COMPARTIMENTAÇÃO GEOMORFOLÓGICA DA BACIA DO RIO DOCE: UMA ATUALIZAÇÃO COELHO; A. L. N. 1

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Transcrição:

COMPARTIMENTAÇÃO GEOMORFOLÓGICA DA BACIA DO RIO DOCE: UMA ATUALIZAÇÃO COELHO; A. L. N. 1 1 Doutorando pela UFF andré.ufes@bol.com.br RESUMO A Bacia Hidrográfica do Rio Doce localiza-se na Região Sudeste do Brasil entre os estados de Minas Gerais e Espírito Santo, com uma extensão total de 853 km e uma área de drenagem com cerca de 83.400 km², dos quais 86% pertencem ao Estado de Minas Gerais e o restante (14%) ao Estado do Espírito Santo sendo, portanto, uma bacia de domínio federal (ANA, 2001). O presente artigo tem como objetivo fazer uma revisão das propostas de classificação das formas de relevo encontradas no interior da bacia do rio Doce, a partir de trabalhos desenvolvidos em toda a sua extensão ou parte da bacia, complementados com a interpretação de imagens de satélite e trabalhos de campo, de maneira a reunir todos os traços típicos do relevo, entender sua dinâmica e o reflexo no modelado fluvial, propondo uma classificação mais detalhada e atualizada da bacia. A linha teórica e metodológica foi baseada a partir da revisão de várias propostas de análise e compartimentação do relevo, a exemplo do Radambrasil (1987), Nunes (1995), Souza (1995), tendo como principal fio condutor os pressupostos teóricos de Walter Penck (1953) até a proposta de compartimentação do relevo de desenvolvida por Ross (1990, 1992 e 2001), esta considerada a mais apropriada na representação dos fatos geomórficos de grandes dimensões e em escalas pequenas e médias, ordenada em seis níveis taxonômicos. Neste trabalho serão utilizados apenas os três primeiros níveis taxonômicos em conformidade com a área de bacia. O primeiro taxon refere-se às Unidades Morfoestruturais geológicas que definem e sustentam um determinado padrão de grandes formas do relevo; o 2º nível trata das Unidades Morfoesculturais representando os compartimentos e subcompartimentos do relevo (ou regiões) pertencentes a uma determinada morfoestrutura e o 3º nível taxonômico é representando pelas Unidades Morfológicas caracterizado por um padrão de semelhanças entre si em função da rugosidade topográfica, bem como do formato de topos, vertentes, vales e etc. O resultado desta análise apresentou-se extremamente satisfatório, pois permitiu não apenas conhecer melhor a estrutura, os modelados, como também, identificar os principais processos que operam no interior da bacia, e que por sua vez influenciam no modelado fluvial, mostrando-se como um importante instrumental de apoio na execução de diversas categorias de planejamento e gestão, a exemplo, das bacias hidrográficas. Palavras-chave: Geografia Física, Bacia do Rio Doce, Unidades de Relevo, Geomorfologia Fluvial. INTRODUÇÃO Este trabalho nasceu da necessidade de se ter uma melhor compreensão da dinâmica e das formas de relevo encontradas no interior da Bacia Hidrográfica do Rio Doce, e que por sua vez influenciam no modelado de relevo fluvial (área de estudo da tese em doutoramento). Trabalhos desta natureza foram realizados como os de Strauch (1955) um dos primeiros estudos geográfico\geomorfológico no interior da bacia, o projeto Radambrasil (1987 a, b) que fez um estudo em toda a bacia, porém não publicou parte do Alto Rio Doce e, por fim, o trabalho de Souza (1995) que realizou um estudo com enfoque na neotectônica, propondo uma classificação. O presente artigo tem como objetivo fazer uma revisão das propostas de classificação das formas de relevo encontradas no interior da bacia do rio Doce a partir de trabalhos desenvolvidos em toda a sua extensão ou parte da bacia, complementados com a 1

interpretação de imagens de satélite e trabalhos de campo, de maneira a reunir todos os traços típicos do relevo, entender sua dinâmica e o reflexo no modelado fluvial, propondo uma classificação mais detalhada e atualizada. A Bacia Hidrográfica do Rio Doce está localizada na Região Sudeste do Brasil entre os estados de Minas Gerais e Espírito Santo nos paralelos 17 45' e 21 15' de latitude sul e os meridianos 39 55' e 43 45' de longitude oeste. Possui uma extensão total de 853 km e uma área de drenagem com cerca de 83.400 km², dos quais 86% pertencem ao Estado de Minas Gerais e o restante (14%) ao Estado do Espírito Santo sendo, portanto, uma bacia de domínio federal 1. A bacia abriga um total de 224 municípios (MG e ES) com uma população superior a três milhões de habitantes (IBGE 2000). A economia está baseada principalmente na mineração: Quadrilátero Ferrífero de Minas Gerais com a extração de minérios ferro (hematita, itabirito, itacolomito e canga), escoado pela Estrada de Ferro Vitória-Minas em direção ao Porto de Tubarão no Espírito Santo; indústria como a siderurgia, metalurgia e celulose; na atividade de agricultura a pecuária de leite e corte, café e cacau. Atualmente há a extração de Gás Natural e Petróleo junto à planície costeira e plataforma interna (bacia do Espírito Santo). O clima que atua no interior da bacia é o tropical úmido, estando caracterizado, entretanto, por uma não uniformidade climática. Esta diversidade é explicada por um conjunto de fatores, sobretudo, pela posição geográfica, pelas características de relevo e do encontro de massas de ar que atuam no interior da bacia, como é o caso das massas de ar influenciado pelo Sistema Tropical Atlântico que predomina grande parte do ano, e também, do Sistema Equatorial Continental, ocasionando Linhas de Instabilidade a Tropical, sobretudo no verão, provocando chuvas intensas, com cerca de 60% do total das chuvas anuais. Normalmente, a estação chuvosa se inicia em novembro e se prolonga até maio com uma distribuição heterogênea no interior da bacia, mas como totais anuais superiores a 700 mm. As regiões de maior altitude e as litorâneas são as que apresentam maiores totais anuais, variando entre 900 mm e 1500 mm. Os fundos de vales e regiões deprimidas são as que apresentam menores totais anuais, variando entre 700 e 1000 mm. O regime fluvial do rio Doce é perene e, de modo geral, acompanha a pluviosidade (cheia, com os níveis máximos ocorrendo nos meses de em dezembro, janeiro e março; e vazante a partir de abril a setembro). Quase a totalidade da bacia apresenta-se temperaturas médias 1 De acordo com o Artigo 20, parágrafo III da Constituição Federal. São bens da União: [...] III. os lagos, rios e quaisquer correntes de águas em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os territórios marginais e as praias fluviais; VIII. os potenciais de energia hidráulica. 2

anuais elevadas durante boa parte do ano e, mesmo nos meses mais frios, as temperaturas médias são superiores a 18º C. No litoral, a temperatura média anual é superior a 24ºC. Essas condições climáticas proporcionam normalmente: A maior velocidade de decomposição sofrida pelos minerais constituintes do material de origem (rocha); Maior atividade no processo de pedogênese dos solos tropicais; Rápida degradação do solo, por efeitos de lixiviação, erosão, intensificados pela ação do homem; Inundações periódicas ou drenagem imperfeita dos solos nas regiões baixas. De acordo com a EMBRAPA (1999) há o predomínio de duas classes de solos na bacia sendo a primeira o Latossolo Vermelho-Amarelo distrófico e/ou álicos, encontradas principalmente nos planaltos dissecados desde o plano e suave ondulado até montanhoso. A segunda classe é o Argissolo (Podzólico) Vermelho-Amarelo ocorrendo desde relevo plano e suave ondulado até o forte ondulado e montanhoso, com predominância do último. Outros solos que ocorrem em menor proporção são: Latossolo Ácrico, Cambissolo, Neossolo Litólico e Neossolo Regolítico. Quanto aos problemas erosivos, duas áreas da bacia se destacam pela concentração desses focos. Uma delas é situada nas sub-bacias dos rios Casca e Matipó (Médio Rio Doce) e a outra localizada nas sub-bacias dos rios Suaçui Grande, Caratinga e o rio Doce entre Baguari e Emê. Relacionado a este processo Almeida e Carvalho (1993), apontam que a bacia é uma das mais prolíficas na produção de sedimentos decorrente de um conjunto de causas, entre elas às concentrações de precipitações, associadas aos solos e as grandes declividades nos limites e interior da bacia, potencializada pelo uso e manejo do solo inadequado. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA A fundamentação teórica foi baseada a partir dos pressupostos teóricos de Walter Penk (1953 in Ross 1990) no qual o relevo é o resultado da atuação conjunta de processos endógenos e exógenos. Os primeiros são emanados do interior da Terra, a exemplo da dinâmica da tectônica de placas, resultando em orogênese, afundamentos, falhamentos, vulcanismos, terremotos, entre outros processos. A segunda processa-se através da ação de fenômenos externos como a atuação do clima (pretérito e atual) resultando em processos de intemperismo, formação de solos, erosão, transporte, deposição de sedimentos. Ambos os processos envolve o aspecto temporal (escala de tempo do homem/histórica e a escala de tempo geológico), escala do espaço, além do homem como um dos principais agentes externos de modificação do relevo. A partir dos pressupostos de Penck (op. cit), Mecerjakov (1968) desenvolveu os conceitos de morfoestrutura (estrutura/litologias 3

associadas a sua gênese) e morfoescultura (resultado da ação climática em determinada estrutura) usadas neste trabalho. A escolha da metodologia utilizada para a presente classificação ocorreu após uma exaustiva revisão de propostas de mapeamento geomorfológico como a do Radambrasil (1987 a, b) 2, IBGE (1995), Souza (1995), entre outras, sendo selecionada a proposta taxonômica de relevo desenvolvida por Ross (1990, 1992 e 2001). Esta além de ser mais atualizada/aperfeiçoada é considerada a mais apropriada para a representação dos fatos geomórficos de diversas escalas, e que valoriza também o uso de imagens satélite como um instrumento a mais na identificação de padrões e formas de relevo. A proposta é baseada em seis níveis taxonômicos, sendo neste trabalho utilizados apenas os três primeiros níveis, em conformidade com a escala da área da bacia. O primeiro taxon corresponde às unidades morfoestruturais, representando a maior extensão em área, sendo identificado a partir de imagens de satélite, complementado com trabalhos de campo e de cartas geológicas. Este taxon organiza a causa dos fatos geomorfológicos derivados de aspectos amplos da geologia como os aspectos estruturais. O segundo taxon trata das Unidades Morfoesculturais representando os compartimentos e subcompartimentos do relevo (ou regiões 3 ) pertencentes a uma determinada morfoestrutura. É identificado também com auxílio de imagens de satélite e controlado por meio da investigação de campo. O terceiro taxon está relacionado com as Unidades Morfológicas ou padrões de formas semelhantes contidos nas unidades morfoesculturais, correspondendo as manchas de menor extensão territorial, definidas por um conjunto de formas de relevos, que guardam em si elevado grau de semelhança de tamanho e aspecto fisionômico com diferentes intensidades de dissecação ou rugosidade topográfica, por influência de canais de drenagem temporários e perenes (processos). Estas unidades morfológicas semelhantes podem ser segundo sua natureza genética de dois tipos: Formas de Denudação e Formas de Agradação (Tabela 1). 2 O projeto Radambrasil desenvolveu quatro metodologias de classificação geomorfológica ao longo de quinze anos de atividades (1970-1985), buscando aprimorar a qualidade da informação cartografada. 3 De maneira análoga as Regiões Geomorfológicas posposta pela metodologia de mapeamento geomorfológico do IBGE (1995 p 11). 4

Tabela 1 Padrões de formas de relevo 3º taxon: primeira Letra sempre maiúscula seguida de letras minúsculas. FORMAS DE DENUDAÇÃO FORMAS DE AGRADAÇÃO D denudação (erosão) A Acumulação Da Formas com topos aguçados Apf Formas de planície fluvial Dc - Formas com topos convexos Apm Formas de planície marinha Dt - Formas com topos tabulares Apl Formas de planície lacustre Dp - Formas de superfícies planas Api Formas de planície intertidal (mangue) De - Formas de escarpas Ad Formas de campos de dunas Dv Formas de vertentes Atf Formas de terraços fluviais Atm Formas de terraços marinhos Fonte: Ross e Fierz (2005, p. 72) e Ross (2001, p. 361). MATERIAL UTILIZADO De forma a alcançar os objetivos propostos neste estudo, inicialmente, foram adquiridas cartas topográficas, geológicas, geomorfológicas que englobam a bacia, imagens de satélite LandSat (atuais) disponibilizadas pela Embrapa para identificação das principais formas de relevo, GPS e Maquina fotográfica Digital (utilizadas nos trabalhos de campo). Em seguida foram consultadas bibliografias que discorrem a respeito deste assunto (já apresentadas). Para elaboração dos mapas foi utilizado o software ArcGis 9.0. PROPOSTA DE COMPARTIMENTAÇÃO GEOMORFOLÓGICA Em função do limite de paginação do trabalho será apresentado à classificação taxonômica do relevo na Tabela 2 e o mapa das 18 unidades de relevo (3º taxon) da Bacia Hidrográfica do Rio Doce na Figura 1. 5

Tabela 2 Taxonomia de relevo da Bacia Hidrográfica do Rio Doce. Morfo estrura (1º Taxon) Morfoe scultura (2º Taxon) Unidades Morfológicas (3º Taxon) P rocesso Principa l 2 1 Cinturão Orogênico Atlântico Leste-Sudeste Bacia Sedimentar (costeira) do Espírito Santo 1.1- Serras e Bordas Limites da Bacia do Rio Doce 1.2 Planaltos Alto Rio Doce 1.3 Serras e Maciços Médio Rio Doce.4 Depressôes Vale do Rio Doce 2.1 - Planícies e Tabuleiros Costeiros Baixo Rio Doce Org.: André Luiz N. Coelho. 1.1.1 - Serra do Espinhaço 1.1.2 - Borda do Quadrilátero Ferrífero 1.1.3 - Borda do Espinhaço 1.1.4 - Borda Serra da Mantiqueira 1.1.5 - Borda Bloco de Mantena 1 c 2 e 3 a 4 a 5 a 1.2.1 - Planalto rebaixado Guanhães 6 c 1.2.2 - Planalto Dissecado Rios Piracicaba/S. Antônio 7 c 1.2.3 - Planalto Xotopó 1.2.4 - Planalto deprimido Rio Piranga 1.3.1 - Serras Zona da Mata 1.3.2 - Maciços Caparaó 1.3.3 - Zona de Pontões 8 c 9 c 0 c 1 a 2 a 1.3.4 - Patamares Escalonados 3 a 1.4.1 Depressão Interplanáltica Alto-Médio Rio Doce 4 c 1.4.2 - Depressão Periférica Médio Rio Doce 2.1.1 - Planície Costeira 2.1.2 - Planície Fluvio-Lacustre 2.1.3 - Tabuleiros Costeiros 5 c 6 pm 7 pf 8 t 6

7 Figura 1 Compartimentação Geomorfológica da Bacia do Rio Doce

CONSIDERAÇÕES FINAIS Algumas considerações mais relevantes são mencionadas tratando-se a respeito da Morfoestrutura e das Unidades de Relevo. Quanto ao aspecto morfoestrutural, os terrenos da Bacia do Rio Doce até o início do Proterozoico pertenciam a dois domínios geotectônicos importantes: o Cráton do São Francisco e o Cinturão Atlântico (Almeida 1977 in Souza, 1995). O Cinturão Atlântico (denominado aqui como Cinturão Orogênico Atlântico LE/SE) faz parte da Província Mantiqueira que é dividida em duas zonas distintas a Oriental e Ocidental. O interior da Bacia do Rio Doce está repartido sobre estas duas Zonas, com os terrenos da margem esquerda do rio Doce até Governador Valadares e que se estendem para o norte pertencentes à Zona Ocidental e os que ocupam a margem direita até Governador Valadares e que se prolongam também para o norte são da Zona Oriental. Este fato resultou em uma morfologia extremamente vinculada à disposição estrutural com o rio Doce encaixado na direção SSO/NNE da geossutura, acompanhando mais o menos o traçado atual linha da costa Capixaba (Unidade Planaltos Alto Rio Doce). A partir dessa localidade (Governador Valadares) ocorre a inflexão do rio para leste abandonando a geossutura assumindo novas direções até alcançar o Oceano (Unidades Serras e Maciços Médio Rio Doce / Depressões Vale do Rio Doce). Este fato também teve reflexos em outros setores da bacia com variadas intensidades, traduzindo perfeitamente na paisagem pelas formas de relevo, com a rede hidrografia ora se adaptando a estrutura ora se impondo a mesma. Assim, o relevo tabular e de planícies costeiras (Unidades Planícies e Tabuleiros Costeiros Baixo Rio Doce) a leste contrasta mais a oeste com os relevos de cristas e o relevo de pontões em estruturas cristalinas. A sudoeste nos limites da bacia surge o relevo das cristas de itacolomito, itabirito e quartzito (Unidade Quadrilátero Ferrífero) e, a sudeste, passam a um relevo característico do espinhaço. Outras formas e padrões de relevo são identificados como os mares de morros, pontões em anfibolitos, tabuleiros, planícies fluviais e costeiras, resultantes da atuação de processos distintos de dissecação ou acumulação que operam no interior da bacia. Enfim, a classificação aqui proposta não só atingiu os seus objetivos ao promover a integração e o maior entendimento da dinâmica morfológica da Bacia do Rio Doce como também desenvolveu um produto de importância substancial para as diversas categorias de planejamento, gestão do meio ambiente e nos estudos em geomorfologia fluvial. 8

REFERÊNCIAS Almeida, Sérgio B.; Carvalho, Newton de O. Efeitos do Assoreamento de Reservatórios na Geração de Energia Elétrica: Análise da UHE de Mascarenhas, ES. X Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos, I Simpósio de Recursos Hídricos do Cone Sul, Gramado, RS, 1993. ANA Agência Nacional de Águas, Bacias Hidrográficas do Atlântico Sul - Trecho Leste (cd nº 4), Série: Sistema Nacional de Informações Sobre Recursos Hídricos, 2001. CDROM. Cunha, Sandra B.; GUERRA, Antônio. J. T. (orgs.) Geomorfologia exercícios técnicas e aplicações. 2ª ed., Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2002. EMBRAPA - Sistema Brasileiro de Classificação de Solos. Brasília, 1999. IBGE - Manual Técnico de Geomorfologia. Rio de Janeiro, IBGE, 1995. 111p. IBGE - Censo Demográfico IBGE 2000. Miranda, E. E. de; (Coord.). Brasil em Relevo. Campinas: Embrapa Monitoramento por Satélite, 2005. Disponível em: <http://www.relevobr.cnpm.embrapa.br/>. Acesso em: 25 abr. 2006. Mescerjakov, J. P. (1968) Les Concepts de Morphostruture et de Morphosculture: un nouvel instrument de I analyse geomorphologique. Annales de Geographie, 77 année-n0 423. Paris. Projeto Radambrasil Volume 32, Levantamento de Recursos Naturais - Folha SF.23/24 Rio de Janeiro/Vitória Rio de Janeiro. IBGE, 1987 a. Projeto Radambrasil Volume 34, Levantamento de Recursos Naturais - Folha SE.24 Rio Doce; Rio de Janeiro. IBGE, 1987 b. Ross, J.L.S. Geomorfologia: Ambiente e Planejamento. São Paulo: Ed Contexto, 1990 85p. Geomorfologia Ambiental. In: CUNHA, S.B.; GUERRA, A.J.T. (orgs.) Geomorfologia do Brasil. 2ª ed., Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2001, pp. 351-388. O registro cartográfico dos fatos geomórficos e questão da taxonomia do relevo. São Paulo. Revista do departamento de Geografia - FFLCH - USP, nº6, pp. 17-29. 1992. Ross, Jurandyr L. S.; Fierz Marisa de S. Algumas Técnicas de Pesquisa em Geomorfologia. In: Venturi, Luis A. B. (org.) Praticando Geografia: técnicas de campo e laboratório. São Paulo, Oficina de Textos 2005, pp. 69-84. 9

Souza, Carla J. de O. Interpretação Morfotectônica da Bacia do Rio Doce. Dissertação de Mestrado do Instituto de Geociências da Universidade Federal de Minas Gerais, 1995, 144f. Strauch, N. A Bacia do Rio Doce. Rio de Janeiro: IBGE. 1955. 199 p. 10