Fauna de ixodídeos em carnívoros silvestres atropelados em rodovias de Santa Catarina: relato de caso

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Transcrição:

Fauna de ixodídeos em carnívoros silvestres atropelados em rodovias de Santa Catarina: relato de caso Rosiléia Marinho de Quadros Bruna L. Boaventura Wilian Veronezi Sandra Márcia Tietz Marques RESUMO O estudo de identificação da fauna de ectoparasitos é parte de um programa de monitoramento da fauna silvestre de quatro rodovias que passam pela região serrana do Estado de Santa Catarina, Brasil. No período de agosto de 2007 a abril de 2013 foram resgatados três Puma concolor, três Leopardus tigrinus, um Puma yagouaroundi, seis Procyon cancrivorus e cinco Cerdocyon thous, totalizando 18 carnívoros. Carrapatos ixodídeos foram registrados em todos os carnívoros, 87 espécimes de Amblyomma aureolatum parasitando P. concolor, P. yagouaroundi, C. thous e P. cancrivorus. P. concolor foi quem apresentou maior grau de infestação (72,15%) com 57 espécimes de A. aureolatum. Três espécimes de Amblyomma trigrinum foram registrados em Lycalopex gymnocercus. Este relato amplia a lista de carrapatos parasitando animais silvestres no estado de Santa Catarina. Palavras-chave: Ixodídeos. Amblyomma spp.. Carnivora. Fauna Silvestre. Ixodids detected in wild carnivores run over on highways of Santa Catarina, Brazil: a case report ABSTRACT The study on the identification of ectoparasites is part of a program for monitoring wildlife on four highways in the mountain region of the state of Santa Catarina, Brazil. Between August 2007 and April 2013, Puma concolor (3), Leopardus tigrinus (3), Puma yagouaroundi (1), Procyon cancrivorus (6) and Cerdocyon thous (5), totaling 18 carnivores, were rescued from the highways. Ixodid ticks were detected in all carnivores, and 87 specimens of Amblyomma aureolatum were found as parasites on Puma concolor, P. yagouaroundi, C. thous and P. cancrivorus. P. concolor was the species with the highest infestation rate (72.15%), infected with 57 A. Aureolatum specimens. Three specimens of Amblyomma trigrinum were reported in Cerdocyon thous. This case report extends the list of ticks that have infected wild animals in the state of Santa Catarina. Keywords: Ixodids. Amblyomma spp.. Carnivora. Wildlife. Rosiléia M. de Quadros, Bruna L. Boaventura e Wilian R. Veronezi Departamento de Parasitologia da Faculdade de Ciências Biológicas da UNIPLAC, Lages-SC. Sandra M. T. Marques Departamento de Patologia Clínica Veterinária da Faculdade de Veterinária da UFRGS, Porto Alegre-RS. Endereço: Av. Bento Gonçalves, 9090, Agronomia, Porto Alegre-RS. CEP.: 91540-000. E-mail: smtmuni@hotmail.com 222Veterinária em Foco Veterinária Canoasem Foco, v.10v.10, n.2, jan./jun. p.222-228 2013 jan./jun. 2013

INTRODUÇÃO A diversidade de espécies de carrapatos parasitando a fauna carnívora silvestres no Brasil é resultante dos diferentes ecossistemas em que estes animais habitam. Nesse sentido, as características ambientais e a diversidade de espécies de hospedeiros de cada área são pontos fundamentais para a existência de determinadas espécies de carrapatos e o constante deslocamento destes animais por regiões diferentes em busca de alimento facilita a infestação por ectoparasitos (LABRUNA et al., 2001). São descritas no mundo aproximadamente 870 espécies de carrapatos, 102 são endêmicas para o Novo Mundo e 55 foram registradas no Brasil (TOLEDO et al., 2008). O gênero Amblyomma apresenta aproximadamente 130 espécies e 57 estão descritas na região neotropical, sendo 30 no Brasil (DANTAS-TORRES et al., 2009) e duas espécies, A. fuscum e A. parkeri são verdadeiramente endêmicas (ONOFRIO et al., 2006). Os carrapatos gastam mais de 90% de sua vida útil fora dos hospedeiros, cujas condições ambientais como temperatura, pluviometria, umidade, latitude, altitude e tipo de vegetação são cruciais para determinar a sobrevivência e o desenvolvimento no meio ambiente, bem como a disponibilidade de hospedeiros primários para este invertebrado (LABRUNA et al., 2005). A maioria das espécies de carrapatos está associada aos animais silvestres, com poucos registros no Brasil, principalmente em relação aos seus hospedeiros, distribuição geográfica e aos efeitos do parasitismo (GUIMARÃES et al., 2001; LABRUNA et at., 2002). O conhecimento das espécies de ectoparasitos é importante uma vez que podem participar na manutenção enzoótica de patógenos em meio natural, parasitando, sobretudo animais silvestres, que passam neste ecossistema a ser importantes vetores de zoonoses emergentes. Quanto ao ciclo vital, os ixodídeos apresentam de um até três hospedeiros e frequentemente as fases imaturas alimentam-se em animais de menor tamanho, tais como aves e roedores, enquanto que os adultos realizam cópulas em animais de médio e grande porte (OLIVER JÚNIOR, 1989). O relato deste estudo faz parte de um programa de monitoramento da fauna silvestre que sofre atropelamento em quatro rodovias que passam pelo Planalto Catarinense, Santa Catarina, Brasil. RELATO DE CASO O estudo é realizado em quatro rodovias da região do Planalto Catarinense, abrangendo as rodovias: BR 282, entre os municípios de São José do Cerrito e Bocaína do Sul, a BR 116 entre Correia Pinto e Capão Alto, SC 425 e SC 438 entre os municípios de Lages e São Joaquim (Figura 1). 223

FIGURA 1 Localização das Rodovias BR 282 entre os municípios de São José do Cerrito e Bocaina do Sul; BR 116 entre Correia Pinto e Capão Alto; SC 425 e SC 438 entre os municípios de Lages e São Joaquim. Fonte: Os autores. O reconhecimento, a busca e a captura dos animais encontrados ao longo das rodovias se devem ao trabalho conjunto com o IBAMA e a Polícia Rodoviária Federal. Os animais são encaminhados para o Laboratório de Parasitologia da Universidade do Planalto Catarinense. No período de agosto de 2007 a abril de 2013 foram resgatados 18 carnívoros: três P. concolor (onça-parda, suçuarana, leão-baio), três L. tigrinus (gato-do-mato-pequeno), um P. yagouaroundi (gato-mourisco, gato-preto, maracajá-preto), seis P. cancrivorus (mãopelada, guaxinim) e cinco C. thous (graxaim-do-mato, cachorro-do-mato, raposa). Entre os animais resgatados, treze eram fêmeas, cinco de felídeos (P. concolor, P. yagouaroundi e L. tigrinus) e oito de canídeos (C. thous, L. gymnocercus e P. cancrivorus). Entre os cinco machos resgatados, dois eram P. cancrivorus, um P. concolor, um L. tigrinus e um C. thous. Os animais recolhidos se apresentaram em óbito (Figura 2). 224

FIGURA 2 Animais resgatados no período de agosto de 2007 a abril de 2013 em quatro rodovias da região do Planalto do Estado de Santa Catarina. Procyon cancrivorus Puma yagouaroundi Puma concolor Cerdocyon thous Fonte: Os autores. As localizações dos resgates foram determinadas através do Sistema de Posicionamento Global (GPS). No laboratório, os animais foram pesados e determinados o peso corporal, o sexo e a espécie. Após, foram inspecionados para a retirada dos ixodídeos, coletados manualmente e acondicionados em frascos com álcool a 70%. A identificação dos ectoparasitos foi baseada nas características morfológicas, segundo Kohls (1956), Keirans (1992) e Onofrio et al. (2006). Carrapatos ixodídeos foram registrados em 18 carnívoros, sendo identificados 87 espécimes (55 fêmeas e 32 machos) de A. aureolatum em P. concolor, P. yagouaroundi, C. thous e P. cancrivorus e três espécimes (duas fêmeas e um macho) de A. trigrinum em L. gymnocercus. Em relação ao sexo dos carnívoros não houve diferença significativa para o encontro de carrapatos. P. concolor apresentou o maior grau de infestação pelos ixodídeos, sendo coletados 57 espécimes de A. aureolatum representando 72,15% dos ácaros identificados. 225

DISCUSSÃO As últimas listas de carrapatos publicados no Brasil foram os relatos de Aragão e Fonseca (1961) e Guimarães et al. (2001), conforme Dantas-Torres et al. (2009). Aragão e Fonseca (1961) descreveram como possíveis hospedeiros de estágios adultos de A. aureolatum canídeos selvagens (Canis azarae e Dusicyon sp.), gatos selvagens (Felis wiedii wiedii), raposas (Cerdocyon thous entrerianus), guaxinins (Procyon cancrivorus), furões (Grison furax e G. brasiliensis vittatus), bicho-preguiça (Bradypus tridactylus), leão-da-montanha (Puma concolor), veados (Cervus sp., Cervus paludosus e Mazama sp.), gambás (Didelphis aurita), capivaras (Hydrochoerus hydrochaeris), quatis (Nosua socialis) e o roedor selvagem Euryzygomatomys spinosus. Gato doméstico, caprino, cavalo (LABRUNA et al., 2002), suíno e bovino também podem ser parasitados (Rodrigues et.al, 2002). Estágios adultos de A. aureolatum foram identificados em cães domésticos por Freire (1972), Massard et al. (1981), Evans et al. (2000), Labruna et al. (2001) e Rodrigues et al. (2002); em bugios-ruivos (Alouatta clamitans) em Santa Catarina por Lavina et al. (2011) e em bugios guariba (Alouatta guariba) no Rio Grande do Sul (MARTINS et al., 2006). A. tigrinum foi descrito no Brasil ocorrendo nos estados do Rio Grande do Sul (EVANS et al., 2000), Santa Catarina (CARDOSO et al., 2008), Minas Gerais (ABEL et al., 2006), Tocantins (MARTINS et al., 2009), Paraná (LABRUNA et al., 2001), Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e São Paulo (GUIMARÃES et al., 2001; PEREIRA et al., 2000). Os ectoparasitos em animais silvestres podem ser de grande importância à saúde pública principalmente se tratando de carrapatos A. aureolatum e A. cajennense, apontados como transmissores da febre maculosa, causada por uma pequena bactéria chamada Rickettsia rickettsii (GÓES et al., 2006). A. tigrinum tem envolvimento na transmissão de microrganismos patogênicos como Rangelia vitalii, Babesia canis e Ehrlichia canis (LORETTI; BARROS, 2004). Os ambientes fragmentados promovem o deslocamento de animais silvestres na busca por outros ambientes para sua sobrevivência o que leva a aproximação de áreas urbanas e ao contato mais direto com espécies domésticas entre elas cães e o ser humano, formando um ciclo de importância dentro das transmissões de patógenos zoonóticos (GÓES et al., 2006). Reforçando esta assertiva, Martins et al. (2010) fazem o primeiro registro do parasitismo de A. aureolatum em gato-maracajá (Leopardus wiedii) encontrado atropelado, no município de Gravataí, junto a rodovia RS 020, área antropizadas, pertencente a região metropolitana de Porto Alegre, semelhante situação apresentada neste relato. Um fator relevante nos estudos da fauna silvestre se deve a grande extensão do território brasileiro e, muitas vezes, as dificuldades nas visualizações e captura/soltura da fauna silvestre para investigações, além dos custos operacionais despendidos nesses esforços. A parceria deste projeto com órgãos oficiais é menos onerosa, servindo também ao propósito de contemplar animais em risco, algumas vezes encontrados vivos, muitas vezes atropelados por já se encontrarem injuriados por armas de fogo. Os animais de 226

produção servem de fonte de alimento para os carnívoros silvestres que perderam seu habitat, muitas vezes em áreas antropizadas e recentemente urbanizadas. Este relato amplia a lista de carrapatos parasitando P. concolor, L. tigrinus, P. yagouaroundi, P. cancrivorus, C. thous e L. gymnocercus no estado de Santa Catarina. REFERÊNCIAS ABEL, I.; PEDROZO, M. G. C.; BUENO, C. Amblyomma tigrinum Koch 1844 (ACARI: IXODIDAE) em cães domésticos procedentes da Reserva Florestal do Boqueirão, Município de Ingaí, Sul de Minas Gerais. Arquivos do Instituto Bioógico, v.73, n.1, p.111-112, 2006. ARAGÃO, H. B.; FONSECA, F. Notas de Ixodologia. VIII. Lista e chave para os representantes da fauna ixodológica brasileira. Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, v.59, p.115-29, 1961. CARDOSO, C. P.; STALLIVIERE, F. M.; SCHELBAUER, C. A. et al. Amblyomma tigrinum no Município de Lages, SC e Observações da Biologia em Condições de Laboratório. Revista Brasileira de Parasitologia Veterinária, v.17, n.1, p.56-58, 2008. DANTAS-TORRES, F.; ONOFRIO, V. C.; BARROS-BATTESTI, D. M. The ticks (Acari: Ixodida: Argasidae, Ixodidae) of Brazil. Systematic and Applied Acarology, v.14, p.30-46, 2009. EVANS, D. E.; MARTINS, J. R.; GUGLIELMONE, A. A. A review of the ticks (Acari: Ixodidae) of Brazil, their hosts and geographic distribution 1. The state of Rio Grande do Sul, Southern Brazil. Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, v.95, p.453-470, 2000. FREIRE, J. J. Revisão das espécies da família Ixodidae. Revista de Medicina Veterinária, v.8, p.1-16, 1972. GÓES, E. M.; GONÇALVES, C. A. Z. M.; TOGNOLLO, N. R. et al. Investigação Acarológica realizada em Ribeirão Pires frente a Infestação de Carrapatos do Gênero Amblyomma. Boletim Epidemiológico Paulista (BEPA), v.3, n.35, p.13-18, 2006. GUIMARÃES, J. H.; TUCCI, E. C.; BARROS-BATTESTI, D. M. Ectoparasitos de Importância Veterinária. São Paulo: Plêiade. 2001, 213p. KEIRANS, J. E. Systematic of the Ixodida (Argasidae, Ixodidae, Nutalliellidae): an overview and some problems. Tick Vector Biology: Medical and Veterinary Aspects. Berlim: Springer-Verlag, p.1-21, 1992. KOHLS, G. M. Concerning the identity of Amblyomma maculatum, A. tigrinum, A. triste and A. ovatum of Koch, 1844. Proceedings of the Entomological Society Washington BioStor, n.58, p.143-147, 1956. LABRUNA, M. B.; JORGE, R. S. P.; SANA, A. A. et al. Ticks (Acari: Ixodida) on wild carnivores in Brazil. Experimental and Applied Acarology, v.36, p.149-163, 2005. LABRUNA, M. B.; KASAI, N.; FERREIRA, F. et al. Seasonal dynamics of ticks (Acari: Ixodidae) on horses in the state of São Paulo, Brazil. Veterinary Parasitology, v.105, p.65-77, 2002. 227

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