1 Pesquisador da Embrapa Mandioca e Fruticultura-BA;

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Transcrição:

SITUAÇÃO DA SIGATOKA-NEGRA DA BANANEIRA NO BRASIL ZILTON JOSÉ MACIEL CORDEIRO 1 ; ARISTOTELES PIRES DE MATOS 1 INTRODUÇÃO A bananicultura é uma das atividades de grande importância no agronegócio brasileiro, embora o País não seja um grande exportador de banana. A produção é da ordem de sete milhões de toneladas anuais, com vendas externas em torno de 2% da produção, ou seja, o mercado interno é o mais importante para a comercialização da fruta, que, em grande parte vem da agricultura familiar. Entre os diversos problemas fitossanitários da cultura, a Sigatoka-negra, causada por Mycosphaerella fijiensis Morelet (fase sexuada) e Paracercospora fijiensis (Morelet) Deighton (fase assexuada) é considerada a mais grave. Está presente nos principais países produtores dos continentes americano, africano e asiático. Apenas para exemplificar o grau de importância do problema, em países produtores como a Costa Rica, têm sido feitas 60 aplicações anuais de fungicidas para controlar a doença. Isso se deve à resistência do fungo aos principais produtos disponíveis para o seu controle, levando os produtores a reduzirem cada vez mais os intervalos entre aplicações, tendo como consequência imediata a elevação do custo de produção. CONSTATAÇÃO, DISSEMINAÇÃO E IMPACTOS DA DOENÇA NO BRASIL A Sigatoka-negra foi relatada pela primeira vez no Brasil em fevereiro de 1998, no Estado do Amazonas, em plantios localizados nos Municípios de Benjamin Constant e Tabatinga, fronteira com a Colômbia e Peru (PEREIRA et al., 1998; CORDEIRO et al., 1998). Há indícios de que tenha sido introduzida por meio de material infectado proveniente de plantios da Colômbia ou do Peru, veiculados pela calha do rio Solimões durante períodos de cheia, passando então a afetar plantios ribeirinhos. Ainda em 1998, a doença foi constatada nas proximidades de Manaus, distante cerca de 1500 km do foco inicial. Nesse processo de dispersão no Amazonas alguns aspectos podem ter sido decisivos. O fenômeno das terras caídas, quebra das margens do rio Solimões pela ação das águas, derrubando e transportando bananeiras infectadas cultivadas nas margens do rio, que posteriormente, aportaram-se às margens do Solimões ou foram recolhidas por produtores e plantadas em suas respectivas áreas. Além desse fenômeno, o uso de folhas infectadas na proteção de cachos durante o transporte em barcos ou outro meio qualquer certamente teve ativa contribuição na disseminação do patógeno a longas distâncias, em curto espaço de tempo. 1 Pesquisador da Embrapa Mandioca e Fruticultura-BA; zilton@cnpmf.embrapa.br; apmatos@cnpmf.embrapa.br

Ao final do mesmo ano (1998) a doença foi constatada no Estado do Acre, mas neste caso a hipótese mais provável é de uma segunda introdução a partir da Bolívia, haja vista as distâncias entre as áreas de ocorrência no Amazonas e as do Acre, pouca comunicação e uma vasta floresta pelo meio. Na sequência as constatações ocorreram em Rondônia e Mato grosso (1999); Pará, Roraima e Amapá, em 2000. Após quatro anos, em junho de 2004, um novo avanço do patógeno ocorreu, constatando-se a doença no vale do Ribeira em São Paulo, importante região produtora de banana no País. Em seguida e, no mesmo ano, ocorreram as constatações em Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do sul e Sul de Minas Gerais (GASPAROTTO, et al., 2006). Em 2010 ocorreu o último avanço de fronteira estadual com a constatação do patógeno no Norte do Tocantins. A Figura 1 mostra a situação atual da disseminação de M. fijiensis no Brasil (MATOS & CORDEIRO, 2011). Dentro deste quadro, há identificações que não evoluíram, mas permanecem como áreas de ocorrência no País. Logo após a constatação da doença e seu rápido avanço para a região Centro-Oeste, ocorreu uma enorme movimentação dos órgãos de defesa agropecuária tanto do Ministério da Agricultura como das agências estaduais, promovendo treinamentos e publicando instruções normativas para regulamentar a movimentação da produção nas áreas afetadas. Nesta fase os Estados afetados pela doença foram impedidos de comercializar a produção com aqueles ainda não atingidos. Isso, sem dúvida, provocou insatisfação por parte dos produtores e consequentes perdas para a bananicultura local. No Estado do Acre, a avaliação do impacto causado, revelou uma queda de 42% na produção no período de 2000/2001 e queda de 47% no valor da produção (CAVALCANTE et al., 2004). Logo após a introdução do patógeno em São Paulo, o problema ganhou uma cobertura ainda maior da mídia escrita e falada, que apesar do aspecto positivo de levar a informação ao público em geral, provocou uma redução de cerca de 20% no consumo de banana, simplesmente porque o consumidor passou a entender que o problema poderia estar ocorrendo também no fruto e poderia causar algum mal à sua saúde. Com a presença da doença em Estados grandes produtores como São Paulo, Santa Cataria e Minas Gerais, seria quase impossível a proibição da comercialização da fruta para outros Estados ainda indenes. Foi então criado pelo MAPA, o sistema de comprovação de áreas livres, para Estados já atingidos pela doença, mas onde a mesma permanecia restrita a alguma área. Surgiram assim as áreas livres do Mato Grosso e Minas Gerais (Norte de Minas). Estados ainda não afetados passaram a ter a obrigação de comprovar, perante a defesa sanitária do MAPA, que continuavam livres, mediante levantamentos detalhados nas áreas de produção. Nessa fase foi

regulamentado também o sistema de mitigação de risco, pelo qual Estados afetados pela doença, mas cumprindo as exigências do sistema de mitigação, estavam liberados para comercializar a fruta em outros Estados, mesmo que estivessem livres da doença. Analisando questões futuras do ponto de vista das mudanças climáticas globais, mapas de favorabilidade da doença no Brasil, construídos a partir dos cenários disponibilizados pelo Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC), mostraram que haverá redução da área favorável à doença no país. Tal redução será gradativa para as décadas de 2020, 2050 e 2080 e de forma mais acentuada no cenário A2 (cenário mais pessimista) que no B2 (cenário mais otimista) (GHINI et al., 2007). Apesar do resultado ser animador para o futuro da bananicultura brasileira, é preciso entender, no entanto, que isto trata-se apenas de previsões e que não levam em conta a capacidade de adaptação do patógeno, que apresenta uma alta variabilidade com possibilidades de recombinação gênica. COMENTÁRIOS SOBRE O PROCESSO DE DISSEMINAÇÃO DE M. FIJIENSIS NO BRASIL Considerando o período decorrido entre a constatação da doença no Amazonas e Acre em 1998, Mato grosso em 1999 e os relatos de agressividade do patógeno mundo afora, era de se esperar que decorridos 14 anos desde a primeira constatação, o patógeno já estivesse disseminado por todo o País. Como isso não ocorreu, algumas hipóteses relativas ao processo de entrada no País e sua disseminação ganharam força. Considerando a introdução, acredita-se que houve duas ou mais vias de entrada, uma a partir da Colômbia e/ou Peru, atingindo o Amazonas, e a outra a partir da Bolívia, atingindo o Acre e sendo levada até Rondônia e o Mato Grosso por folhas infectadas, utilizadas na proteção de cachos. Por esta mesma linha de raciocínio, pode-se aventar hipóteses de outros pontos de entrada como por exemplo, via Roraima, a partir da Venezuela, cuja doença já estava presente desde 1991. Considerando a disseminação, a expansão do patógeno sobre a região amazônica foi rápida, mesmo considerando as várias possibilidades de entrada a partir dos Países vizinhos. Isso se deve às condições de clima tropical úmido predominante e, naturalmente, altamente propício ao desenvolvimento da Sigatoka-negra. Considerando que o patógeno que se desenvolveu e alastrou sobre o continente americano, o fez sob condições climáticas bastante similares às da Amazônia, pode-se dizer que o variante patogênico que avançou sobre toda a América do Sul, deve ter atingido

a Amazônia brasileira, onde encontrou condições climáticas similares às quais estava perfeitamente adaptado, fato que poderia explicar o impacto devastador causado nessa região. Para o caso do Amazonas, a substituição de variedades suscetíveis por resistentes, foi a única alternativa viável, cujo comportamento vem sendo também adotado no Estado do Pará (CORDEIRO, 2007; CORDEIRO; MATOS, 2006). Considerando, todavia, as condições do Sul/Sudeste brasileiro, e tendo em vista os oito anos passados desde a constatação do primeiro foco da doença em São Paulo e, posteriormente, em Estados vizinhos, o patógeno parece estar passando por um período/processo de acomodação com seleção de variantes mais adaptados ao novo ambiente. Enquanto isso não ocorre, novas constatações de avanços da doença não têm ocorrido. Nesta região - a estação chuvosa é mais curta e os períodos de seca mais longos do que na Amazônia, assim como a umidade relativa do ar é mais baixa. Acredita-se que essas condições possam ter feito da M. fijiensis um patógeno menos competitivo, necessitando, portanto de tempo para se adaptar às novas condições. Entre os estados do Sul e Sudeste, São Paulo é onde a doença tem sido mais grave, praticamente dominando a Sigatoka-amarela. A explicação mais uma vez são as condições climáticas, que no Vale do Ribeira se assemelham mais às condições da Amazônia com verão quente e úmido. A expectativa gerada pelas informações da própria literatura (STOVER, 1972) era de que o domínio da Sigatoka-negra sobre a amarela ocorreria em prazo de três anos. Isso reforça a tese de que patógeno novo em ambiente novo ou diferente, necessita de um período de adaptação, até que selecione formas capazes de competir em igualdade de condições com patógenos similares, já adaptados ao ambiente e competindo pelo mesmo sítio de infecção como é o caso da M. fijiensis e M. musicola. Além das questões climáticas, aspectos legais também tiveram sua parcela de contribuição no processo de disseminação do patógeno da Sigatoka-negra. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e Agências Estaduais de Defesa Agropecuária atuaram no sentido de prevenir/disciplinar a movimentação/comercialização de frutos a partir de áreas de ocorrência da doença para áreas livres da mesma. De maneira similar, foram adotadas medidas sanitárias quanto à movimentação das embalagens utilizadas no transporte dos frutos. Estas ações, com certeza, contribuíram significativamente para restringir/retardar a dispersão da Sigatoka-negra no País. Além disso, há o papel positivo exercido pelas barreiras naturais formadas por grandes áreas de culturas de milho, soja e algodão na região Centro-Oeste, ou seja, longas áreas sem plantas hospedeiras; ocorrência de longos períodos de estiagem com prevalência de clima pouco favorável

a um patógeno oriundo de ambientes úmidos aos quais estava perfeitamente adaptado (CORDEIRO, 2007). O Tocantins, onde a doença foi constatada em 2010, lançou mão de ferramenta diferenciada na tentativa de conter a disseminação de M. fijiensis no Estado. Após a constatação da doença, as plantas da área afetada foram erradicadas, mantendo a área sempre livre de rebrotas. Esta não é uma estratégia comum utilizada para patógenos de disseminação aérea como este, mas como o mesmo foi constatado em pequena área, a alternativa foi utilizada com sucesso. Intervenções semelhantes foram realizadas na Austrália, procedendo-se inclusive ao enterrio das plantas arrancadas (STANSHBURY et al., 2000). OCORRÊNCIAS AINDA NÃO EXPLICADAS Entre os focos inicialmente identificados pelo menos dois não se confirmaram. 1- foco identificado no Sul de Minas Gerais (FERRARI, et al., 2005) e que não se expandiu. Várias hipóteses poderiam ser levantadas: condições climáticas não favoráveis, variante pouco adaptado à região, mas pode também ter havido falha na identificação, principalmente considerando o que ocorreu em 2006 em relação ao Estado de Pernambuco. Uma amostra suspeita foi analisada e diagnosticada como positiva para Sigatoka-negra, de acordo com o método molecular em uso. Como houve discordância por parte de técnicos de Pernambuco, em relação ao resultado, os testes foram refeitos, inclusive com alteração nos primers utilizados, e o novo resultado foi negativo. O Instituto Biológico, responsável pelas análises, assumiu que havia falha no método anteriormente utilizado e aceitou como verdadeiro o resultado negativo. Diante desse fato, é pertinente pensar que a identificação no Sul de Minas também pode ter sido um caso de falso positivo, uma vez que a doença não evoluiu num local em que a Sigatoka-amarela continua altamente agressiva. 2. Foco do Rio Grande do Sul. Em inspeções realizadas no ano de 2005, a convite do MAPA, não se identificou os possíveis focos da doença, que originaram uma identificação positiva em 2004. As razões levantadas para o caso do Sul de Minas Gerais são também válidas para esta situação. Em resumo, o fato é que M. fijiensis não avançou sobre as áreas de produção de banana, conforme se imaginava. Isso é válido para áreas onde a doença já está presente e para aquelas em que a constatação não foi feita. Para justificar tal comportamento é necessário incluir a hipótese de que além das condições climáticas predominantes nas áreas fora da Amazônia, para as quais acredita-se que essa espécie não está bem adaptada, pode-se aliar uma segunda que diz respeito à

presença de um competidor altamente eficiente como a M. musicola, perfeitamente adaptado às variantes climáticas onde a bananeira é cultivada no Brasil. REFERÊNCIAS CAVALCANTE, M. de J. B.; SÁ, CLAUDENOR P de ; GOMES, F. C. da R. ; GONDIM, T. M. de S. ; CORDEIRO, Z. J. M. ; HESSEL, J. L. Distribuição e impacto da Sigatoka-negra na bananicultura do Estado do Acre. Fitopatologia Brasileira, Fortaleza, v. 29, n. 5, p. 544-547, 2004. CORDEIRO, Z. J. M.; MATOS, A. P. de; SILVA, S. de O. Black Sigatoka confirmed in Brazil. Infomusa, v. 7, p. 31, 1998. CORDEIRO, Z. J. M. Panorama nacional das principais doenças da bananeira. IN: Manejo integrado de doenças de fruteiras, Núcleo de Estudos em Fitopatologia, UFLA Brasília: Sociedade Brasileira de Fitopatologia, p. 165-183. 2007. CORDEIRO, Z. J. M.; MATOS, A. P. de Dispersão e impacto da Sigatoka-negra sobre a atividade bananeira no Brasil. Fitopatologia Brasileira, v. 31(supl.), p. 68-70. 2006. FERRARI, J. T., HARAKAVA, R.; NOGUEIRA, E. M. C. ; CASTRO, M. E. A. Ocorrência de Sigatoka-negra da bananeira no Sul de Mias Gerais. Summa Phytopathológica, v. 31(supl), p. 34, 2005. GASPAROTTO, L.; PEREIRA, J. C. R.; HANADA, R. E.; MONTARROYOS, A. V.V. Sigatokanegra da bananeira. Manaus: Embrapa Amazônia Ocidental, 2006, 177p. Ghini, R.; Hamada, E; Gonçalves, R. R.V.; Gasparotto, L.; Pereira, J. C. R. Análise de risco das mudanças climáticas globais sobre a sigatoka-negra da bananeira no Brasil. Fitopatol. Brasileira, Brasília, v. 32, no.3, p. 197-204, 2007. MATOS, A. P. de; CORDEIRO, Z. J. M. O patógeno e sua distribuição geográfica. IN: CORDERO, Z. J. M.; MATOS, A. P. de; SILVA, S. de O. (Editores) Recomendações técnicas sobre a Sigatoka-negra da bananeira, Cruz das Almas: Embrapa Mandioca e Fruticultura, p. 15-25, 2011. PEREIRA, J. C. R.; GASPAROTTO, L.; COELHO, A. F. S.; URBEN, A. Ocorrência da Sigatokanegra no Brasil. Fitopatologia Brasileira 23:295. 1998. (supl). Stansbury, C.; McKirdy, S.; Hortguard, G. P. Black sigatoka Mycosphaerella fijiensis Exotic threat to Western Australia. Factsheet, Information Services, Agriculture Western Australia, n. 14, 2000. STOVER, R. H. Banana, plantain and abaca disease. Commonwealth Mycological Institute, England, 1972. 316p.

Figura 1 - Distribuição atual da Sigatoka-negra da bananeira nos estados produtores do Brasil. (Fonte MATOS;CORDEIRO, 2011). Figura de José da Silva Souza.