A INFLUÊNCIA DOS INTEMPERISMOS NA CONSERVAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PINTURA RUPESTRE NO SEMI-ÁRIDO PERNAMBUCANO

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Transcrição:

A INFLUÊNCIA DOS INTEMPERISMOS NA CONSERVAÇÃO E APRESENTAÇÃO DA PINTURA RUPESTRE NO SEMI-ÁRIDO PERNAMBUCANO Carlos Henrique Romeu Cabral Programa Associado de Pós-Graduação em Artes Visuais UFPB/UFPE RESUMO Este artigo aborda as relacões existentes entre o processo de conservação/apresentação da pintura abstrata Pré-colonial no Agreste do Estado de Pernambuco e as influências geradas pelos intemperismos físicos e químicos causados pelas condições climáticas presentes no clima Semi-árido do Nordeste brasileiro. Nesta pesquisa, essas relações são observadas a partir do corpus gráfico impresso no Sítio Arqueológico da Pedra da Buquinha, localizado na zona rural da cidade de Venturosa PE, apresentando pinturas rupestres de estilo geométrico elaborado e cerca de 80% de seu corpus gráfico preservado. Os painéis gráficos analizados permitem questionar as influências do meio ambiente, em suas diversas instâncias, na produção das primeiras manifestações artísticas visuais do Nordeste brasileiro. Palavras-chave: Arte-Rupestre. Conservação. Intemperismos. ABSTRACT This article discusses the relations between the conservation process / presentation of the Pre-colonial abstract painting in the Agreste of Pernambuco state and the influences generated by physical and chemical weathering, caused by the climatic conditions present in the Brazilian semi-arid northeastern. In this study, these relations are observed from the printed on the graphic corpus at a Archaeological Site of Pedra da Buquinha, located in the rural city of Venturosa - PE, presenting paintings of geometric style developed in about 80% of this graphic corpus preserved. The graphic panels analyzed allow us to question the influences of the environment in this various instances, in the production of the first visual art events in the Northeast of Brazil. Key words: Rock-Art. Conservation. Weathering Introdução Diversas linguagens artísticas serviram de instrumentos e métodos utilizados e elaborados pela humanidade nos seus processos de desenvolvimento civilizatório. Como resultado dessas práticas podemos observar o surgimento de experiências estéticas que acabam extrapolando as finalidades funcionais na criação do que hoje limitamos a chamar de registros e não de obras-de-arte. Esses acervos residuais acabam sendo gerados também por práticas artísticas dentre as quais percebemos 2617

uma maior incidência das linguagens da Escultura, da Pintura e da Gravura. Os Sítios Arqueológicos, lugares que comportam esse Patrimônio Material i, nos mostram, de acordo com o seu grau de preservação, uma enorme incidência de práticas cerâmicas, escultóricas e principalmente pictóricas. Como resultado dessas atividades observamos uma estruturação de uma rede de comunicações que se utilizam da visualidade como campo de expressão que perdura em meio ao tempo e resiste às interferências naturais e humanas. Dentro do contexto Arqueológico, a presença da imagem através de suas formas e códigos sobrepõe-se em relação a outras formas de comunicação realizadas por esses autores, o que nos leva a pensar sobre algumas propriedades desse processo de criação, veiculação e conservação. Sabemos que as linguagens artísticas experienciadas na pré-história se cruzam também no campo da visualidade, entretanto o elo de informações acaba sendo rompido quando essas, de acordo com suas propriedades acabam se diluindo com a passagem do tempo e suas transformações. Nesse emaranhado de atividades culturais e artísticas teremos as práticas gráficas como as mais resistentes e conhecidas, visto que quantitativamente e qualitativamente, esses registros chegam à comunidade científica em interessantes estágios de integridade e preservação, oferecendo elementos de investigação desses processos para diferentes áreas do conhecimento humano. Por serem vestígios milenares, as pinturas e gravuras, no seu conjunto apresentam-se ao observador como um produto final heterogêneo, restos de obras gráficas realizadas em tempos diferentes por numerosos autores pertencentes a etnias diversas, em ambientes distintos e histórias próprias. São figuras portadoras de múltiplos significados porque os mesmos desenhos, no interior de uma mesma cultura, experimentam variações de significação, segundo a história particular de cada grupo e da maneira particular como foram resolvidos os problemas que tiveram de encarar para sobreviver (Pessis 2003:56). Diversas pesquisas arqueológicas já foram realizadas tendo como objeto de análise o Sítio Arqueológico da Pedra da Buquinha ii, no entanto os dados levantados e suas conclusões apontam um processo de visão unilateral no que diz respeito ao material analisado e sua carga estética. As possibilidades científicas de estudar os grafismos presentes no Sítio possuem ainda um tímido embasamento teórico que se enverede por um viés artístico-científico e que se debruce também nos aspectos 2618

relacionados as formas de conservação desse tipo de acervo, atribuindo assim à Arqueologia o papel de única ciência capaz de investigar e explicar as atividades artísticas desenvolvidas dentro desse contexto estético, histórico e arqueológico. Dentro dessas perspectivas percebe-se a possibilidade e a necessidade de entrelaçar áreas de estudos distintas que ao somarem seus métodos e critérios analíticos complementam-se e ampliam as possibilidades investigativas, tendo como soldo um processo de construção de conhecimento interdisciplinar e amplo. Nesse intuito evidenciam-se a inserção e a importância da Teoria e da História da Arte como disciplinas do conhecimento que recortam e analisam os processos de criação artística em todos os níveis e contextos, objetivando uma prática científica complementar e porque não questionadora a determinadas teorias e conclusões formuladas pelos estudos desenvolvidos pelo campo da Arqueologia sobre os mesmos assuntos postos em questão. Caracterização da área de estudo Localizado na Mesorregião do Agreste do Estado de Pernambuco e na Microrregião do Vale do Ipanema, o município de Venturosa possui segundo o censo realizado pelo IBGE no ano de 2007 um total de 15.576 habitantes. Sua área de 338 Km 2 limita-se ao Leste com o município de Pesqueira, ao norte com o município de Alagoinha e ao Sul com o município de Caetés, representando 0.33 % do Estado de Pernambuco iii. A sede do município tem uma altitude aproximada de 530 metros e coordenadas geográficas de 08 Graus 34 min. 29 seg. de latitude sul e 36 Graus 52 min. 27 seg. de longitude oeste, distando 243,4 km da capital, cujo acesso é feito pela BR-232 e PE-217 iv 2619

Fig. 01- Mapa do Vale do Ipanema O município de Venturosa situa-se em uma área rica em Sítios Arqueológicos com forte presença de elementos visuais. Para o estudo desenvolvido, foi escolhido o Sítio Arqueológico da Pedra da Buquinha. Cadastrado no Sistema do Patrimônio Arqueológico do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN em 06/01/2000 sob responsabilidade da Profª Dra. Suely Cristina Albuquerque de Luna através de suas pesquisas realizadas no Núcleo de Estudos Arqueológicos da Universidade Federal de Pernambuco onde leciona. Esse enorme bloco de formação granítica possui impresso em seu entorno 9 (nove) conjuntos de grafismos agrupados e cerca de 5 (cinco) focos de grafismos isolados. Dentre os conjuntos gráficos observados foram escolhidos dois painéis gráficos que de acordo com suas propriedades estruturais acabam se entrelaçando diretamente com questões relacionadas às formas de conservação desse acervo devido as aparentes modificações e interferências que a composição plástica vem sofrendo pela influências do clima seus componentes. Características climáticas O clima que envolve a região onde se situa o objeto analisado acompanhado pelo seu corpus gráfico, classifica-se como Semi-árido. Na classificação mundial do clima, o clima Semi-árido é aquele que apresenta precipitação de chuvas com médias entre 300 mm e 800 mm v apresentando altas temperaturas durante o dia e baixas temperaturas durante a noite. Essas características são definidas pelos sistemas de circulação atmosférica que ao passarem pela região, provocam longos 2620

períodos secos e chuvas ocasionais concentradas em poucos meses do ano e que juntamente com as variações de temperatura acabam tendo suas influências refletidas diretamente nas composições plásticas no que diz respeito ao suporte lítico e o tipo de manifestação pictórica nele impresso. A contração e a dilatação das rochas expostas às mudanças diárias de temperatura no Semi-árido provocam movimentos mecânicos na rocha, que em cada mineral que a compõe é diferenciado, e durante longo período de atuação leva a fissuras na rocha que contribuem para seu desgaste. O intemperismo físico da rocha é constante nestas regiões, tendo em vista que os climas mais áridos tendem a ter uma grande amplitude térmica. (Proença, 2008). Entendemos então o clima como um dos principais agentes transformadores da Paisagem Natural e, portanto na transformação das superfícies que carregam consigo informações residuais que indicam um modo de viver, sentir, refletir a vida, visto que esses suportes estão diluídos na composição da Arquitetura Natural. As ações climáticas nesse caso além de danificarem as superfícies pintadas, dificultam a compreensão e o estudo desse processo compositivo e suas reverberações estéticas. Nesses casos deve-se levar em consideração até a simples incidência da luz solar que é capaz de alterar quimicamente os pigmentos e fisicamente os suportes graníticos utilizados, de acordo com as temperaturas atingidas e também de acordo com os ângulos de incidência que atingem os conjuntos pictóricos, alterando e dificultando a compreensão técnica e estética do material posto em análise,bem como a compreensão do seu processo gráfico e portanto criativo. Sobre os Intemperismos De acordo com a Geologia, os intemperismos apresentam-se como um conjunto de processos operantes na superfície terrestre que ocasionam a decomposição dos minerais das rochas graças à ação de agentes atmosféricos e biológicos, tendo o Clima como principal agente nesses processos. Nesse caso poderemos perceber não apenas um tipo de desgaste nas superfícies líticas que abrigam os acervos pictóricos rupestres e sim diferentes formas que possibilitam alterações tanto físicas quanto químicas nesse tipo de suporte. Nos intemperismos físicos percebemos as alterações mais bruscas nos suportes líticos utilizados na produção pictórica rupestre. Com as extremas variações de temperatura sofridas pela superfície e a presença de chuvas repentinas 2621

características do clima Semi-árido, os esforços seculares gerados pelas sucessivas séries de dilatações e retrações presentes no plano rochoso ocasionam quebras bruscas na superfície que acabam atingindo as atividades plásticas presentes e fragmentando a composição pictórica, dificultando o estudo dessas atividades e comprometendo sua conservação como mostra a foto 1. Nesse caso apenas a estrutura física do suporte é afetada, não existindo nenhuma alteração química no processo compositivo que comprometa outros aspectos envolvidos na pintura rupestre como a composição dos pigmentos e suas prováveis alterações. Foto 1 Exemplo de intemperismo físico Em outros casos observamos que de acordo com a forma de exposição desse acervo, alterações químicas são desencadeadas comprometendo em alto grau o processo de estudo e análise das atividades pictóricas rupestres. Esse processo de intemperismo é caracterizado pela reação química entre a rocha e as diversas soluções aquosas. A água de precipitação atmosférica, apesar de naturalmente destilada, não é pura, pelo fato de os gases do ar serem nela dissolvidos. Destes gases, os mais importantes no intemperismo são o oxigênio e o gás carbônico. (Leinz, 1970). As reações químicas ocasionadas pelo solvente aquoso e as propriedades minerais presentes na estrutura granítica, composta neste caso em cerca de 85% a 2622

95% de quartzo e feldspato (minerais de cor branca), acabam comprometendo e interferindo as propriedades plásticas das pinturas rupestres gerando enormes manchas brancas que interferem e por muitas vezes suprimem os pigmentos utilizados no processo pictórico conforme a foto 2. Foto 2 Exemplo de Intemperismo Químico Observamos então que as problemáticas no estudo apresentado, relacionamse diretamente com os processos de exposição e conservação que se apresentam nos produtos artísticos visuais pré-coloniais. A pintura rupestre nesse caso, deve ser tratada como um acervo artístico que carece, como toda e qualquer obra de arte, de cuidados específicos quanto a sua forma de exposição e conservação, visto que os eventuais danos causados a esse tipo de produção são irreversíveis. Considerações Finais O presente trabalho torna possível, compreendendo as manifestações gráficas Pré-coloniais brasileiras como uma espécie de acervo artístico e não apenas arqueológico, apontar questionamentos ligados aos processos de conservação e restauração desse tipo de produção plástica. 2623

Com a situação analisada, percebe-se então a importância em preservar esse acervo não apenas através de sua documentação e de seu registro, mas também através de sua dimensão material, preocupando-se também com o processo de fruição estética. As dificuldades relacionadas aos processos de restauração das pinturas rupestres, nesse caso, não se limitam apenas ao processo técnico da criação artística, mas também às características relacionadas ao suporte lítico utilizado na composição. Diferentemente de uma escultura cerâmica, por exemplo, a produção artística delimitada aponta impossibilidades de restauro no suporte lítico utilizado, quando esse se fragmenta ou se decompõe através dos intemperismos físicos e químicos apresentados anteriormente. As propriedades constituintes do suporte posto em questão, apresentadas como minerais de quartzo e feldspato, se mostram como estruturas compositivas do processo natural de formação da rocha, o que impossibilita qualquer tipo de reconstituição artificial no intúito de sua reestruturação física ou química. Quanto ao processo de conservação, percebemos que esse encontra-se comprometido e submisso às características climáticas presentes no ambiente que abriga o acervo artístico analisado. Para estabelecermos estratégias de conservação necessitamos de um amplo entendimento sobre as características climáticas do Semi-árido e suas influências nos contextos ambientais. Como o acervo exige características especificas para a sua contemplação, assumindo uma taxonomia que hoje entendemos como um site especific e sendo esse impossibilitado de ser transferido para uma instituição museológica, evitando assim a degradação e descaracterização da paisagem natural e suas propriedades, as estratégias de conservação devem ser pensadas para o ambiente que engloba o material plástico como um todo. Isso denuncia a necessidade do envolvimento de profissionais de diversas áreas do conhecimento como a Geologia, Arqueologia, Geografia, Engenharia Ambiental, Artes, etc. Essas estratégias interdisciplinares assumem no momento o papel de agentes problematizantes e não devem ser entendidas como medidas paliativas ou emergenciais para a resolução dos problemas apontados. 2624

Os estudos desenvolvidos pela Teoria e História da Arte sobre o Patrimônio Arqueológico nacional apresentam-se ainda de forma tímida no processo de estruturação desse conhecimento, mas devem ser compreendidos como elementos indispensáveis para o entendimento e a preservação dessas manifestações artísticas, ampliando as possibilidades de estudo, levantando os problemas percebidos e apontando os caminhos a serem percorridos. i Entende-se o Patrimônio Material como o conjunto de bens culturais que podem ser imóveis como os núcleos urbanos, sítios arqueológicos e paisagísticos e bens individuais; e móveis como coleções arqueológicas, acervos museológicos, documentais, bibliográficos, arquivísticos. Tomados em conjunto ou individualmente, o Patrimônio possui uma carga identitária Histórica e Artística de diferentes grupos que contribuíram e contribuem para a formação da sociedade brasileira e funcionam como fontes de pesquisas em diversas áreas do conhecimento. ii Torna-se importante destacar as informações levantadas pelo pesquisador André Luiz Proença em sua dissertação de mestrado apresentada ao programa de Pós-Graduação em Arqueologia da Universidade Federal de Pernambuco sob o titulo: Onde viviam aqueles que por aqui passaram? Propostas interpretativas para as ocupações Pré-coloniais no Agreste de Pernambucano. iii IBGE, 2007. iv IBGE, 2007. v IBGE, 2007. REFERÊNCIAS GASPAR, Madu. A arte rupestre no Brasil. Jorge Zahar: Rio de Janeiro, 2003. LEINZ. Viktor. Geologia Geral. Nacional: São Paulo, 1970. MARTIN, Gabriela. Pré-história do Nordeste do Brasil. UFPE: Recife, 2005. PESSIS, Anne-Marie. Imagens da pré-história. FUMDHAM/PETROBRAS: São Paulo, 2003. PROENÇA, André Luiz. Onde viviam aqueles que aqui passaram?: proposta interpretativa para as ocupações pré-coloniais no agreste pernambucano. 2008. Dissertação (Mestrado em Arqueologia) Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2008. Carlos Henrique Romeu Cabral Graduado em Educação Artística/Artes Plásticas pela Universidade Federal de Pernambuco, especialista em Artes Visuais: cultura e criação pelo SENAC, mestrando em Artes Visuais pelo Programa Associado de Pós-Graduação em Artes Visuais UFPB/UFPE, membro pesquisados do grupo de pesquisa em Arte, Cultura e Memória - CNPQ e atua como professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Alagoas IFAL. 2625