As micotoxinas e a segurança alimentar na soja armazenada Micotoxins and food safety in soybeans storage

Documentos relacionados
As micotoxinas e a segurança alimentar na soja armazenada

Classificação dos grãos de soja convencional e transgênica desde a recepção até a expedição: estudo de caso. Resumo. Introdução

Palavras-chave: feijão, qualidade dos grãos, contaminação, micotoxinas.

42º Congresso Bras. de Medicina Veterinária e 1º Congresso Sul-Brasileiro da ANCLIVEPA - 31/10 a 02/11 de Curitiba - PR 1

OCORRÊNCIA DE MICOTOXINAS EM MASSAS ALIMENTÍCIAS

QUANTIFICAÇÃO DE GIBERELA NA PRÉ-COLHEITA E EM ETAPAS DO BENEFICIAMENTO DE SEMENTES DE TRIGO

QUALIDADE DE GRÃOS DE MILHO EM MATO GROSSO

Ocorrência e Distribuição de Aflatoxina B 1. e Zearalenona em Soja

Prevalência de contaminantes do trigo e derivados: Desoxinivalenol

Incidência do Fungo Aspergillus flavus em Grãos de Soja Armazenados no Brasil nas Safras 2014/15 e 2015/16

Contaminação por Micotoxinas em Grãos de Arroz (Oryza sativa L.)

Palavras-chave: pragas de armazenamento, pragas de soja, ocorrência

SEMINÁRIO ARMAZENAMENTO E PREPARO DE GRÃOS PALESTRA: MICOTOXINAS

Determinação dos Grãos de Soja Danificados por Percevejos (IN11) nas Safras 2014/15 a 2016/17

Teores de aflatoxinas totais em milho armazenado em paióis da região Central de Minas Gerais

Determinação de Micotoxina Desoxinivalenol (Don) em Pães Brancos eintegrais Comercializados ea Cidade de Ponta Grossa Pr RESUMO

Presença de Insetos-praga em Grãos de Soja Armazenada, Produzidos nas Safras 2014/15 a 2016/17

DETERMINAÇÃO DE ZEARALENONA EM MILHO ARMAZENADO EM PROPRIEDADES FAMILIARES DA REGIÃO CENTRAL DE MINAS GERAIS

Estimativa de Quebra Técnica devido ao teor de umidade e impureza em uma Unidade Armazenadora

AVALIAÇÃO DA CONTAMINAÇÃO POR AFLATOXINAS TOTAIS E ZEARALENONA EM VARIEDADES DE MILHO CRIOULO (Zea mays L.) ATRAVÉS DO MÉTODO IMUNOENZIMÁTICO ELISA

Teores de ocratoxinas em milho armazenado com palha na região Central de Minas Gerais


Determinação dos Grãos de Soja Avariados (IN11) nas Safras 2014/15 a 2016/17

PROGRAMA ANALÍTICO E EMENTA DE DISCIPLINA DA PÓS GRADUAÇÃO

Contaminação por Micotoxinas em Grãos de Arroz (Oryza sativa L.) e seus Produtos - farinha, farelo e quirera

Aplicação do Teste de Tetrazólio para a Avaliação da Qualidade de Grãos de Soja Produzidos no Brasil nas Safras 2014/15 a 2016/17

Luís Abrunhosa, Thalita Calado e Armando Venâncio

AVALIAÇÃO QUALITATIVA E QUANTITATIVA DOS GRÃOS DE MILHO E DE SOJA ARMAZENADOS EM SILOS BAG

Soja Armazenada em Silo Bolsa: Avaliação Sanitária

VALIDAÇÃO DE MÉTODO ANALÍTICO PARA DETERMINAÇÃO SIMULTANEA DE MICOTOXINAS E FUNGICIDAS EM GRÃOS DE TRIGO

QUALIDADE SANITÁRIA DE SEMENTES DE MAMONA, CULTIVARES NORDESTINA E PARAGUAÇU.

Programa Analítico de Disciplina ENG370 Secagem e Armazenagem de Grãos

Ocorrência de Aflatoxinas em Amendoim e Produtos Derivados

Contaminantes microbianos do cacau: aspectos de saúde pública do cacaueiro até o chocolate

Recirculação de Fosfina em Silos de Alvenaria para Eficácia do Expurgo

Pragas de grãos armazenados e formas de controle

OCORRÊNCIA DE MICOTOXINAS EM FARELOS DE SOJA, TRIGO E SORGO NO BRASIL NOS ANOS DE 2016 E 2017

Recirculação de fosfina em silos de alvenaria para eficácia do expurgo

Método Multianalito para Análise Simultânea de Treze Micotoxinas na Matriz Milho COMUNICADO TÉCNICO

DETERMINAÇÃO DE AFLATOXINAS EM AMOSTRAS DE LEITE E AMENDOIM CONSUMIDAS NA CIDADE DE BELÉM-PARÁ 1.

Ocorrência de Aflatoxinas em amendoim e seus produtos comercializados no estado da Bahia durante o ano de 2002*

Segurança alimentar e alimentos seguros

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO

Especificação Técnica Fecomix 425 Integral Farinha de Milho Inteiro

Determinação da Quebra Técnica em uma Unidade Armazenadora Estudo de Caso

Patologia, Tamanho de Grão, Poder Germinativo e Teor de Micotoxina em Genótipos de Cevada Produzidos em Ambiente Favorável a Doenças de Espigas

Resumo. Abstract. Alunas do Programa de Pós Graduação em Sanidade Animal (nível: Mestrado), DMVP/CCA/UEL. 3

Cromatografia aplicada a determinação de qualidade de arroz

Comparação entre tratamento preventivo e curativo na proteção dos grãos de trigo contra as pragas durante o armazenamento

Número de animais nas propriedades Região Média N Castro Minas Gerais Goiás Toledo Santa Catarina RMC Média

Eficiência de fungicidas para controle de giberela em trigo: resultados dos ensaios cooperativos - safra 2012

MICOTOXINAS PRESENTES NA CULTURA DO MILHO

Copyright Biostrument, S.A.

Armazenamento Refrigerado de Grãos de Trigo em Unidade Cooperativa do Centro Sul Paranaense

OCORRÊNCIA DE OCRATOXINA A EM CAFÉ (Coffea arábica L.) MOÍDO, TIPO FORTE E TRADICIONAL EMBALADO A VÁCUO

Efeito da fosfina em três concentrações, na qualidade fisiológica da semente de trigo armazenada

Problemas de micotoxinas nos grãos e os novos limites toleráveis na cadeia alimentar

Eficiência do gás ozônio na desinfecção microbiológica de grãos de milho armazenado 1

Especificação Técnica Sabmix Sabugo Moído

CONTAMINAÇÃO POR AFLATOXINAS EM MILHO UTILIZADO NA ALIMENTAÇÃO DE SUÍNOS

AVALIAÇÃO DA CONTAMINAÇÃO POR OCRATOXINA A EM SUCO DE UVA INTEGRAL E NÉCTAR DE UVA COMERCIALIZADOS NO BRASIL EM 2014

Introdução ISSN

APLICAÇÃO DA FOTOCATÁLISE HETEROGÊNEA NO TRATAMENTO DE AFLATOXINA PROVENIENTE DE RESÍDUOS DE LABORATÓRIOS

Ocorrência de fungos e aflatoxinas em grãos de milho

e G 2 , G 1 , B 2 (AFB1), com níveis entre 0,54 e 2,04µg/kg e uma (3,84%) apresentou presença de aflatoxina B 2 and G 2

3FEAGRI/UNICAMP, Campinas, SP. 4DCA/UFLA, Lavras, MG.

Avaliação de Perdas em Unidades Armazenadoras

COMPARATIVO DE LUCRATIVIDADE ENTRE O PLANTIO DE MILHO SEQUEIRO/SOJA E O ARRENDAMENTO DA ÁREA

III BENEFÍCIOS DO RESFRIAMENTO EM GRÃOS DE MILHO

QUALIDADE DE SEMENTES

QUALIDADE MICROBIOLÓGICA DE GRÃOS DE MILHO ARMAZENADOS EM SILOS DE ALAMBRADO E SECADOS COM AR NATURAL FORÇADO

Micotoxinas no Armazenamento de Grãos. Profa Giniani Dors

XXIX CONGRESSO NACIONAL DE MILHO E SORGO - Águas de Lindóia - 26 a 30 de Agosto de 2012

Jornal Oficial da União Europeia L 143/3

SITUAÇÃO DA ARMAZENAGEM BRASILEIRA E SUA RELAÇÃO COM AS PERDAS NA PÓS- COLHEITA

Utilização do sabugo de milho como fonte energética no processo de secagem

Perdas de grãos ocasionadas por pragas em armazéns,

ESCOPO DA ACREDITAÇÃO ABNT NBR ISO/IEC ENSAIO

Fungos Isolados a Partir de Rações Para Roedores Comercializadas na Cidade de Fortaleza Ceará

AVALIAÇÃO DO PROCESSO DE LIMPEZA E POLIMENTO DOS GRÃOS DE TRIGO PARA ELIMINAÇÃO DE MICOTOXINA DESOXINIVALENOL

Marcos Paulo Ludwig A EFICIÊNCIA NO PROCESSAMENTO DE SEMENTES COMO CAMINHO PARA A SUSTENTABILIDADE DO NEGÓCIO

Incidência de Aflatoxinas, Desoxinivalenol e Zearalenona em produtos comercializados em cidades do estado de Minas Gerais no período de

Efeito da Secagem e Ozonização no Armazenamento de Trigo

AVALIAÇÃO DO TESTE IMUNOLÓGICO QuickTox NA QUANTIFICAÇÃO DE DEOXINIVALENOL EM TRIGO PARA SEGREGAÇÃO DE LOTES

Tratamento Preventivo dos Grãos no Controle de Pragas do Trigo Armazenado

Avaliação da qualidade nutricional de soja em Mato Grosso

11º Congresso Interinstitucional de Iniciação Científica CIIC a 04 de agosto de 2017 Campinas, São Paulo ISBN

I Identificação do estudo

Avaliação energética de um secador de grãos do tipo cavalete

PRODUTIVIDADE ATINGÍVEL EM FUNÇÃO DAS ÉPOCAS DE SEMEADURA PARA SOJA NA REGIÃO SUL DO BRASIL

ASPECTOS REGULATÓRIOS DO BRASIL E CODEX LIGIA LINDNER SCHREINER

ANÁLISE DA CONCENTRAÇÃO DE AFLATOXINA EM PASTAS DE AMENDOIM NAKANO, G. B. 1 ; TOLEDO, E. A. 2

Perguntas Frequentes sobre SPC. Índice 1 - PROCESSO DE FABRICAÇÃO 2 - COMO AVALIAR A QUALIDADE DA PROTEÍNA DO SPC?

EFEITO DA RADIAÇÃO SOLAR DIRETA NA QUALIDADE DE GRÃOS DO MILHO

Colágeno hidrolisado como aditivo para inoculação de Bradyrhizobium em sementes de soja

EFEITOS DA HERMETICIDADE NO ARMAZENAMENTO DE SOJA SOBRE RENDIMENTO E QUALIDADE DE GRÃOS E DO ÓLEO PARA BIODIESEL

Micotoxinas em alimentos produzidos no brasil

XXIX CONGRESSO NACIONAL DE MILHO E SORGO - Águas de Lindóia - 26 a 30 de Agosto de 2012

Identificação de aflatoxinas em paçocas de amendoim comercializadas na cidade de Lavras-MG

EFEITO DO CONTATO DOS FRUTOS DO CAFEEIRO COM O SOLO DA LAVOURA EM SUA QUALIDADE FINAL

Transcrição:

Braz. J. Food Technol., III SSA, novembro 2010 DOI: 10.4260/BJFT20101304114 Micotoxins and food safety in soybeans storage Autores Authors Marcelo Alvares de OLIVEIRA Embrapa Soja Rod. Carlos João Strass, Bloco Pesq II Caixa Postal: 231 CEP: 86001-970 Londrina/PR - Brasil e-mail: malvares@cnpso.embrapa.br Irineu LORINI Embrapa Soja e-mail: lorini@cnpso.embrapa.br Carlos Augusto MALLMANN Universidade Federal de Santa Maria (UFMS) e-mail: mallmann@lamic.ufsm.br Autor Correspondente Corresponding Author Resumo Micotoxinas associadas aos grãos são uma das principais causas de não conformidade em relação a alimentos seguros e as impurezas e/ou matérias estranhas presentes podem estar associadas à sua maior incidência. Amostras de grãos de soja e respectivas impurezas foram avaliadas na recepção e na expedição de uma Unidade Armazenadora de grãos da região norte do Estado do Paraná na safra 2008/2009. As micotoxinas avaliadas no Laboratório de Análises Micotoxicológicas (LAMIC, em Santa Maria-RS) foram: aflatoxinas (B1, B2, G1, G2), deoxinivalenol, nivalenol, ocratoxina A e zearalenona. Os resultados mostraram baixa ocorrência de micotoxinas em grãos de soja quando armazenados de forma correta. A grande fonte de contaminação por aflatoxina e zearalenona são as impurezas e/ou matérias estranhas permitidas na legislação brasileira até o limite de 1%. A legislação deve ser alterada e deve ser adotado o limite zero de impurezas, na etapa de expedição, visando garantir a segurança alimentar na cadeia produtiva da soja. Palavras-chave: Armazenagem de grãos; Segurança alimentar; Glycine Max; Toxinas. Summary Mycotoxins are an important contaminant on grains mainly on the impurities which coming with from the field during harvesting. Samples of soybean grain and their impurities were taken at reception of storage unit, during storage period and at delivering to industries for processing at a Grain Stored Unit located at north of Parana State 2008/2009 crop season. The mycotoxins evaluated at Analytical Laboratory Mycotoxicological (LAMIC in Santa Maria / RS) were: aflatoxins (B1, B2, G1, G2), deoxynivalenol, nivalenol, ochratoxin A and zearalenone. Results showed that soybean grains when stored properly have low occurrence of mycotoxins. The major source of contamination by aflatoxin and zearalenone were impurities allowed at a rate of 1% by Brazilian legislation. The legislation should be amended and adopted the zero limit of impurities in the stage of shipment in order to ensure a safe food in soybean chain. Key words: Grain storage; Food safety; Food security; Glycine max; Toxins.

1 Introdução O Brasil é o segundo maior produtor mundial de soja e, na safra de 2009/10, alcançou patamares de 68,7 milhões de t, ficando apenas atrás dos Estados Unidos (CONAB, 2010). Nas Unidades Armazenadoras de Grãos (UAs), as operações de pré-armazenamento incluem colheita, transporte, recepção, pré-limpeza, secagem, limpeza ou seleção, e expurgo preliminar. Observe-se que nem sempre são realizadas todas estas operações; entretanto, a pré-limpeza e a secagem são geralmente compulsórias (ELIAS e OLIVEIRA, 2009). Os grãos são porosos e, ao serem armazenados, se comportam como uma massa de grãos. Assim sendo, a presença de impurezas e/ou matérias estranhas pode formar partículas menores que os espaços intergranulares, diminuindo a porosidade, dificultando a aeração da massa de grãos e comprometendo a qualidade durante o armazenamento. Nas UAs, são armazenados os grãos com a menor quantidade possível de impurezas e/ou matérias estranhas em silos/graneleiros. As impurezas e/ou matérias estranhas são separadas durante as operações de pré-armazenamento e estocadas em sacarias. No processo de expedição da soja, essas impurezas e/ou matérias estranhas podem ser misturadas novamente à massa de grãos, até o limite de 1% permitido pela legislação brasileira. Micotoxinas associadas aos grãos são uma das principais causas de não conformidade em relação a alimentos seguros e as impurezas e/ou matérias estranhas presentes podem estar associadas à sua maior incidência. A micotoxina é um metabólito secundário produzido por certos tipos de fungos, que podem causar danos aos animais e ao homem devido ao seu potencial tóxico. Os produtos agrícolas estão constantemente sujeitos à contaminação fúngica, sendo que as principais espécies de fungos toxigênicos com capacidade de produzir micotoxinas são aqueles dos gêneros Aspergillus, Penicillium e Fusarium. Em grãos e produtos processados de soja, as principais micotoxinas relatadas são: aflatoxinas (B1, B2, G1, G2), deoxinivalenol, nivalenol, ocratoxina A e zearalenona, (GONÇALEZ et al., 2001; SASSAHARA et al., 2003; MARTINELLI et al., 2004). As aflatoxinas e as ocratoxinas são produzidas pelos fungos do gênero Aspergillus, enquanto deoxinivalenol, nivalenol e zearalenona, pelos fungos do gênero Fusarium (SALINAS, 2006). O objetivo deste trabalho foi verificar a presença de aflatoxinas (B1, B2, G1, G2), deoxinivalenol, nivalenol, ocratoxina A e zearalenona em grãos de soja e nas impurezas e/ou matérias estranhas, em uma Unidade de Armazenadora de Grãos da região norte do Estado do Paraná, durante as etapas de pós-beneficiamento e final da armazenagem (expedição) na safra 2008/2009. 2 Material e métodos 2.1 Amostragem 2.1.1 Pós-beneficiamento Os grãos foram recepcionados e no mesmo dia passaram pela etapa de beneficiamento. Após a pré-limpeza, última etapa do beneficiamento, 100g de amostras separadas de soja transgênica, soja convencional e respectivas impurezas e/ou matérias estranhas foram retiradas a cada 30 min. Assim, em cada dia de amostragem, foram retiradas amostras compostas que, quarteadas na Embrapa Soja, deram origem às seguintes amostras simples: Amostra 1 - Soja convencional recepcionada dia 16/03/2009; Amostra 2 - Soja convencional recepcionada dia Amostra 3 - Soja transgênica recepcionada dia 05/03/2009; Amostra 4 - Soja transgênica recepcionada dia Amostra 5 - Impurezas e/ou matérias estranhas de soja convencional recepcionada dia 16/03/2009; Amostra 6 - Impurezas e/ou matérias estranhas de soja convencional recepcionada dia Amostra 7 - Impurezas e/ou matérias estranhas de soja transgênica recepcionada dia 05/03/2009; Amostra 8 - Impurezas e/ou matérias estranhas de soja transgênica recepcionada dia 04/04/2009. As amostras foram acondicionadas em caixas de papelão com capacidade para armazenar 1 kg e, em seguida, encaminhadas para o Laboratório de Análises Micotoxicológicas (LAMIC, em Santa Maria-RS). 2.1.2 Expedição A retirada das amostras no final da armazenagem (etapa de expedição) ocorreu com a finalidade de avaliar as amostras após armazenamento e seguiu o mesmo padrão da etapa de recepção. Em relação às impurezas e/ ou matérias estranhas, somente foram retiradas amostras do material transgênico, pois não havia mais as impurezas e/ou matérias estranhas para serem misturadas na Braz. J. Food Technol., III SSA, novembro 2010 88

expedição da soja convencional, que ficou armazenada por um período maior. Em cada dia de amostragem, foram retiradas amostras a cada 30 min, que foram agrupadas e posteriormente quarteadas na Embrapa Soja, dando origem às seguintes amostras simples: Amostra 9 - Soja convencional expedida dia 05/10/2009; Amostra 10 - Soja convencional expedida dia 26/09/2009; Amostra 11 - Soja transgênica expedida dia 27/07/2009; Amostra 12 - Soja transgênica expedida dia 27/07/2009; Amostra 13 - Impurezas e/ou matérias estranhas de soja transgênica expedida dia 27/07/2009; Amostra 14 - Impurezas e/ou matérias estranhas de soja transgênica expedida dia 27/07/2009. As amostras foram acondicionadas em caixas de papelão com capacidade para armazenar 1 kg e, em seguida, encaminhadas para o Laboratório de Análises Micotoxicológicas (LAMIC, em Santa Maria-RS). 2.2. Métodos de determinação Para extração de aflatoxinas, zearalenona, deoxinivalenol e nivalenol, 50g de amostra foram pesados em um copo blender, seguido da adição de 100 ml de solução acetonitrila:água (84:16, v/v), sendo a solução agitada por 3 min. Em seguida, as amostras foram filtradas evaporadas sob fluxo de nitrogênio. O extrato seco foi dissolvido em 1 ml de solução acetonitrila:água (84:16, v/v), sendo então conduzido ao sistema automatizado de purificação em fase sólida com sílica-gel. Após a purificação, para análise de aflatoxinas, 200 µl do extrato foram derivatizados com ácido trifluoroacético por 10 min a 65 C. Em seguida, as amostras foram conduzidas à análise por cromatografia liquida de alta eficiência e detecção por Espectrometria de Massas (CLAE MS/ MS). Para análise de ocratoxina A, 10 g de amostra foram pesados em erlemeyer, seguido da adição de 60 ml de clorofórmio e 5 ml de solução 1% ácido fosfórico. Após agitação (30 min), a amostra foi filtrada e 10 ml do filtrado foi evaporado sob fluxo de nitrogênio a 65 C. O extrato seco foi dissolvido com 600 µl de solução acetonitrila:água (55:45, v/v) e centrifugado com 1000 µl de hexano por 10 min a 2500 rpm. Após centrifugação, a fase orgânica foi coletada em vial e conduzida à análise por cromatografia líquida de alta eficiência e detecção por fluorescência. Os resultados foram expressos em µg.kg -1. Os limites de quantificação e coeficiente de recuperação foram: AFB1 (Aflatoxina B1) 1 µg.kg -1 e 94,5%; AFB2 (Aflatoxina B2) 1 µg.kg -1 e 80,0%; AFG1 (Aflatoxina G1) 1 µg.kg -1 e 88,5%; AFG2 (Aflatoxina G2) 1 µg.kg -1 e 88,1%; ZEA (Zearalenona) 10 µg.kg -1 e 85,0%; DON (Deoxinivalenol) 140 µg.kg -1 e 94%; NIV (Nivalenol) 10 µg.kg -1 e 74%, e OTA (Ocratoxina A) 2 µg.kg -1 e 80%. 3 Resultados e discussão Na etapa de recepção, a única micotoxina encontrada nos grãos de soja foi a aflatoxina B1, na concentração de 1 ppb, nas duas amostras de soja convencional. Nos grãos de soja transgênica, não foi detectada nenhuma micotoxina (Tabela 1). Em relação às impurezas e/ou matérias estranhas amostradas na etapa de recepção, verificou-se a presença de aflatoxina B1 em todas as amostras, com valores variando de 1,6 a 9,8 ppb, sendo este último valor muito próximo ao limite máximo para sementes oleaginosas, que é de 10 ppm (consulta publica nº 100, de 21 de dezembro de 2009 da ANVISA). Foi verificada a presença de zearalenona em uma amostra de impurezas e/ou matérias estranhas. Na Europa, todos os produtos derivados de cereais devem apresentar limites inferiores a 100 ppb de zearalenona, não existindo regulamentação desta micotoxina em soja e seus derivados (FREIRE et al., 2007). No Brasil, não há legislação para essa micotoxina. Na etapa de expedição, verificou-se indiretamente que a armazenagem ocorreu de forma correta, devido à ausência de micotoxinas nos grãos de soja transgênicos e convencionais (Tabela 2). Tabela 1. Resultados fornecidos pelo laboratório LAMIC, para análise de micotoxinas em µg.kg 1 nos grãos de soja e impurezas e/ou matérias estranhas, provenientes da recepção de uma UAG da região norte do Estado do Paraná, na safra 2008/2009. Amostra AFB1 AFB2 AFG1 AFG2 DON NIV OTA ZEA 1 1,0 ND ND ND ND ND ND ND 2 1,0 ND ND ND ND ND ND ND 3 ND ND ND ND ND ND ND ND 4 ND ND ND ND ND ND ND ND 5 2,9 ND ND ND ND ND ND 12,9 6 4,6 ND ND ND ND ND ND ND 7 9,8 ND ND ND ND ND ND ND 8 1,6 ND ND ND ND ND ND ND Braz. J. Food Technol., III SSA, novembro 2010 89

Tabela 2. Resultados fornecidos pelo laboratório LAMIC, para análise de micotoxinas em µg.kg 1 nos grãos de soja e impurezas e/ou matérias estranhas, provenientes da expedição de uma UAG da região norte do Estado do Paraná, na safra 2008/2009. Amostra AFB1 AFB2 AFG1 AFG2 DON NIV OTA ZEA 9 ND ND ND ND ND ND ND ND 10 ND ND ND ND ND ND ND ND 11 ND ND ND ND ND ND ND ND 12 ND ND ND ND ND ND ND ND 13 1,8 ND ND ND ND ND ND 13,1 14 2,8 ND ND ND ND ND ND 31,6 Gonçalez et al. (2001) não encontraram nenhuma micotoxina em amostras de grãos de soja analisadas no Instituto Biológico entre os anos de 1989 e 1999. Entretanto, esses autores relataram a presença de aflatoxinas em farelo de soja. Assim, a presença de aflatoxinas pode estar associada às condições de armazenamento dos grãos ou do farelo de soja. Já em relação às impurezas e/ou matérias estranhas na etapa de expedição, verificou-se a presença de aflatoxinas B1 e zearalenona em todas as amostras, sendo que a contaminação por zearalenona foi bastante expressiva em uma das amostras, superando o limite imposto pela Romênia para todos os alimentos, que é de 30 ppb (LEGISLAÇÃO..., 2010). Dessa forma, a fonte de contaminação de micotoxinas foram as impurezas e/ ou matérias estranhas que podem ser misturadas até o limite de 1% na etapa de expedição, comprometendo a segurança alimentar da soja e de toda sua cadeia alimentar. Martinelli et al. (2004) afirmaram que a maioria dos isolados brasileiros de Fusarium graminearum produz nivalenol como a principal toxina dos tricotecenos, sendo que esta espécie também pode produzir a toxina deoxinivalenol. Entretanto, não foi constatada a presença de nenhuma destas micotoxinas nos grãos de soja e impurezas e/ou matérias estranhas neste ensaio. Fick et al. (2004) avaliaram a presença de ocratoxina A em 69 amostras de grãos de soja e derivados, durante o período de janeiro de 2001 a abril de 2004, e relataram a contaminação de 10,14%, ou seja, em sete amostras. Portanto, a ocorrência de ocratoxina A pode ocorrer em grãos de soja ou derivados. No presente estudo, esta micotoxina também não foi detectada em nenhuma das amostras. 4 Conclusões Os resultados obtidos permitem concluir que: Os grãos de soja quando armazenados de forma correta apresentam baixa ocorrência de micotoxinas. Entretanto, a grande fonte de contaminação por aflatoxina B1 e zearalenona são as impurezas e/ou matérias estranhas Referências permitidas na legislação brasileira até o limite de 1%. A legislação deve ser alterada e ser adotado o limite zero de impurezas na etapa de expedição, visando garantir um alimento seguro na cadeia produtiva da soja. AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA - ANVISA. Consulta Pública nº 100, de 21 de dezembro de 2009. Disponível em: <http://www.anvisa.gov.br>. Acesso em: 13 jan. 2010. COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO - CONAB. Soja Brasil. Série Histórica de Produção Safras 1976/77 a 2009/10. Disponível em: <http://www.conab.gov.br/conabweb/ index.php?pag=131>. Acesso em: 30 jun. 2010. ELIAS, M. C.; OLIVEIRA, M. Aspectos Tecnológicos Legais na Formação de Auditores Técnicos do Sistema Nacional de Certificação de Unidades Armazenadoras. Pelotas: Santa Cruz, 2009. 430 p. FICK, F. A.; ARAUJO, D. D. F.; DILKIN, M.; DILKIN, P.; MALLMANN, C. A. Prevalência de Ocratoxina A em soja e seus derivados. In: Congresso de Ciências Farmacêuticas de Cascavel, 2004, Cascavel. Simpósio em Ciência e Tecnologia de Alimentos do Mercosul, 2004, Cascavel. Anais... Cascavel: 2004. FREIRE, F. C. O.; VIEIRA, I. G. P.; GUEDES, M. I. F.; MENDES, F. N. P. Micotoxinas: Importância na Alimentação e na Saúde Humana e Animal. Fortaleza: Embrapa Agroindústria Tropical, 2007. 48 p. GONÇALEZ, E.; PINTO, M. M.; FELICIO, J. D. Análise de micotoxinas no instituto biológico de 1989 a 1999. Biológico, São Paulo, v. 63, n. 1/2, p. 15-19, 2001. LEGISLAÇÃO sobre micotoxinas. Disponível em: <http://www. micotoxinas.com.br/legisla.html>. Acesso em: 13 jan. 2010. MARTINELLI, J. A.; BOCCHESE, C. A. C.; XIE, W.; O DONNELL, K.; KISTLER, H. C. Soybean oid blight and root rot caused by lineages of the Fusarium graminearum and the production of Braz. J. Food Technol., III SSA, novembro 2010 90

mycotoxins. Fitopatolologia Brasileira, Lavras, v. 29, n. 5, p. 492-498, 2004. SALINAS, V. M. V. Micotoxinas: un factor de riesgo la seguridad alimenticia. Revista Aniame, Praga, v. 11, n. 54, p.10-14, 2006. SASSAHARA, M.; YANAKA, E. K.; PONTES NETO, D. Ocorrência de aflatoxina e zearalenona em alimentos destinados ao gado leiteiro na Região Norte do Estado do Paraná. Semina: Ciências Agrárias, Londrina, v. 24, n. 1, p. 63-72, 2003. Braz. J. Food Technol., III SSA, novembro 2010 91