Exame de Prática Processual Penal 23 de Janeiro de 2009

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Transcrição:

No dia 6 de Maio de 2008, António, alegando urgente necessidade de auxiliar um seu irmão a fazer face a inesperadas despesas de saúde, convenceu Maria, com quem vivia em situação análoga à dos cônjuges, a entregar-lhe a quantia de 4.500,00 (quatro mil e quinhentos euros) Em 2 de Julho de 2008, ao conferir o extracto do cartão de crédito de António, Maria verificou que os 4.500,00 haviam servido para aquele pagar as despesas ocasionadas por um fim de semana que, juntamente com uma amiga, Berta, tinha gozado numa luxuosa instância turística entre os dias 1e 6 de Fevereiro de 2008. Em 25 de Julho de 2008 Maria, por intermédio de Advogado, apresentou nos serviços do M.P. queixa contra António nela referindo, entre o mais e embora por lapso, que a quantia entregue fora a de 45.000,00 (quarenta e cinco mil euros) e manifestando desde logo a intenção de se constituir assistente o que veio a fazer em 3 de Setembro de 2008. Aberto o inquérito António foi notificado para comparecer nos serviços do M.P. a fim de ser constituído Arguido e sujeito a interrogatório. Dado que António não compareceu na data indicada o M.P. ordenou a respectiva detenção, que ocorreu em 15 de Setembro, tendo António sido presente ao Magistrado do M.P. que o constituiu como Arguido e o inquiriu de imediato. António prescindiu da presença de defensor e, após ter corrigido o montante indicado na queixa, confessou os factos mas recusou a entrega do extracto do cartão de crédito. No dia seguinte o M.P. ordenou uma busca ao escritório onde António desenvolvia a sua profissão de vidente, que foi efectuada pela P.S.P. em 17 de Outubro, e durante a qual foi apreendido o dito extracto. Findo o inquérito, no qual para além de António foi também ouvida Berta, o M.P. deduziu acusação contra António imputando-lhe a prática de um crime de Burla p. e p. pelo art. 217º, nº1 do C. Penal. Maria, e o seu Advogado, foram notificados desta acusação por cartas enviadas em 15 de Dezembro de 2008 tendo deduzido acusação, por mera adesão à apresentada pelo M.P., bem como formulado PIC no último dia do respectivo prazo. António foi notificado da acusação por carta depositada na sua caixa do correio em 17 de Dezembro de 2008 e entrou em contacto com o defensor que lhe fora nomeado tendo sido decidido não requerer a abertura de Instrução.

Grupo I Considerando exclusivamente os dados do enunciado, e sem esquecer a fundamentação legal, responda às seguintes questões: 1. Aprecie a legalidade/oportunidade da constituição de assistente da Maria. (2 valores) 2. Aprecie a validade da detenção de António e das respectivas declarações. (5 valores) 3. Aprecie a validade/legalidade da prova resultante da busca efectuada ao escritório de António (3 valores) 4. Em que dia foi apresentada a acusação e PIC de Maria. (4 valores) Grupo II Suponha agora que no dia do julgamento o defensor nomeado faltou. Imagine que, encontrando-se de escala, foi nomeado defensor do Arguido, tendo o juiz concedido, a requerimento seu, tempo para conferenciar com o arguido e preparar a defesa. Decorridos 30 minutos, dirigiu-se ao juiz dizendo estar pronto para o julgamento. Elabore o requerimento que ditaria para a acta no inicio do julgamento, de modo a evitar a sua realização. (6 valores)

Grelha de Correcção Grupo I 1 Os factos cuja prática Maria imputa a António configuram a prática de crime de burla simples que, atenta a qualidade do agente (vive com a ofendida em situação análoga à dos cônjuges) tem a natureza de crime particular Pelo que a constituição como assistente é obrigatória e tem lugar no prazo de 10 dias, prazo este que no caso foi respeitado já que, sendo um prazo para a prática de acto processual, a respectiva contagem se interrompe durante as férias judiciais que decorreram durante o mês de Agosto. Maria, que é ofendida, tem legitimidade para se constituir como assistente e está devidamente representada por Advogado Arts. 217º/1/4 e 207º do C.P. e 50/1, 68/1/a/2, 70, 103/1, 104/1 do CPP, 144/1 do CPC e 12 da LOFTJ 2 2 Os factos participados ao MP configuram a prática de um crime de burla qualificada ao qual, em abstracto, é aplicável a medida de coacção de prisão preventiva. A falta de António permite concluir que existem fundadas razões para considerar que aquele se não apresentará espontaneamente perante a autoridade judiciária no prazo que lhe fosse fixado. Assim a detenção fora de flagrante delito por mandado do MP é legal. António quando presta declarações está detido pelo que era obrigatória a presença do seu defensor cuja falta gera uma nulidade insanável tornando assim nulo o interrogatório bem como as declarações que dali resultaram que não poderão ser usadas como prova Arts. 218/2/a do CP, 202/1/a, 257/1, 64/1/a, 143, 119/c e 122 do CPP 5 3 Perante os indícios existentes o MP podia ordenar a busca ao escritório de António. Este despacho foi proferido em 16 de Setembro (o dia seguinte ao do interrogatório) e tem um prazo máximo de validade de trinta dias mas só foi cumprido em 17 de Outubro (31 dias depois) pelo que

A) a busca e a apreensão estão feridas de nulidade dependente de arguição que, se declarada, impede a utilização como prova do documento apreendido Arts. 174/2/3/4, 178, 120/3/c, 122 do CPP; OU B) a busca e a apreensão estarão feridas de nulidade por terem sido realizadas sem o consentimento do titular e fora das condições previstas na lei, constituindo o seu resultado prova proibida e não podendo ser utilizada Arts. 174/2/3/4, 178, 118/3, 126/3, 122 do CPP 3 4 Assistente e advogado notificados por via postal registada em 15/12/2008; Presumem-se notificados em 18/12 Prazo 10 dias Primeiro dia do prazo 19/12 Férias de Natal de 22/12 a 03/01 Último dia do prazo 10/01(Sábado) passa para 12/01 (Segunda feira) Com multa 13/14/15 Arts. 113º/1/b/2, 103/1, 104º/1, do CPP, 279/b do CC, 144/1/2 do CPC, 107/5 do CPP e 145/5 do CPC 4 Grupo II Nos presentes autos o arguido vem acusado pelo Ministério Público, acompanhado da Assistente, da autoria de um crime de burla, simples, previsto e punido pelo art. 217º, nº 1 do Código Penal. Ora, de acordo com a matéria de facto constante da acusação o Arguido, alegando urgente necessidade de auxiliar um seu irmão a fazer face a inesperadas despesas de saúde, convenceu a assistente com quem vivia em situação análoga à dos cônjuges, a entregar-lhe a quantia de 4.500,00 que utilizou para pagar as despesas ocasionadas por um fim de semana que gozou numa instância turística entre os dias 1 e 6 de Fevereiro de 2008. Estes factos configuram a prática de crime de burla simples que, atenta a qualidade do agente (vive com a ofendida em situação análoga à dos cônjuges) se enquadra na previsão legal dos arts. 217º, nºs 1 e 4 do CP, sendo-lhe assim aplicável o disposto no art. 207º, al.a) do mesmo código pelo que o crime em causa depende de acusação particular não podendo o Ministério Público, por falta de legitimidade e sob pena de nulidade insanável, deduzir acusação sem que, previamente, o

assistente, por sua vez, a tenha deduzido. Ora, tendo o MP deduzido acusação sem que previamente a assistente o tivesse feito verifica-se, face ao disposto nos arts. 48º, 50º, nº 1 e 2, uma situação geradora da nulidade insanável tipificada pelo art. 119º, al. b) do CPP, que aqui expressamente se argui e que nesta fase do procedimento pode, e deve, ser declarada, e, por via disso, ser a acusação declarada inválida e de nenhum efeito bem como serem igualmente invalidados todos os actos a ela subsequentes. Assim requer a V. Exa., nos termos do disposto nos arts. 48º, 50º, nº1, 119º, al. b) e 122, nºs 1 e 2, todos do CPP, se digne declarar a nulidade insanável e determinar a invalidade da acusação do MP bem como a invalidade de todos os actos a esta subsequentes. 6 Notas: I Na resposta à questão 3 será admitida qualquer uma das duas posições referidas, desde que devidamente justificada;