1 UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DE TECNOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA E ENGENHARIA DE MATERIAIS SIMULAÇÃO DA LAMINAÇÃO A QUENTE DE UM AÇO LIVRE DE INTERSTICIAIS (IF) ATRAVÉS DE ENSAIOS DE TORÇÃO WILIAM REGONE SÃO CARLOS - SP 21
2 PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA E ENGENHARIA DE MATERIAIS SIMULAÇÃO DA LAMINAÇÃO A QUENTE DE UM AÇO LIVRE DE INTERSTICIAIS (IF) ATRAVÉS DE ENSAIOS DE TORÇÃO WILIAM REGONE Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciência e Engenharia de Materiais como requisito parcial à obtenção do título de DOUTOR EM CIÊNCIA E ENGENHARIA DE MATERIAIS. Orientador: Prof. Dr. Oscar Balancin Agência Financiadora: FAPESP SÃO CARLOS SP 21
3 MEMBROS DA BANCA EXAMINADORA DA TESE DE DOUTORADO DE WILIAM REGONE Apresentada ao programa de Pós-Graduação em Ciências e Engenharia de Materiais da Universidade Federal de São Carlos em 28 de Junho de 21. Prof. Dr. Oscar Balancin Orientador/PPG-CEM Prof. Dr. Dagoberto Brandã o Santos UFMG Prof. Dr. Luiz Carlos Casteletti EESC-USP Prof. Dr. Alberto Moreira Jorge Júnior UFSCar Prof. Dra. Wanda Aparecida Machado Hoffmann UFSCar VITAE DO CANDIDATO Mestre em Engenharia de Materiais pela Universidade Federal de São Carlos (1997), Engenheiro Metalúrgico pela Universidade Federal de Ouro Preto (1992).
4 AGRADECIMENTOS Ao Prof. Dr. Oscar Balancin, pela orientação. Ao Prof. Dr. Alberto Moreira Jorge Júnior, pela ajuda constante. A Fundação Amparo à Pesquisa do Estado de Sã o Paulo (FAPESP) pelo apoio financeiro. Aos técnicos Rover, Militão, Beto, Maunel Denari, Pedro, Tico, Silvano (EESC- USP). Ao Professor Dr. Luiz Carlos Casteletti, pela contribuição a este trabalho, na utilização do equipamento de microscopia ótica. Ao Professor Dr. João Manuel Domingos de Almeida Rollo, pela contribuição a este trabalho, na utilização do equipamento de dilatometria. Aos colegas Marcelo Mello, Marcelo Napoleão, Célia, José Maria (Ribamar), Estefano, Malu, Rodrigo, Ivete (UFMG), Ayres. Aos professores, funcionários e colegas do DEMa que direta ou indiretamente contribuíram para a elaboração deste trabalho. À COSIPA, pelo material fornecido.
5 SIMULAÇÃO DA LAMINAÇÃO A QUENTE DE UM AÇO LIVRE DE INTERSTICIAIS (IF) ATRAVÉS DE ENSAIOS DE TORÇÃO RESUMO O comportamento mecânico dos aços em condições de trabalho a quente está diretamente relacionado aos parâmetros de processamento tais como a deformação, taxa de deformação, temperatura, tempo de espera entre passes e taxa de resfriamento. Neste trabalho realizou-se um conjunto de experimentos em um aço IF-Ti utilizando-se ensaios de dilatometria, ensaios de torção a quente isotérmicos e contínuos, ensaios de torção isotérmicos com duas deformações, ensaios de torção com múltiplas deformações em resfriamento contínuo e simulações física da laminação de tiras a quente. Com os resultados dos ensaios de dilatometria elaborou-se o diagrama de transformação por resfriamento contínuo, determinando-se os valores das temperaturas de início e fim de transformação de fase. Através das curvas de escoamento plástico, determinou-se o tipo de processo de restauração que atua durante a deformação, sendo observado a recristalização dinâmica na austenita e a recuperação dinâmica na ferrita. Tais informações foram obtidas através da análise da variação da taxa de encruamento em função da tensão aplicada, que revela a competição entre a recuperação e a recristalização. A cinética da recristalização estática após a deformação a quente foi investigada e, também, a interação entre precipitados e os fenômenos de restauração foram investigados via microscopia eletrônica de varredura e transmissão (MEV e MET). Também foram feitas observações microestruturais, por MO, para investigar a evolução da microestrutura na ferrita após grandes quantidades de deformação. Assim, baseado na interpretação do conjunto de resultados dos ensaios citados, fez-se simulações da laminação de tiras a quente, visando o controle dos fenômenos metalúrgicos atuantes no processamento.
6 SIMULATION OF HOT ROOLING OF INTERSTICIAL FREE STEEL THROUGH TORSION TESTS ABSTRACT The plastic behavior of steels under hot working conditions is related with processing parameters such as strain, strain rate, temperature, interpass time and cooling rate. In this work, several experiments in a Ti-IF steel were carried out using dilatometer and hot torsion tests. Isothermal, double straining, on continuous cooling conditions and simulation of the hot strip mill were carried out throughout hot torsion tests. Continuous cooling transformation diagram was elaborated using dilatometric tests, indicating the values of the starting and finishing temperatures for phase transformation. Through the flow curves, restoration processes acting during deformation were determined; dynamic recrystallization for austenite and dynamic recovery for ferrite were achieved. Such information s were obtained analyzing the variations on the workhardening rate with the applied stress that indicate the competition between recovery and recrystallization. Also, the kinetic of the static recrystallization after hot deformation was analyzed and the interaction between precipitates and restorations phenomena investigated through scanning and transmission electron microscopy (SEM and TEM). Also, optical observations were carried out, in order to investigate the microstructural evolution after large-straining in the ferrite phase. Thus, based on the interpretation of the all-previous results, it was possible to carry out hot strip mills simulations, in order to control the metallurgical phenomena that act during the processing.
7 PUBLICAÇÕES - REGONE, W.; JORGE JÚNIOR, A. M. e BALANCIN, O.; Precipitation Upon Hot Strip Mill Conditions of a Ti-IF Steel ; aceito para apresentação no Microscopy and Microanalysis 21 - M&M 21; Long Beach Convention Center; Long Beach, Califórnia; USA; 5-9/8/21. - REGONE, W.; JORGE JÚNIOR, A. M. e BALANCIN, O.; Sulfide Precipitation During Hot Strip Rolling; Acta Microscopica ; trabalho completo em revista, numero regular; no prelo; 21. - REGONE, W.; JORGE JÚNIOR, A. M. e BALANCIN, O.; Sulfide Precipitation During Hot Strip Rolling; Acta Microscopica ; Sup B, resumo, no prelo; 21. - REGONE, W.; JORGE JÚNIOR, A. M. e BALANCIN, O.; Sulfide Precipitation During Hot Strip Rolling ; Trabalho apresentado no 7 Congresso Brasileiro de Microscopia de Materiais; 3 a 6 de dezembro; São Pedro; SP; 2. - REGONE, W.; JORGE JÚNIOR, A. M. e BALANCIN, O.; Metodologia para Determinar os Tipos de Amaciamento que Atuam em Processos Termomecânicos ; Trabalho apresentado no 14 Congresso Brasileiro de Engenharia e Ciências de Materiais; 3 a 6 de dezembro; São Pedro; SP; 2. - REGONE, W.; JORGE JÚNIOR, A. M. e BALANCIN, O.; Thermomechanical Properties And Microstructural Characterization Of If Steel. 9 Encontro da Sociedade Portuguesa de Materiais; Universidade de Minho, Guimarães, Portugal, no período 21 a 23 de junho de 1999.
8 - REGONE, W.; JORGE JÚNIOR, A. M. e BALANCIN, O.; Comportamento Mecânico De Um Aço IF Associado À Evolução Microestrutural Nas Regiões Intercrítica E Subcrítica. 13 Congresso Brasileiro de Engenharia e Ciência dos Materiais CBECIMAT -, Curitiba, de 6 a 8 de dezembro de 1998. - REGONE, W.; JORGE JÚNIOR, A. M. e BALANCIN, O.; Caracterizaç ão Do Comportamento Mecânico A Quente De Um Aço IF Na Região Austenítica. V Congresso de Engenharia Mecânica Norte-Nordeste, Fortaleza, 27-3 de outubro de 1998. - REGONE, W.; JORGE JÚNIOR, A. M. e BALANCIN, O.; Determinação Das Temperaturas Críticas Da Laminação A Quente. Simpósio sobre Ciência e Engenharia de Materiais no Mercosul, São Carlos, UFSCar, de 5 a 8 de outubro de 1998. - REGONE, W.; JORGE JÚNIOR, A. M. e BALANCIN, O.; Comportamento Mecânico A Quente De Um Aço IF. 53 o Congresso Anual da ABM, Belo Horizonte, de 13 a 17 de setembro de 1998.
9 SUMÁRIO Pág. BANCA EXAMINADORA... i AGRADECIMENTOS... iii RESUMO... v ABSTRACT... vii PUBLICAÇÕES... ix SUMÁRIO... xiii ÍNDICE DE TABELAS... xvii ÍNDICE DE FIGURAS... xix 1 INTRODUÇÃO... 1 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA... 3 2.1 Introdução... 3 2.2 Fundamentos Metalúrgicos da Deformação a Quente... 5 2.2.1 Encruamento... 6 2.2.2 Recuperação Dinâmica... 7 2.2.3 Recristalização Dinâmica... 8 2.2.4 Equação Constitutiva... 13 2.2.5 Recuperação Estática... 14 2.2.6 Recristalização Estática... 14 2.2.6.1 Nucleação... 15 2.2.6.2 Crescimento... 16 2.2.7 Cinética de Recristalização Estática... 16 2.2.8 Recristalização Metadinâmica... 17 2.3 Precipitação... 18 2.4 Análise da Curva Tensão Versus Deformação... 2 2.4.1 Interrelação entre Encruamento, Recuperação e Recristalização... 21 2.4.2 Amaciamento no Intervalo Entre Passes... 22 2.5 Etapas Metalúrgicas Em Processos de Conformação Mecânica... 24 2.5.1 Reaquecimento... 24
1 2.5.2 Desbaste... 25 2.5.3 Acabamento... 26 2.5.4 Resfriamento... 29 3 MATERIAIS E MÉTODOS... 31 3.1 Material... 31 3.1.2 Preparação do Material... 31 3.2 Ensaios dilatomêtricos... 32 3.3 Ensaios de Torção a Quente... 34 3.3.1 Equipamento para a Realização de Ensaios de Torção a Quente... 34 3.4 Programação dos Ensaios de Torção a Quente... 36 3.4.1 Ensaios Isotérmicos... 36 3.4.2 Ensaios Isotérmicos Interrompidos com Duas Deformações... 38 3.4.2.1 Determinação da Fração de Amaciamento Após a Deformação Quente... 39 3.4.3 Ensaios com Múltiplas Deformações em Resfriamento... 4 3.4.3.1 Cálculo da Tensão Média Equivalente (TME)... 41 3.5 Simulações de Seqüências de Passes... 42 3.6 Observações Microestruturais... 44 3.6.1 Equipamentos Utilizados nas Observações Microestruturais... 44 3.6.2 Técnicas de Preparação de Amostras... 44 3.6.2.1 Lâminas Finas... 46 3.6.2.2 Réplicas de Extração... 46 3.6.2.3 Procedimento para a Identificação de Precipitados... 47 4 RESULTADOS... 49 4.1 Introdução... 49 4.2 Diagrama de Transformação por Resfriamento Contínuo... 49 4.3 Ensaios de torção Isotérmicos e Contínuos... 51 4.3.1 Curvas de escoamento plástico... 51 4.3.2 Análise da Região Austenítica... 61 4.3.3 Análise da Região Ferrítica... 65
11 4.3.4 Análise da Evolução Microestrutural na Região Ferrítica... 67 4.4. Ensaios Isotérmicos Interrompidos Com Duas Deformações na Austenita e na Ferrita... 72 4.4.1 Observações Microestruturais... 82 4.4.1.1 Observações Microestruturais Realizadas na Amostra Reaquecida a 12 C e Temperada... 83 4.4.1.2 Observações Microestruturais Realizadas na Amostra Reaquecida a 12 C e Temperada Após Deformação a 11 C... 85 4.4.1.3 Observações Microestruturais Realizadas na Amostra Reaquecida a 12 C, Deformada e Temperada a 1 C... 88 4.4.1.4 Observações Microestruturais em Amostras Reaquecidas a 12 C, Temperadas a 92 C Após Deformação de,2... 89 4.5 Ensaios Com Múltiplas Deformações Em Resfriamento... 94 4.6 Simulação Física da Laminação de Tiras a Quente... 131 5 DISCUSSÃO... 149 5.1 Temperaturas de Início e Fim de Transição de Fase... 149 5.2 Precipitação... 151 5.3 Processos de Amaciamento que Atuam Durante a Deformação a Quente... 156 5.3.1 Durante a Deformação Isotérmica... 156 5.3.2 Durante Seqüências de Deformações... 159 6 CONCLUSÕES... 163 7 SUGESTÕES PARA TRABALHOS FUTUROS... 165 8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS... 167 ANEXO A... 173
12 1 INTRODUÇÃO Aços IF (Interstitial Free) são materiais com capacidade excepcional de serem conformados a frio, normalmente na forma de chapas, utilizados na indústria automobilística na fabricação de carrocerias de autos e outros componentes similares. O baixo teor de intersticiais reduz o limite de escoamento plástico, aumentando a formabilidade, melhorando o acabamento, e possibilitando a execução de curvaturas mais acentuadas durante a estampagem das mesmas. A combinação de composições químicas adequadas com técnicas de fabricação e processamento determinam as propriedades finais dos aços. O processo de conformação a quente consiste, inicialmente, em aquecer o material até a temperatura de encharque para a austenitização, realizar deformações programadas nas etapas de desbaste e de acabamento e em seguida promover o resfriamento controlado do material. A etapa de acabamento, durante o processo de tiras a quente na laminação de aços livres de intersticiais, é realizada com curtos tempos de espera entre passes. Sendo o intervalo entre passes pequenos, a recristalização estática não se completa, podendo ter o acúmulo de deformação de um passe para o outro e, consequentemente, o processo passa a ser controlado pela recristalização dinâmica ou metadinâmica, quando os últimos passes são efetuados no campo austenítico e ou pela recuperação dinâmica no campo ferrítico. Assim, o estudo do comportamento dos aços IF durante esta etapa de processamento exige a utilização de técnicas que possam detectar e medir os efeitos dos parâmetros que atuam durante a deformação e nos intervalos entre passes. Uma técnica experimental capaz de reproduzir estas condições de processamento e que permite investigar os mecanismos que estão operando é o ensaio de torção a quente, através das curvas de escoamento plástico e do acompanhamento microestrutural. Com ensaios de torção a quente pode-se realizar seqüências de passes impondo parâmetros de processamento tais como a temperatura de reaquecimento, a taxa de resfriamento, a quantidade de deformação, a taxa de deformação e o tempo de espera entre passes.
13 Analisando a evolução da curva de escoamento plástico em conjunto com observações microestruturais pode-se determinar o mecanismo de amaciamento dominante em cada uma das etapas de processamento, permitindo assim, determinar os eventos característicos da laminação a quente e projetar seqüências de deformações que otimizam o processamento. Neste trabalho, investiga-se o comportamento mecânico e a evolução microestrutural de um aço livre de intersticiais, através de ensaios de torção a quente, em condições próximas às do processamento industrial. Combinando ensaios isotérmicos e em resfriamento contínuo, analisa-se a atuação dos mecanismos de restauração em seqüências de deformações e discute-se o papel desses mecanismos na forma das curvas de escoamento plástico.
14 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1 Introdução Aço IF, abreviatura do termo inglês Intersticial Free, distingue-se por possuir um baixo nível de átomos intersticiais, e é usado em aplicações onde necessita-se de ótima formabilidade [1 e 2]. Este aço é elaborado em usinas integradas por um processo que envolve três etapas primordiais: o refino primário, a desgaseificação a vácuo e o lingotamento contínuo. No refino primário do aço IF, os conversores servem para remover o carbono a um nível desejável e produzir uma temperatura adequada para processamento posterior. A desgaseificação a vácuo do aço é necessária para a obtenção de níveis muitos baixos de carbono (menor que,5%). Atualmente, utiliza-se um desgaseificador do tipo RH. Neste desgaseificador, dois tubos (snorkes) refratários são imersos no interior da panela com aço líquido. Faz-se vácuo na câmara acima dos tubos, e argônio é injetado no interior da aço através de diversos pontos de injeção localizados em um dos tubos. O argônio local reduz a densidade aparente do aço e causa um movimento ascendente do aço líquido, que entra na câmara e, subseqüentemente, retorna desgaseificado à panela através do segundo tubo. Por intermédio desta diferença de densidades é estabelecido o fluxo de circulação. A descarburação ocorre pela reação: C + O CO. Devido à redução da pressão parcial do monóxido de carbono, a reação é deslocada para a direita. O teor de carbono pode ser estimado através de modelagens matemáticas aplicadas ao desgaseificador. No lingotamento contínuo a absorção de carbono pode atingir até 1 ppm, por isso o controle é feito dentro de uma margem de segurança estreita. Na prática, é necessário evitar a absorção de carbono reduzindo o teor de carbono dos refratários, eliminando o uso de isolantes contendo carbono e eliminando ou reduzindo o teor de carbono do pó moldante [3]. O aço é constituído basicamente por ferro e elementos de liga. Na produção e elaboração dos aços, os elementos químicos como silício, manganês, enxofre e titânio são adicionados intencionalmente. Os átomos
15 desses elementos dissolvem-se no cristal de forma substitucional, onde um átomo de silício substitui um de ferro no cristal, ou de forma intersticial, como exemplo, o átomo de carbono que aloja-se entre átomos de ferro, ou seja, nos interstícios da rede cristalina. Assim, uma maneira de conseguir reduzir ainda mais o nível dos solutos intersticiais é adicionar Ti e/ou Nb, pois átomos de carbono que ainda encontram-se no interstício do cristal de ferro são removidos ou capturados pela adição do titânio, que atua como elemento formador de carbonetos. Desta maneira, tem-se a obtenção de um ferro quase puro. A Figura 2.1 mostra um corte do diagrama de equilíbrio do sistema Fe-C, onde observam-se as linhas de início de transformação de fase, Ar3, e de fim de transformação de fase, Ar 1, obtidas para uma composição de carbono de aproximadamente 3 ppm (linha pontilhada). Em geral, o aço IF é classificado em função do elemento químico utilizado como formador de carboneto. Existem três tipos: aço IF com adição de titânio (IF-Ti), aço IF com adição de nióbio (IF-Nb) e aço IF com adições de nióbio e titânio (IF-Nb+Ti). Desses três, o aço IF-Ti é o mais sensível às variações de composição e de processamento [4]. 11 15 1 Austenita (fase-γ) 95 Ar 3 9 Temperatura ( o C) 85 8 75 7 65 6 Ar 1 Ferrita (fase-α) (γ + α) 55 5 45 4 Fe,5,1,15,2,25 Carbono (%) Figura 2.1 Corte do diagrama de equilíbrio do sistema Ferro-Carbono.
16 2.2 Fundamentos Metalúrgicos da Deformação a Quente No estudo da trabalhabilidade a quente de um metal ou liga metálica deve-se considerar os aspectos relativos à resistência mecânica e também as mudanças microestruturais que ocorrem em função da temperatura, deformação, taxa de deformação e intervalo entre passes [5]. Estas variações são particularmente importantes na conformação mecânica a quente, uma vez que a microestrutura obtida é a resposta intrínseca das propriedades dos materiais. Uma maneira de análise extrínseca do comportamento do material pode ser feita por ensaios de torção a quente, em escala de laboratório, gerada por uma seqüência de deformações programadas através da observação dos fenômenos metalúrgicos existentes. Os fenômenos metalúrgicos de recuperação e de recristalização são processos através dos quais um metal encruado pode ter a sua microestrutura restaurada, e assim, as suas propriedades mecânicas são restauradas, parcial ou totalmente, até um estágio semelhante ao apresentado antes do encruamento. Quando o amaciamento ocorre durante a deformação, os processos de restauração são chamados dinâmicos. Quando o amaciamento do material ocorre após a deformação ou nos intervalos entre deformações, os processos de restauração são chamados estáticos. Curvas de escoamento plástico, ou seja, curvas tensão equivalente em função da deformação equivalente, podem descrever os fenômenos metalúrgicos de amaciamento dinâmico e estático que atuam interagindo com o encruamento e também, quando existir, com a precipitação. Portanto, de forma global, todos esses dados devem ser compilados [6 e 7] e interpretados para obter-se o controle da conformação mecânica a quente. Os fenômenos metalúrgicos que ocorrem em uma seqüência de deformações serão abordados nos tópicos de Encruamento, Recuperação Dinâmica e Recristalização Dinâmica, Recuperação Estática e Recristalização Estática e Recristalização Metadinâmica. Também será analisado o fenômeno de precipitação que ocorre no material em seqüência de deformações, ou seja a precipitação induzida por deformação. O controle do proc essamento
17 termomecânico dos aços será interpretado através da análise conjunta dos fenômenos metalúrgicos e de processamento a quente. 2.2.1 Encruamento O encruamento é um dos mecanismos que contribui para o aumento da resistência mecânica dos materiais durante a deformação plástica. Sob o ponto de vista subestrutural, o encruamento é caracterizado pelo aumento da densidade de discordâncias e pelo tipo de arranjo no qual estes defeitos se apresentam. Durante a deformação plástica, podem estar presentes na rede cristalina, basicamente, duas classes de discordâncias: as móveis, através das quais tem -se mudanças de forma ou acomodações nos cristais, e as imóveis, que acumulam -se interagindo entre si de forma aleatória, aprisionando-se e formando subestruturas emaranhadas, células ou subgrãos [8 e 9]. 2.2.2 Recuperação Dinâmica Quando um material é deformado a quente ocorre a geração de defeitos cristalinos como discordâncias, lacunas e maclas. O aumento da resistência do material devido ao aumento da densidade das discordâncias é representado por seu encruamento. A Figura 2.2 é típica de um material que somente se recupera dinamicamente. Durante o encruamento as discordâncias tornam-se emaranhadas. A operação de mecanismos termicamente ativados como a escalagem e o deslizamento cruzado fazem com que as discordâncias se rearrangem formando uma estrutura celular. A recuperação dinâmica envolve o rearranjo de discordâncias, que pode alcançar o equilíbrio dinâmico entre as taxas de geração e de aniquilação de discordâncias, com a formação de células e subgrãos. Este comportamento é típico de metais com alta energia de falha de empilhamento [1 e 11].
18 Tensão Equivalente Deformação Equivalente Figura 2.2 - Representação esquemática da curva tensão versus deformação de um material que se recupera dinamicamente. Quando o equilíbrio dinâmico entre as taxas de geração e de aniquilação é alcançado, chega-se ao estado estacionário, que é caracterizado por manter a tensão constante. No estado estacionário tem-se o rearranjo contínuo dos contornos de subgrãos com a aniquilação de subcontornos antigos e formação de novos, fazendo com que o tamanho médio dos subgrãos não varie com a deformação, sendo dependente da temperatura e da taxa de deformação [11]. 2.2.3 Recristalização Dinâmica Os materiais que recristalizam -se dinamicamente tendem a formar arranjos planares de discordâncias com baixa mobilidade, sendo a taxa de aniquilação individual das discordâncias insuficiente para equilibrar a taxa de geração. A recristalização dinâmica ocorre em altas temperaturas e tem sido observada em materiais com baixa ou moderada energia de falha de empilhamento [12]. A curva tensão versus deformação, característica de um material que se recristaliza dinamicamente, apresenta um pico de tensão, a qual, com o aumento da deformação, diminui para um valor intermediário entre a de início de escoamento plástico e a de pico, como mostra a Figura 2.3.
19 Tensão Equivalente Deformação equivalente Figura 2.3 - Representação esquemática da curva de escoamento plástico de materiais que se recristalizam dinamicamente. No estágio inicial de deformação, onde a tensão aumenta com a deformação, a subestrutura desenvolvida é pouco recuperada. As células possuem paredes bastante emaranhadas e são relativamente pequenas. Com o encruamento os grãos equiaxiais vão se alongando, a tensão passa por um máximo e antes de alcançar este pico aparecem os primeiros núcleos nos contornos de baixo e alto ângulos. Quando a tensão alcança o estado estacionário, os grãos recristalizados são equiaxiais com tamanhos muito menores que os iniciais [13]. O endurecimento promovido pelo aumento da densidade de discordâncias, que indica o aumento da tensão com a deformação imposta, pode ser analisado através de curvas da taxa de encruamento (θ) em funç ão da tensão aplicada, derivando-se a curva tensão versus deformação, ou seja : θ σ = d dε Estudos realizados em monocristais CFC mostraram que em baixas temperaturas a taxa de encruamento pode ser divida em três estágios. O estágio I é uma região de encruamento com baixa linearidade, que corresponde à ativação de um único sistema de deslizamento. No estágio II aparece um encruamento linear, associado à ativação de múltiplos sistemas de escorregamento. A seguir, a taxa de encruamento diminui de forma (1)
2 aproximadamente parabólica devido a superposição dos dois fenômenos que caracterizam a recuperação dinâmica, isto é, acúmulo e rearranjos de discordâncias, que corresponde ao estágio III. Em materiais CFC policristalinos, o encruamento começa no estágio II, ou seja, não existe o estágio I, e freqüentemente é seguido pelo estágio III. Quando se produzem grandes deformações, um regime secundário de endurecimento (estágio IV) e um regime de recuperação (estágio V) podem ser observados [14-16]. Em altas temperaturas o encruamento em monocristais ou policristais puros geralmente inicia no estágio III, onde tem-se a ocorrência da recuperação dinâmica (Figura 2.4a). O estágio II é menos pronunciado com o aumento da temperatura e pode estar inteiramente ausente. A taxa de encruamento diminui com a tensão até atingir a deformação crítica para o início da recristalização dinâmica. Neste ponto, a curva da taxa de encruamento muda de inclinação até que a derivada seja igual a zero, que corresponde à tensão de pico (σp ), mostrando a ocorrência da recristalização dinâmica. A curva da taxa de encruamento pode ser extrapolada para uma tensão de saturação hipotética (σ* ss ), cuja taxa de encruamento é igual a zero, devido apenas à ocorrência de recuperação dinâmica (estágio V), Figura 2.4a. Assim, a tensão de saturação,σ* ss, fornece uma medida do amaciamento adicional que aconteceria depois do pico de tensão, σp, se o material não se recristalizase dinamicamente [17 e 18]. Resultados obtidos por vários autores [18 e 19] mostram que, na região de recuperação dinâmica a curva consiste de dois segmentos lineares distintos, como pode ser observado na Figura 2.4b. No primeiro, com uma grande inclinação, θ diminui linearmente com a tensão, sobre uma faixa significativa de tensão na curva tensão versus deformação, onde se inicia a formação de subgrãos. Na segunda parte, a curva θ x σ muda de inclinação gradualmente, até atingir um segmento com inclinação menor. Finalmente, a curva se inclina na direção de θ = (em σp) cuja inflexão, chamada σc, indica que a recristalização dinâmica teve início e se torna operante. Quando se extrapola o segundo segmento linear, através de uma linha reta, até θ =, pode-se
21 determinar o valor da tensão de saturação, quando somente a recuperação dinâmica está ocorrendo ( σ * SS ). Figura 2.4a - Representação esquemática dos estágios de encruamento em altas temperaturas em um diagrama taxa de encruamento versus tensão aplicada [17]. Figura 2.4b - Representação do comportamento da curva θ x σ, de uma curva obtida a 882 o C e 1 s -1, para o aço inoxidável austenítico tipo 34. As linhas que partem da origem identificam os pontos de início de formação de subgrãos (3) (ε.1), seu término (2) e o início da recristalização dinâmica (1) (σ c ). A linha
22 que parte do cruzamento da curva θxσ com a linha 2 e atinge o eixo das tensões em θ=, representa a extrapolação da curva θxσ, quando somente ocorre recuperação dinâmica [19]. A recristalização dinâmica inicia quando a deformação atinge um valor crítico (ε c ), que é menor que a da deformação de pico (ε p ). Sendo que esta diferença pode ser associada ao fato de que os primeiros núcleos restauram apenas localmente, enquanto o material como um todo continua a encruar. A expressão abaixo mostra esta relação, onde k é uma constante que depende do material, ou seja [2 e 21]: ε c k ε (2.1) p Os efeitos da temperatura e da taxa de deformação são descritos simultaneamente utilizando o parâmetro de Zener-Hollomon (Z) [22]: Q Z = ε& exp (2.2) RT onde Q é a energia de ativação aparente para a deformação a quente e R é a constante universal dos gases. Os valores da deformação de pico são encontrados como dependentes de Z. A deformação de pico está relacionada ao tamanho de grão inicial e Z pela seguinte expressão [5]: n P ε = A d o Z (2.3) P sendo que A, n e p são constantes dependentes do material e d é o tamanho de grão inicial. 2.2.4 Equação Constitutiva Nos processos industriais, a temperatura e a taxa de deformação variam durante a etapa de deformação, o que por sua vez se reflete no comportamento do material. McQueen e Jonas [11] têm apresentado evidências que indicam que os mecanismos que operam durante o trabalho a
23 quente são uma extensão dos que operam em condições de fluência. Assim, em trabalho a quente a tensão aplicada está relacionada com a temperatura e taxa de deformação pela equação 2.4 [2, 23 e 24]:. n Z = åexp (Q/RT) = A (senh ( α σ P)) (2.4) sendo A, n e α são constantes do material e independentes da temperatura. R é a constante universal dos gases (8,32 J/mol K), Q a energia de ativação aparente para a deformação a quente e T a temperatura absoluta durante a deformação. 2.2.5 Recuperação Estática A recuperaç ão estática, após deformação a quente, inicia-se imediatamente após a interrupção da deformação sem a necessidade de um tempo de incubação, uma vez que a aniquilação de discordâncias dá-se individualmente. Parte da energia que foi armazenada durante a deformação plástica é liberada pela aniquilação e rearranjo de discordâncias, sendo que em altas temperaturas a força motriz para este rearranjo é a diminuição da energia armazenada, causada pela poligonização. Este processo induz a formação de estruturas de células e de subgrãos. A taxa de recuperação depende das características do material, tais como, a proporção de elementos de liga, a energia de falha de empilhamento e os parâmetros de processamento como a quantidade de deformação, taxa de deformação e a temperatura imposta. Temperaturas menores e taxas de deformações maiores implicam em maior quantidade de energia armazenada, e consequentemente maior força motriz para a recuperação [25 e 26]. 2.2.6 Recristalização Estática Após o término da deformação tem-se a recuperação estática que restaura o material até uma certa proporção, sendo que o seu amaciamento ou restauração total só ocorre através da recristalização estática. Esse fenômeno