RESUMO TRABALHO COMPLETO

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Transcrição:

935 CLIENTELISMO E EDUCAÇÃO: A INFLUÊNCIA DE PREFEITOS MINEIROS NO PROCESSO DE RECONSTRUÇÃO DE ESCOLAS, NOS PRIMEIROS ANOS DA DÉCADA DE TRINTA DO SÉCULO XX RESUMO Ana Amélia Borges de Magalhães Lopes Universidade do Estado de Minas Gerais O presente trabalho pretende discutir o significado do clientelismo na construção do sistema de ensino público primário em Minas Gerais, no período indicado. Com esse objetivo privilegiará uma pesquisa realizada pelo jornal Estado de Minas, junto aos prefeitos mineiros, de novembro de 1931 a julho de 1932. Esse inquérito, como dizia o jornal, procurava conhecer o desenvolvimento e as atividades dos municípios mineiros, incluindo o atendimento escolar à população. Foram entrevistados 75 prefeitos. As informações obtidas foram analisadas considerando-se o contexto político mineiro Durante o Governo Antônio Carlos (1926-1930), foi realizada a Reforma Francisco Campos do Ensino Primário e Normal. Nessa época, paralelamente à reforma interna da escola ocorreu um grande crescimento das oportunidades de acesso à escola primária. Mas, no período pós-30, enfrentando uma grande crise econômica, o governo mineiro vê-se às voltas com o problema de como equacionar a questão educacional, face às dificuldades enfrentadas. Nesse processo, as prioridades são redefinidas: o ideário escolanovista é mantido, bem como a ênfase na qualidade e na busca da eficiência. Mas, o salário dos professores é reduzido e muitas escolas são fechadas. Os motivos alegados foram as dificuldades financeiras, além da infrequência, deficiência de matrícula e falta de prédio escolar. Posteriormente, o número de escolas volta a crescer, especialmente na zona rural. Nessa mesma época, em Minas Gerais, ocorre uma intensa articulação política. Apesar das transformações da sociedade brasileira - passagem de uma sociedade agrária para urbano-industrial - e da tentativa dos tenentes de reduzir o domínio das oligarquias, pelas características da formação do Estado e ainda da sua participação no movimento de 30, alguns líderes mantêm o seu domínio e tentam prolongar uma situação típica da República Velha. As peculiaridades políticas do Estado permitem essa situação. Nesse contexto, pretendeu-se responder às seguintes questões: a criação ou reabertura de escolas seria em função de reivindicações sociais? Como o governo teria conciliado essas demandas e as limitações da situação econômica? Até que ponto o clientelismo teria influenciado a atitude do governo? Procurando responder essas perguntas foram realizadas pesquisas na Coleção das Leis e Decretos do Estado de Minas Gerais, em publicações do INEP, anuários estatísticos, na Revista do Ensino e no Minas Gerais. Foram consultados ainda os jornais, Diário da Tarde, Diário de Minas e Estado de Minas. Os dados obtidos indicaram que a oferta de escolas era uma forma de conquistar eleitores. Os momentos de crescimento da rede de escolas públicas coincidiram exatamente com os momentos politicamente importantes. Assim, em 1931, pressionado pelas dificuldades financeiras e pela elite econômica, o governo procura reestruturar o sistema de ensino, racionalizando-o. Inúmeras escolas são fechadas. Mas, posteriormente, face às necessidades políticas, reformula a legislação e muitas escolas são criadas ou restauradas, principalmente nas cidades do interior e na zona rural, isto é, naquelas regiões que poderiam trazer maior rendimento eleitoral. Nesse sentido a pesquisa, já mencionada, realizada junto aos prefeitos mineiros pelo jornal Estado de Minas é esclarecedora. Apenas uma das entrevistas não faz menção à educação. Quase todos os prefeitos referem-se às escolas que haviam sido cortadas no início de 1931, lamentando o ocorrido e manifestando interesse na reabertura das mesmas. Sem dar uma explicação aos leitores, em julho de 1932, o jornal Estado de Minas cessa a publicação da pesquisa feita junto aos prefeitos das cidades do interior, e que incluía questões sobre a educação. É possível que as reivindicações feitas diretamente ao secretário tenham continuado, pois ainda em 1932 a legislação do ensino começa a ser modificada possibilitando expansão das oportunidades educacionais. A partir de janeiro de 1933, algumas escolas são restauradas ou criadas. Com o desenvolvimento do estudo ficou claro que a oferta de escolas atendia os interesses dos prefeitos e era uma forma de conquistar eleitores. Os momentos de crescimento da rede de escolas públicas coincidiam com os momentos politicamente importantes, reafirmando a relação entre clientelismo e educação em Minas Gerais. TRABALHO COMPLETO O presente trabalho pretende discutir o significado do clientelismo na construção do sistema de ensino público primário em Minas Gerais, no período indicado. Com esse objetivo privilegiará uma pesquisa realizada pelo jornal Estado de Minas, junto aos prefeitos mineiros, de novembro de 1931 a julho de 1932. Esse inquérito, como dizia o jornal, procurava conhecer o desenvolvimento e as atividades dos municípios mineiros, incluindo o atendimento escolar à população. Foram entrevistados 75 prefeitos. As informações obtidas foram analisadas considerando-se o contexto político mineiro.

936 Em Minas, a força das oligarquias sempre foi muito grande, o que pode ser explicado, em parte, pela própria formação social deste Estado. Seu povoamento teve início na época da mineração que trouxe para a região uma grande concentração demográfica, incluindo: os proprietários e trabalhadores; e os setores médios, formados pelos comerciantes e pelos encarregados da fiscalização e da tributação - atividades indispensáveis para o Estado português. Daí teria se originado a vocação política de Minas Gerais. Com a queda da produção do ouro, no final do século XVIII, a população concentrada na região dirigiu-se para as atividades rurais, a opção encontrada tanto por proprietários quanto por trabalhadores. A partir daí, a sociedade foi se tornando mais simples, configurando-se a bi-polaridade de classes 1. Era esse o cenário em que se inseria a política tradicional. Dominava-a o senhoriato rural, sobretudo do sul e da Mata, a que se associavam as elites das velhas regiões mineradoras, empobrecidas mas ainda prestigiosas e influentes. Era uma composição natural de grupos semelhantes pela posição de domínio, embora distintos pelo contexto e pela tradição a que correspondiam. Aos senhores rurais, conservadores, tendencialmente imobilistas, mesclavam-se os segundos herdeiros de uma tradição de luta pela liberdade. Somados, esses grupos formavam a oligarquia que exerceu controle incontrastado sobre a vida econômica, política e cultural de Minas, até que o século XX já estivesse bem avançado 2. Os valores estáveis da sociedade agrária contribuíram significativamente para o ritmo lento das mudanças e para a solidez da oligarquia, marcada também por sua homogeneidade. Graças a essa homogeneidade das oligarquias, à medida que defendiam interesses sociais semelhantes, careciam de diversidade ideológica. As lutas que existiam eram apenas pelo poder local. Acima dessas disputas mantinha-se a uniformidade de pensamento. Em ensaio sobre a participação de Minas no quadro institucional da Primeira República, Silva (1982) mostra como a inserção deste Estado na aliança com São Paulo condicionou não apenas a política mineira, mas também refletiu negativamente no seu desenvolvimento econômico, reforçando ainda mais as relações clientelísticas. A autora revela que naquela época tem início o poder político do Estado, apesar de a atuação dos mineiros na mudança do regime ter sido muito pequena, uma vez que coube fundamentalmente à burguesia cafeeira, entendida como os produtores paulistas, a queda do Segundo Reinado. A despeito da participação ativa dos cafeicultores na Proclamação da República, nos primeiros anos do novo regime, os republicanos históricos, ocupando inicialmente os principais cargos da administração, privilegiaram os empreendimentos industriais e financeiros. Mas, a médio prazo, isso não seria possível, considerando que a economia brasileira sustentava-se na agro-exportação. Em decorrência dessa contradição, o período que vai de 1889 a 1898 foi marcado por conflitos e crises econômicas e políticas, mas a partir do governo de Prudente de Moraes (1894-1898) os cafeicultores paulistas procuraram garantir-se, colocando na presidência representantes seus. Daí a necessidade de estabelecer alianças com outros estados, pois na República Velha nenhum estado tinhas condições de dominar a federação. Como não existia um sistema partidário nacional as eleições presidenciais dependiam de coalizões estáveis durante as campanhas, que eram negociadas entre facções e partidos estaduais desiguais. 3 1 A respeito das origens da sociedade mineira ver DULCI, 1982. p. 8. 2 DULCI, 1982. p. 76. 3 WIRTH, 1982. p. 232.

937 Quando buscaram dirigir uma aliança, os paulistas pretenderam garantir mecanismos de acesso ao governo central. Para isso, deveriam buscar acordos com aqueles estados que tivessem interesses semelhantes aos seus e condições de participar do controle do poder político no quadro institucional da época. A Constituição de 1891, ao aumentar o número de membros do Congresso Federal, determinando a participação de cada estado em função da sua população, privilegiou, de antemão, alguns Estados: Minas Gerais, como o mais populoso, tinha a maioria das cadeiras - 37, em comparação com as 22 de São Paulo e Bahia, 17 de Pernambuco e Rio de Janeiro, e 16 do Rio Grande do Sul 4. Para Silva (1982), os dois estados que se adequavam melhor a uma aliança com São Paulo eram Minas Gerais e Bahia, uma vez que ambos dependiam da exportação de produtos agrícolas e possuíam grandes bancadas. Apesar do poder econômico dos cafeicultores paulistas, a forma como estava organizada a produção - voltada para o comércio externo - tornava esse setor extremamente vulnerável às oscilações do mercado internacional e às crises de superprodução. Daí a necessidade de nos momentos de crise ter acesso ao governo central, pois em determinados aspectos, como política monetária e cambial e garantia de empréstimos, a ação isolada do Estado era impossível ou insuficiente. Em 1913, com o Pacto de Ouro Fino, consolidou-se a aliança entre São Paulo e Minas Gerais. Como já mencionado, a força deste último residia no tamanho de sua bancada. Considerando-se sua unidade política, sua importância era ainda maior. O sistema funcionava perfeitamente bem quando essa força se unia ao poder econômico - e portanto político - de São Paulo, formando a aliança do café-com-leite. Quando Minas Gerais aderiu à política de coalizão em nível federal, assumiram o poder aquelas facções que conseguiram se impor no Estado: os políticos da Zona Metalúrgica, estagnada economicamente, mas que pelo seu passado - ligado à mineração - tinha os políticos mais experientes, treinados na burocracia pública, que se unem, ao assumir a liderança, aos cafeicultores da Zona Sul, cuja origem estava relacionada à expansão da cafeicultura paulista de formação mais recente. Ainda segundo Silva (1982), a representação da Zona Metalúrgica sempre foi a maior da bancada mineira no Congresso. Essa superioridade teria condicionado a política mineira e a expansão do clientelismo, pois A supremacia da Zona Metalúrgica em termos de representação política, sem contrapartida numa estrutura econômica dinâmica e em expansão, é, a nosso ver, grandemente responsável pelo caráter clientelístico progressivamente impresso à política econômica do Estado. A posição clientelística assegura o caráter de instrumentalidade essencial a certos atores políticos específicos, tornando-os parceiros preferenciais quando se trata de articular bases de apoio e sustentação políticos. A persistência dessa opção por parte da liderança política mineira ressaltou claramente, por exemplo, após a Revolução de 1930, quando Minas se transformou em peça essencial de transformação da nova ordem. 5 Com a consolidação da aliança Zona Metalúrgica-Zona Sul, firma-se a posição mineira na aliança em nível federal, ainda que numa situação de subordinação a São Paulo, e dependência do Governo Federal. A posição privilegiada ocupada pelo Estado no plano federal, capacitava-o a pedir favores econômicos à União, em troca de apoio político. Os mineiros estavam sempre presentes em importantes cargos federais, além de ser constante o favorecimento econômico ao Estado. O federalismo das instituições republicanas interessava aos mineiros. Como o Estado dependia da União, tentava estruturar esse relacionamento com vantagens. Mesmo quando na 4 Fonte dos dados: WIRTH, 1982. Em 1929, o PRM dividido não conseguiu evitar a perda de 14 cadeiras, reduzindo o bloco da máquina para 23, o que reforça a idéia da necessidade da união interna do Estado. 5 SILVA, 1982. p. 160.

938 década de 20, nos governos de Bernardes e Washington Luís, o sistema federalista brasileiro passa por dificuldades, aos mineiros não interessava substituí-lo por outro, desde que seus interesses não fossem feridos 6. Apesar de o sistema de coalizões vigente durante a Primeira República ter funcionado bem, uma vez que atendia aos diferentes interesses, cada eleição nacional significava a possibilidade de uma crise. O mesmo acontecia nas eleições estaduais. Foi o que ocorreu em 1929, gerando uma dupla crise: a ruptura da política do café-com-leite e a impossibilidade de um acordo entre os líderes do Partido Republicano Mineiro (PRM), quanto ao candidato a presidente do Estado. A partir daí surgem algumas transformações na sociedade mineira. Mesmo assim, não se pode falar em ruptura com o passado. No plano federal, a insatisfação estava relacionada à insistência de Washington Luís em indicar como seu sucessor um outro paulista, Júlio Prestes, em lugar de um mineiro, como era esperado. Antônio Carlos, presidente do Estado, que se julgava no direito de aspirar à presidência do País, considerou esse ato uma afronta a Minas Gerais. Ao Estado não restava assim outra alternativa senão aliar-se ao Rio Grande do Sul, pondo fim à coalizão que havia vigorado nas últimas décadas, formando então a Aliança Liberal. E, como se sabe, com o apoio da Paraíba, é lançado o nome de Getúlio Vargas para a presidência. Em meio a esse quadro de instabilidade, quando se decidia a sucessão de Antônio Carlos, surgem três candidatos: Artur Bernardes, Wenceslau Brás e Melo Viana (vicepresidente do Governo Washington Luís). Face à impossibilidade de um acordo, o presidente do Estado propõe uma fórmula conciliatória: Olegário Maciel (presidente do Senado) para a presidência e Pedro Marques (presidente da Câmara Estadual) para a vice-presidência. Mesmo assim ocorre uma cisão na oligarquia mineira. Durante toda a República Velha, a comissão executiva do PRM tinha obtido grande sucesso, adaptando-se ao coronelismo e fazendo a ligação entre o governador e os chefes políticos. A transferência de poder de um governo a outro era feita sem problema. Mas, em 1929 os coronéis não apenas se opuseram ao presidente do Estado como não conseguiram um acordo em torno da sucessão. A falta de unidade acarretou dificuldades para o Estado. Concordar quanto ao nome dos candidatos e manter a unidade do PRM era essencial para preservar a posição de barganha do Estado. Em decorrência da dissidência, surge a Concentração Conservadora, chefiada por Manuel Tomás de Carvalho Brito. Com a adesão de Melo Viana - que como membro do diretório do PRM já havia se comprometido com a candidatura Vargas - apoiam a candidatura Júlio Prestes, sendo lançado o mesmo Melo Viana para substituir Antônio Carlos. Para Monteiro (1987) a sucessão estadual refletia a mentalidade de uma época em que o personalismo sempre prevaleceu sobre as idéias. (...) Não havia divergências ideológicas, tampouco programáticas, pois todos pertenciam ao mesmo partido, o PRM 7. Bomeny (1980) acrescenta que o apoio ao candidato da situação, dado pela Concentração Conservadora, foi um dos elementos mais decisivos para a entrada de Minas no Movimento Revolucionário, mas também comprometeu a candidatura Vargas. De fato, a cisão das forças mineiras enfraquecia decididamente o movimento dirigido para a eleição do candidato da Aliança Liberal. A divisão interna refletia-se duplamente sobre o Estado: dificultava o estabelecimento de uma frente política de oposição ao governo federal, e permitia uma política de intervenção em Minas. 6 WIRTH, 1982. Cap. 6 7 MONTEIRO, 1987. p. 165-166.

939 Apesar do entusiasmo da campanha da Aliança Liberal, a fraude e a corrupção, que como sempre ocorriam naquela época, continuaram. Com a derrota de Vargas e o fracasso da Aliança Liberal, a oligarquia mineira reinicia as articulações para recuperar o poder perdido. A partir de então, novos líderes irão assumir e articular a revolução surgindo uma aliança entre os tenentes e oligarquias dissidentes, conveniente aos dois grupos, mas que já nasce comprometida. Enquanto os tenentes pretendiam a centralização política, reduzindo fortemente o domínio das oligarquias, a elas interessava apenas recuperar o poder perdido com a ruptura do pacto do café-com-leite. Após a implantação do Governo Provisório, Vargas tenta se impor em Minas Gerais, integrando-o ao seu projeto revolucionário de centralização política, o que significava desarticular a oligarquia mineira, isto é, destruir o PRM, que apesar de dividido ainda era suficientemente forte. Para isso, apoia-se nos tenentes e na Legião de Outubro. Mas, não era fácil para Vargas integrar Minas Gerais ao seu projeto revolucionário, especialmente pela participação do Estado na Revolução de Trinta. À frente do movimento em Minas estiveram Artur Bernardes, Olegário Maciel e Virgílio de Melo Franco. Apesar deste último estar de acordo com os objetivos revolucionários, as pretensões de Bernardes eram diversas. A ele interessava garantir seu poder, prolongando no Estado uma situação típica da República Velha, de relacionamento clientelista entre o chefe político e suas bases municipais. Como o presidente necessitava do apoio de Minas aos poucos o Estado começa a recuperar sua influência, mas em condições que o tornam um cliente político de Vargas. Olegário Maciel, presidente do Estado, mesmo tendo sido mantido em seu cargo pela sustentação que dera ao movimento revolucionário, pelas dificuldades econômicas enfrentadas em Minas Gerais, necessitava do apoio do Governo Federal. A lei eleitoral de 1932 que permitiu a criação de partidos estaduais deu início a um processo de reorganização das forças políticas mineiras e possibilitou a criação do Partido Progressista (PP). Mas ainda que o PP, como partido do presidente do estado/interventor, tenha tido uma relação de compromisso com o governo central, guardou muitas das características de um partido regional, mantendo em suas propostas princípios oligárquicos: fortalecimento e coalizão das forças regionais, aceitação do federalismo e ainda das tradições democráticas. Sua organização mostra, mais uma vez, a força da oligarquia mineira. Mesmo Vargas, por necessitar do apoio do Estado durante o processo de constitucionalização do País, utiliza-se dos tradicionais líderes políticos estaduais para a realização de seus interesses. Em fevereiro de 1933, tem início um processo de mobilização política com vistas à eleição dos representantes à Assembléia Constituinte. As articulações políticas continuam intensas. A morte inesperada de Olegário Maciel (5.9.1933), justamente quando a situação em Minas parecia tranqüila, trouxe um novo problema: a substituição do presidente do Estado. A necessidade de indicação de um interventor que desse sustentação a Vargas se impunha. Controlar a situação em Minas era fundamental, pois além da força política do Estado, a morte de Maciel coincidiu com a abertura política e a instalação da Assembléia Nacional Constituinte. Como era necessário equilibrar as forças nacionais, para Getúlio o apoio do Partido Progressista mineiro seria indispensável. Foi em uma lista com seis nomes de membros do partido situacionista que Vargas escolheu para interventor Benedito Valadares, um obscuro deputado do PP, surpreendendo a todos. Para Vargas, a nomeação de Valadares tinha sido uma vitória: a partir de então tinha um interventor fiel e descomprometido com as diferentes facções políticas do Estado. Segundo Wirth (1982), com Valadares no poder, a situação pouco mudou. Mantendo posição de cliente de Vargas, intermediava a ajuda Federal,...tornando-se conhecido mestre em conceder pistolões (... ) Quanto a acabar com

940 os coronéis, Valadares não era um reformista e inúmeros chefes locais entraram na linha 8. Com a abertura política Getúlio precisava resolver algumas questões: garantir a sua elegibilidade e de seus interventores, a sua eleição para presidente constitucional e, especificamente em Minas, a eleição de Benedito Valadares. Em julho de 1934 Getúlio Vargas é eleito presidente constitucional. Nesse mesmo mês, a comissão executiva do PP começa a reunir-se para indicar seu candidato à Presidência do Estado e elaborar as chapas para a Constituinte Mineira. Os diretórios municipais do partido são consultados a respeito. São realizadas inúmeras reuniões para debater a questão. Valadares era o candidato provável, mas em setembro a direção do PP decide não indicar seu candidato, deixando a decisão para a Assembléia Constituinte. No dia 14 de outubro foi realizada a eleição para a Assembléia Constituinte e nos primeiros dias de abril de 1935 Valadares é eleito Governador do Estado. Assim, retomando a questão colocada inicialmente -- qual teria sido a influência do clientelismo no processo de construção do sistema de ensino público primário em Minas Gerais -- nos primeiros anos da década de 30? Nessa mesma época, a política educacional mineira passa por mudanças significativas. Anteriormente, durante o Governo Antônio Carlos (1926-1930), foi realizada a Reforma Francisco Campos do Ensino Primário e Normal que, paralelamente à reforma interna da escola promoveu um grande crescimento das oportunidades de acesso à escola primária: foram criadas 3.355 escolas, sendo que a grande maioria era de escolas rurais 2.482 (Peixoto, 1983. p.155). Mas, no período pós-30, enfrentando uma grande crise econômica, o governo mineiro vê-se às voltas com o problema de como equacionar a questão educacional, face às dificuldades enfrentadas. Nesse processo, as prioridades são redefinidas: o ideário escolanovista, presente na Reforma Francisco Campos, é mantido, bem como a ênfase na qualidade e na busca da eficiência. Por outro lado, à grande expansão dos anos vinte seguiu-se um processo inverso: em 1931, inúmeras escolas são fechadas. Só no mês de janeiro, quando as matrículas ainda não haviam sido encerradas, 475 escolas foram suspensas, das quais 440 eram rurais, 10 urbanas e 25 noturnas. Os motivos alegados foram infreqüência, deficiência de matrícula e falta de prédio escolar. Ao final de 1931 restam apenas 2105: são fechadas mais de 3.000 escolas estaduais, o que representa uma redução de 59 %! Posteriormente, em 1934, momento politicamente importante, ocorrem as mudanças mais significativas dessa época: uma redução acentuada nas escolas primárias estaduais - menos 924, acompanhada de um grande aumento nas municipais, de 314 para 1749; o que significa um acréscimo de 1435 escolas, das quais 683 estavam localizadas na zona rural. e o que é mais significativo, o aumento do número de escolas ocorreu especialmente nos meses de maio a setembro, quando inúmeras escolas foram criadas ou restauradas. Em outubro foi realizada a eleição para a Assembléia Constituinte Mineira que deveria eleger o novo governador do Estado. Como explicar estas constantes mudanças na política de atendimento escolar em Minas Gerais? O que teria levado o governo mineiro a reduzir o número de escolas, reabrindo-as pouco depois? Até que ponto o clientelismo teria influenciado a atitude do governo? Nesse sentido, a pesquisa realizada junto aos prefeitos mineiros é esclarecedora. De novembro de 1931 a julho de 1932, o jornal Estado de Minas promoveu um inquérito sobre o desenvolvimento e as atividades dos municípios mineiros, incluindo o atendimento escolar à 8 WIRTH, 1982. p. 172.

941 população. Não foi encontrada nenhuma referência ao que deu origem à pesquisa, mas as informações referentes ao ensino são muito significativas. Foram localizadas 75 entrevistas, das quais apenas uma não faz menção à educação. Nas outras, quase todos os prefeitos referem-se às escolas que haviam sido cortadas no início de 1931, indicando o número existente anteriormente, e que a freqüência às mesmas atendia às exigências legais, muitas vezes ultrapassando a exigência de 30 a 35 alunos para as escolas rurais, dos quais 20 deveriam ser freqüentes, e 35 a 40, com freqüência mínima de 25 alunos para as escolas distritais, determinadas por lei (art. 260 e 261 do Decreto 7.970-A de 15.10.1927). Entretanto, nenhum dos prefeitos se refere à suspensão das escolas em tom de acusação ao governo estadual. Como os municípios eram muito dependentes, não lhes interessava entrar em atrito com a administração do Estado. Para eles, as dificuldades econômicas do Estado e a certeza de que tão logo fosse possível, as escolas suspensas seriam restauradas, justificavam a atitude do governo. Como afirma o prefeito de Eloy Mendes, João Batista Ximenes: A instrução pública deste município não atende às necessidades, mas conto como certo que, logo que a situação permita, o governo do Presidente Olegário Maciel não porá dúvida em restaurar o ensino nas escolas que aqui foram suprimidas. 9 ou como Joubert de Vasconcellos - prefeito de Luz - que ao se referir à insuficiência das escolas superlotadas, e à necessidade de sua ampliação, diz que:... nesse sentido já oficiei (esta solicitação) ao ilustre titular da pasta da Educação, Dr. Noraldino Lima, cuja dedicação e devotamento à causa do ensino são dignas de nossa admiração 10. Percebe-se também uma preocupação em mostrar os esforços que vinham sendo desenvolvidos pelas municipalidades no sentido de ampliar o atendimento à população, ou em explicar, quando a prefeitura mantém um número reduzido de escolas ou não as mantém, que isso ocorre por falta de recursos e ainda pelo fato de concorrer com 10% das rendas para o Fundo Escolar 11 Alguns entrevistados referem-se também à boa qualidade de suas escolas e à dedicação dos professores. Especificamente quanto à oferta de vagas para um atendimento satisfatório às necessidades da população em idade escolar, em 74 entrevistas apenas dois prefeitos afirmam que a instrução atende perfeitamente às necessidades do município, e ainda que a freqüência escolar é mesmo mais que regular. Num segundo grupo - 32 depoimentos - incluem-se aqueles que não dizem claramente se as escolas atendem às necessidades de todas as crianças. Entre estes, um pequeno número refere-se à educação de forma bastante sucinta, como o prefeito de Entre Rios, que diz apenas que o município não custeia nenhuma escola de instrução pública; ou indica as condições daquele momento informando o número de escolas, o número de alunos, etc. Mesmo entre estes, pelos dados indicados é possível concluir que em alguns lugares a freqüência às escolas estava muito além do determinado pela legislação escolar. 9 ESTADO de Minas, 9.12.1931, p. 3. 10 ESTADO de Minas, 24.12.1931, p. 1. 11 Lei 989 de 20.09.1927 -- Essa lei determinava que esse fundo seria constituído, dentre outros impostos, por dez por cento (10%) sobre a arrecadação anual da receita dos municípios, deduzidos desta, para os efeitos da porcentagem, a quota destinada ao serviço da dívida municipal (art. 1º, b). Determinava ainda que ficaria ao exclusivo encargo do Estado o ensino primário público nos municípios (art. 5º).

942 Em um último grupo, em que se incluem 40 entrevistados, estes afirmam claramente que o ensino primário não corresponde às necessidades locais 12. Entre estes, está também o prefeito de Alfenas, que conclui o seu depoimento dizendo que As medidas econômicas de emergência do governo feriram fundamentalmente a instrução primária em nosso município, suprimindo-lhes todas as escolas rurais, inclusive duas em localidade com mais de duzentas crianças, na sua quase totalidade filhos de operários, sem condições de custear o ensino de seus filhos... 13. Assim, o quadro que emerge desses depoimentos é bastante diverso daquele apresentado pelo governo mineiro: infreqüência, deficiência de matrícula e falta de prédio escolar (nas entrevistas existe uma referência a um prédio construído pela prefeitura à espera da criação do grupo escolar, e escolas que funcionavam em prédios alugados pela prefeitura). Percebe-se, pois, que existia uma demanda pela educação na zona rural. A preocupação dos prefeitos em expandir as escolas em seus municípios e em divulgar as suas realizações parece indicar a importância da educação naquelas regiões. Sem dar uma explicação aos leitores, em julho de 1932, o jornal Estado de Minas cessa a publicação da pesquisa feita junto aos prefeitos das cidades do interior, e que incluía questões sobre a educação. É possível que as reivindicações feitas diretamente ao secretário tenham continuado, pois no dia 28 de dezembro de 1932 foi publicado o Decreto 10.641, que parece ser uma resposta às solicitações dos prefeitos e que possibilitaria a expansão das oportunidades educacionais. A partir daí, 50% da contribuição dos municípios para o Fundo Escolar passa a ser destinada à manutenção das escolas rurais, urbanas, diurnas e noturnas, isoladas ou reunidas (art. 4º). Além disso o secretário da Educação ficava autorizado a restaurar o ensino em quaisquer das escolas suspensas e sempre que houver a competente proposta do prefeito do município em que forem situadas (art. 5º, grifo nosso). Note-se que o secretário, além de ter autonomia, tinha poder de decisão e a verba do Fundo Escolar, gerido por ele próprio. Assim, a decisão sobre a abertura de escolas dependia do secretário, da existência de verbas, da solicitação dos prefeitos, o que era uma forma de valorizar as administrações locais, viabilizando uma troca de favores entre o secretário e os chefes locais. Essas mudanças na legislação indicam que mesmo num momento de dificuldades financeiras o governo estava atento às reivindicações que pudessem trazer um retorno político. A partir de janeiro de 1933, algumas escolas são restauradas ou criadas. De um total de setenta e cinco cidades que tiveram seus prefeitos entrevistados, vinte e seis tiveram escolas criadas ou restauradas e quatro transferidas, no primeiro semestre daquele ano. Este número torna-se mais expressivo quando consideramos que 134 escolas foram fechadas nesse mesmo ano. Em 1934, o governo do Estado restitui aos municípios a contribuição a que estavam obrigados, e que deveria ser aplicada no ensino rural. (Decreto 11.297 de 10.04.1934). Assim, quando houvesse solicitação dos prefeitos, as escolas seriam restauradas pelo secretário e mantidas com as verbas dos próprios municípios que ficariam desobrigados de contribuir para o fundo escolar. Os professores seriam contratados ou dispensados pelo próprio secretário. A partir daí, no mês de maio, as escolas voltaram a crescer. Isso significa que quando o governo estadual precisou de apoio político dos municípios houve uma troca de favores : os prefeitos solicitavam ao secretário a abertura de escolas e este por sua vez atendia aos pedidos. As escolas eram mantidas pelos recursos devolvidos aos municípios. Em troca, os prefeitos apoiavam o governo estadual, que obtinha o apoio político de que necessitava. 12 PREFEITO de Piranga, Miguel Baptista. Estado de Minas, 31.12.1931, p. 3. 13 PREFEITO de Alfenas, Ismael Brasil. Estado de Minas, 5.12.1931, p. 3.

Com o desenvolvimento do estudo ficou claro que a oferta de escolas atendia os interesses dos prefeitos e era uma forma de conquistar eleitores. Os momentos de crescimento da rede de escolas públicas coincidiam com os momentos politicamente importantes, reafirmando a relação entre clientelismo e educação em Minas Gerais. 943

944 BIBLIOGRAFIA Fontes Documentais COLEÇÃO das Leis e Decretos do Estado de Minas Gerais 1927-1934. Imprensa Oficial. JORNAL Estado de Minas 1931-1935. JORNAL Folha de Minas 1934-1935. JORNAL Minas Gerais 1931-1935. Obras De Referência BOMENY, Helena Maria Bousquet. A Estratégia da conciliação: Minas Gerais e a abertura política dos anos 30. In: GOMES, Angela Maria de Castro (Org.). Regionalismo e Centralização Política: Partidos e Constituinte nos anos 30. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980. p. 135-235. (Brasil, Século 20). CHAGAS, Paulo Pinheiro. Depoimento de um Contemporâneo da Revolução de 30 em Minas. Seminário de Estudos Mineiros 6. Belo Horizonte: UFMG/PROED, p.83-114, 1987. 228p. (Séries não periódicas; 2). DINIZ, Clélio Campolina. Estado e capital estrangeiro na industrialização mineira. Belo Horizonte, Imprensa Oficial: UFMG, 1981. 260p. DULCI, Otávio Soares. Minas Gerais: Continuidade e Mudança. Revista de Cultura Política, São Paulo, n.7, p. 75-92, 1982. GOMES, Ângela Maria de Castro. Confronto e Compromisso no Processo de Constitucionalização (1930-1935) In: História Geral da Civilização Brasileira Tomo III O Brasil Republicano, 3 Volume Sociedade e Política (1930-1964), v. 10, São Paulo: Difel/Difusão, 1981. p. 7-76. 604p. MONTEIRO, Norma de Góes. A Revolução de 30: Vargas e sua Luta pela Hegemonia Política em Minas. Seminário de Estudos Mineiros 6. Belo Horizonte: UFMG/PROED, p.159-182. 1987. 228p. (Séries não periódicas; 2). PEIXOTO, Ana Maria Casasanta. Educação no Brasil: anos vinte. São Paulo: Loyola, 1983. 182p. (Coleção Educ-Ação). SILVA, Vera Alice Cardoso. O significado da participação dos mineiros na política nacional, durante a primeira República. Seminário de Estudos Mineiros 5. Belo Horizonte, 1982. p. 145-163. WIRTH, John D. O fiel da balança: Minas Gerais na Federação Brasileira. Tradução de Maria Carmelita Pádua Dias. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. 385p. (Coleção Estudos Brasileiros; v.15).