Análise de dietas enterais não industrializadas

Documentos relacionados
PERFIL DOS HOSPITAIS EM RELAÇÃO AO USO DE FÓRMULAS ENTERAIS NAS CIDADES DE UBERLÂNDIA, UBERABA E ARAGUARI- MG.

ESTRATÉGIAS NUTRICIONAIS NA ALTA HOSPITALAR E EM CASA: DIFICULDADES E SOLUÇOES NO HOSPITAL PRIVADO ANNA CAROLINA SARA FONSECA NUTRICIONISTA EMTN HSC

Terapia Nutricional Enteral cuidado e assistência domiciliar

Padronização de dietas enterais não industrializadas para uso domiciliar: a experiência de Campinas

RESPOSTA RÁPIDA 386/2013. Assunto: NUTRISON SOYA NATS GL. Dra.Sabrina Cunha Peixoto Ladeira Juiza de Direito da comarca de Pirapora SOLICITANTE

Memorial Descritivo Pregão eletrônico Nº 34/2016

COMPARAÇÃO NUTRICIONAL DE DIFERENTES FORMULAÇÕES DE PAPINHAS DE TRANSIÇÃO PARA BEBÊS

RESPOSTA RÁPIDA 49/2014 Nutren Júnior

Parte 4.

Terapia nutricional (APLV e Doença Celíaca)

Preços recuam em 15 capitais

ANÁLISE NUTRICIONAL E SENSORIAL DE SUPLEMENTOS ALIMENTARES

ELABORAÇÃO DE TALHARIM A BASE DE FARINHA DE FEIJÃO COMO FONTE ALTERNATIVA DE FERRO

ELABORAÇÃO E ACEITAÇÃO DE PÃO COM REDUÇÃO DE CLORETO DE SÓDIO E CARACTERÍSTICAS FUNCIONAIS

DESENVOLVIMENTO DE TIPO HAMBURGUER BOVINO COM ADIÇÃO DE FARINHA DE BERINJELA

DESENVOLVIMENTO DE DIETA ENTERAL ARTESANAL COM ALIMENTOS FUNCIONAIS E ANÁLISE BROMATOLÓGICA - UNIMED CAMPINAS

Há espaço para a nutrição enteral artesanal e. + semi-artesanal

Prêmio Jovem Cientista

COMPOSIÇÃO QUIMICA DE FARINHAS DE DIFERENTES ESPÉCIES DE INSETOS COMO INGREDIENTE PARA RAÇÃO ANIMAL

RESPOSTA RÁPIDA 433/2013 Nutrison

Dieta Hipercalórica e Hiperproteica

Custo da cesta básica diminuiu em 13 capitais

Memorial Descritivo Pregão eletrônico Nº 55/2017

Doze capitais têm queda no preço dos alimentos essenciais

BOAS PRÁTICAS NO PREPARO, MANIPULAÇÃO E ADMINISTRAÇÃO DA NUTRIÇÃO ENTERAL

Informativo técnico sobre a terapia nutricional enteral domiciliar,com foco para a dieta. Introdução

AVALIAÇÃO DA COMPOSIÇÃO FÍSICO-QUÍMICA DE BOLINHOS SEM GLÚTEN DO TIPO CUPCAKE ELABORADOS COM FARINHA DE AMARANTO E DE ARROZ

Preço da cesta cai em 14 capitais

Cozinha experimental de Soja RECEITAS

Cesta básica aumenta em 15 cidades

AS DIETAS PASTOSAS ARTESANAIS NA DISFAGIA: UMA SOLUÇÃO OU UM PROBLEMA?

COMO USAR A PASTA DE AMENDOIM EM 7 RECEITAS

Desenvolvimento de massa de pizza enriquecida com feijão-caupi (Vignaunguiculata (L.) Walp.)

RESPOSTA RÁPIDA 272/2014 Nutren

Cesta básica mais barata em 13 cidades

Cesta básica: preços aumentam em 16 capitais

I SEMINÁRIO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA EMBRAPA ACRE ACEITAÇÃO SENSORIAL DE BOLO ELABORADO COM FARINHAS DE CASTANHA- DO-BRASIL E BANANA VERDE

Introdução. Nutricionista FACISA/UNIVIÇOSA. 2

Cuidados no pré-operatório

Cesta Básica tem aumento em 12 cidades

Cesta básica mais barata em 13 capitais

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Embrapa Amazônia Oriental Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

2006 começa com queda no preço da cesta básica

Cesta básica mais barata em 10 capitais

18. DESENVOLVIMENTO DE PANQUECA COM QUINOA

Cesta básica está mais barata que há um ano

Cesta básica: Preços aumentam em 17 capitais

RESULTADO DE JULGAMENTO DA LICITAÇÃO TERMO DE HOMOLOGAÇÃO DO PREGÃO PRESENCIAL Nº 13/2017-PPSRP

RESULTADO DE JULGAMENTO DA LICITAÇÃO TERMO DE HOMOLOGAÇÃO DO PREGÃO PRESENCIAL Nº 03/2018 PPSRP

Cesta básica sobe em nove capitais

Cesta básica mantém tendência de alta

Cesta básica tem forte alta em novembro

Preço da carne sobe em todas as capitais

ELABORAÇÃO E ACEITAÇÃO DE BOLO DE CENOURA SEM GLÚTEN PARA PORTADORES DE DOENÇA CELÍACA

Cesta básica mais barata em 14 cidades

Cesta básica de Porto Alegre registra aumento de 4,35% em outubro de 2013

ELABORAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DE BARRAS DE CEREAIS ELABORADAS COM RESÍDUO SÓLIDO DE CERVEJARIA

Conjunto de alimentos básicos tem queda em 11 cidades

Cesta básica aumenta em quase todas as capitais

CESTA BÁSICA T EM VARI AÇÕES ENTRE -5,22% E 4,31%

Valor da cesta básica aumenta em 17 capitais em 2014

MAIORIA DAS CAPITAIS TEM REDUÇÃO NO CUSTO DA CESTA BÁSICA

Cesta básica de Porto Alegre registra queda de 0,24% em julho de 2015

Características Nutricionais das Dietas Hospitalares. Juliana Aquino

Preço da cesta sobe em nove capitais

Cesta básica aumenta em todas capitais em janeiro

Cesta básica fica mais cara em 14 capitais

Valor da cesta básica aumenta em 15 capitais

Ano começa com alta no preço da cesta básica

Preço da cesta básica aumenta em 13 cidades

Alimentação no 1º ano de vida

Valor da cesta básica aumenta em todas as capitais em 2013

Pelo segundo mês consecutivo, valor da cesta básica recua em todas as capitais

Cesta básica de Porto Alegre registra variação de 2,23% em julho

Valor da Cesta Básica aumenta em 12 cidades

RESPOSTA RÁPIDA 362/2014. Nutri Diabetic

PROGRAMA DE DISCIPLINA

Cesta básica de Porto Alegre registra queda de 2,47% em janeiro de 2014

Alimentos básicos caem em metade das capitais

ANÁLISE MICROBIOLÓGICA DA CARNE BOVINA COMERCIALIZADA IN NATURA EM SUPERMERCADOS DO MUNICÍPIO DE ARAPONGAS-PR

AVALIAÇÃO SENSORIAL DE PREPARAÇÕES COM SOJA MARROM ADICIONADOS DE FEIJÃO CARIOQUINHA

CESTA BÁSICA do município de Catalão-GO

Tipos de dietas hospitalares

PREFEITURA MUNICIPAL DE VENDA NOVA DO IMIGRANTE

I SEMINÁRIO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA EMBRAPA ACRE

Cesta Básica: preços continuam em queda

Alimentação Complementar apartir do 6º mês de vida. Marcelo Soares de Moraes Doutorando em Alimentos e Nutrição - UNIRIO

Ainda predominam os aumentos para a cesta em janeiro

Custo da Cesta básica tem comportamento diferenciado nas capitais pesquisadas

DESENVOLVIMENTO DE HAMBURGUERES COM REDUÇÃO DE SÓDIO

Cesta básica aumenta em todas capitais em 2012

PROCESSO-CONSULTA CFM 41/13 PARECER CFM 34/13 INTERESSADO:

CARACTERIZAÇÃO FÍSICO-QUÍMICA DE PRATOS TÍPICOS DA CULINÁRIA PARAENSE SERVIDOS EM PONTOS COMERCIAIS DE BELÉM/PA.

Custo da cesta básica aumenta em todas as cidades

Tratamento Dietético das DHM Tipo Intoxicação Proteica. Carla Vasconcelos Nutricionista da UND Centro Hospitalar São João Dezembro 2017

SISTEMA ESPECIALISTA BASEADO EM REGRAS PARA AVALIAÇÃO NUTRICIONAL ATRAVÉS DE MEDIDAS ANTROPOMÉTRICAS IMPLEMENTADO NO EXPERT SINTA

SINDNUT-PA Sindicato dos Nutricionistas no Estado do Pará

EXIN Nutrição SÉRIE 4MA e 4NA Assuntos 1a chamada Assuntos 2a.chamada. Nutriçao Social

Cesta básica fica mais cara em 15 capitais

Cesta básica de Porto Alegre registra variação de 1,75% em março de 2015

Transcrição:

Artigo Original Hackbarth L et al. Análise de dietas enterais não industrializadas Analysis of non-industrialized enteral diets Lucimara Hackbarth 1 Maria Eliana Madalozzo Schieferdecker 2 Danielle Rodrigues Lecheta 3 Karyne Sant ana Gonzales Gomes 4 Unitermos: Nutrição enteral. Dieta. Dietoterapia. Key words: Enteral nutrition. Diet. Diet therapy. Endereço para correspondência Lucimara Hackbarth Travessa Rafael Francisco Greca, 151, apto 91, Torre Lazzi Água Verde CEP 80620-150 Curitiba, PR, Brasil. E-mail: lucimara_hackbarth@yahoo.com.br Submissão 5 de março de 2010 Aceito para publicação 8 de janeiro de 2011 1. Nutricionista graduada pela Universidade Federal do Paraná e Especialista em Terapia Nutricional e Treinamento em Serviço pelo Hospital de Clínicas/Universidade Federal do Paraná. 2. Professora do Departamento de Nutrição/Universidade Federal do Paraná, Especialista em Nutrição Enteral e Parenteral pela Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral, Especialista em Nutrição Clínica pela UNISINOS, Membro da EMTN do Hospital de Clínicas/Universidade Federal do Paraná, Mestre em Medicina Interna e Doutora em Clínica Cirúrgica pela Universidade Federal do Paraná. 3. Nutricionista graduada pela Universidade Federal do Paraná e Especialista em Gerontologia e Saúde Coletiva, ambas pela Universidade Positivo. 4. Nutricionista graduada pelas Faculdades Integradas Espírita, Especialista em Nutrição Clínica pela Universidade Federal do Paraná, Especialista em Vigilância Sanitária dos Alimentos pela Universidade Tuiuti do Paraná e Especialista em Saúde Coletiva pela Universidade Positivo. RESUMO Introdução: A terapia enteral domiciliar vem sendo cada vez mais utilizada, pois mantém o paciente mais próximo de familiares, evita contaminações hospitalares, além de diminuir gastos com internação. Os pacientes acompanhados por Unidades de Saúde/SUS permanecem com esta terapia por tempo indeterminado e, muitas vezes, têm como única opção a nutrição enteral não industrializada, também conhecida como nutrição enteral artesanal. Objetivos: Analisar as características gerais e a composição química centesimal de macronutrientes de dietas enterais não industrializadas utilizadas no Programa de Atenção Nutricional (PAN) da Secretaria Municipal da Saúde do município de Curitiba-PR e comparar aos valores estimados por tabelas de composição de alimentos. Método: Foram selecionadas cinco dietas orientadas no PAN. Em laboratório realizaram-se análises do tempo de preparo, escoamento pela sonda, consistência, gotejamento ao final do preparo e após 3, 6, 9, 12 e 24 horas, odor e custo. Seguiram-se com análises físico-químicas das dietas em laboratório, cujos resultados foram comparados estatisticamente com estimativas a partir da Tabela Brasileira de Composição de Alimentos Taco (Brasil, 2006) e da Tabela de Composição de Alimentos ENDEF (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 1977). Resultados: O tempo médio de preparo das dietas foi de 55,5 minutos, com exceção da dieta 5, que necessitou apenas 13 minutos. Todas apresentaram bom escoamento pela sonda, gotejamento reduzido ao longo das horas de refrigeração, odor suave e custo baixo. Não houve diferença estatisticamente significativa ao comparar os resultados obtidos na análise físico-química com os estimados por tabelas. Conclusão: O tempo de preparo das dietas foi de 55,5 minutos, com bom escoamento pela sonda, odor suave, custo baixo e com composição química de macronutrientes de acordo com os valores estimados nas tabelas. ABSTRACT Introduction: The home enteral therapy has been increasingly used because it keeps the patient closer to family members, avoids hospital contamination and also reduces expenses with hospital admission. Patients accompanied by Health Centers/SUS remain with this therapy for an indefinite period and sometimes have the non-industrialized enteral nutrition, also called homemade enteral nutrition, as the only option. Objectives: To analyse the general characteristics and the centesimal chemical composition of macronutrients of non-industrialized enteral diets used in the Nutritional Attention Program, in the city of Curitiba-PR and to compare with values estimated by tables of food composition. Methods: Five diets prescribed in the Program were selected. It was analysed in laboratory the time of preparation, drainage through the feeding tube, consistency, dripping at the end of preparation and after 3, 6, 9, 12 and 24 hours, odor and cost. Then the physical-chemical analyses of the formulas were done in laboratory, and the results were compared statistically to the estimates from the TACO Food Composition Brazilian Table (Brazil, 2006) and the ENDEF Food Composition Table (Foundation Brazilian Institute of Geografy and Statistics, 1977). Results: The average preparation time of the diets was 55.5 minutes, except for diet 5 which needed only 13 minutes. All diets had good drainage through the feeding tube, reduced dripping along the hours of refrigeration, delicate odor and low cost. It was not found significant statistically difference when comparing the results obtained in the physical-chemical analysis to the estimated by tables. Conclusion: The preparation time of the diets was 55.5 minutes, with good drainage through the feeding tube, delicate odor, low cost and with chemical composition of macronutrients in agreement with the values estimated by tables. 192

Análise de dietas enterais não industrializadas Introdução O atendimento domiciliar ou home care é definido como um conjunto de procedimentos hospitalares possíveis de serem realizados na casa do paciente, visando a promoção, manutenção e reabilitação da saúde. É realizado por profissional e/ou equipe de saúde 1 e abrange desde cuidados pessoais até o uso de alta tecnologia hospitalar, como nutrição enteral e parenteral, entre outros 2. Os primeiros relatos do atendimento domiciliar no Brasil datam de 1919, quando ocorreu a criação do Serviço de Enfermeiras Visitadoras no Rio de Janeiro. Ao longo dos anos houve valorização, remodelação e expansão desses serviços 1-3. Associado ao home care vem crescendo também o uso de formulações enterais, sejam elas não industrializadas, mistas (acrescidas de produtos industrializados) ou essencialmente industrializadas. As dietas industrializadas possuem composição, osmolaridade e estabilidade definidas; risco reduzido de complicações por contaminações, além da possibilidade do uso de sondas de fino calibre, já que a maioria possui um bom fluxo. Devido a estas características, são teoricamente consideradas mais seguras e eficientes nos tratamentos 4. Entretanto, tais dietas possuem um custo elevado, o que pode impossibilitar o seu uso. Até mesmo instituições de saúde e seguradoras enfrentam dificuldades pelo custo elevado dessas dietas, quando necessitam o seu uso por períodos longos. Em seu estudo com dietas não industrializadas, Sasse et al. 4 de monstraram que elas poderiam ser até 75% mais baratas que dietas industrializadas. Além do custo, existem situações especiais, como nas alergias ou intolerâncias às dietas industrializadas, o que também pode impossibilitar seu uso. As dietas não industrializadas são produzidas com alimentos in natura, produtos alimentícios e/ou módulos de nutrientes 5, que fazem parte do esquema alimentar da população, o que permite um menor custo. As dificuldades no uso destas dietas são em relação à composição nutricional e à estabilidade. Porém, são amplamente utilizadas na terapia nutricional domiciliar, sendo que, muitas vezes, são a única opção de alimentação para os enfermos. A Secretaria Municipal da Saúde (SMS) do município de Curitiba-PR possui o Programa de Atenção Nutricional a Pessoas com Necessidades Especiais de Alimentação (PAN) 6, no qual são acompanhados indivíduos com alimentação via sonda, além de outros com situações específicas. Segundo o protocolo desse programa, indivíduos maiores de 10 anos são atendidos com dieta não industrializada e acompanhados por nutricionistas e demais profissionais da equipe da US, tanto a nível ambulatorial quanto em domicílio. A possibilidade do fornecimento de produtos industrializados (dietas industrializadas, suplementos alimentares e módulos de nutrientes) pode ser avaliada pela SMS com base na justificativa clínica do nutricionista da US, porém, segundo os critérios descritos no protocolo, pode ocorrer por no máximo 3 meses e fornecer até 50% da necessidade energética do paciente. Portanto, com exceção dos pacientes cujas famílias optam por comprar dietas industrializadas, os indivíduos maiores de 10 anos fazem uso de dieta não industrializada. Tendo em vista esta situação, o objetivo deste trabalho é analisar a composição química centesimal dos macronutrientes e as características gerais de cinco dietas enterais não industrializadas utilizadas no PAN, e comparar os resultados com tabelas de composição de alimentos. Método Foram selecionadas cinco dietas orientadas no PAN. A descrição e a quantidade de ingredientes das dietas foram relacionadas (Tabela 1) para a confecção e análise dos resultados. Foram seguidos os seguintes modos de preparo de acordo com o protocolo do Programa de Atenção Nutricional: dieta 1: preparou-se os vegetais a serem utilizados, higienizandoos e descascando-os. Após lavar o arroz e picar a carne, estes ingredientes foram submetidos à cocção em 600 ml de água fervente, em panela de pressão, por 15 minutos. Após resfriamento, acrescentou-se 400 ml de leite desnatado, liquidificandose a mistura por 4 minutos, em velocidade alta, para então coar duas vezes em peneira fina. Após adição de açúcar, óleo, sal, leite em pó e 100 ml de água, liquidificou-se novamente a mistura por 4 minutos e peneirou-se mais duas vezes em peneira fina. dieta 2: em relação aos vegetais, arroz e carne, procedeu-se como na dieta 1. Estes ingredientes sofreram cocção em 500 ml de água fervente, em panela tampada, por 15 minutos, adicionandose a clara de ovo nos últimos 5 minutos. Após a cocção, com o fogo desligado, acrescentou-se 400 ml de leite desnatado, deixando resfriar. O conteúdo foi liquidificado por 4 minutos, em velocidade alta, e coado duas vezes em peneira fina. Após adição de farinha de arroz, açúcar, óleo, leite em pó e 500 ml de água, liquidificou-se novamente a mistura por 4 minutos e peneirou-se mais duas vezes em peneira fina. dieta 3: em relação aos vegetais, arroz e carne, procedeu-se como na dieta 1. Estes ingredientes sofreram cocção em 800 ml de água fervente em panela por 20 minutos, adicionando-se o ovo inteiro e a clara de ovo nos últimos 10 minutos. Após a cocção, com o fogo desligado, acrescentou-se 200 ml de água, deixando resfriar. Acrescentou-se 400 ml de leite desnatado e o conteúdo foi liquidificado por 4 minutos, em velocidade alta, e coado duas vezes em peneira fina. Após adição de farinha de arroz, açúcar, óleo, leite em pó e 200 ml de água, liquidificouse a mistura novamente por 4 minutos e peneirou-se mais duas vezes em peneira fina. dieta 4: em relação aos vegetais, arroz e carne, procedeu-se como na dieta 1. Estes ingredientes sofreram cocção em 400 ml de água fervente em panela por 15 minutos, adicionando-se a clara de ovo nos últimos 3 minutos. Após a cocção, deixouse esfriar a mistura por 15 minutos, em panela tampada. O conteúdo foi liquidificado por 4 minutos, em velocidade alta, e coado duas vezes em peneira fina. Após adição de farinha de arroz, açúcar, óleo, leite em pó e 150 ml de leite integral, liquidificou-se novamente a mistura por 4 minutos e peneirou-se mais duas vezes em peneira fina. dieta 5: todos os ingredientes foram liquidificados por 4 minutos em velocidade alta e em seguida peneirados 3 vezes em peneira fina. 193

Hackbarth L et al. Tabela 1 Descrição e quantidade de ingredientes utilizada nas cinco dietas analisadas, calorias totais e rendimento final. Alimentos (g ou ml) D1 D2 D3 D4 D5* Cenoura 100 100 100 50 40 Arroz branco 45 55 75 10 50 Batata 65 65 60 65 - Feijão (grão) - - - - 40 Carne bovina magra 90 80 150 20 20 Açúcar 40 50 80 10 - Leite em pó integral 50 60 100 20 - Leite desnatado longa-vida 400 400 400 - - Leite integral longa-vida - - - 150 200 Óleo de soja 15 20 20 5 5 Farinha de arroz - 21 15 7 - Ovo - - 50 - - Clara de ovo - 30 30 30 - Sal 1 1 1 - - Água 700 1000 1200 400 50 Valor calórico** 1029 1278 1797 497 320 Rendimento final 1200 1500 1700 500 400 Fonte: Programa de Atenção Nutricional 6. * Dieta confeccionada apenas com alimentos cozidos. ** Valor calórico calculado pela Tabela de Composição de Alimentos TACO 7. Para leites fluidos e farinha de arroz utilizaram-se valores nutricionais de rótulos de alimentos. Durante o preparo das dietas, observaram-se características gerais, como: tempo de preparo, escoamento por equipo macrogotas para dieta não industrializada e por sonda de fino calibre, consistência, gotejamento ao final do preparo e após 3, 6, 9, 12 e 24 horas e odor. O custo médio foi apurado por meio de pesquisa direta em três supermercados da cidade de Curitiba - PR, verificado em moeda vigente (real) por grama ou ml de cada ingrediente, no mês de novembro de 2009. As análises físico-químicas foram realizadas em duplicata no Laboratório de Tecnologia de Alimentos do Departamento de Nutrição da Universidade Federal do Paraná (UFPR). A composição química centesimal foi determinada segundo a metodologia preconizada pela AOAC (Association of Official Analytical Chemists), 1990 8. Utilizou-se o método de dessecação em estufa para análise da umidade, calcinação em mufla a 550 C para cinzas, método de Bligh e Dyer para lipídeos e método de Kjedahl para determinação do nitrogênio total, sendo utilizado o fator 6,25 para conversão do nitrogênio total em proteína bruta. Carboidratos foram determinados por diferença. Os dados obtidos nas análises físico-químicas foram comparados estatisticamente com a Tabela Brasileira de Composição de Alimentos TACO 7 e a Tabela de Composição de Alimentos ENDEF 9. Não foi possível estimar a composição da dieta 5 a partir da Tabela de Composição de Alimentos ENDEF 9, já que a mesma não possui lista de alimentos cozidos. Os resultados obtidos foram submetidos à análise de variância ANOVA e as médias foram comparadas pelo teste de Tukey (p<0,05) 10. Resultados O tempo médio de preparo das dietas foi de 55,5 minutos. As dietas 1, 2, 4 e 5 foram classificadas como de consistência líquida, apenas a dieta 3 teve uma consistência mais concentrada. Apesar disso, todas as dietas testadas tiveram um bom escoamento pela sonda (Tabela 2). O gotejamento de todas as dietas diminuiu à medida que passava o número de horas de refrigeração. A dieta 5 apresentou o maior gotejamento, enquanto a 3 apresentou o menor. Todas as dietas foram classificadas como de odor suave. Em relação ao custo financeiro, a dieta 3 apresentou maior valor. Porém, de um modo geral, todas apresentaram baixo custo (Tabela 2). Pela análise estatística realizada, não houve diferença significativa entre os resultados encontrados em laboratório e os estimados utilizando as tabelas TACO 7 e ENDEF 9 nas cinco dietas analisadas (Tabela 3). Discussão O tempo médio de preparo das dietas foi considerado baixo (13 a 66 minutos), o que é bastante positivo. A dieta 5 apresentou o menor tempo de preparo, pois os alimentos já estavam cozidos. Araújo & Menezes 11 analisaram o tempo de preparo de quatro formulações não industrializadas preparadas com alimentos convencionais de baixo custo financeiro, como: carne bovina, arroz, açúcar refinado, fubá de milho, ovo, chicória, cenoura, óleo de soja, sal, Soymilk e Nidex. O menor tempo de preparo observado no estudo citado foi de duas horas e dez minutos, mais do que o dobro do tempo médio encontrado no presente estudo. Todas as dietas testadas apresentaram bom escoamento. Isto ocorreu pelo fato de que os ingredientes in natura foram cozidos antes de serem liquidificados e os produtos finais foram coados em peneira fina, reduzindo a presença de resíduos na dieta pronta. Quando os alimentos são misturados em liquidificador, podem tornar a solução viscosa e de difícil infusão via sonda, havendo a necessidade de uso de sondas de maior calibre, causando 194

Análise de dietas enterais não industrializadas Tabela 2 Análise das características gerais das cinco dietas analisadas. ANÁLISES DIETA 1 DIETA 2 DIETA 3 DIETA 4 DIETA 5 Tempo de preparo (minutos) 46 49 61 66 13 Escoamento pela sonda fácil fácil fácil fácil fácil Consistência líquida líquida concentrada líquida líquida Gotejamento (gotas por minuto) - final do preparo 148 186 64 114 206 - após 3 horas 128 136 24 94 200 - após 6 horas 99 110 24 78 200 - após 12 horas 99 66 16 44 170 - após 24 horas 99 62 16 30 152 Odor suave suave suave suave suave Custo (R$) 3,34 3,60 4,93 1,31 0,82 Tabela 3 Composição química centesimal das cinco dietas analisadas em laboratório e estimadas segundo a Tabela de Composição de Alimentos TACO e a Tabela de Composição de Alimentos ENDE. UMIDADE (%) CINZAS (g) LIPÍDEOS (g) PROTEÍNAS (g) CARBOIDRATOS (g) DIETA 1 - Analisada 82,7 a 0,84 a 2,12 a 3,99 a 10,35 1a - TACO 76,79 a 0,72 a 3,08 a 3,99 a 11,16 a - ENDEF 76,58 a 0,82 a 2,92 a 4,21 a 11,45 a DIETA 2 - Analisada 82,79 a 0,7 a 2,16 a 3,46 a 10,89 1a - TACO 80,2 a 0,6 a 2,82 a 3,56 a 11,2 a - ENDEF 80,03 a 0,7 a 2,83 a 3,73 a 11,2 a DIETA 3 - Analisada 77,05 a 0,77 a 4,3 a 4,82 a 13,06 1a - TACO 86,23 a 0,72 a 3,68 a 4,93 a 12,98 a - ENDEF 87,33 a 0,85 a 4,19 a 5,5 a 13,01 a DIETA 4 - Analisada 81,61 a 0,71 a 3,93 a 3,44 a 10,31 1a - TACO 85,89 a 0,87 a 3,21 a 4,31 a 11,02 a - ENDEF 83,73 a 0,84 a 3,59 a 4,56 a 11,72 a DIETA 5 - Analisada 83,93 a 0,6 a 3,73 a 3,46 a 8,28 1a - TACO 41,15 a 0,63 a 3,55 a 3,97 a 7,84 a - ENDEF 2 1 Calculado por diferença 2 Tabela ENDEF não possui alimentos cozidos a Letras iguais não diferem estatisticamente entre si desconforto ao paciente e maior risco de pneumonia por aspiração pulmonar. As dietas analisadas não tiveram este problema. O escoamento está diretamente relacionado à consistência da dieta. Quanto mais concentrada, maior a dificuldade de escoamento, como foi o caso da dieta 3, que apresentou a maior consistência pelo fato de possuir maior quantidade de arroz branco e carne bovina que as demais. O arroz incorpora líquidos, aumenta o volume e torna as preparações mais consistentes. Além disso, essa dieta possui um ovo inteiro, além de uma clara, o que não foi observado nas demais dietas (as dietas 1 e 2 possuem apenas uma clara, enquanto que as outras não são compostas por este ingrediente proteico). Outro fato é que o tempo de cocção após a adição do ovo e da clara foi maior na dieta 3 que nas demais. Enquanto nas dietas 2 e 4 as claras foram cozidas durante cinco e três minutos, respectivamente, na dieta 3, o ovo e a clara foram cozidos por dez minutos, tornando a dieta muito mais consistente. 195

Hackbarth L et al. No estudo de Araújo & Menezes 11, já citado anteriormente, o escoamento e a consistência das quatro dietas formuladas também foram analisados, obtendo dietas homogêneas, de aspecto uniforme e de bom escoamento no equipo. Os autores observaram que a adição de uma menor quantidade de carne em suas formulações tornou as soluções mais fluidas e que as dietas não deveriam ser acondicionadas em refrigerador, para evitar o aumento da viscosidade. A diminuição do gotejamento ao longo das 24 horas de refrigeração das dietas pode ser explicado pelo aumento de consistência que ocorre durante o armazenamento em refrigeradores, o que dificultou seu escoamento pela sonda. Por este e outros motivos, como contaminações e crescimento de microrganismos, recomenda-se que as dietas sejam utilizadas logo após sua confecção e que se evite seu armazenamento por mais de 12 horas. A dieta 3 apresentou o menor gotejamento, devido às características de seus ingredientes e tempo de cocção, como já discutido anteriormente. Em relação à análise de gotejamento, o presente estudo teve resultados parecidos com o estudo já citado 11. Os gotejamentos encontrados foram de 60 a 80 gotas/minuto, para as formulações que não continham arroz, e de 22 a 26 gotas/minuto, para a formulação que continha esse ingrediente. O odor suave das dietas é uma característica positiva, já que o cheiro dos alimentos influencia no processo psicológico dos pacientes e seus cuidadores. Apesar do paciente não sentir o sabor das dietas, o odor agradável pode evitar que o mesmo repudie a alimentação pela sonda. A dieta 3 foi a de maior custo financeiro, devido à quantidade de carne utilizada para sua confecção. De um modo geral, o custo das dietas foi baixo, característica importante devido às dificuldades e restrições socioeconômicas de muitos pacientes acompanhados pelo Programa da SMS. Resultado semelhante foi observado por Henriques & Rosado 12, que elaboraram cinco formulações dietéticas nutricionalmente equilibradas a partir de alimentos convencionais (leite mais frutas, caldos de vegetais mais suplemento proteico, mingaus de leite mais suplemento proteico, fórmulas infantis adaptadas e extratos de frutas concentrados). Os autores encontraram um valor médio de R$ 6,12 ao dia e concluíram que as dietas não industrializadas elaboradas apresentavam custo quatro vezes menor que o de dietas industrializadas disponíveis no mercado. O fato das composições centesimais em relação aos macronutrientes das cinco dietas analisadas em laboratório não possuírem diferença estatisticamente significativa, quando comparadas às estimadas pelas tabelas TACO e ENDEF, é um ponto muito positivo, mostrando que a forma de preparação não comprometeu a composição química centesimal. As orientações realizadas por nutricionistas em visitas domiciliares, assim como a ação conjunta dos demais membros das equipes multidisciplinares de terapia nutricional domiciliar, são importantes para prevenir e/ou corrigir erros no preparo e manipulação das dietas artesanais, garantindo a preparação de fórmulas mais estáveis, nutricionalmente equilibradas e com menor risco de contaminação, contribuindo para a manutenção e/ou recuperação do estado nutricional dos pacientes. Também é fundamental que os nutricionistas testem as formulações enterais não industrializadas antes de orientar o seu uso, a fim de certificar-se da sua adequação em relação à consistência e ao escoamento através do equipo, prevenindo dificuldades durante a sua administração ao paciente domiciliar. Conclusão O presente estudo demonstrou que as dietas apresentaram tempo de preparo menor de 60 minutos, bom escoamento pela sonda e consistência líquida, com exceção da dieta 3, que ficou mais concentrada. As preparações apresentaram diminuição do gotejamento devido ao armazenamento em refrigeração, odor suave e baixo custo financeiro. Não houve diferença estatisticamente significativa em relação à composição centesimal de macronutrientes entre os resultados encontrados na análise físicoquímica realizada em laboratório e os estimados utilizando as tabelas de composição de alimentos TACO e ENDEF. Referências 1. Fabrício SCC, Wehbe G, Nassur FB, Andrad JI. Assistência domiciliar: a experiência de um hospital privado do interior paulista. Rev Latino-Am. Enfermagem 2004;12 (5):721-6. 2. Floriani CA, Schramm FR. Atendimento domiciliar ao idoso: problema ou solução? Cad Saúde Pública. 2004;20 (4):986-94. 3. Araújo EM, Menezes HC. Composição centesimal, lisina disponível e digestibilidade in vitro de proteínas de fórmulas enterais para nutrição enteral ou oral. Ciênc Tecnol Aliment. 2005;235(4):768-71. 4. Sasse AP, Wady MTB, Verruma-Bernardi MR. Formulação de dietas enterais hiperprotéicas não-industrializadas e suas análises físicas, sensorial e de custo. Nutr Bras. 2003;2:349-55. 5. Mitne C. Preparações não-industrializadas para nutrição enteral. In: Waitzberg DL, ed. Nutrição oral, enteral e parenteral na prática clínica. 3ª ed. São Paulo: Atheneu;2006. p.629-40. 6. Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba. Protocolo do Programa de Atenção Nutricional a Pessoas com Necessidades Especiais de Alimentação. Curitiba:Secretaria Municipal da Saúde;2009 (versão preliminar). 7. NEPA/UNICAMP. Tabela brasileira de composição de alimentos (TACO). Versão 2. 2ª ed. Campinas:NEPA/UNICAMP;2006. 113p. 8. Association of Official Analytical Chemists. Offic i a l m e t h o d s o f a n a l y s i s. 1 5 t h e d. Wa s h i n g t o n : AOAC;1990. 9. Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Estudo nacional de despesa familiar. Tabela de composição de alimentos. 4ª ed. Rio de Janeiro:IBGE;1977. 10. Ferreira SMR. Controle da qualidade em sistemas de alimentação coletiva I. São Paulo:Varela;2002. p.22. 11. Araújo EM, Menezes HC. Formulações com alimentos convencionais para nutrição enteral ou oral. Ciênc Tecnol Aliment. 2006;26(3):533-8. 12. Henriques GS, Rosado GP. Formulação de dietas enterais artesanais e determinação da osmolalidade pelo método crioscópico. Rev Nutr. 1999;12(3):225-32. Local de realização do trabalho: Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil. 196