SIMPÓSIO: MOTIVAÇÃO CONCEPTUAL NO LÉXICO E NA GRAMÁTICA: ESTUDOS EM LINGUÍSTICA COGNITIVA

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Transcrição:

SIMPÓSIO: MOTIVAÇÃO CONCEPTUAL NO LÉXICO E NA GRAMÁTICA: ESTUDOS EM COORDENADORES DIOGO PINHEIRO (UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL) MAURO JOSÉ DA ROCHA DO NASCIMENTO (UFRJ) Já se tornou lugar-comum a afirmação de que a Linguística Cognitiva (LC) não constitui um corpo teórico homogêneo a ponto de Geeraerts e Cuyckens (2007) sugerirem que esse paradigma deve ser entendido como uma categoria wittgensteiniana do tipo family resemblance. Apesar do seu caráter francamente multifacetado, é possível identificar pelo menos uma linha de força capaz de irmanar os estudos cognitivistas: a crença na motivação conceptual da gramática. Fundamentalmente, trata-se da hipótese de que a forma linguística, longe de se encerrar nos limites estreitos da própria forma, encontra sua motivação em habilidades cognitivas gerais, ou seja, não especificamente linguísticas. Com efeito, a questão da motivação está no cerne da oposição entre a LC e abordagens formalistas. Recentemente, o debate protagonizado por Frederick Newmeyer e Adele Goldberg acerca da inversão sujeito-auxiliar no inglês (NEWMEYER, 1998; GOLDBERG, 2006; BORSLEY; NEWMEYER; 2009; GOLDBERG, 2009) deu mostras da atualidade dessa controvérsia. Ainda mais recentemente, a coletânea Motivation in Grammar and the Lexicon (PANTHER; RADDEN, 2011) compilou estudos que evidenciam a inter-relação entre língua e cognição geral, aí incluídas as estruturas conceptual (metáfora, metonímia, inferência, modelos cognitivos, etc.) e perceptual (figura/fundo, simulação, perspectiva, arranjo de visualização, etc). Nessa esteira, este simpósio reúne cinco trabalhos que evidenciam o papel de habilidades cognitivas gerais na motivação da forma linguística. O trabalho de Mauro José Rocha do Nascimento recorre à habilidade de categorização reputada por Tomasello (2003) como uma das duas capacidades não-linguísticas fundamentais para o desenvolvimento da linguagem para descrever a rede

de construções predicativas do português brasileiro (PB). Por seu turno, tanto Rosângela Gomes Ferreira quanto Diogo Pinheiro recorrem à noção de Ponto de Vista outro conceito central à LC que mereceu recentemente um volume completo (DANCYGIER; SWEETSER, 2012) para explicar, respectivamente, a classe linguística dos anguladores ( hedges ) e o fenômeno da inversão do sujeito no PB. Patrícia Teles Alvaro debruça-se sobre expressões com o item até, que manifestam escalarização epistêmica, para evidenciar os processos cognitivos gerais que atuam na construção dos sentidos, dentre os quais se destacam a mesclagem e a compressão conceptual. Por fim, Paulo Jeferson Araújo é autor do único trabalho que não focaliza o PB: seu estudo investiga as construções possessivas, existenciais e locativas nas línguas bantas, defendendo que a relação entre esses padrões pode ser explicada a partir do Modelo langackeriano do Ponto de Referência (LANGACKER, 1991; 2003; 2009) e da categoria de controle (TALMY, 2000).

Gramática Cognitiva, produção de sentidos e escalarização epistêmica no PB PATRÍCIA TELES ALVARO (IFRJ) A pesquisa por ora apresentada, em Alvaro (2008, 2009, 2011), propõe-se a tratar a rede de trabalho cognitivo operada pelos sujeitos discursivos no processo de produção de sentidos, focalizando, mais estritamente, o caso da escalarização epistêmica. Alvaro (2008) abordou essa operação linguísticocognitiva, fundamentando-se na ótica da Teoria dos Espaços Mentais de Fauconnier (1985, 1987, 2002), alinhando-se, também, aos estudos cognitivistas de Lakoff, Jonhson, Langacker, Sweetser, Almeida, Ferrari entre outros. O objetivo geral da pesquisa recai sobre o interesse em contribuir para a descrição cognitivista do funcionamento da língua, tendo como objetivos específicos (a) descrever a rede de trabalho cognitivo da produção de sentidos, evidenciando a metaforização cognitiva, MCIs (modelos cognitivos idealizados), esquemas imagéticos, construtores de espaços mentais, compressão e mapeamentos e (b) abordar, em termos de Fauconnier (2002), a produção de sentidos e sua relação com os 3 Is da mente, Identidade, Imaginação e Integração. A pesquisa baseou-se num paradigma qualitativo e quantitativo de análise, sendo realizadas interpretações dos exemplos coletados e também a quantificação das ocorrências. A base de dados foi extraída de três diferentes tipos de corpora: Norma Urbana Culta do Rio de Janeiro (NURC/ RJ), Discursos & Gramática (D&G) desenvolvidos na Faculdade de Letras da UFRJ e frases colhidas na internet, indiscriminadamente. Os corpora foram rastreados de acordo com as estruturas sintáticas pelo programa Unitex, (Software criado no Laboratoire Automatique Documentaire et Linguistique, sob a direção de Maurice Gross). Os resultados da pesquisa evidenciam a operação linguístico-cognitiva da produção de sentido como uma atividade constitutiva, convergindo aos estudos de Ilari (2003), uma vez que resulta em questionar ou modificar o sistema de referências através do qual olhamos

para a realidade. Da mesma maneira, a expressão comunicativa (nesse caso em proposições com até) instancia processos mais profundos e criativos, que dizem respeito à identidade do falante, que (re)organiza suas escolhas e as (re)enquadra conceitualmente. Esperamos assim contribuir para a descrição do processamento de sentidos na operação cognitiva do uso dos recursos gramaticais.

Construção do significado e ponto de vista: o papel dos anguladores ROSÂNGELA GOMES FERREIRA (UFRJ) O presente trabalho em desenvolvimento - propõe haver uma categoria linguística no Português a dos anguladores (hedges) que contribui para a construção do ponto de vista (FAUCONNIER, 1985, 1987, 2002; FERRARI & SWEETSER, 2012), o que implica em padrões gramaticais relevantes, assim como são relevantes os aspectos semântico-pragmáticos. Além disso, acreditamos serem os anguladores elementos participantes da atividade constitutiva da linguagem (FRANCHI, 2011; ILARI, 2011; FIORIN, 2011). Seu estímulo é a verificação de que existem categorias léxico-cognitivas no Português que resistem a se enquadrar em conceitos pré-determinados; tal faz com que haja classes que, embora consagradas, tenham dificuldades de abranger todos os itens que lhes são atributos. A pesquisa fundamenta-se nos pressupostos teóricos da Linguística Cognitiva (doravante LC) (cf. LAKOFF (1973, 1987), LANGACKER (1987,1991) SWEETSER (1999), CROFT & CRUSE (2004), FAUCONNIER, (1985, 2002), principalmente), visto que a categorização está no centro das preocupações em LC, por evidenciar teses caras a essa teoria: a interdependência entre a faculdade da linguagem e as outras faculdades cognitivas, e, em decorrência, o fato de as estruturas formais da linguagem expressarem a organização conceptual. A centralidade da cognição, e das experiências sensório-motoras que a alimentam, colocou o sujeito como no palco das investigações, desinvestindo o caráter objetivista das análises de estruturas formais das línguas. A promoção do sujeito acarretou a consideração dos cenários comunicativos como elementos determinantes para a descrição e verificação do funcionamento daquelas estruturas. A língua não pode ser entendida como um sistema simbólico que veicula significados objetivos, isentos do ponto de vista do enunciador. Desse modo, verifica-se a evidência para a tese de Franchi (2011), de que a função primordial da linguagem é refletir o pensamento e é o processo pelo qual organizamos

nossas experiências, antes de ser sua transmissão ou de servir para comunicação. Assim, o presente trabalho pretende, através da revisão e aprofundamentos dos estudos acerca dos anguladores, realçar a importância do ponto de vista para a LC, bem como o fato de os anguladores serem instrumentos de manifestação do ponto de vista, o que interfere diretamente na categorização das coisas no mundo e, em decorrência, de conceptualização.

Os verbos predicativos e auxiliares sob a perspectiva da gramática das construções MAURO JOSÉ ROCHA DO NASCIMENTO (UFRJ) Este trabalho parte dos pressupostos teóricos da Linguística Cognitiva, mais especificamente do modelo da Gramática das Construções (Goldberg, 1995). São utilizados, ainda, o conceito de categorização (Langacker, 1987) e esquemas imagéticos (Lakoff, 1987). Seu objetivo principal é comprovar que existe no português uma Construção Predicativa, relacionada, até certo ponto, com os verbos tradicionalmente categorizados como predicativos. A primeira proposta apresentada é de que os verbos considerados como predicativos não formam uma categoria à parte; eles só são plenamente predicativos quando figuram em uma construção gramatical (Goldberg, 1995) do tipo predicativa, ou seja, a construção gramatical é que é predicativa, e não o verbo. Uma evidência disso é que todos os verbos considerados tradicionalmente como predicativos também podem figurar em outras construções, não-predicativas. Além disso, outros verbos, considerados tradicionalmente como nocionais também podem figurar nessa construção, o que explica a irregularidade do elenco de verbos considerados como predicativos de um autor para outro. A segunda proposta apresentada é de que os verbos predicativos e os verbos auxiliares aspectuais não são duas categorias estanques; é o mesmo verbo que figura em diferentes construções gramaticais. As construções de gerúndio, com verbos ditos auxiliares, são construções decorrentes ou, nas palavras de Goldberg (1995), derivadas das construções predicativas; nesse caso herdam da construção-base a característica de manter um traço descritivo do sujeito na construção-base, esse traço descritivo se apresenta na forma de um SAdj; na construção derivada, na forma gerundial do verbo. As relações de significado entre os verbos que instanciam a construção predicativa envolvem diferentes valores aspectuais e pressuposicionais. Esses valores correspondem à evocação de diferentes esquemas imagéticos (Lakoff, 1987).

A possibilidade de determinados verbos poderem ou não figurar nesse tipo de construção tem relação com o esquema imagético evocado por esses verbos. Propomos, ainda, que as Construções Predicativas formem uma rede construcional, em que a construção do tipo SN V SAdj (Maria é feliz) seria a construção mais básica. Outras construções predicativas, como, por exemplo, a que é instanciada em Maria é professora (SN V SN), seriam decorrentes da primeira por relações de polissemia.

Espaços mentais e ponto de vista na gramática: a inversão do sujeito no português brasileiro DIOGO PINHEIRO (UFFS) Com sua admirável recalcitrância, o problema da inversão do sujeito tem intrigado um sem-número de pesquisadores que se ocupam da gramática do português brasileiro. Com efeito, o assunto tem motivado estudos alinhados à linguística funcional (PONTES, 1986; FERRARI, 1990; NARO; VOTRE, 1999), à sociolinguística variacionista (LIRA, 1986; COELHO, 2000; SPANO, 2008) e à teoria gerativa (NASCIMENTO, 1984; FIGUEIREDO SILVA, 1996; PILATI, 2006; NEGASE, 2007). Neste trabalho, minha expectativa é a de enriquecer a compreensão do fenômeno por meio da adoção de uma perspectiva cognitivista. A hipótese fundamental do trabalho é a de que a alternância SV/VS reflete duas possibilidades de conceptualização de um mesmo fenômeno, decorrente da disponibilidade de dois pontos de vista para a conceptualização do evento em foco. Na trilha de Talmy (2000), argumentarei que a posição do sujeito está associada à Distância Perspectival, vale dizer, à distância entre o sujeito conceptualizador e o objeto conceptualizado. Da seguinte maneira: a ordem SV envolve maior distanciamento entre o sujeito conceptualizador e o objeto conceptualizado; inversamente, a ordem VS associa-se a uma distância menor: tudo se passa como se o conceptualizador estivesse presenciando o evento diante dos seus olhos. Proporei ainda que a diferença de Distância Perspectival entre as sentenças SV e VS reflete o fato de que esses padrões associam-se a Sujeitos de Consciência distintos. Diretamente ligado à noção de perspectiva, o conceito de Sujeito de Consciência ( Subject of Conciousness ) tem lugar de destaque em versão recente da Teoria dos Espaços Mentais desenvolvida por Sanders, Sanders e Sweetser (2009; 2012) e por Ferrari e Sweetser (2012) e é usado aqui para fazer referência ao sujeito responsável pela conceptualização ou construção de um evento. Procurarei mostrar que eventos designados por sentenças SV são

interpretados a partir do ponto de vista de um Sujeito de Consciência que desempenha o papel de Falante (vale dizer, um indivíduo inserido em uma situação de troca verbal que executa um ato de fala); por seu turno, eventos designados pela construção VS são construídos sob o ponto de vista de um SdC que desempenha o papel de Observador (vale dizer, alguém que testemunha diretamente o evento). Do ponto de vista metodológico, o trabalho analisa usos reais do português brasileiro falado extraídos de dois corpora: corpus BBB 10, com aproximadamente 40 horas de transcrições de falas do programa Big Brother Brasil 10, e corpus Discurso & Gramática, que inclui uma variedade de tipos textuais.

Domínios conceituais das construções locativas, existenciais, comitativas e possessivas em línguas bantas PAULO JEFERSON PILAR ARAÚJO (USP) Este estudo se concentra sobre os debates referentes à relação entre as construções locativas, existenciais e possessivas nas línguas do mundo, dando especial atenção para o caso particular das línguas bantas, para as quais o entendimento mais completo da relação entre aquelas construções só se dá se o domínio conceitual do comitativo for levado em conta. O trabalho trata, inicialmente, das questões teóricas, apresentando as diversas propostas que almejaram analisar as construções possessivas e outras a elas relacionadas, sendo classificadas em duas: (i) as propostas localistas, para as quais o domínio de possessivos e existenciais são em última instância locativos; e (ii) as propostas não localistas, que buscaram identificar outros fatores na relação de possessivos e as demais construções. Partindo dos pressupostos da Gramática Cognitiva, os domínios conceituais de locativos, existenciais, comitativos e possessivos são analisados a partir do construto da Análise do Ponto de Referência, considerado como a base conceitual comum àquelas quatro construções. Em seguida, dedicamo-nos às questões relativas à descrição das construções locativas, existenciais, comitativas e possessivas em línguas bantas. Para cada construção, são consideradas as subconstruções que devem receber uma maior atenção dos estudiosos, para que se tenha um quadro mais completo dos estudos sobre possessivos. Por exemplo, para as construções locativas, uma discussão sobre inversão locativa; para as construções existenciais, a questão do efeito de definitude em línguas bantas; para as construções comitativas, a relação delas com o da coordenação entre NPs, por fim, para as construções possessivas, a relação dessas com os diferentes processos de gramaticalização responsáveis pela grande diversidade das construções de posse predicativa, como o processo de transitivização ou Have-drift. Para uma análise conjunta dessas construções,

preocupada com a particularidade tipológica das línguas bantas, propõe-se que se faz necessário um refinamento teórico da categoria semântico-gramatical Controle, encarada como o fator que diferencia locativos, existenciais e comitativos de possessivos.