valor sob a ótica do cliente final. Processos Preparação e pós- ajustes Atividades Transformação Inspeção Transporte Espera Essenciais Auxiliares Figura 2: Classificação de processos e operações (adaptado de Shingo (1996)). Foram definidas, então, as seguintes operações para o modelo de custeio proposto: Processamento: é uma operação de transformação que intersecciona um processo essencial. É a única operação que pode agregar valor ao produto final. Implica a incorporação, montagem ou fabricação de algum elemento permanente do produto especificado pelo cliente (Pregenzer et al., 1999). São exemplos de processamento as operações de transformação pertencentes às tarefas de concretagem e elevação da alvenaria; Pré-processamento: é uma operação de transformação pertencente a um processo auxiliar, pré-requisito de um processo essencial. Embora tais operações sejam coincidentes com atividades de conversão, elas não resultam na fabricação ou montagem de elementos definitivos do produto, i.e., não agregam valor ao produto

final. É o caso, por exemplo, das operações de transformação existentes nos processos de montagem de fôrmas e de montagem de andaimes; Pós-processamento: é uma operação de transformação executada em um processo auxiliar, posterior a um processo essencial. Assim como o pré-processamento, essa operação se diferencia do processamento em razão do tipo de processo que intersecciona. As operações de pós-processamento são empregadas com o propósito de desfazer os produtos ou serviços executados no pré-processamento. Fazendo referência aos exemplos utilizados anteriormente, são operações de pósprocessamento aquelas atividades de conversão executadas nos processos de desfôrma e de desmontagem de andaimes; Transporte de material: são operações que implicam a mudança de localização dos materiais que fluem por processos essenciais ou auxiliares; Limpeza do posto: são as operações necessárias à retirada de entulho tanto dos postos de trabalho quanto do canteiro de obras como um todo. Segundo Shingo (1996), fazem parte dos processos de pós-ajuste; Correção e ajuste: incluem as operações relacionadas à correção de defeitos (retrabalhos) e ao setup de tarefas; Circulação: são operações nas quais ocorre apenas a movimentação dos operários. Tais operações não interseccionam os processos de produção, i.e., não fazem parte dos fluxos de materiais; Espera: são operações correspondentes às folgas por fadiga, para higiene pessoal, operacionais, causadas por mau tempo ou desbalanceamento da produção. Assim como a circulação, a espera não intersecciona nenhum processo de produção, i.e., não exerce qualquer ação sobre os fluxos de materiais ou produtos. Diferentemente do evento espera (estoque) relacionado ao fluxo de materiais, a operação de espera refere-se ao operário; Este conjunto de operações foi proposto especificamente para o presente estudo e levou em consideração os objetivos e os recursos disponíveis no mesmo. Em outros estudos, um conjunto diferente de operações pode ser sugerido, observando-se, no entanto, a relação custo-benefício de uma coleta de dados mais detalhada. 2.1 Coleta e Processamento dos Dados Embora seja possível utilizar cost drivers medidos objetivamente, a percepção dos gerentes e funcionários envolvidos na produção foi adotada, neste estudo, como instrumento de avaliação da intensidade com a qual cada uma das operações é acionada nas diferentes tarefas. Esta decisão foi fundamentada na dificuldade de medir efetivamente o tempo consumido pelas operações em cada uma das tarefas. Segundo Drucker (1995), em situações em que a obtenção de dados medidos é muito difícil, é justificável basear a avaliação em julgamento e percepção, ao invés de baseá-la em medição. De modo geral, o procedimento de coleta de dados proposto neste estudo possui duas fases distintas. Na primeira, registram-se, diariamente, as tarefas realizadas, o código do recurso empregado na tarefa, a quantidade de horas trabalhadas e a incidência de adicionais sobre o custo-hora normal. Dessa forma, o custo total da tarefa t l, pode ser expresso pelas equações (1) e (2); Ct t, i = ht, i t i CLht, i Ch l l l, l (equação 1) C n = T Ct tl l, i i= 1 (equação 2)

onde Ct tl,i : custo do registro i da tarefa t l ; h tl,i : horas trabalhadas no registro i da tarefa t l ; Ch tl,i: custo hora do recurso envolvido no registro i da tarefa t l ; CLh tl,i : adicional incidente sobre o custo-hora no registro i da tarefa t l (hora extra ou noturna); : custo total dos n registros da tarefa t l. CT tl Em uma segunda fase, o tempo consumido pelas diferentes operações em cada uma das tarefas registradas é avaliado com base na percepção dos intervenientes envolvidos no processo de produção (gerentes e funcionários) por meio da atribuição de um índice (0 a 10) que expressa a intensidade relativa de cada operação. De acordo com esse procedimento, durante uma reunião, atribuí-se, inicialmente, um valor 10 para a operação considerada pelos intervenientes da produção como a mais acionada em uma determinada tarefa. Em seguida, assumindo-se essa operação como referencial, atribuíam-se às demais valores que variavam entre 0 e 10. Desse modo, admitindo que P 1, P 2, P 3,..., P x sejam os índices de intensidade atribuídos às x operações - que podem ou não coincidir com o número de operações apresentadas anteriormente - o custo de cada operação op é, então, expresso pela equação (3): Pk, tl Copk t = CTt, com k = 1, 2, 3,...x (equação 3), l x P onde Cop k,tl : custo atribuído à operação k da tarefa t l ; P k,tl : índice de intensidade atribuído à operação k da tarefa t l ; j= 1 Para ilustrar o processo de coleta e análise dos dados, considere-se o exemplo apresentado na tabela 1. A tarefa registrada consiste na instalação da rede lógica da sala da presidência de uma edificação industrial. Considerando que o recurso A, empregado nesta tarefa, possui um custo-hora de $300,00, o custo total da tarefa (equação 1) é de $4500,00. Por sua vez, empregando-se a equação 3 evidencia-se, por exemplo, que a operação de circulação consumiu cerca de 19% dos recursos dedicados à tarefa de instalação da rede lógica, ou seja aproximadamente $845,00. j, t l Tarefa Recurso Tempo Préprocess. Pós- Process. Process. Operações Transporte Espera Circulação Correções e Ajustes Instalação - rede lógica - sala presidência A 15 3 0 10 2 3 6 4 3 Custo Total da Tarefa $ 4500,00 10% 0% 32% 6% 10% 19% 13% 10% Tabela 1: Informações sumarizadas para o exemplo numérico. Limpeza Embora o uso da percepção possa ser apontado como uma limitação do presente estudo, cabe ressaltar que o modelo de alocação proposto independe do método utilizado para rastrear o custo das tarefas às operações. Medidas objetivas podem ser utilizadas quando os processos de produção são razoavelmente estáveis e os recursos administrativos necessários estão disponíveis. Além disso, métodos mais objetivos de medição - tais como a amostragem de trabalho ou estudos de tempo, embora mais trabalhosos, não invalidam o

modelo de alocação aqui proposto, mas apenas contribuem para uma alocação de custos mais precisa. 3. EXEMPLOS DE IMPLANTAÇÃO DO MODELO PROPOSTO A estrutura de alocação proposta neste estudo foi desenvolvida e implantada em três estudos de caso realizados em empresas de construção do estado do Rio Grande do Sul. Nos itens seguintes, apresentam-se brevemente alguns dos resultados obtidos a partir da implantação da sistemática descrita neste trabalho. Uma discussão mais profunda da estratégia de implantação e dos resultados obtidos pode ser encontrada no trabalho de Marchesan (2001). modificação do processo de concretagem dos pilares: em uma das obras analisadas foi identificado, por meio do emprego de mapofluxogramas, um excesso de operações de transporte no processo de concretagem dos pilares. Além de ratificarem essa constatação, as informações de custo permitiram aos gerentes avaliar o impacto econômico do excesso de transporte (figura 3). Como resultado, os engenheiros e diretores decidiram adquirir um equipamento que permitia à grua descarregar o concreto diretamente dentro da fôrma dos pilares. Como se observa na figura 3 (2 o e 3 o períodos), os custos atribuídos ao transporte foram imediatamente reduzidos. No entanto, a grua não tinha altura suficiente para alcançar os dois últimos pavimentos da obra e, dessa forma, utilizou-se, nesses pavimentos, o mesmo processo manual empregado inicialmente. O resultado foi um novo aumento dos custos atribuídos ao transporte (figura 3); 50% Distribuição dos Custos 40% 30% 20% 10% 0% -10% -20% -30% 01-15/06 16-30/06 01-15/07 16-31/07 01-15/08 16-31/08 Tempo (quinzenas) Figura 3: Evolução do custo percentual das operações - concretagem de pilares. Mobilização Circulação Transporte Processam ento Espera Correções e Ajus te Lim peza Des m obilização Custo Total avaliação e discussão sobre o serviço de fornecimento de concreto: em outro caso analisado, os relatórios de custeio indicaram que, nas concretagens de laje, a espera consumia uma grande parcela dos custos da mão-de-obra do empreiteiro geral (figura 4). Essa espera, no entanto, era causada, principalmente, pela grande variabilidade na entrega do concreto usinado. Os freqüentes atrasos e a demora entre a saída de um caminhão betoneira e a chegada de outro provocavam longos períodos de espera na concretagem, o que, em geral, resultava na dilatação do tempo e do custo total da tarefa. Como se observa na figura 4, nos períodos 2 e 4, os problemas com o

fornecimento do concreto resultaram, ao mesmo tempo, nos maiores custos de espera e nos maiores custos totais da tarefa (indicado na linha espelhada na parte inferior do gráfico). Esses resultados do custeio provocaram uma discussão a respeito da substituição do fornecedor de concreto. Avaliando-se a diferença de preço entre concreteiras e a expectativa de economia com a redução da espera, decidiu-se pela manutenção do fornecedor. Contudo, mais importante do que a opção em si foi o fato de as informações de custo terem possibilitado a avaliação dos processos de produção, bem como do impacto econômico que a escolha do fornecedor teria sobre os mesmos; 50% Distribuição de Custos (%) 40% 30% 20% 10% 0% -10% -20% 01-15/06 16-30/06 01-15/07 16-31/07 01-15/08 16-31/08 Custo do Período = R$ 3.120,00 Mobilização Circulação Transporte Processamento Espera Correções e Ajus te Limpeza Desmobilização -30% Custo Total -40% Tempo (quinzenas) Figura 4: Evolução do custo percentual das operações - concretagem de laje. 4. CONCLUSÕES Neste artigo, apresentou-se uma estrutura de alocação de custos adaptada para ambientes produtivos instáveis utilizando-se como base a abordagem proposta no custeio baseado em atividades (ABC Activity-Based Costing). O caso da construção civil foi analisado como uma das situações específicas nas quais a estrutura proposta pode ser aplicada. Alguns resultados obtidos em estudos de caso nos quais a estrutura proposta foi implementada com sucesso foram também descritos. De maneira geral, as principais conclusões do presente trabalho são as seguintes: a aplicação, em um ambiente de produção turbulento como o da construção civil, do custeio por atividade - apontado na literatura como a principal alternativa aos métodos tradicionais - exige que se façam algumas adaptações, as quais são necessárias, basicamente, para viabilizar a coleta de dados e a manutenção do sistema de custeio. Neste trabalho, atendendo ao objetivo específico de adaptar à construção civil os conceitos do custeio por atividade, propôs-se uma nova estrutura de alocação de custos com base no modelo sugerido no ABC. De acordo com a mesma, os recursos de produção são consumidos por operações que, por sua vez, são acionadas por tarefas destinadas a partes específicas do produto. Diferentemente do ABC, um conjunto limitado de operações genéricas é empregado para descrever e parametrizar quaisquer processos de produção existentes em obras civis. Na definição dessas operações, buscou-se incorporar ao sistema de custeio as visões de fluxo e valor. Em razão da dificuldade de se medir, objetivamente, o tempo consumido em cada operação, optou-se por basear parte da coleta de dados em julgamento e percepção. Cabe destacar, no entanto, que, em obras com recursos administrativos suficientes, é

possível empregar também procedimentos de medição direta como a amostragem de trabalho ou o cartão de produção. Além disso, em processos estáveis, essas técnicas podem ser utilizadas, também, como forma de validar os dados coletados com base na percepção dos encarregados da produção; a lógica de custeio proposta neste estudo demonstrou-se capaz de gerar informações relevantes para a gestão da produção. A sua implementação conferiu maior transparência aos processos de produção, tornando visíveis importantes aspectos negligenciados pelos sistemas tradicionais de custeio. As informações de custo geradas estimularam a discussão e a reflexão a respeito da estrutura dos processos de produção. Nesse sentido, a implantação da lógica proposta auxiliou na identificação de ineficiências, bem como na avaliação das ações corretivas realizadas; embora acredite-se que o modelo de custeio proposto nesse estudo seja aplicável a outras indústrias do tipo one-of-a-kind, como por exemplo a indústria naval, os casos estudados limitam-se à indústria da construção civil não havendo evidências suficientes para permitir tal generalização. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Berliner, C.; Brimson, J.A. Cost Managment: for today s advanced manufacturing. Boston: Harvard Business School, 1988. Brimson, J.A. Contabilidade por Atividades: uma abordagem de custeio baseado em atividades. São Paulo: Atlas, 1996. Bonelli, R.; Fleury, P.F.; Fritsch, W. Indicadores microeconômicos do desempenho competitivo. Revista de Administração, São Paulo, v. 29, n. 2, p.3-19, abr/jun 1994. Cokins, G. Learning to love ABC. Journal of Accountancy, New York, v. 188, n. 8, p. 37-398, Aug. 1999. Drucker, P.F. The information executives truly need. Harvard Business Review, Boulder, 73(1), 54-62. 1995 Johnson, H.T. and Kaplan, R.S. Relevance lost: the rise and fall of management accounting. Harvard Business School, Boston, 269pp. 1987 Kaplan, R.S.; Cooper, R. Custo & Desempenho: administre seus custos para ser mais competitivo. São Paulo: Futura, 1998. 376p. Krieger, J. Establishing activity-based costing: Lessons & Pitfalls. Newspaper Financial Executives Quarterly, 3(4), 14-17. 1997. Marchesan, P.R.C. Modelo integrado de gestão de custos e controle da produção para obras civis. 2001. 163f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Escola de Engenharia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2001. Ploss, G. W. Cost Manufacturing: dawn of a new era. Production Planning & Control, London, 1(1), 61-68. 1990. Pregenzer, L.J.; Seppanen, P.J.; Kunz, J.C. and Paulson, B.C. Value-added assessment of construction plans. J. Constr. Engrg. and Mgmt, ASCE, New York, NY, 125(4), 242-248. 1999. Shingo, S. Non-Stock Production: The Shingo System for Continuous Production. Productivity Press, Cambridge, Massachusetts. 1988