Sistemas de Geração e Distribuição de Água Purificada na Indústria Farmacêutica



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Transcrição:

Gestão Circular para Sistemas de Geração e Distribuição de Água Purificada na Indústria Farmacêutica Kátia Anunciata dos Santos e Eli Alves da Cruz Introdução Na ótica da engenharia ambiental, o conceito de qualidade da água é muito amplo. Isto por que devido às suas propriedades de solvente e à sua capacidade de transportar partículas, a água incorpora diversas impurezas, as quais definem sua qualidade (Sperling, 1996). A terra poderia ser chamada de planeta-água. As águas superficiais ocupam 71% do planeta, o potencial hídrico subterrâneo é 100 vezes maior que o potencial das águas superficiais. As águas subterrâneas têm maior pureza e representam uma reserva permanente. Entre as reservas subterrâneas mais vastas encontra-se o Aqüífero Guarani, que está localizado em rochas da Bacia Sedimentar do Paraná e ocupa uma área de mais de 1,2 milhões de km 2. Este aqüífero pode conter mais de 40 mil quilômetros cúbicos de água, o que é superior a toda a água contida nos rios e lagos de todo o planeta. O Brasil tem, provavelmente, as maiores reservas de água do mundo. Estas reservas estão distribuídas em todo o território nacional. Água potável O conceito de qualidade da água encontra-se relacionado à utilização e às características apresentadas pela água, por sua vez determinadas pelas substâncias nela presentes. O padrão de potabilidade da água é composto por um conjunto de características (parâmetros) que lhe confere qualidade para o consumo humano. No Brasil, o Ministério da Saúde, em consonância às ações de vigilância sanitária, estabeleceu um padrão para a potabilidade da água, regulamentado pela Portaria MS nº 518/2004. 34 Fármacos & Medicamentos 50 - Janeiro/Fevereiro de 2008

Água purificada nas indústrias farmacêutica, cosmética e afins Na indústria farmacêutica a água purificada pode ser considerada uma das mais importantes matérias-primas, pois está envolvida diretamente na produção da grande maioria dos produtos e também de outros processos industriais como, por exemplo, limpeza e esterilizações em forma de vapor. Além disso pode ser utilizada também em testes laboratoriais com finalidades diversas. A qualidade da água purificada depende de uma série de fatores como o tipo de sistema de tratamento utilizado, a freqüência de manutenção e limpeza do mesmo, bem como os procedimentos de armazenamento e distribuição da água purificada produzida. Esses procedimentos podem afetar suas características e comprometer a qualidade do produto final. Sendo assim, para garantir a qualidade da água purificada, é necessária uma apropriada seleção, instalação, operação e, por fim, validação dos processos de purificação da água, bem como dos sistemas de armazenagem e distribuição. A água purificada deve ser obtida a partir da água potável e tratada em um sistema que assegure a obtenção de uma água de acordo com as especificações farmacopeicas. Referências e padrões de água purificada (PW) e água para injetáveis (WFI) podem ser encontrados em várias publicações. Entre elas as mais utilizadas são: Farmacopéia Americana - USP; Farmacopéia Européia - EP; Farmacopéia Japonesa - JP; Farmacopéia Brasileira. Geração de água purificada A geração de água purificada compreende uma série de etapas. Algumas estão descritas a seguir. Pré-Tratamento Um pré-tratamento bem projetado aumenta a confiabilidade e a vida útil do sistema de tratamento final. Resultados de analises físico-químicas e microbiológicas da água de alimentação do sistema devem ser levadas em consideração como base para o projeto do pré-tratamento. É fundamental que se tenha uma quantidade de resultados representativos da água de alimentação do sistema frente à sazonalidade (variação de qualidade de água nas diferentes estações do ano), evitando-se, desta maneira, problemas de subdimensionamento ou superdimensionamento do pré-tratamento, o que poderia acarretar vários problemas nos equipamentos finais para geração de água purificada. Basicamente, existem alguns equipamentos que fazem parte da maioria dos sistemas de pré-tratamento, sendo o dimensionamento o fator de diferenciação e de impacto fundamental na qualidade da água purificada gerada. A seguir uma descrição desses equipamentos. A performance de cada um deles deverá ser avaliada durante a validação do sistema para garantir que o mesmo produza água consistentemente de acordo com os padrões definidos. Filtro multimedia Este processo consiste em passar a água através de um tanque cilíndrico (vertical) que pode ser de fibra de vidro, aço carbono ou aço inoxidável com diferentes meios filtrantes, tais como seixos rolados, antracita, quartzo, entre outros. Este processo é o primeiro passo para obtenção da água purificada e caracteriza-se pela remoção mecânica das partículas de até 15µm em suspensão. Esse equipamento tem como característica principal um baixo custo operacional e de manutenção. Vários contaminantes podem estar presentes na água de alimentação como, por exemplo, íons cálcio, magnésio e ferro. Esse último, muitas vezes, pode ser de difícil remoção e pode causar danos importantes no sistema de geração (oxidação de resinas de troca iônica e membranas de osmose, se não for adequadamente removido no pré-tratamento). Presença de ferro na água O ferro é amplamente encontrado na natureza, surgindo habitualmente em águas subterrâneas sob a forma de bicarbonato ou de sulfito. Levando-se em consideração a posição geográfica e a geologia do solo podemos encontrar o ferro na água sob as mais variadas formas: 2+ Forma ferrosa, Fe, também chamada de ferro dissolvido/ferro solúvel; 3+ Forma férrica, Fe, ferro oxidado (sob forma de óxido ou hidróxido) ou ferro precipitado/ ferro insolúvel; Ferro na forma orgânica, que Fármacos & Medicamentos 50 - Janeiro/Fevereiro de 2008 35

Gestão pode estar associado a compostos orgânicos como os ácidos húmicos - estão ligados à contaminação por Iron bacteria (ferrobactérias); Ferro coloidal. Métodos para remoção de ferro Existem várias opções que podem ser utilizadas separadamente ou em conjunto, para reduzir ou remover o ferro. Dependendo das condições de aplicação, os métodos existentes podem ser distribuídos pelos seguintes grupos: Troca iônica; Arejamento seguido de filtração; Oxidação química seguida de filtração; Oxidação catalítica/filtração. Troca Iônica A resina catiônica forte (em ciclo sódio) habitualmente utilizada nos abrandadores pode também remover ferro e manganês quando presentes sob a forma iônica (dissolvida). No entanto, só se deve utilizar este método se as concentrações presentes forem reduzidas, tendo sempre o cuidado de eliminar qualquer contato com o ar (para evitar formação de precipitados). O sistema deve ser regenerado antes que atinja a exaustão da capacidade de troca iônica do leito de resinas. Existem dados de fabricantes que colocam o limite em 5ppm de ferro dissolvido (ou de ferro mais manganês). Arejamento seguido de filtração O arejamento é um processo físico que permite o contato da água com o ar, provocando a precipitação do ferro e do manganês dissolvidos (ou, no caso do sulfito de hidrogênio, a libertação de gases). É o método mais econômico para tratar grandes volumes de água, sendo, normalmente, seguido de filtração. Oxidação química seguida de filtração A oxidação do ferro e/ou manganês dissolvidos pode ser realizada por meio da injeção de agentes oxidantes como, por exemplo, o hipoclorito de sódio. Normalmente, os produtos são injetados na linha por meio de uma bomba dosadora, sendo a solução posteriormente conduzida para um depósito de retenção ou de contato. O tempo de permanência requerido neste ponto é cerca de 20 minutos (para o ferro ou manganês), após o que a água deverá ser filtrada em filtro multimedia. Oxidação catalítica/filtração Zeólitos Normalmente designadas de manganese greensands, algumas das formas de zeólitos de sílica gel e resina catiônica poliestirenica podem ser utilizadas como meios para filtros de oxidação catalítica. Este tipo de meio é regenerado com sulfato de manganês ou permanganato de potássio. Dióxido de manganês São meios que funcionam por oxidação catalítica, mas não são 36 Fármacos & Medicamentos 50 - Janeiro/Fevereiro de 2008

regeneráveis como os zeólitos. A concentração mínima de oxigênio dissolvido para estas aplicações é de cerca de 15% do valor do ferro total dissolvido. De um modo geral este tipo de meio é sensível ao valor de ph que deverá situar-se próximo da neutralidade ou na zona levemente alcalina. Para remoção de ferro, o ph ideal é aproximadamente 7,5, sendo preferível, no caso do manganês, que seja 8,5. No dimensionamento deste tipo de equipamento deverão sempre ser respeitadas as recomendações dos fabricantes como, por exemplo, altura do leito suporte e do leito filtrante e expansão deixada no filtro para uma performance adequada. Filtro de carvão ativado Utilizado para eliminação de cloro por meio da formação de óxidos, o carvão ativado também tem a característica de remover matéria orgânica em seus sítios, através da adsorção, o que gera uma potencialidade para o aparecimento de contaminação microbiológica nesse equipamento. Dessa forma, cuidados devem ser tomados na utilização desse equipamento, sendo que devem ser definidos procedimentos de sanitização (vapor limpo, de preferência), que possam garantir controle da contaminação microbiológica em seu leito. Dosagem de metabissulfito Alternativamente à utilização de filtro de carvão, a filtração com metabissulfito tem sido utilizada em projetos de sistemas de água purificada. Podem também ser utilizados bissulfito e sulfito de sódio. A remoção ocorre por meio de uma reação rápida de redução do cloro presente em solução: Na HSO + Cl + H O Na HSO + 2HCL 2 3 2 2 2 4 Na SO + Cl + H O Na HSO + 2HCL 2 3 2 2 2 4 O sistema de dosagem normalmente consiste em utilização de tanque de estocagem da solução, bomba de dosagem e ponto de injeção. Abrandador São equipamentos utilizados para redução dos teores de cálcio e/ou magnésio. Esse tipo de água é chamado de dura. Um processo parcial de troca iônica, denominado de abrandamento, é obtido, quando a água bruta (potável) passa em um leito de resina catiônica forte, no ciclo sódio. Os íons cálcio e magnésio, Ca 2+ e Mg 2+, solúveis na água, são retidos no grupamento do ácido sulfônico e os íons sódio, Na +, da resina, liberados para a água. Este processo retira somente os sais formadores de dureza da água bruta (potável) e tem largo emprego industrial. Quando todos os íons sódio presos ao grupamento do ácido sulfônico foram trocados por cálcio e magnésio, a resina se encontra no estado saturado e necessita, então, ser regenerada. O ciclo completo de regeneração das resinas do abrandamento compreende quatro estágios: Exaustão: saturação da resina com íons cálcio e magnésio; Expansão: contra-lavagem do leito saturado da resina, expandindo-a até a parte superior do vaso. A finalidade da expansão ou contra-lavagem é soltar as impurezas sólidas presas aos cristais, que funcionam como um filtro, oriundas da água na fase de exaustão, expelindo-as junto ao efluente. Além disso, ela reclassifica o leito da resina, removendo finos por ventura existentes, descompactando-o para evitar a formação de canais preferenciais e perda de carga; 2+ Regeneração: é a rejeição dos íons Ca e Mg 2+ captados da água, por meio da passagem de uma solução de salmoura a 10% no leito da resina quando, então, os íons sódio voltam a se prender ao grupamento do ácido sulfônico; Enxágüe: o enxágüe lento, executado inicialmente, completa a regeneração da resina e o enxágüe rápido final remove todo o excesso da salmoura regenerante do leito. Fármacos & Medicamentos 50 - Janeiro/Fevereiro de 2008 37

Gestão Geração Troca Iônica (desmineralização/ deionização) A troca iônica consiste na remoção de cátions e ânions dissolvidos na água. A resina catiônica forte, no ciclo hidrogênio, é utilizada para remover todos os cátions da água tais como cálcio, magnésio e sódio, liberando hidrogênio ácido, que se combina com os ânions ligados aos cátions removidos. Em seguida a água é passada em resina aniônica, fracamente básica, ou em resina aniônica, fortemente básica. Durante muitos anos a troca iônica foi utilizada como técnica de escolha para a obtenção de água purificada (que, anteriormente, também era chamada de desmineralizada) pelo fato de ser efetiva na remoção de íons, de instalação relativamente simples, regenerável e de baixo investimento. Com o desenvolvimento das técnicas de osmose reversa e o lançamento de equipamentos mais modernos, que proporcionam maior controle da qualidade da água purificada produzida, tanto do ponto de vista físico-químico quanto microbiológico, essa técnica perdeu um pouco de mercado, apesar de ainda ser utilizada, sem demérito algum, em muitas plantas. Osmose reversa A osmose é um fenômeno encontrado na natureza, que consiste na difusão, através de uma membrana semipermeável, entre duas soluções de concentrações salinas diferentes. Membranas deste tipo são tecidos que permitem a difusão preferencial da água e retêm sais minerais nela dissolvidos, assim como colóides e bactérias. Esta difusão mostra que os sistemas não estão em equilíbrio, porquanto, há uma diferença de pressão entre os líquidos nos dois compartimentos. A passagem da água pura através da membrana semipermeável provocará um aumento no volume da água salinizada, com a formação de uma coluna de água. Este efeito físico decorre da pressão exercida sobre a membrana, no lado da água salinizada. Esta pressão hidrostática de equilíbrio é denomina- 38 Fármacos & Medicamentos 50 - Janeiro/Fevereiro de 2008

da pressão osmótica da solução salina em questão. Pode ocorrer outro processo chamado osmose reversa, obtido por meio da aplicação mecânica de uma pressão superior à pressão osmótica do lado da solução mais concentrada. Assim, a água pura pode ser retirada de uma solução salina por meio de uma membrana semipermeável, contanto que a solução em questão se encontre a uma pressão superior à pressão osmótica relativa a sua concentração salina. Na prática, isso é obtido pressionando-se a solução por meio de uma bomba e passando esta solução sob alta pressão por um vaso de pressão, em que está contida a membrana de osmose reversa. A tecnologia de osmose reversa, utilizada desde a década de 60, teve seu mecanismo integrado para a produção de água ultrapura, a partir da década de 70. As membranas de osmose reversa atuam como uma barreira a todos os tipos de sais e microorganismos com peso molecular acima de 100. Elas são compostas, basicamente, de poliamida e polisulfona microporosa, enroladas em forma de espiral e revestidas, geralmente, de resina ou fibra de vidro. A água é pressurizada através desta membrana, conseguindo dois fluxos distintos de água ao final dela: um fluxo de água tratada chamado permeado e um fluxo de água salobra denominado rejeito. Para que um sistema de osmose reversa produza consistentemente água purificada, de acordo com as especificações, a água de alimentação deve ter algumas características, entre elas: Silt Density Index (SDI) < 5; Turbidez < 1NTU; Ferro < 0,05ppm; Dureza < 0,1ppm. Eletrodeionização Técnica utilizada atualmente em conjunto com osmose reversa para obtenção de água purificada. É uma combinação de membranas seletivas, resinas de troca iônica e potencial elétrico. A eletrodeionização tem a capacidade de remover substâncias fracamente ionizáveis e outros contaminantes não removidos pela osmose reversa de forma contínua, pois não necessita de paradas para regeneração (auto-regenerada eletricamente), reduzindo também o uso de produtos químicos e resíduos. Para que o sistema de eletrodeionização tenha um bom funcionamento, alguns padrões na água de alimentação devem ser estritamente seguidos: TDS (sólidos totais dissolvidos) < 5mg/L; Condutividade a 25ºC < 10mS/ cm; ph entre 4 e 10; Sílica < 1mg/L (considerada extremamente crítica para a operação de equipamentos de eletrodeionização, podendo ocasionar perda dos módulos). Distribuição e armazenamento A água purificada gerada deve ser armazenada e mantida sob recirculação até sua utilização. Para que as características de qualidade, principalmente do ponto de vista microbiológico, sejam mantidas até a utilização, vários cuidados devem ser tomados no projeto e dimensionamento do sistema de distribuição e armazenamento: Utilização de tanques dedicados e lacrados, construídos em material inerte (aço inoxidável 316L eletropolido no mínimo até 0,5 Ra) certificado, dotado de filtro respiro 0,22mm, spray balls, válvula de segurança etc.; Tubulação e bomba de recirculação construídas em material inerte (aço inoxidável 316L eletropolido no mínimo até 0,5 Ra certificado, instalação da tubulação em looping (dead ends são inaceitáveis para padrões USP), dimensionadas para proporcionar fluxo turbulento, velocidade > 2,5ft/sec, drenabilidade total, manutenção de fluxo mesmo durante abertura de válvulas (simultaneidade) etc.; Válvulas de utilização sanitária, do tipo diagrama zero dead legs; Documentação adequada de todos os processos de soldagem realizados, incluindo inspeções/ videoscopia; Isométricos de tubulação, certificados rastreados de materiais de construção etc. Toda documentação deve ser adequadamente arquivada e checada durante a qualificação do sistema. Qualificação/validação Os seguintes requisitos para a validação de um sistema de água devem considerados durante a fase de projetos: Estabelecimento de padrões para atributos de qualidade relativos ao tipo de água a ser utilizado (USP PW, por exemplo). No caso de indústrias que exportam para vários países, deve haver uma harmonização dos padrões necessários a cada região, utilizando-se os parâmetros mais críticos de cada referência, sendo que, no mínimo, deve ser atendida a regulamentação local; Características de qualidade da água de abastecimento (poço artesiano, abastecimento público etc.);

Gestão Definição dos sistemas e subsistemas adequados a produzir os desejados atributos de qualidade a partir da fonte de água disponível; Critérios de qualidade e performance para cada componente do sistema de tratamento; Seleção de equipamentos, controles e tecnologias de monitoramento; Custos de manutenção e operacionais. Análise de risco Para que a validação de um sistema de água purificada seja realizada, devem ser executadas previamente as qualificações de instalação, operação e performance do sistema, as quais devem estar embasadas em uma análise de risco de todo o sistema. Essa análise de risco deve avaliar todos os riscos relacionados a instrumentos, equipamentos, utilidades, hardware, software, documentação e procedimentos ligados ao sistema. Qualificação de Instalação (IQ) Verificação documentada de que o sistema está adequadamente instalado. A execução do protocolo deve demonstrar que os componentes do sistema e instalação geral foram executados de acordo com as especificações de projeto e desenhos e diagramas do fabricante. O protocolo de IQ pode ser constituído de um check-list que verifica, por exemplo, os itens a seguir. Equipamentos: Número de TAG; Número de serie/fabricação; Modelo; Tamanho e capacidade; Material de construção; Lista de peças sobressalentes. Instrumentos: Número de TAG; Número de série/fabricação; Modelo; Material de construção; Faixa de trabalho; Registros de calibração. Filtros: Descrição (elemento filtrante e carcaça); Número de série; Modelo; Tamanho; Material de construção; Resultados de testes de integridade. Tubulações e válvulas: Tipo; Soldas; Conexões ( tri clamps etc.); Acabamento interno e externo; Vedações (materiais e tipo); Registros e procedimentos de passivação e limpeza; Conexões com utilidades (tipo, fonte, fluxo e pressão). Deve ser executada também verificação documental: Manuais dos equipamentos, SOP; Especificações técnicas; Diagramas P&I de todos os sistemas e subsistemas; Diagramas elétricos; Certificados de testes de pressão/ hidrostático; Diagramas isométricos de tubulações com indicações de pontos de solda, inclinações; Documentação referente às soldas (EPS, qualificação do soldador, videoscopia de soldas etc.); Caderno de encargos (automação). Qualificação de Operação (OQ) A execução do protocolo de OQ deverá demonstrar que os componentes do sistema operam de acordo com as especificações de projeto. Os protocolos devem conter testes que incluem os seguintes quesitos: Deverá desafiar a operação de cada componente instalado; Verificação elétrica: entradas e saídas digitais e analógicas; Avaliação de parâmetros de controle críticos, seqüências programáveis/ciclos como, por exemplo, regeneração, enxágüe e sanitização de looping de recirculação; Características de qualidade (parâmetros como condutividade e TOC); Devem ser realizadas amostragens antes e depois de cada componente do sistema; Teste de instrumentos (operação, faixa e registros de calibração); Verificação de funcionamento de motores e bombas; Testes funcionais: parâmetros 40 Fármacos & Medicamentos 50 - Janeiro/Fevereiro de 2008

como temperatura, pressão, fluxos e diferenciais de pressão entre filtros; Dispositivos de segurança: verificação de operação; Verificação de intertravamentos; Procedimentos de operação, manutenção corretiva e preventiva, calibração, back up (no caso de sistemas ligados a softwares) etc. Qualificação de Performance (PQ)/ validação Após finalização das fases de IQ e OQ, o protocolo de PQ deve ser executado para verificação da qualidade da água produzida pelo sistema. Os seguintes pontos devem ser amostrados durante um período entre duas a seis semanas (amostragem inicial para liberação do sistema para produção): Água de alimentação (recomendado diariamente durante o período de validação); Diariamente após cada ponto do pré-tratamento para verificar performance de funcionamento do componente; Saída da geração (osmose reversa/ troca iônica/eletrodeionização): após cada fase; Tanque de estocagem (diariamente); Retorno do looping (diariamente); Em todos os pontos de uso diariamente, incluindo finais de semana. Após finalização da etapa de PQ sem nenhuma intercorrência não justificável, ou seja, com todos os resultados dentro das especificações, a água purificada pode ser liberada para uso e inicia-se a Validação do Sistema de água purificada. A validação do sistema de água purificada deve ser realizada durante um ano, em que serão avaliados os resultados microbiológicos e físicoquímicos da água purificada gerada nas diferentes estações do ano (avaliação do impacto da sazonalidade). Deve ser elaborado um plano de amostragem que contempla todos os pontos de uso, pré-tratamento e geração e deve definir a freqüência de amostragem de cada ponto de acordo com sua criticidade (impacto na qualidade do produto final e freqüência de utilização). Esse plano de amostragem deverá ser base para a elaboração do protocolo de validação do sistema de água purificada. Durante a validação do sistema devem ser realizadas todas as atividades de rotina do sistema, incluindo as manutenções preventivas, passivações e sanitizações, de acordo com os procedimentos descritos. Para que a validação seja considerada concluída devem estar disponíveis um ano de amostragem com resultados aceitáveis e todos os desvios encontrados, se devidamente investigados e resolvidos. Após a finalização da validação, vários cuidados devem ser tomados para manutenção do status validado do sistema, entre eles: Cumprimento do plano de manutenção preventiva e de calibração; Change control das modificações realizadas e avaliação do impacto nas diversas funcionalidades do sistema, por meio da orientação do pessoal técnico; Auto-inspeções do sistema de água purificada; Monitoramento dos resultados físico-químicos e microbiológicos e análise de tendências com estabelecimento de limites de alerta, as quais podem mostrar alguma descontinuidade no sistema, que pode ser tratado proativamente. Obviamente, todo esse controle deve estar embasado em um sistema de qualidade robusto, que garante que as atividades anteriormente descritas são realizadas de maneira adequada e na freqüência adequada. Kátia Anunciata dos Santos é farmacêutica-bioquímica graduada pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF-USP). Possui experiência de mais de dez anos em laboratórios como Stiefel e Boehringer Ingelheim, atuando nos departamentos de validação, garantia de qualidade, auditoria e produção. Atualmente é sócia da Duowasser Consultoria, Projetos e Qualificação, supervisora de validação da Allergan Produtos Farmacêuticos e docente nos cursos de pós-graduação em Gestão e Tecnologia Farmacêutica - Engenharia Farmacêutica, Gestão e Tecnologia Cosmética - Engenharia Cosmética e Formação de Auditores para a Cadeia Farmacêutica - Auditoria Farmacêutica do Instituto Racine. Eli Alves da Cruz é graduado em engenharia elétrica e pósgraduado em engenharia de segurança e medicina do trabalho pela Faculdade de Engenharia Industrial (FEI). Possui experiência em empresas do segmento de papel e celulose e indústria farmacêutica, com carreira desenvolvida na área de manutenção (elétrica/instrumentação) e utilidades, tendo participado da modernização do setor de utilidades bem como em projetos de máquinas de papel. Foi chefe de energias e manutenção geral na Boehringer Ingelheim do Brasil, onde coordenou todas as atividades de manutenção elétrica, instrumentação, mecânica, civil e utilidades, além de participar de projetos de automação visando aplicação de novas tecnologias e melhoria constante. Hoje é gerente de engenharia e projetos da Zodiac Produtos Farmacêuticos S/A. Docente dos cursos de pós-graduação em Gestão e Tecnologia Farmacêutica - Engenharia Farmacêutica, Gestão e Tecnologia Cosmética - Engenharia Cosmética e de outros cursos de extensão do Instituto Racine. Referências Bibliográficas (1) Collentro, VW. Pharmaceutical Water (System Design, Operation and Validation). Interpharm Press Inc., 1999; (2) FDA Guide to Inspection of High Pure Water Systems. (www.fda.gov/ora/inspect); (3) ISPE BASELINE. Pharmaceutical Engineering Guides. (www.ispe.org); (4) Artiss, DH. Materiais, superfícies e componentes para sistema WFI e outros sistema de tubulações sanitárias. Pharmaceuical tecnology, 1982; (5) Morellato, F. A influência do eletropolimento na limpeza e desinfecção de equipamentos nas indústrias de processo. (www.humma.com.br); (6) PDA. Technical Report n. 4. Design Concept for Water for Injection System. 1983; (7) Validation for Water Systems, FDA News and Information. Volume 2, número 35, Agosto, 2001. Fármacos & Medicamentos 50 - Janeiro/Fevereiro de 2008 41