UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU FACULDADE INTEGRADA AVM

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Transcrição:

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU FACULDADE INTEGRADA AVM A IMPORTÂNCIA DO PROCESSO VISUAL NO DESENVOLVIMENTO COGNITIVO DO SER HUMANO Por: Rosélia Maria Silva Vilarins Orientador Prof.ª Dra Marta Relvas Rio de Janeiro 2011

2 UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSO FACULDADE INTEGRADA AVM IMPORTÂNCIA DO PROCESSO VISUAL NO DESENVOLVIMENTO COGNITIVO DO SER HUMANO Apresentação de monografia à Universidade Cândido Mendes como requisito parcial para a obtenção do grau de Especialista em Neurociências Pedagógicas. Por Rosélia Maria Silva Vilarins.

3 AGRADECIMENTOS A Deus, que me permitiu realizar mais um sonho; A minha orientadora Dra. Marta Relvas, pelo apoio efetivo e carinhoso durante o curso e a realização deste trabalho; Ao optometrista Dr.Ricardo Bretas, que, ao me falar de Optometria Comportamental, mostroume o caminho das Neurociências; À Dra. Andrea Rocha Ferreira e à Prof.ª Sandra Pelegrini, que com paciência e carinho elucidaram tantas dúvidas; À Dra. Renata Fully, por me incentivar a iniciar esta caminhada.

4 DEDICATÓRIA A meu pai Deusdedit Vilarins e a minha irmã Rose May Vilarins, que partiram durante a realização deste curso, com muito amor e saudade; A meu grupo familiar unido e querido: mãe, irmãs e sobrinhos, pelo apoio em todos os meus projetos; A Jorge, companheiro de vida e de ideais;

5 RESUMO Este trabalho tem a finalidade de estabelecer a importância do pleno funcionamento do sentido da visão no processo de aprendizagem e desenvolvimento pessoal do ser humano. Para que a visão atinja sua plenitude é necessário que, desde o nascimento, o olho receba o estímulo da luz e que na retina haja a formação de uma imagem bem focalizada. Também é certo que cerca de 50% do córtex cerebral de primatas e seres humanos está envolvido com o mecanismo visual. Tal preponderância atesta a importância da visão para o pleno desenvolvimento dos seres. No momento do nascimento, o globo ocular está com suas estruturas quase aptas a um perfeito funcionamento. Para a maturação, é fundamental o estímulo luminoso, que fará com que o desenvolvimento se complete. A retina precisa receber imagens perfeitas e transmiti-las pelas vias ópticas ao córtex visual. Imagens perfeitas só são obtidas com a correção de alguma ametropia existente. Os globos oculares devem estar bem alinhados. Olhos desviados por estrabismo não propiciarão uma imagem retiniana correta, e olhos com ametropias vão gerar imagens borradas. Pais, parentes, cuidadores e, mais tarde, professores devem estar atentos a sinais e sintomas que possam evidenciar a existência de problemas oculares o mais precocemente possível, já que, até os sete anos de idade, é possível, por meio de exercícios e estimulação específica, reverter satisfatoriamente alguns quadros de baixa acuidade visual. Embora neurocientistas já estejam desenvolvendo pesquisas para melhora visual em adultos amblíopes, esses procedimentos ainda estão na fase de experiências laboratoriais. É importante que muita atenção seja dispensada para a triagem das condições visuais desde os primeiros anos de vida e não apenas quando a criança ingressa na escola, perto dos sete anos de idade, o que impede a possibilidade de intervenção em uma fase de plasticidade neuronal mais propícia. No primeiro capítulo, será estudado o globo ocular, com ênfase nas estruturas responsáveis pelo processo visual. O globo ocular tem o formato esférico

6 e é formado por três túnicas concêntricas. A mais interna, a retina, é uma parte do cérebro e contém células foto sensíveis, os cones e bastonetes, além de uma rede intrincada de neurônios que fazem sinapse entre si e iniciam o processamento das imagens visuais captadas. O nervo óptico, o trato óptico e as radiações ópticas compõem as vias ópticas e levam ao córtex visual primário os impulsos visuais. No segundo capítulo, será apresentada a formação do sistema nervoso central em suas etapas desde o momento da concepção e a origem do globo ocular. Serão apresentadas pesquisas que mostram a prevalência de deficiências visuais em crianças. Essas deficiências causam impacto no processo cognitivo e na escolaridade formal. A conclusão é que é fundamental que as crianças sejam examinadas antes mesmo de seu ingresso na escola. Os que convivem com elas devem conhecer os sinais de dificuldades visuais. Isso vai garantir uma melhor visão, elemento de grande importância para o desenvolvimento e a educação. Dificuldades visuais em idades precoces alteram o desenvolvimento da motricidade, cognição e linguagem durante os períodos sensíveis do desenvolvimento infantil. A baixa acuidade visual está associada ao baixo rendimento escolar. As pesquisas sobre prevalência de deficiências visuais deveriam ser repassadas para as escolas e os dados confrontados com o desempenho escolar. Assim, teríamos um entrelaçamento de informações que permitiria o planejamento de ações efetivas em benefício das crianças de nosso país. Estamos tão familiarizados com o ato de enxergar, que é preciso um salto de imaginação para nos darmos conta de que há problemas a serem resolvidos. Mas imagine. Recebemos imagens invertidas diminutas e distorcidas, e vemos objetos sólidos, separados no espaço que nos rodeia. Pelos padrões de estimulação da retina nós percebemos o mundo de objetos e isso é nada menos que um milagre. (Richard l. Gregory. Eye and Brain.1966.)

7 METODOLOGIA Esta pesquisa é uma revisão bibliográfica sobre o problema da necessidade de prevenção e intervenção precoce, visando evitar a perpetuação de problemas visuais que ocasionem baixa visão e suas consequências na vida das pessoas atingidas. A pesquisa foi feita com a leitura de livros e artigos especializados em algumas áreas como Anatomia e Fisiologia ocular e Neurociências. Foram consultados sobretudo os clássicos, em busca de opiniões abalizadas. Também foram utilizados artigos de revistas especializadas com informações de pesquisas mais recentes sobre o processo do desenvolvimento infantil e o papel da visão nessa etapa crucial do ser humano. Nos tratados de Oftalmologia, foram pesquisadas as estruturas oculares e, nas revistas especializadas, resultados de avaliações visuais em crianças de vários grupos, buscando as ametropias e as patologias oculares mais encontradas na infância. Na área da Educação, foram encontradas informações sobre como acontece a aprendizagem formal e as condições que podem facilitar ou prejudicar o seu desenvolvimento. Foram consultados, ainda, sites específicos sobre o desenvolvimento infantil e a importância dos primeiros anos de vida no desabrochar pleno do ser humano. Após o levantamento bibliográfico, foram realizadas leituras críticas. Neste trabalho, foram utilizados também os registros de atendimentos no consultório de Óptica e Contatologia da autora.

8 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 09 CAPÍTULO I - O GLOBO OCULAR E SUAS ESTRUTURAS 11 1.1: A RETINA 14 1.2: CÓRTEX VISUAL 23 CAPÍTULO II - DESENVOLVIMENTO CEREBRAL 27 2.1: O MECANISMO VISUAL 34 2.2: O DESENVOLVIMENTO DA VISÃO 38 2.3: DIFICULDADES VISUAIS NA INFÂNCIA 42 CONCLUSÃO 46 ANEXO 48 BIBLIOGRAFIA 54 ÍNDICE 57

9 INTRODUÇÃO A visão é um dos principais sentidos do ser humano. As informações captadas pelos olhos são a maneira da criança aprender, por imitação, a se comportar, a se inserir no mundo que a rodeia. Pela visão, ela reconhece formas e letras na educação formal. Com o auxílio da visão, o processo de letramento vai se realizar com mais facilidade. As deficiências visuais constituem uma barreira a ser vencida e superada. Dependendo de sua gravidade, pode ser necessário o uso de recursos especiais para que a aprendizagem formal aconteça e mesmo para os atos corriqueiros da vida diária. Crianças com baixa visual grave demonstram essa deficiência. Crianças com deficiências visuais moderadas não fornecem pistas de sua necessidade. Dessa forma, ficam isoladas nas brincadeiras coletivas, tornam-se tímidas e ensimesmadas sem que as causas desse comportamento sejam identificadas. Como não enxergam nitidamente o quadro, não copiam corretamente os deveres ou o fazem lentamente. Pais ou professores, ignorando a deficiência, cobram um desempenho que a criança não consegue alcançar. Daí surge o desânimo, o desinteresse com os estudos, o mau desempenho escolar. Infelizmente, nem todos os municípios brasileiros exigem exames básicos como o teste do reflexo vermelho em recém-nascidos ou exames de acuidade visual em escolares. Esses procedimentos alertariam para problemas visuais, e as crianças se beneficiariam bastante, pois algumas deficiências são passíveis de correção. A literatura nos brinda com muitos resultados de pesquisas, resultados de triagens visuais. Na quase totalidade, as triagens são realizadas em escolares, ou seja, crianças já com sete anos de idade ou mais. As intervenções em problemas visuais são mais efetivas quanto mais precocemente sejam realizadas. Examinar crianças antes dos sete anos de idade seria o ideal. Esses exames

10 deveriam ser repetidos rotineiramente, e não serem realizados em caráter excepcional, como ocorre agora. As pesquisas de acuidade são geralmente feitas por profissionais da área da saúde. Infelizmente, os achados não são repassados para as equipes de Educação nem confrontados com o desempenho escolar. Essa providência permitiria a elaboração de gráficos que quantificassem a relação e o impacto da baixa visão no fracasso escolar. Para compreender a importância do processo visual é fundamental conhecer o próprio mecanismo visual, suas estruturas e as conexões cerebrais das quais participa. Entendendo a visão como um todo, pode-se avaliar sua importância no processo cognitivo do ser humano.

11 CAPÍTULO I O GLOBO OCULAR E SUAS ESTRUTURAS A visão é um dos sentidos especiais do ser humano e traz muitas das informações que podem ser obtidas sobre o mundo que nos rodeia e no qual estamos inseridos. Ela é de grande importância para se obter detalhes sobre objetos distantes que não podem ser discriminados por tato, olfato ou audição. Do ponto de vista evolutivo, suas utilidades principais são: observação de objetos móveis ou imóveis como alimentos em potencial, a manutenção da postura adequada e a percepção de nossa própria posição no espaço. Essas funções são assemelhadas às do sistema vestibular, já que existe uma relação fisiológica entre esses dois sistemas sensoriais. Fox, 1999. O sistema visual inclui os globos oculares, as estruturas neurais das vias visuais e o córtex visual (córtex estriado). Inicialmente, serão descritas as estruturas oculares, as estruturas neurais das vias visuais, o córtex estriado e as áreas visuais primárias e secundárias. Compreendendo como o sistema deve funcionar, serão abordados a seguir as diversas anomalias visuais que decorrem de falhas estruturais desse sistema e sua consequência para a aprendizagem formal. O globo ocular (G.O.) fica alojado na órbita. A órbita é uma cavidade óssea formada por sete ossos: maxilar, frontal, zigomático, etmoide, lacrimal, palatino e esfenoide. Sua função é proteger e alojar uma estrutura importante e frágil, o olho. A órbita contém o globo ocular, gordura orbitária que serve de proteção, fáscia (bainha de tecido conjuntivo), músculo elevador da pálpebra superior, glândula lacrimal, os seis músculos extraoculares, além de nervos e vasos sanguíneos que irrigam o conteúdo orbitário e algumas estruturas da face. A órbita possui oito aberturas (forames) que permitem a entrada e saída de veias, artérias e nervos relacionados ao G.O. (figura 01)

12 O olho é um órgão excepcionalmente complexo, envolvendo elementos sensoriais e estruturas acessórias elaboradas que processam as informações tanto antes como após a sua detecção pelas células fotossensíveis. Meiss, 2008. Tem a forma aproximada de uma esfera e é composto de três túnicas concêntricas. A camada mais externa é a esclera, uma camada rija e opaca de tecido conectivo. A parte anterior da esclera é a córnea, onde há uma organização mais regular das fibrilas, tornando-a transparente e permitindo a passagem dos raios luminosos para o interior do olho. A córnea é avascular e sua curvatura é mais acentuada que a da esclera. Ela contribui com aproximadamente 42.00 dioptrias para o processo de refração. Esse poder de refração é suficiente para focalizar os raios luminosos a aproximadamente 2,4 cm atrás, na distância que a separa da retina. Dioptria é a unidade de medida que indica o poder de vergência de um sistema óptico. A distância da superfície refratora até o ponto em que os raios de luz paralelos convergem chama-se distância focal. A córnea é inervada pelos ramos sensoriais do nervo trigêmeo (V par), que são responsáveis pelas sensações de dor, temperatura e tato. Fox, 1999. A segunda túnica que compõe o globo ocular é a coroide, uma camada vascular que possui uma ampla rede de vasos sanguíneos que abastecem a parte externa da retina e as camadas internas da esclera. Na sua face anterior, está localizada a íris, que dá a coloração ao olho. A íris é um diafragma circular pigmentado que fica em frente ao cristalino. Sua borda periférica está ligada ao corpo ciliar enquanto a borda central é livre, formando uma abertura controlada neuralmente, a pupila. A íris divide o espaço interno do olho em câmara anterior, espaço limitado pela face posterior da córnea e a face anterior da íris, e câmara posterior, pequeno espaço entre a face posterior da íris e o cristalino. O tamanho da pupila é condicionado pelo equilíbrio das ações dos músculos intrínsecos do olho, os músculos esfíncter e o músculo dilatador, que integram a anatomia da íris. Yamane, 2003. O músculo esfíncter da pupila é controlado por fibras autônomas parassimpáticas que percorrem a divisão inferior do N.C. III, formam sinapse no gânglio ciliar e se projetam para o esfíncter da pupila como nervos ciliares curtos. O músculo dilatador é controlado por fibras autônomas simpáticas que acompanham a divisão nasociliar do ramo oftálmico do N.C. V, que se divide no interior da órbita em dois nervos ciliares longos. Fox, 1999. Quando a luz incide sobre a pupila, provoca a miose, a contração pupilar do olho que está

13 sendo iluminado (reflexo pupilar direto) e do olho contralateral (reflexo consensual). Esse reflexo pupilar à luz direta envolve conexões entre a retina e os neurônios do tronco encefálico que controlam os músculos que contraem a pupila. Portanto, alterações dos reflexos pupilares ou da reação à luz são indícios clínicos importantes de distúrbios do sistema nervoso autônomo. O conjunto de coroide, corpo ciliar e íris recebe o nome de úvea, por sua cor arroxeada. O diafragma da íris tem três funções importantes: regula a quantidade de luz que penetra no olho; aumenta a profundidade de foco do olho pela diminuição do orifício pupilar e reduz as aberrações cromática e esférica, especialmente sob luz intensa, quando a pupila está pequena. Davson, apud Dantas, 1995. Exatamente atrás da íris está o cristalino, a lente natural do olho. O cristalino é totalmente transparente e está preso ao corpo ciliar por fibras organizadas radialmente, as fibras zonulares. Essas fibras têm certa elasticidade, o que permite a alteração da forma do cristalino quando focalizamos para longe ou para perto. Ao olhar para longe, para o infinito (convencionado como 6 m), o cristalino está relaxado. O ponto mais distante que pode ser visto sem esforço pelo olho normal ou olho Emétrope, que mantém a medida, está situado no infinito. Ao olharmos para perto, ocorre a acomodação, na qual o cristalino altera sua face anterior, aumentando o seu poder dióptrico. O ponto mais próximo em que podemos ver em foco é chamado ponto próximo. No adulto jovem, o ponto próximo está a cerca de 10 cm. Com o passar da idade, o cristalino vai perdendo sua elasticidade e o ponto próximo se afasta, na condição chamada presbiopia. Aos 60 anos, o ponto próximo está a aproximadamente 80 cm. O cristalino contribui com cerca de 16 a 26 dioptrias para o processo de refração. Rhoades, 2008. À frente do cristalino, entre sua face anterior e a face posterior da córnea, há um espaço, a câmara anterior, cheia permanentemente de um líquido incolor, o humor aquoso, que é secretado pelos vasos sanguíneos do corpo ciliar e drenado pelas veias da esclera. O humor aquoso dá suporte metabólico ao cristalino e à parte posterior da córnea e é responsável pela pressão intraocular. Fox, 1999. Ele está sempre sendo formado e drenado para fora do olho pelas veias da esclera. Distúrbios nesse mecanismo resultarão em aumento da pressão intraocular, uma patologia chamada glaucoma, que, se não tratada corretamente, acarreta perda de fibras do nervo óptico, aumento da escavação fisiológica e alteração no campo visual, com prejuízo significativo da visão.

14 1.1 - A Retina Toda essa superestrutura intrincada existe no interesse da retina, ela mesma uma estrutura fantástica. A retina transforma luz em sinais nervosos, nos permitindo ver em condições que vão da luz das estrelas à intensidade do sol, discriminando comprimentos de onda de modo que possamos ver cores e dando precisão suficiente para podermos detectar um fio de cabelo ou uma mancha de poeira alguns metros além. (David Hubel). A camada mais interna a compor o globo ocular é a retina. Diferentemente de outras estruturas sensoriais como a cóclea ou os receptores somáticos da pele, a retina não é um órgão periférico, mas parte do sistema nervoso central. Durante o desenvolvimento, ela forma uma extensão do diencéfalo, denominada vesícula óptica, que sofre invaginação para formar o cálice óptico. A parede interna do cálice óptico produz a retina enquanto a parede externa dá origem ao epitélio pigmentar. Purves, 2005. A organização sináptica da retina é similar a de outras estruturas neurais centrais e é relativamente simples, se comparada a outras regiões cerebrais. A retina contém apenas cinco classes principais de neurônios conectados em um padrão de conexões intrincadas, mas com uma organização anatômica de camadas bem ordenada. Essa combinação de diversidade fisiológica e organização estrutural relativamente simples faz a retina muito útil para a compreensão de como as informações são processadas pelos complexos circuitos neurais. Kandel, 2000. Na retina, pela proximidade entre seus neurônios, a maior parte das comunicações celulares envolve dispersão eletrotônica (as células simplesmente hiperpolarizam ou despolarizam) e não propagação de potenciais de ação. Meiss, 2008. A importância da condução eletrotônica é que ela permite uma condução gradual ou proporcional à força do sinal. Assim, para os cones e bastonetes, o sinal hiperpolarizante de saída está diretamente relacionado à intensidade da iluminação. O sinal não é tudo ou nada, como seria no caso de condução por potencial de ação. Guyton, 2009. (figura 02) O processamento visual se inicia na própria retina, após a luz atingir as células fotorreceptoras, cones e bastonetes, onde tem início uma série de eventos mediados pelas células bipolares, horizontais, amácrinas e ganglionares. As informações processadas serão projetadas para quatro núcleos: o corpo geniculado lateral, para a percepção de objetos; o colículo superior, para o controle dos movimentos oculares; o pré-tecto, para o controle pupilar e o núcleo

15 supraquiasmático, para o controle dos ritmos diurnos e alterações hormonais. Daw, 2006. As células fotorreceptoras da retina são os cones e os bastonetes. A parte sensível à luz dos fotorreceptores é a sua parte externa, adjacente ao epitélio pigmentar. Assim, a luz que penetra no olho deve atravessar praticamente toda a retina antes de sensibilizar estas terminações. Por esta razão, alguns autores falam em retina invertida, condição presente em todos os vertebrados. Como a retina é transparente, suas camadas não significam uma barreira para os raios luminosos. Kiernan, 2003. A retina é constituída de dez camadas. Oito constituem a retina neural e duas a retina não neural. A camada mais externa, próxima à coroide, é o epitélio pigmentar da retina (EPR) e faz parte da retina não neural. Portanto, a primeira camada e a décima, que será citada mais à frente, são camadas não neurais. As células do EPR contêm melanina, material opaco que também está presente entre os cones e bastonetes, impedindo a dispersão luminosa e reflexão intraocular. O EPR participa da fisiologia da retina fornecendo vitamina A e nutrientes aos fotorreceptores e removendo resíduos metabólicos de suas terminações. A retina neural se inicia na segunda camada, a camada de células fotorreceptoras. Nela, estão as células fotossensíveis do olho humano, os cones e bastonetes. Eles são o primeiro neurônio da via visual. A disposição de cones e bastonetes é caprichosa. Os cones ocupam o centro da retina e estão agrupados principalmente na região conhecida como mácula lútea, que mede um cm de diâmetro. No centro da mácula há uma área côncava chamada fóvea, medindo cerca de 1,5 mm. Ela abriga uma região ainda menor, a fovéola, onde só há cones. Os cones do centro da retina são pequenos e estão densamente agrupados. A mácula, por isso, responde pela discriminação fina e alta acuidade visual dos seres humanos. À medida que se afastam da fóvea, os cones ficam mais longos e o espaçamento entre eles é maior. A densidade das células receptoras diminui em direção à periferia da retina e cessa totalmente na região conhecida como ora serrata. Também não há fotorreceptores na papila ou emergência do nervo óptico, o local por onde o nervo óptico sai do olho, que por esta razão recebe o nome de ponto cego. Cada olho contém cerca de 110 a 125 milhões de bastonetes e 6,3 a 6,8 milhões de cones. Os cones estão agrupados no centro e bastonetes estão

16 localizados na periferia da retina. Os cones são responsáveis pela visão fotótica (na presença de luz) e os bastonetes respondem pela visão escotópica (na sombra). Os detalhes estruturais dos cones e bastonetes são muito semelhantes, mas os bastonetes têm sido mais estudados. Os cones possuem um segmento externo de forma cônica e o pigmento iodopsina. Há três fotopigmentos associados aos cones, e eles reagem à luz de comprimentos de onda diferentes. O pico de sensibilidade espectral para o pigmento sensível ao vermelho é 560 nm, para o verde é em torno de 530 nm e para o azul, 420 nm. Os fotorreceptores correspondentes são chamados cones vermelho, verde e azul, respectivamente. Dantas, 1995. A falta de um dos sistemas de cores produz uma visão dicromática. A falta de dois, uma visão monocromática. Se os três forem inexistentes, haverá apenas visão com os bastonetes. Os bastonetes têm a forma de bastão e o seu segmento externo tem um pigmento fotossensível chamado rodopsina ou púrpura visual. Eles são extremamente sensíveis à luz e reagem mesmo com baixa luminosidade. Os bastonetes não detectam cores. Os elementos visuais dos fotorreceptores são responsáveis pela fototransdução, que é a transformação da energia luminosa em sinais elétricos biologicamente reconhecíveis, e é processada no segmento externo dos cones e bastonetes. A terceira camada da retina é a membrana limitante externa. Na verdade, ela não é uma membrana, mas sim um ponto no qual os fotorreceptores são agrupados em um tipo de junção celular chamado zônula adherens. A seguir, vem a quarta camada, a membrana nuclear externa, que contém os corpos celulares dos fotorreceptores. Eles desempenham as funções específicas de suporte metabólico e transmitem as respostas elétricas iniciadas nos segmentos externos das células fotorreceptoras. Fox, 1990. A quinta camada é a plexiforme externa, e nela ocorrem as primeiras sinapses da via visual. O termo plexiforme indica camadas sem corpos celulares, mas com sítios sinápticos. Nessa camada, as extremidades dos fotorreceptores fazem sinapse com os dendritos das células bipolares (que são o segundo neurônio da via visual) e das células horizontais. A terminação sináptica dos cones é achatada e tem o nome de pedículo. Já os bastonetes têm extremidades

17 arredondadas, as esférulas. As células bipolares transmitem os sinais visuais em direção ao córtex em uma transmissão vertical de informações. Fox, 1990. Algumas células bipolares retransmitem informações de um único cone foveal e, dessa forma, cada célula representa um só ponto no espaço. Como a concentração de cones na fóvea é alta, esta transmissão direta de informações é responsável pela alta resolução espacial e melhor acuidade visual da fóvea. Outras células bipolares recebem e integram informações provenientes de vários cones e bastonetes periféricos. O mapeamento inicial de informações de muitos para um (vários receptores fazendo conexão com uma única célula bipolar) representa um início de processamento de informações no sistema visual. A integração diminui a especificidade espacial de cada fotorreceptor, resultando em uma resolução baixa, mas, por outro lado, assegura uma integração espacial alta na retina periférica. Essa organização aumenta a sensibilidade para a detecção de luz. A camada plexiforme externa também contém células horizontais que conectam lateralmente os corpos sinápticos de cones e bastonetes, bem como se conectam com dendritos de células bipolares. As saídas das células horizontais são sempre inibitórias. Essa ação assegura a transmissão de padrões visuais com o contraste correto já que evita que os padrões excitatórios se espalhem na retina. Células bipolares e células horizontais têm ações específicas. As células bipolares estabelecem uma via direta desde os fotorreceptores até as células ganglionares. Já as células horizontais fornecem informação lateralmente para a camada plexiforme externa, influenciando a atividade tanto de células bipolares vizinhas como de fotorreceptores. Bear et al, 2007. A sexta camada é a nuclear interna, que contém os núcleos das células bipolares, cujos prolongamentos centrais formam o segundo neurônio da via visual. Nela estão contidas também células horizontais, células amácrinas e células de Muller. As células de Muller são gliócitos retinianos e foram descritas pela primeira vez por Muller em 1851 e depois estudadas por Cajal em 1892. Dantas, 1995. Como células gliais, as células de Muller dão apoio nutricional e mecânico aos neurônios da retina. Elas estão dispersas pelas camadas internas até a camada nuclear externa, ou seja, da camada 5 à camada 9. A camada 9 é a camada mais externa suprida pela circulação retiniana e não mais pela circulação da coroide. As células amácrinas não possuem axônio e por isso conduzem os impulsos bidirecionalmente. Elas integram informações das células ganglionares,

18 melhorando a detecção de limites e podem estar também envolvidas no processamento temporal de informações como o movimento da imagem visual através da retina. A sétima camada é a camada plexiforme interna. Nela há sinapses formadas por projeções das células amácrinas e axônios das células bipolares com dendritos das células ganglionares. A oitava camada é a camada das células ganglionares. As células ganglionares são os primeiros neurônios da via visual a demonstrar os verdadeiros potenciais de ação observados no SNC. Fox, 1999. A maioria das células ganglionares tem os campos receptivos com organização concêntrica, podendo ser células ganglionares com centro On ou com centro OFF. Stephen Kuffler, em 1950, foi o primeiro a gravar as respostas das células ganglionares a focos de luz. Seu estudo foi feito na retina de gatos. Kufler usou um estimulador óptico desenhado por Samuel Talbot e pode identificar a característica de células que reagem quando iluminadas no centro ou quando a luz incide em sua periferia. As células ganglionares recebem aferência de tipos específicos de células bipolares e podem ser células ganglionares do tipo M, magno, que são células grandes ou células ganglionares do tipo P, parvo, que são células pequenas. As células P constituem 90% das células ganglionares. As do tipo M representam 5%. Os demais 5% são constituídos de um tipo celular chamado células ganglionares não M e não P. Há ainda outra característica importante, pois algumas células do tipo P e células do tipo não M e não P são sensíveis a diferenças no comprimento de onda da luz. Esses neurônios sensíveis à cor são chamados de células de oposição de cores, pois a resposta a um comprimento de onda no centro do campo receptivo pode ser cancelada por outro comprimento de onda, incidindo na periferia do campo receptivo. Há oposição vermelho versus verde e azul versus amarelo. Bear et al, 2007. Os axônios das células ganglionares formam o nervo óptico, II nervo craniano, que transmite as informações visuais do olho. Esses axônios percorrem o interior da retina, formando a nona camada, a camada de fibras nervosas. A última e décima camada é a membrana limitante interna, composta de fibras colagenosas que conectam as células de Müller. Ela separa a camada de células ganglionares do humor vítreo, a substância gelatinosa que preenche o fundo do olho.

19 O sinal neural gerado na retina é transmitido ao córtex visual pelas vias visuais. Elas são constituídas de partes diversificadas, responsáveis por áreas específicas dos campos visuais. Dessa forma, através das alterações (defeitos) nos campos visuais, é possível a localização topográfica das patologias existentes. As vias visuais ou vias ópticas são constituídas pelo nervo óptico, II par craniano, quiasma óptico, tratos ópticos, corpos geniculados laterais e radiações ópticas (trato genículo - calcarino). Bicas, 1997. (figura 03) O nervo óptico tem um comprimento aproximado de 35 mm do globo ocular ao quiasma óptico. Ele pode ser dividido em quatro partes: porção interocular, com comprimento de 1 mm do disco óptico à lâmina crivosa, parte perfurada da esclera por onde ele sai do globo ocular; porção intra-orbitária, com comprimento de cerca de 25 mm, do globo óptico ao forame óptico, uma abertura em formato de S na parede da órbita. Do polo posterior do olho ao forame, seu comprimento é 18 mm, com 7 mm de comprimento extra para que ele possa realizar as rotações oculares; porção intracanalicular, com cerca de 7 mm de comprimento ao atravessar o forame junto com a artéria oftálmica. A última parte é uma porção intracraniana, com aproximadamente 10 a 12 mm de comprimento, que vai do forame ao quiasma óptico. Rhein, 2010. Cada nervo óptico contém cerca de um milhão de fibras. Após passar pelo forame na parte posterior da órbita, o N.O. segue pela parte inferior do cérebro até o quiasma óptico (do grego Khiasma, encruzilhada), onde ocorre um cruzamento parcial das fibras provenientes de cada olho. As fibras oriundas das retinas temporais seguem sua direção ipsilateralmente enquanto as fibras provenientes das retinas nasais cruzam contralateralmente. Meiss, 2008. Nos mamíferos, as relações anatômicas de projeção do campo visual para a retina e, posteriormente, para o córtex visual são muito bem elaboradas. Em invertebrados inferiores como o sapo, o cruzamento de fibras provenientes dos olhos ocorre integralmente, ou seja, as fibras provenientes de O.D. passam para o lado esquerdo, e as provenientes de O.E. passam integralmente para o lado direito. Por esta condição, o animal não tem visão binocular. Em mamíferos inferiores como o rato ou coelho, ocorre uma sobreposição parcial dos campos visuais dos dois olhos, havendo um cruzamento incompleto. Deste modo, apenas cerca de 30% da área visual do córtex cerebral recebe informação dos dois olhos e pode mediar a visão binocular. Em cães e gatos ocorre cerca de 80% de sobreposição, o

20 que confere uma visão binocular bem satisfatória. Primatas e seres humanos possuem uma visão binocular total, pois a parte nasal de cada retina se projeta para o lado contralateral. A visão binocular assegura a estereopsia, que é a noção de distância e profundidade. Thompson, 2005. Após o cruzamento no quiasma, as fibras formam os tratos ópticos, que seguem em direção ao corpo geniculado lateral, o núcleo retransmissor do tálamo. Partindo do trato óptico, alguns axônios ganglionares, em vez de seguirem para o geniculado corpo lateral (C.G.L.), seguem para alvos não talâmicos e vão inervar outras estruturas. Assim, um pequeno número de axônios se desprende e vai estabelecer conexões sinápticas com células do hipotálamo (núcleo supraquiasmático do hipotálamo), formando a via retino-hipotalâmica, via responsável por informações de claro/escuro para os ritmos circadianos. Cerca de 10% das fibras atravessa o tálamo e se dirige para o mesencéfalo e núcleo prétectal, formando a via retino pré-tectal. Essas fibras estão relacionadas com o reflexo fotomotor consensual e fotomotor direto e movimentos oculares reflexos para focalização. Há ainda axônios que formam o feixe retino tectal, com fibras que se dirigem para o colículo superior, relacionado com o controle dos movimentos oculares direcionais rápidos conjugados. A maior parte das fibras, porém, segue para o C.G.L., conduzindo as informações visuais na chamada via retino geniculado. Guyton, 2009. Os corpos geniculados laterais são os maiores e provavelmente os mais importantes núcleos visuais primários em humanos. Nele, as fibras retinofugais cruzadas ou não cruzadas são organizadas em pares homônimos. Os C.G.L. fazem parte do tálamo e estão inseridos profundamente no recesso lateral da fissura coroidal. A visualização direta é obstruída pelo giro do hipocampo, no lobo temporal. O C.G.L. apresenta seis camadas neuronais distintas e constitui o quarto neurônio das vias visuais. Ele recebe os axônios dos tratos ópticos. Os axônios cruzados do olho contralateral terminam nas camadas 1,4 e 6. Os nãos cruzados, provenientes do olho ipsilateral, terminam nas camadas 2,3 e 5. Cada camada recebe impulsos de apenas um olho. Os neurônios das quatro camadas superiores são pequenos ou parvocelulares e recebem projeções das células ganglionares reticulares. Os neurônios das duas camadas inferiores são grandes ou magnocelulares e recebem projeções das células ganglionares M da retina. A maior parte das células P é sensível à cor, e as células M não, mas as células M são

21 muito mais sensíveis a estímulos em branco e preto de baixo contraste, ou seja, a formas. Estes dois tipos de células ganglionares retinianas são a origem de duas correntes distintas no cérebro do primata e do ser humano. Thompson, 2005. Os neurônios do C.G.L. projetam-se para o córtex visual primário, a área 17 de Brodman. Os C.G.L. são mais que um simples centro de retransmissão de sinais e atuam no processamento das informações. Eles recebem impulsos de centros corticais e subcorticais, incluindo formação reticular pontina, pulvinar do tálamo e córtex visual. 80% dos axônios que chegam a cada NGL vêm do córtex visual primário, embora não exista uma explicação funcional para estas conexões de retroalimentação. O processamento dos sinais visuais ocorre por meio de uma organização sináptica altamente complexa de células de retransmissão dentro do C.G.L. Quando os axônios do trato óptico alcançam o N.G.L. terminam em um mapa ordenado do hemicampo contralateral, embora em camadas separadas. Os neurônios do C.G.L. mantêm esta ordem topográfica em sua projeção para o córtex estriado. As regiões mais periféricas da retina são representadas em regiões mais anteriores do córtex visual enquanto a fóvea é representada na parte posterior. A área cortical correspondente a cada unidade de superfície sensorial reflete a densidade de receptores que suprem a região e, assim, a representação da mácula é desproporcionalmente grande, ocupando a maior parte do polo caudal do lobo occipital. Purves, 2005. As seis camadas do C.G.L. esquerdo projetam impulsos para a IV camada do córtex visual esquerdo, e as seis camadas do C.G.L. direito projetam para a IV camada do córtex visual direito. As entradas das diferentes camadas do C.G.L. para o córtex visual são segregadas, e assim uma determinada célula na IV camada do córtex visual recebe impulso de um ou de outro olho, não de ambos. Thompson, 2005. Os axônios do C.G.L. formam as radiações ópticas ou radiações ópticas de Gratiolet. Os axônios deixam o CGL formando um feixe compacto, o pedúnculo óptico, no lobo temporal, e passam lateralmente pelo corno inferior do ventrículo lateral. A partir daí seguem em feixes ordenados relativamente ao campo visual representado. Esses feixes ocupam uma área ampla, sendo, por essa razão,

22 sujeitos a traumatismos dos lobos occipital, parietal e temporal. As lesões dessas vias suprageniculares ocasionam defeitos de campo visual característicos. Deficiências grandes dos campos visuais são chamadas de anopsias. Deficiências pequenas são escotomas. O primeiro termo é considerado com vários prefixos para indicar a região específica do campo visual a que se refere. (Figura 04) As lesões no N.O. situadas antes do quiasma óptico geram perda visual limitada a um olho. As lesões no quiasma óptico resultam em deficiências que abrangem os campos visuais de ambos os olhos, podendo afetar as fibras das retinas nasais que aí se cruzam, deixando intactas as fibras das retinas temporais que não fazem cruzamento. Lesões em estruturas mais centrais em relação ao quiasma óptico, incluindo o trato óptico, N.G.L., radiações ópticas e córtex visual resultam em deficiências limitadas ao hemicampo contralateral. As lesões em estruturas visuais centrais podem levar ao fenômeno denominado preservação de mácula, onde há perda visual de grandes áreas do campo visual com exceção da visão da fóvea. Embora a preservação da mácula esteja mais associada à lesão do córtex, pode ser um aspecto característico de qualquer lesão ao longo da via visual. As bases para esta preservação ainda não são conhecidas. Purves, 2005. As radiações ópticas terminam na área estriada (área 17 de Brodman) ou paraestriada (Área 18) no córtex occipital. O córtex visual ocupa o lobo visual, sendo definido anatomicamente como as áreas 17,18 e 19 de Brodman. Seus limites anatômicos são de difícil definição, sendo demarcados geralmente por uma linha teórica da fissura parietooccipital até a incisura têmporo-occipital. A área 17 é chamada de córtex estriado porque tem a aparência macroscopicamente estriada, contendo faixas ou linhas brancas e cinza, chamadas Estrias de Gennari. Essas estrias são fibras das radiações ópticas misturadas com fibras intracorticais que conectam o córtex estriado com outras áreas do córtex cerebral. Tais projeções neuronais mielinizadas vistas através dos neurônios locais mais escuros produzem o aspecto estriado. Fox, 1999. Elas são visualizadas mesmo a olho nu e têm esse nome porque foram descritas pela primeira vez em 1782, pelo estudante de medicina Franscesco Gennari, da Universidade de Parma. (Figura 05).

23 Conclusão: A saída do olho, após duas ou três sinapses, contém informações bem mais sofisticadas que a representação pontual do mundo codificada nos cones e bastonetes. O que foi especialmente interessante para mim foram os resultados inesperados refletidos no fracasso de que ninguém antes de Kuffer tivesse sequer imaginado que pudesse existir alguma coisa como células com campo centro-periferia ou que o nervo óptico iria virtualmente ignorar alguma coisa tão tediosa como níveis difusos de luz. Pela mesma reflexão, ninguém fazia uma ideia mesmo aproximada do que estava para aparecer nos níveis seguintes da via no cérebro. É essa falta de previsibilidade que torna o cérebro fascinante e torna ainda mais engenhosos seus trabalhos depois que nós os descobrimos. (David Hubel). 1.2 - Córtex visual O córtex visual tem sido sistematicamente pesquisado, e, por esta razão, sua estrutura é mais bem compreendida que a de outras regiões do córtex cerebral. A maioria das regiões do córtex possui seis camadas, mas o córtex visual apresenta oito camadas. Fox, 1999. Para manter a organização de Brodman de seis camadas para o neocórtex, a camada IV foi subdividida. O córtex é dividido em cinco áreas. A principal é a área V1, que recebe os sinais do tálamo. Ela é chamada de córtex visual primário ou córtex estriado e tem seis camadas, sendo que a quarta camada é dividida em quatro partes: IVA, IVB, IVCα e IVCβ. A principal função do córtex visual primário é a de decompor a imagem que chega à retina, obtendo características estruturais das informações visuais levando em conta forma, movimento e cor. O processo de interpretação dos sinais visuais é distribuído, sendo processado em vários estágios. Os sinais percebidos são mais específicos à medida que se avança. Os neurônios do córtex visual podem ser piramidais ou estrelados espinhosos. Os neurônios piramidais têm axônios que saem da área V1. Os neurônios estrelados têm apenas conexões locais. A camada 1 é formada por axônios e dendritos de neurônios de outras camadas. As radiações ópticas se projetam para as células granulosas da camada IV. As células granulosas, por sua vez, projetam-se para outros neurônios do córtex estriado. Elas também se projetam para neurônios oculomotores do tronco cerebral, ao longo do trato cortico-mesencefálico. O trato mesencefálico está envolvido na

24 geração de movimentos oculares rápidos em direção a objetos localizados dentro do campo visual. Fox, 1999. O córtex visual primário, ou área 17 de Brodman, contém um mapa topográfico da retina. A área V1 responde ao movimento, à cor, à posição do campo visual. Ela recebe projeções topograficamente organizadas do N.G.L. e, por sua vez, se projeta topográfica e/ou funcionalmente a todas as outras áreas visuais. Fox, 1999. A área 18 ou V2 circunda a área V1. Ela responde a informações sobre direção e cor, pois seus neurônios são orientados em relação às faixas do espectro e seletivos à cor e à disparidade. Pontos retinianos adjacentes da área V1 conectam-se a pontos adjacentes da área V2 e por esta razão a área V2 possui um segundo mapa topográfico da retina. Essa área projeta informações sobre a retina periférica para a área V4. A área V3 está situada na área 18 e segue próxima à V2. V3 recebe projeções diretas de V1, criando um espelho de V2. V3 responde a informações de orientação, mas não a informações para cores. A área V4 está lateral à V3 e recebe estímulos da área V2, com um menor estímulo da área V1. V4 responde aos campos grandes e à cor. Ela apresenta alguma resposta específica à orientação. A área V5 está localizada anteriormente à V4, ao longo do lobo temporal póstero-lateral e recebe projeções de V1. V5 responde sobretudo ao movimento unidirecional e não responde à cor. A área V6 foi descrita em macacos e certamente é o equivalente à área temporal súpero-medial TSM em humanos. Esta área TSM está situada anteriormente à V3 e recebe projeções complexas da área V2. Ela responde ao movimento unidirecional complexo. Todas as áreas visuais apresentam respostas corticais múltiplas e estão estreitamente interconectadas, projetando-se para pelo menos duas outras áreas corticais e para estruturas subcorticais. Fox, 1999. Do córtex visual primário, a informação visual é disseminada em mais de 30 áreas corticais diferentes para funções visuais superiores específicas, fluindo em duas direções principais: para o lobo parietal, através da via dorsal, e para o lobo temporal inferior, através da via ventral. Na via ventral (via What, ou o que ) ocorrem funções de reconhecimento, percepção de cores e discriminação de figurafundo. Na via dorsal (via Where ou Onde ), estão funções como a coordenação

25 olho-mão e a orientação espacial. Na Via ventral pode ser destacada a área IT (temporal inferior), que está relacionada à percepção e à memória visual. Parte desta área seria responsável pelo reconhecimento de faces (Bar et al., 2002). Na Via dorsal se localiza a área MST, que detecta movimentos lineares além de movimentos radiais que vão em direção a um determinado centro, bem como movimentos circulares. (Figura 06). Embora a visão se forme nas áreas estriadas e paraestriadas, esta é ainda um nível intermediário, e o processo de compreensão de imagens, resgate de memórias para as devidas identificações e entendimento do que se vê só vai ocorrer nas áreas de associação. Há indícios de associação nas áreas 17 e 18, porém, também participam do processo as áreas periestriadas 19, a área 39 do giro angular, as áreas supramarginais 40, no lobo parietal. Algumas áreas do lobo temporal e algumas conexões entre os hemisférios cerebrais por meio do corpo caloso também estão envolvidas com as funções de reconhecimento visual. Pelo exposto até aqui, cabe uma pergunta: o que significa ver? Na retina há um primeiro contacto com a imagem, a recepção e um início de processamento. Depois os sinais seguem pelos vários caminhos inicialmente a rede altamente complexa das células retinianas e depois nervo óptico, quiasma óptico, onde há um cruzamento parcial. Isso nos confere a visão binocular, ou seja, a junção da visão fornecida por um olho, com detalhes específicos, à visão fornecida pelo olho contralateral, também com suas especificidades. Mais além, as fibras retinofugais atingem várias regiões cerebrais, e é aí que vai ocorrer realmente a visão, a compreensão do que está sendo captado com os olhos. A interpretação visual ocupa muitas áreas cerebrais, muito mais que áreas específicas para outros sentidos. Neste processamento visual ocorre o resgate de memórias, a lembrança do que já conhecemos, e é esse conjunto de conhecimentos que traz a compreensão do objeto visualizado. Algumas vezes, são feitas comparações entre o olho humano e uma câmera fotográfica. Na verdade, o olho é muito mais do que uma câmera, ele é um computador dos mais sofisticados já que não só capta, mas também processa e decodifica a imagem obtida. Hubel e Wiesel afirmaram que temos que entender a visão em termos de uma hierarquia anatômica e funcional, na qual células simples alimentam células complexas, células complexas alimentam células hipercomplexas, e assim os sinais vão seguindo até chegarem ao córtex estriado.

26 À medida que técnicas de exame mais sofisticadas permitem um maior conhecimento das estruturas envolvidas no processo visual, mais é percebida a amplitude desse sistema no cérebro humano. Com as pesquisas de David Hubel e Torsten Wiesel, que receberam o Prêmio Nobel de Medicina em 1981, foi desvendado muito sobre a estrutura do corpo geniculado e do córtex cerebral. Em seu trabalho, eles fizeram a implantação de eletrodos no córtex visual de gatos e depois no de macacos. Os resultados evidenciaram a formação colunar do córtex com colunas específicas de dominância ocular para cada um dos olhos se sucedendo em áreas denominadas listras e espaços intermediários com bolhas. Em pesquisas complementares, já foram identificadas mais de 25 áreas visuais além das áreas V1 a V5. Algumas dessas áreas foram comprovadas em primatas, mas há indícios de que estejam presentes também em seres humanos. Portanto, já é conhecido que mais da metade do neocortex de primatas não humanos está envolvida no processamento de informações visuais. Fox, 1999. Quais as contribuições desses conhecimentos para a Educação? Não há dúvidas de que seja possível estimular uma criança nascida cega para despertar suas outras potencialidades, até porque exames de imagem mostram outras áreas cerebrais sendo ativadas durante atividades específicas quando não há visão. Porém, a tarefa de ensinar será mais difícil e envolverá estratégias específicas, que não são dominadas pela maioria dos professores dos primeiros anos. A preocupação com o ensino de crianças cegas não será objeto deste trabalho, mas é importante comentar que Vigotski já se preocupava com essa particularidade do processo ensino-aprendizagem para alunos com necessidades especiais, sobretudo com a criança cega. Vigotski, sem data.

27 CAPÍTULO II DESENVOLVIMENTO CEREBRAL Os educadores sempre se interessaram pelas complexidades do processo ensino - aprendizagem, e mais especificamente, porque um aluno aprende e outros não, embora sejam despendidos esforços e utilizadas estratégias variadas. No mundo atual, onde uma pluralidade de mídias e aportes de novas tecnologias atrai ou dispersa o aluno, a atividade do magistério tornou-se mais árdua. Os novos conhecimentos das Neurociências mostraram a complexidade do ser humano, mais que tudo a do ser aprendente, trazendo um novo desafio: não bastam os conhecimentos específicos de uma disciplina ou o saber como transmitir esses ensinamentos. Há que saber também como se aprende, como acontece a mágica da transmissão / fixação de conhecimentos, o que se passa no cérebro do aluno, pois, como já dizia o mestre Paulo Freire, para ensinar é preciso saber como se aprende. Contando com pesquisas e novos conhecimentos sobre as atividades cerebrais, as dificuldades de aprendizagem cada vez mais são um desafio e não uma barreira. Relvas corrobora: Diante disso é fato que diversas dificuldades de aprendizagens poderão ser resolvidas ou ao menos amenizadas, caso os educadores tenham seu olhar focalizado também em sua sala de aula como neuroanatomistas, ou seja, mantendo a ação de promover o desenvolvimento das diversas inteligências a que se expõe de forma que se compreendam os processos e os princípios das estruturas do cérebro, conhecendo e identificando cada área funcional, visando estabelecer rotas alternativas para aquisição da aprendizagem. Relvas, 2009. Dessa maneira, o estudo das Neurociências e o conhecimento que as novas pesquisas trouxeram sobre o cérebro em funcionamento, e não mais apenas do cérebro pós-morte, tem contribuído de forma significativa com o trabalho dos educadores. Enquanto Broca só pode se certificar da área cerebral que causava o

28 problema de seu famoso paciente Tan após realizar sua autópsia, hoje, os exames de imagem nos permitem estudar o cérebro em atividade, identificando o aporte sanguíneo para as áreas que estão desempenhando ou planejando uma tarefa. Sabe-se mais, também, sobre a importância de uma estimulação precoce, e já está comprovado que, nos primeiros anos de vida, a criança está mais apta a adquirir conhecimentos, e que é através dessa aquisição que são estimuladas as formações e preservadas as sinapses, arcabouço indispensável a um bom desenvolvimento cerebral. Segundo Herschkowitz, o crescimento cerebral é determinado pela interação de genes, expressão de genes e estímulos ambientais. Ele vai além, afirmando que um cérebro privado de estímulos terá uma estrutura comprometida e, assim, uma criança isolada de experiências sociais apresentará um crescimento cerebral anômalo, bem como atraso no comportamento, emoções e habilidades cognitivas. Conclui que é importante conhecer como ocorrem as etapas do desenvolvimento para tentar evitar alterações anormais enquanto isso ainda é evitável. Herschkowitz, 1988. Há muito as dificuldades de aprendizagem são estudadas. Numa revisão histórica, os primeiros especialistas que as pesquisaram foram os médicos. O final do século XVIII e o início do século XX foram marcados por um grande desenvolvimento das ciências e da psiquiatria e, a partir daí, surgiram rígidas classificações de anormais para pessoas não integradas em um comportamento pré-determinado. Os estudos de neurologia, neurofisiologia e neuropsiquiatria eram realizados em laboratórios anexos a hospícios. Não foi, portanto, estranho que os fracassos escolares fossem atribuídos a alunos duros de cabeça ou idiotas, categoria que era anteriormente confundida com a de loucos, e que fosse mesmo sugerida a criação de pavilhões especiais para abrigar essas crianças. Patto, 1990. Porém, apesar dos aportes das Neurociências cognitivas, com estudos sobre o desenvolvimento cerebral e a constatação da importância da estimulação ao desenvolvimento da criança desde as mais tenras idades, para alguns, ainda era e é mais fácil atribuir o fracasso escolar a transtornos ou mesmo a heranças genéticas, num processo chamado por Patto de medicalização do fracasso escolar.