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Transcrição:

10 ANOS DO IPCG - O GOVERNO SOCIETÁRIO EM PORTUGAL 9 de junho de 2013 Conferência de Encerramento Carlos Tavares O que mudou em 10 anos I 10 ANOS DE IPGC, 14 DE CORPORATE GOVERNANCE EM PORTUGAL O IPCG surgiu em pleno período de aplicação dos princípios de governo das sociedades em Portugal, 4 anos após a publicação dos Princípios de Governo das Sociedades da OCDE e das primeiras Recomendações de Governo das Sociedades da CMVM. A CMVM assumiu assim o encargo e a responsabilidade de ocupar, desde 1999, um espaço que, pela natureza da matéria em causa, pertence em geral à área da autorregulação. A constituição do IPCG surgiu então como a primeira manifestação activa de adesão dos emitentes e do mercado aos princípios de bom governo das sociedades e como primeiro passo no sentido da autorregulação. Nos 10 anos que nos separam do surgimento do IPCG, muita coisa evoluiu na corporate governance em Portugal: A dimensão normativa do governo das sociedades, com a Reforma societária de 2006 e as profundas alterações introduzidas em aspetos chave da organização das sociedades, como os modelos de governo, os deveres dos administradores e a fiscalização da sociedade. As recomendações sobre o governo das sociedades, que sofreram uma profunda revisão em 2009 em matéria de remunerações e gestão de riscos, sob o impulso do Relatório Larosière e das

Recomendações da CE sobre remunerações de executivos nas sociedades cotadas e nas instituições financeiras, passando a incluir recomendações sobre temas até aí intocados, como o relacionamento das sociedades com os seus auditores. A cultura dos emitentes em matéria de governo das sociedades, que mostram hoje um grau de adesão aos princípios de governo das sociedades muito mais elevado do que há 10 anos atrás, incorporaram naturalmente um conjunto significativo desses princípios como indiscutíveis. A autorregulação, inexistente há uma década e que tem hoje no Código do IPCG a sua manifestação mais evidente. As práticas de avaliação e enforcement das Recomendações de governo das sociedades, com a relevância crescente que têm vindo a ser conferida pela CMVM ao princípio comply or explain na aferição do cumprimento das recomendações. O âmbito de aplicação dos princípios de bom governo, que extravasaram o âmbito natural e original das sociedades cotadas e assumiram a sua vocação universal e transversal, encontrando-se hoje já implementados em domínios como os fundos de investimento, os fundos de pensões, as instituições financeiras e as entidades públicas, em termos que permitem hoje falar no governo das organizações em vez do governo das sociedades. II AS ALTERAÇÕES AO REGIME DO GOVERNO DAS SOCIEDADES PROPOSTO PELA CMVM A profunda mudança de filosofia das últimas alterações ao regime do governo das sociedades aprovado pela CMVM é enformada por 3 princípios fundamentais: (i) Abrir espaço para a autorregulação: liberdade de escolha de códigos diferentes do da CMVM;

(ii) Assegurar aos acionistas a prestação de informação regulada em termos acessíveis, comparáveis e transparentes; (iii) Melhorar e simplificar o seu próprio Código de Bom Governo, à luz da experiência colhida com a sua aplicação. As alterações submetidas a Consulta Pública serão tornadas públicas na próxima semana e reflectem o resultado dessa consulta e, particularmente, o intenso diálogo e a cooperação com o IPCG e também com a Associação Portuguesa de Emitentes. Creio que elas marcam o início de uma nova fase no Corporate Governance em Portugal, em que a responsabilização e o papel das entidades privadas e particularmente do IPCG serão progressivamente maiores. Dois aspetos em particular precisarão de progressos que, espero, venham a resultar da continuada cooperação entre a CMVM e o IPCG: (i) A avaliação e o enforcement dos princípios e recomendações de Corporate Governance; (ii) A garantia de existência de mecanismos eficazes de fiscalização independente das sociedades. No que respeita à avaliação e enforcement dos princípios e recomendações de Corporate Governance, esperamos vir a definir com o IPCG um processo de avaliação do cumprimento do Código de Bom Governo qualquer que ele seja numa lógica de comply or explain que seja efetiva; Relativamente à garantia de existência de mecanismos eficazes de fiscalização independente das sociedades, há que assegurar a) Mecanismos de selecção de administradores efectivamente independentes e de controlo e responsabilização da sua atuação perante todos os acionistas; b) a independência efetiva do órgão de fiscalização (qualquer que ele seja) e a competência dos seus membros para tal tarefa; e c) a independência do auditor externo e a sua responsabilização efetiva em caso de incompetência ou negligência.

Estas são condições essenciais para que todos os níveis de controlo funcionem e se complementem. Muito do que aconteceu na origem da presente crise financeira decorreu sobretudo da falência de um ou vários deste níveis de controlo interno e não apenas da supervisão ou das agências de rating. Daí que este seja um dos aspetos da organização das sociedades que entendo não poderem ser baseados exclusivamente em princípios ou recomendações, mas em que regras vinculativas mínimas são necessárias. Por isso espero que a CMVM venha a contribuir com propostas de melhoria do Código das Sociedades Comerciais e da sua articulação com o Código dos Valores Mobiliários destinadas visando garantir maiores segurança e eficácia na fiscalização de sociedades. Do mesmo modo que espero que a Diretiva da Auditoria, em revisão, venha a estabelecer mecanismos mais eficazes de supervisão dos auditores e da garantia da sua independência. III - O IMPACTO DE UM MERCADO EMERGENTE DE DÍVIDA NO GOVERNO DAS SOCIEDADES: UM NOVO REGIME DE DEBT GOVERNANCE? O actual ambiente internacional de crescimento modesto e de muito baixas taxas de juro tem levado a um significativo aumento do papel da dívida no financiamento das empresas. Portugal não precisou desse impulso, na medida que sempre a dívida tem assumido o papel primordial no financiamento das empresas, embora essencialmente sob a forma de crédito bancário. Por isso, as empresas portuguesas apresentam dos mais elevados níveis de alavancagem na UE, situação a que não escapam as empresas cotadas, apesar do seu acesso ao mercado de capitais. Mas o crescente peso dos credores no financiamento das empresas levanta problemas novos ao governo societário, na medida em que eles poderão passar a ter uma influência

porventura mais decisiva na vida da sociedade do que os próprios acionistas. Os mecanismos de exit and voice funcionam de forma diferente para os titulares de obrigações: a possibilidade de exit é menor do que no mercado de equity, atenta a fraca liquidez do mercado de dívida; mas a possibilidade de voice tende a ser maior, por força das cláusulas incluídas nos contratos de financiamento. Esses contratos de financiamento representam, de facto, o mecanismo de corporate governance à disposição dos financiadores. As cláusulas incluídas nos contratos de financiamento (change of control, step in rights, direitos de informação, etc) influenciam decisivamente a organização, o funcionamento e o governo da sociedade. O grau de influência do financiador sobre a sociedade pode ser, no limite, maior do que a influência dos acionistas, até porque não existem mecanismos definidos para a mitigação dessa influência: os mecanismos de corporate governance estão pensados para a relação acionista/sociedade, e não credor/sociedade. É assim que que, por exemplo, medidas que afectam de facto a livre transmissibilidade das acções sejam censuradas aos accionistas mas consideradas normais nos contratos de financiamento. Num sistema de corporate governance tradicional, os acionistas procuram maximizar o potencial da empresa assumindo riscos, enquanto os obrigacionistas e financiadores procuram minimizar o risco, numa dinâmica totalmente diferente mas não necessariamente negativa: a dinâmica do risco dos acionistas pode ser contrabalançada pela dinâmica conservadora dos financiadores

Previsivelmente, obrigacionistas e financiadores tornar-se-ão crescentemente ativos, diversificados e interventivos nas sociedades. A valorização das obrigações tende a apresentar uma relevância paralela à da valorização das ações: se o valor das ações cai, o risco direto para a empresa é de um ataque hostil; mas se o valor das obrigações cai, implicitamente sobe o custo do financiamento, na medida em que a confiança dos investidores desce, exigindo um retorno mais elevado pelo próximo investimento. Há pois que refletir sobre uma eventual adaptação das regras de governo das sociedades a esta nova realidade, que poderíamos designar por debt governance. Alguns dos aspectos que ela pode envolver e que convido desde já o IPCG a ponderar são, a título exemplificativo, os seguintes: Regras sobre a intervenção dos obrigacionistas e financiadores nas decisões fundamentais da empresa: revisão do regime e situações de obrigatoriedade de assembleias obrigacionistas; Regras sobre conflitos de interesses para os representantes comuns dos obrigacionistas (não poderem ser, como hoje são, o intermediário financeiro encarregue da colocação da dívida ou o escritório de advogados que o assiste) Recomendações sobre o conteúdo dos contratos de financiamento: cláusulas de change of control, step in rights, informação; Impacto da influência crescente dos financiadores na vida das sociedades a ser mitigado por níveis elevados de transparência

sobre os pressupostos de intervenção e a intervenção concreta dos mesmos Ponderação sobre o acréscimo de informação a disponibilizar aos obrigacionistas e financiadores (equilíbrio entre necessidades informativas acrescidas e segredos comerciais). IV UMA NOVA ETAPA DA CORPORATE GOVERNANCE EM PORTUGAL Tudo o que foi dito mostra a importância da informação que é devida àqueles que, sob diferentes formas, se dirigem aos mercados de capitais para confiar as suas poupanças às empresas que delas necessitam para investir e crescer. Esta é a nobre e indispensável função dos mercados, que não são propriamente entidades abstractas onde alguns ditos especuladores procuram ganhos indevidos ou uma espécie de casino onde se apostam as poupanças. Por isso, os investidores precisam que os mercados funcionem bem e sejam adequadamente supervisionados. Mas precisam igualmente que as empresas que recebem as suas poupanças sejam devidamente geridas e adoptem soluções de governo societário eficazes para a defesa do interesse dos que as financiam, por menor que seja a sua participação no capital. E, acima de tudo, têm o direito a uma informação suficiente e clara sobre a forma como as entidades a quem confiam o seu dinheiro são administradas e governadas. E esta é a lógica da nova fase da Corporate Governance que vamos inaugurar com os documentos regulamentares e recomendatórios que publicaremos na próxima semana e que trazem: (i) Maiores liberdade e responsabilidade das empresas na escolha do Código da Governo a que decidam submeter-se; (ii) Maiores consistência e transparência na avaliação do seu cumprimento, numa lógica reforçada de conformação ou explicação ;

(iii) Melhor, mais acessível e mais comparável informação dos accionistas das empresas cotadas. Contamos, naturalmente, com o IPCG para percorrer esta etapa connosco, num papel que desejamos cada vez mais forte. Se daqui a cinco anos o regulador tiver as suas funções nesta matéria confinadas às questões estritamente legais e regulamentares, pode dizer-se que terá cumprido bem o seu papel na área do governo societário, entrando nela plenamente quendo foi preciso e sabendo retirar-se quando as sementes que lançou deram os seus frutos.