Prevalência de trauma dental em crianças atendidas na Universidade Federal do Ceará

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Transcrição:

Artigo Original Sousa et al. Prevalência de trauma dental em crianças atendidas na Universidade Federal do Ceará Prevalence of dental trauma in children attending the Federal University of Ceará Resumo Objetivo: Avaliar a prevalência dos traumas dentários de crianças atendidas na disciplina de Odontopediatria da Universidade Federal do Ceará. Metodologia: Durante o período de janeiro de 2002 a dezembro de 2005, 312 pacientes apresentaram-se à clínica citada, totalizando 489 dentes traumatizados, sendo as informações contidas em suas fichas clínicas coletadas e submetidas à análise estatística. Resultados: A amostra foi constituída por 61,9% meninos e 38,1% meninas, numa proporção de 1,6:1. A maior freqüência de trauma ocorreu na primeira infância (33,7%), sendo a média da idade de 5,8±0,6 anos. A causa mais comum de trauma foi queda (63,5%) e a maioria (60,3%) das injúrias traumáticas ocorreram em casa. Os incisivos centrais superiores foram os dentes mais afetados (82,7%). Luxação intrusiva foi o tipo de trauma mais comum na dentição decídua (32,3%), e fratura coronária de esmalte e dentina sem exposição pulpar, na dentição permanente (46,7%). A maioria dos pacientes procurou atendimento 1-7 dias após a ocorrência do trauma (25,0%). Conclusão: Na dentição decídua as injúrias traumáticas por luxação foram mais prevalentes, e na dentição permanente, ocorreram mais fraturas coronárias nesta amostra. Palavras-chaves: Epidemiologia; traumatismos dentários; fraturas dos dentes Denise Lins de Sousa a José Jeová Siebra Moreira Neto d Juliana Oliveira Gondim b José Gomes Bezerra Filho c a Programa de Mestrado em Odontologia Clínica, Faculdade de Farmácia, Odontologia e Enfermagem, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil b Programa de Doutorado em Odontopediatria, Faculdade de Odontologia de Araraquara, UNESP, Araraquara, SP, Brasil c Departamento de Saúde Comunitária, Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil d Departamento de Clínica Odontológica, Faculdade de Farmácia, Odontologia e Enfermagem, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil Abstract Purpose: This cross-sectional study aimed to measure the prevalence of dental trauma in children treated at the Pediatric Dentistry Clinic of the Federal University of Ceara (UFC), Brazil, from January 2002 to December 2005. Methods: The sample consisted of 312 patients who presented a total of 489 injured teeth. The patients clinical records were retrieved and provided the information used for statistical analyses. Results: Subjects were 61.9% males and 38.1% females (ratio of 1.6:1), with mean age of 5.84±0.62 year-old. Trauma was more frequent during the first infancy (33.7%), and the most common etiological cause was falls (63.5%). Most trauma injuries (60.3%) occurred at home. The maxillary central incisors were the most affected teeth (82.7%). Intrusive luxation and coronary fracture of the enamel and dentin without pulp exposure were the most common type of trauma in primary (32.3%) and permanent (46.7%) dentition, respectively. Conclusion: In this sample, luxation injuries were the most prevalent type of dental trauma for primary dentition, while more coronary fractures prevailed for permanent dentition. Key words: Epidemiology; tooth injuries, tooth fractures Correspondência: José Jeová Siebra Moreira Neto Rua Prof. José Arthur de Carvalho, 360, casa 12. Fortaleza, CE Brasil 60831-370 E-mail: jeova@ufc.br Recebido: 28 de abril, 2008 Aceito: 11 de setembro, 2008 Rev. odonto ciênc. 2008;23(4):355-359 355

Trauma dental em crianças Introdução O traumatismo buco-dentário é um sério problema de saúde que pode acarretar dor, perda de função, estética pobre e problemas psicológicos, tanto para a criança quanto para os seus pais. Segundo Andreasen e Andreasen (1), as injúrias traumáticas afetam principalmente crianças, sendo o seu pico de incidência dos 2 aos 4 anos e dos 8 aos 10 anos de idade, sendo a maior prevalência para o sexo masculino. Os traumas dentários envolvem uma variedade de fatores, sendo o conhecimento destes essencial para que se promova uma prevenção efetiva. O cirurgião-dentista deve estar atento aos fatores relacionados com os traumas, como a idade mais freqüente de ocorrência, como e onde ocorreu, os tipos mais comuns e os dentes mais afetados, a fim de que adote uma conduta terapêutica adequada nos casos de atendimento de emergência e para que possa orientar os pais e responsáveis sobre as providências a serem tomadas no momento do trauma, principalmente nos casos de avulsão (2). A procura imediata por tratamento especializado é fundamental para que se obtenha um diagnóstico precoce, sendo de suma importância para a elaboração de um plano de tratamento adequado e para um bom prognóstico. Observase, no entanto, que quando o trauma não está associado à dor, ao sangramento, ao deslocamento ou à perda dentária, há uma certa demora por procura a atendimento especializado, podendo favorecer o surgimento de complicações posteriores como necrose pulpar, obliteração do canal radicular, reabsorção radicular, perda óssea e até perda total do elemento dentário (3). Desse modo, estudos de prevalência dos casos de trauma favorecem o direcionamento de trabalhos de pesquisa, a elaboração de campanhas educativas e a conduta terapêutica adequada, no sentido de orientar a prevenção e a manipulação destas situações emergenciais. O objetivo deste trabalho foi realizar um estudo epidemiológico dos traumatismos dentários de crianças atendidas na clínica de Odontopediatria da Universidade Federal do Ceará (UFC) no período de janeiro de 2002 a dezembro de 2005. Metodologia Este trabalho trata-se de um estudo epidemiológico transversal observacional, caracterizado pela observação direta de uma amostra composta por uma demanda espontânea de pacientes traumatizados, que procuraram a clínica de Odontopediatria da UFC como unidade de referência durante o período de janeiro de 2002 a dezembro de 2005. Após aprovação do projeto pelo Comitê de Ética e Pesquisa da UFC, protocolo 185/03, iniciou-se a coleta de dados a partir das fichas clínicas dos pacientes, desde que estivessem devidamente preenchidas, e possuíssem, no mínimo, uma radiografia do caso e o consentimento livre e esclarecido dos pais ou responsáveis pela criança. As fichas continham informações sobre sexo, idade, onde, como e quando ocorreu o trauma, dente envolvido, tipo de trauma e tempo decorrido entre a incidência do trauma e a procura por atendimento. Essas fichas foram preenchidas por alunos da graduação, sob a orientação dos professores da disciplina de Odontopediatria, e avaliadas por um único examinador após devida calibração. A classificação da Organização Mundial de Saúde modificada por Andreasen e Andreasen (1) foi utilizada para determinar os tipos de traumas buco-dentários: fratura de esmalte; fratura de esmalte/dentina sem envolvimento pulpar; fratura de esmalte/dentina com envolvimento pulpar; fratura radicular; fratura corono-radicular, com ou sem envolvimento pulpar; concussão/subluxação; luxação intrusiva; luxação extrusiva; luxação lateral; avulsão. Os dados coletados foram submetidos à análise estatística descritiva, utilizando-se o programa Epi-Info versão 6.04. Uma análise descritiva das variáveis foi acompanhada por uma análise comparativa, buscando associação entre as variáveis através de testes estatísticos bivariados (teste de qui-quadrado, ao nível de significância de 0,05). Resultados Durante o período de estudo foram atendidos 312 pacientes com histórico de trauma, totalizando 489 dentes traumatizados. Destes pacientes, 193 (61,9%) eram meninos e 119 (38,1%), meninas, sendo a proporção de meninos para meninas de 1,6:1. A média de idade foi 5,8±0,6 anos. A maior freqüência de trauma ocorreu no grupo de 0-3 anos de idade (33,7%), seguido pelos grupos de 3-6 anos (19,9%) e 6-9 anos (20,2%) (Fig. 1). Embora a prevalência de trauma tenha sido maior para o sexo masculino, a sua ocorrência em relação ao gênero foi homogênea, não existindo preponderância estatisticamente significante do gênero sobre a idade (P>0,05). Número de pacientes 60 50 40 30 20 10 0 56 49 36 26 45 22 18 10 Idade (anos) 14 6 > 12 meninos meninas Fig. 1. Freqüência dos traumas de acordo com a idade e o gênero. 356 Rev. odonto ciênc. 2008;23(4):355-359

Sousa et al. A principal etiologia das injúrias traumáticas foi queda, seguida por colisão, atividades esportivas, violência e outras (Tabela 1). As causas mais freqüentes de trauma foram queda (44%) e colisão (17%) na faixa etária de 0-3 anos; colisão (27%) e queda (20%) entre 3-6 anos; atividades esportivas (35%) e colisão (25%) entre 6 e 9 anos; violência (43%) e atividades esportivas (13%) entre 9 e 12 anos; e violência (29%) e colisão (16%) acima de 12 anos. Observou-se uma diferença estatisticamente significante da idade em relação à etiologia (P< 0,05), havendo uma prevalência da ocorrência de queda durante a primeira infância. Com relação ao gênero, evidenciou-se uma tendência de meninas sofrerem mais trauma por razão de queda enquanto que os meninos traumatizam-se mais devido a outros fatores; contudo, esta relação entre gênero e etiologia não foi estatisticamente significante (P>0,05). A maioria dos traumas ocorreu em casa, na rua e na escola (Tabela 1). Na faixa etária de 0-3 anos, os traumas ocorreram mais comumente em casa (44,7%), e de 6-9 anos, na escola (41,2%). Esta diferença foi estatisticamente significante (P<0,05), demonstrando que existe um aumento da ocorrência de trauma fora de casa com o aumento da idade. Também se observou uma relação estatisticamente significante entre o gênero e o local da ocorrência do trauma (P<0,05), evidenciando que existe uma prevalência de meninas acidentarem-se mais em casa, e meninos, na rua e na escola. Tabela 1. Distribuição das injúrias traumáticas de acordo com a etiologia e o local de ocorrência. Etiologia Variável Queda 198 (63,5) Colisão 52 (16,7) Atividades esportivas 37 (11,9) Violência 7 (2,2) Outros 18 (5,8) Local de ocorrência Casa 188 (60,3) Rua 51 (16,3) Colégio 34 (10,9) Outros 39 (12,5) Dos 489 dentes afetados, 294 (60,1%) eram decíduos e 195 (39,9%), permanentes. A maxila foi envolvida em 94,1% dos casos (94,3% na dentição decídua e 93,7% na permanente). Tanto na dentição decídua quanto na permanente, os dentes mais atingidos foram os incisivos centrais superiores (81,7% e 84,0%, respectivamente), seguido pelos incisivos laterais superiores (11,9% e 9,7%, respectivamente). O tipo de trauma que ocorreu com maior freqüência na dentição decídua foi injúria por luxação (68,3%), e na dentição permanente, fratura coronária (62,1%) (Tabela 2). Observouse uma relação estatisticamente significante entre o tipo de trauma e a dentição envolvida (P<0,05). Tabela 2. Freqüência dos tipos de trauma nas dentições decídua e permanente. Diagnóstico clínico Fratura coronária somente de esmalte Fratura coronária de esmalte e dentina sem envolvimento pulpar Fratura coronária de esmalte e dentina com envolvimento pulpar O tempo decorrido entre o trauma e a procura por atendimento variou da seguinte forma: 0-24h (23,1%), 1-7 dias (25,0%), 1-4 semanas (16,3%), 1-6 meses (11,9%) e mais que seis meses (15,1%). O restante (8,7%) não soube determinar o período em que o trauma ocorreu. Discussão Dentição decídua Dentição permanente Total 13 (4,4) 10 (5,1) 23 (9,5) 15 (5,1) 91 (46,7) 106 (51,8) 8 (2,7) 20 (10,3) 28 (13,0) Fratura radicular 1 (0,3) 3 (1,5) 4 (1,8) Fratura corono-radicular 16 (5,4) 8 (4,1) 24 (9,5) Concussão/ subluxação 48 (16,3) 22 (11,3) 70 (29,6) Intrusão 95 (32,3) 14 (7,2) 109 (39,5) Extrusão 16 (5,4) 4 (2,0) 20 (7,4) Luxação lateral 42 (14,3) 2 (1,0) 44 (15,3) Deslocamento total (avulsão) 40 (13,6) 21 (10,8) 61 (24,4) Este estudo demonstrou que meninos são mais freqüentemente afetados pelos traumas do que meninas numa proporção de 1,6:1. Este resultado é semelhante a outros estudos (1-6,8,11-19), sendo esta proporção similar à achada por Sandalli et al. (3) e Cardoso e de Carvalho Rocha (12). Segundo Caldas e Burgos (4) e Rajab (5), meninos são enérgicos e inclinados para atividades ao ar livre, possuindo uma vida social com trabalho e esportes mais perigosos, ao passo que meninas são mais maduras. Kargull et al. (6) afirmou que meninos são mais envolvidos em trauma por possuírem níveis mais elevados de epinefrina, dopamina e estresse emocional. O pico de incidência de trauma foi maior na primeira infância (0-3 anos), seguido pelo grupo de 6-9 anos; a partir dos 9 anos, observou-se uma diminuição na freqüência de trauma com o aumento da idade. Este resultado pode ser explicado devido ao fato do local de atendimento ser uma clínica de Odontopediatria que, apesar de realizar atendimento a pacientes adultos traumatizados, ainda não se tornou referência neste sentido. Observou-se também que o trauma acontece em todas as faixas etárias independente do gênero. Segundo Flores (7) e Sandalli et al. (3), quando a criança começa a andar, entre 18 e 30 meses, o risco da incidência de trauma aumenta duas vezes em relação a sua incidência nos demais grupos etários. Já outros autores encontraram uma maior prevalência de trauma entre 6-12 anos Rev. odonto ciênc. 2008;23(4):355-359 357

Trauma dental em crianças de idade (3,5,6,8-10). Segundo Andreasen e Andreasen (1), os traumatismos aumentam substancialmente com os primeiros esforços da criança para mover-se, devido à falta de experiência e coordenação motora, sendo o pico de incidência dos 2 aos 4 anos, seguido por um segundo pico dos 8 aos 10 anos de idade. Queda e colisão foram as causas mais freqüentes de trauma, estando este resultado de acordo com outros estudos (1,2,4,5,11,12). Embora a prevenção para estas causas seja muito difícil, outras etiologias, como quedas de bicicleta e acidentes esportivos, podem ser evitadas com o uso de capacetes e protetores bucais, devendo a utilização destes dispositivos ser estimulado entre a população (6). A maioria dos acidentes ocorreu em casa e na rua, estando em concordância com outros estudos (13,14). O conhecimento dos principais locais de ocorrência de trauma é de fundamental importância para que se desenvolvam programas de prevenção, visando minimizar o seu acontecimento. Neste estudo, observou-se que até a idade de 6 anos as injúrias traumáticas ocorreram mais comumente em casa, devendo-se, portanto, alertar os pais e responsáveis para esses achados a fim de orientá-los de como devem proceder quando da sua ocorrência. A maxila foi mais envolvida em trauma do que a mandíbula, corroborando estudos anteriores (1-6,8-18). Os incisivos centrais e laterais superiores foram os dentes mais afetados, respectivamente, tanto na dentição decídua quanto na permanente, sendo este achado semelhante à literatura (2,5,12,14,16). Segundo Şaroğlu e Sönmez (15) e Kargull et al. (6), os incisivos centrais superiores são os dentes mais afetados por trauma devido a sua posição vulnerável na arcada dentária e por estes dentes geralmente estarem protruídos e possuírem um selamento labial inadequado. Os dentes decíduos foram mais envolvidos em traumas do que os permanentes, estando este achado em contraste com Kargull et al. (6) e Sandalli et al. (3). Observou-se que na dentição decídua ocorreram mais injúrias por luxação enquanto que fraturas coronárias foram mais freqüentemente observadas na dentição permanente. Alguns autores afirmam que isto ocorre porque as estruturas de suporte (osso alveolar e ligamento periodontal) na dentição decídua são mais resilientes, favorecendo que ocorram mais deslocamentos do que fraturas (2,3,14-16), ao passo que os dentes permanentes estão mais firmemente aderidos no osso alveolar, sendo mais propensos a sofrerem fraturas (3). As injúrias por luxação mais freqüentes na dentição decídua foram intrusão e concussão/subluxação. Segundo Cardoso e de Carvalho Rocha (2), a concussão é provavelmente a injúria que ocorre com maior freqüência, contudo, é pouco relatada porque, como normalmente não se observa sangramento, ou se este está presente é insignificante, os pais acham que o trauma não é sério e relutam em levar seus filhos para tratar de uma injúria que aparentemente tem poucas conseqüências. Encontrou-se que a maioria dos pacientes procura atendimento entre 0-24 horas e 1-7 dias após o trauma. Segundo alguns autores (2,12,17), o tempo decorrido entre a ocorrência do trauma e a procura por cuidados profissionais está diretamente relacionado com o nível educacional dos pais e as informações que estes possuem à respeito dos serviços disponíveis. A urgência na procura por tratamento ocorre principalmente quando há o envolvimento dos dentes permanentes ântero-superiores, devido ao valor estético (12), nos casos de luxação, onde se observa deslocamento dentário, sangramento e interferência oclusal (17), e quando o trauma está associado à dor. Contudo, observa-se ultimamente uma maior busca por atendimento, mesmo quando há envolvimento apenas de dentes decíduos, refletindo numa mudança no comportamento dos pais e/ou responsáveis, que estão dando mais atenção a esta dentição. Vale ressaltar que o tratamento imediato dos traumas buco-dentários é essencial para que um bom prognóstico seja obtido. Conclusões Pôde-se observar que os traumatismos dentários ocorreram com maior freqüência em crianças entre 0-3 anos de idade, sendo as quedas da própria altura o principal fator etiológico. Em ambas as dentições, os incisivos centrais superiores foram os dentes mais atingidos, sendo as injúrias por luxação mais prevalentes na dentição decídua e as fraturas coronárias, na dentição permanente. Verificou-se uma baixa procura por tratamento imediato após o trauma, fazendo-se necessária a realização de campanhas educativas para prevenção e cuidados após os traumas dentários. Agradecimentos Este estudo foi financiado pelo CNPq. Referências 1. Andreasen JO, Andreasen FM. Texto e atlas colorido de traumatismo dental. 3.ed. Porto Alegre: Artmed; 2001. p.151-180. 2. Cardoso M, de Carvalho Rocha MJ. Traumatized primary teeth in children assisted at the Federal University of Santa Catarina, Brazil. Dent Traumatol 2002;18:129-33. 3. Sandalli N, Cildir S, Guler N. Clinical investigation of traumatic injuries in Yeditepe University, Turkey during the last 3 years. Dent Traumatol 2005; 21:188-94. 4. Caldas Jr AF, Burgos MEA. 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