Lesões Ortopédicas nas Categorias de Formação de um Clube de Futebol

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Transcrição:

Rev Bras Ortop. 2013;48(1):41-45 www.rbo.org.br/ Artigo Original Lesões Ortopédicas nas Categorias de Formação de um Clube de Futebol Daniel Augusto de Carvalho 1* 1 Médico Ortopedista e Traumatologista do Centro de Formação de Atletas Ninho da Gralha, Paraná Clube, Quatro Barras, Paraná, Brasil. Trabalho feito no Centro de Formação de Atletas Ninho da Gralha, Paraná Clube, Quatro Barras, Paraná, Brasil. informações sobre o artigo resumo Histórico do artigo: Recebido em 25 de agosto de 2011 Aprovado em 21 de dezembro de 2011 Palavras-chave: Futebol Ferimentos e Lesões Introdução: O futebol é uma das modalidades esportivas mais populares do mundo, com aproximadamente 400 milhões de praticantes. Toda atividade física gera uma sobrecarga em algum ponto do aparelho locomotor, sobretudo em atletas jovens. Objetivo: fazer o levantamento epidemiológico das lesões ortopédicas de um departamento médico das categorias de formação de um clube de futebol de Curitiba. Métodos: Levantamento epidemiológico das lesões em 310 atletas durante as temporadas 2009 e 2010. Resultados: O número de registros de atendimentos por atleta foi de 3,64 queixas ortopédicas em dois anos. Além disso, encontramos 2,88 lesões/1.000 h de jogo, sendo a categoria júnior (sub 20 e sub 18) com a maior taxa (3,05). A lesão mais frequente foi a contusão (32,15%) em membros inferiores, principalmente coxa (3,94%). A maior incidência de lesões ocorreu nos meio-campistas (30,65%), sendo os treinos responsáveis por 88,31% das queixas. Conclusão: O levantamento epidemiológico dos atendimentos médicos de um departamento médico é instrumento importante para análise das principais queixas, bem como o meio principal para medidas de prevenção e manutenção da saúde dos atletas. 2013 Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia. Publicado pela Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados. Orthopedic Injuries in a Formation of a Soccer Club abstract Keywords: Football Wounds and Injuries Training Categories Introduction: Football is one of the most popular sports in the world with approximately 400 million practitioners. All physical activity generates an overload somewhere in the locomotor system, above all, in young athletes. Objective: To conduct the epidemiological survey of orthopedic injuries in a medical department of the categories of junior soccer a football club in Curitiba. Methods: Epidemiological survey of injuries in 310 different athletes during the 2009 and 2010 seasons. Results: The number of recorded visits was *Autor para correspondência: Rua Rio Grande do Sul 116, apto 133, Curitiba, PR, Brasil. CEP: 80620-080. E-mail: decarvalho78@hotmail.com; ortopedia.esporte@hotmail.com ISSN/$ see front matter 2013 Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia. Publicado pela Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.

42 Rev Bras Ortop. 2013;48(1):41-45 3.64 per athlete orthopedic complaints in two years. Furthermore, we find 2.88 injuries / 1,000 hours of play, and the junior (under 20 and under 18) with the highest rate (3.05). The most frequent injury was contusion (32.15%), lower limbs, especially the thigh (3.94%). The higher incidence of injuries occurred in the Middle - campers (30.65%), being the training responsible for 88.31% of the complaints. Conclusion: The epidemiological survey of medical care is a medical department is important tool for analysis of the main complaints, as well as the primary means of prevention and maintaining the health of athletes. 2013 Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia. Published by Elsevier Editora Ltda. All rights reserved. Introdução O futebol é a modalidade esportiva mais praticada e popular no mundo, com mais de 400 milhões de adeptos em aproximadamente 186 países, segundo a Fifa (Fédération Internationale de Football Association). 1,2 A prática desse esporte depende do desenvolvimento adequado de fatores táticos, técnicos, nutricionais, psicológicos e físicos, 3 sendo a equipe dividida em: goleiros, zagueiros, laterais, meio-campistas e atacantes, percorrendo diferentes distâncias, com intensidades e movimentos diferenciados. 4 Toda atividade física gera uma sobrecarga em algum ponto do aparelho locomotor 5 e o aumento da prática esportiva também provoca um aumento considerável na incidência de lesões. 2 Além disso, a busca pela evidência e pelo sucesso impõe aos atletas necessária e inevitável condição de serem submetidos a esforços físicos e psíquicos muito próximos dos seus limites fisiológicos que os expõem a uma faixa de atividade potencialmente patológica e resulta em alto número de lesões esportivas. 6 O futebol é a maior causa de lesões em atletas no mundo e essas são responsáveis por 50% a 60% de todas as lesões esportivas na Europa. 7,8 Dentre todos os traumas físicos tratados em hospitais europeus, entre 3,5% e 10% são causados pelo futebol. Além disso, a idade tem sido um fator importante nos estudos de exposição a fatores de risco de lesões, uma vez que observa-se um número maior de lesões nos adultos em relação a atletas jovens. 7,9-11 Raramente as equipes de formação de atletas apresentam profissionais da saúde atuando diretamente na avaliação de fatores de risco e reabilitação de lesões, bem como poucos trabalhos têm investigado a incidência de lesões nesses atletas. Objetivo Fazer um levantamento epidemiológico das lesões ortopédicas de um departamento médico das categorias de formação de um clube de futebol de Curitiba. Materiais e métodos Fez-se levantamento epidemiológico das lesões e dos atendimentos clínicos que ocorreram durante duas temporadas (24 meses), de janeiro de 2009 a dezembro de 2010, em um clube de formação de jogadores de futebol de campo (Paraná Clube), na cidade de Curitiba, PR. Participaram do estudo 310 atletas que estavam registrados durante as temporadas analisadas. Os atletas que permaneceram no clube para a temporada de 2010 foram excluídos do cálculo total, uma vez que já estavam incluídos no total da temporada de 2009. De acordo com as idades, foram divididos em três categorias: pré-infantil/infantil (sub 15 anos 116 atletas), juvenil (sub 16 e 17 anos 105 atletas) e juniores (sub 18 e 20 anos 89 atletas). As categorias apresentaram períodos de treinos e jogos diferentes, sendo divididos em período preparatório e período competitivo, totalizando 79 semanas para a categoria infantil (1.016 h), 77 semanas para categoria juvenil (1.254 h) e 87 semanas para a categoria júnior (1.520 h). As queixas dos atletas chegaram a 1.548 registros (clínicas = 419 ; traumáticas = 1.129), sendo destacados: localização e tipo de lesão por seguimento corporal; distribuição por posição tática dos jogadores; momento da ocorrência da lesão (treino ou jogo). Os dados foram tabulados usando-se o programa Excel (Microsoft Office 2007). A definição de lesão usada foi qualquer acontecimento ocorrido durante jogos ou treinos do clube, com redução ou afastamento completo da participação dos atletas nas atividades esportivas. 12 A prevalência das lesões foi expressa em número de lesões por 1.000 horas de jogo/treino por atleta. Além disso, foi analisada a posição do atleta, bem como em que momento a lesão ocorreu (treino ou jogo oficial). Resultados Foram relatadas 1.548 queixas, sendo 419 (27,07%) clínicas e 1.129 (72,93%) ortopédicas. Em relação ao total de queixas ortopédicas, observamos 3,64 queixas por atleta, sendo que a categoria júnior apresentou 36,49 % das lesões, seguida pela categoria infantil (34,63%) e pela categoria juvenil (28,88%) (Tabela 1). Em relação ao tipo de lesão encontramos os seguintes resultados em ordem decrescente: contusão (32,15%), dor muscular (28,70%), entorses (19,22%), bursites/tenossinovites e tendinopatias (8,41%), dor articular (3,37%), ferimentos (2,48%), contratura (1,15%) e fraturas (0,71%) (Tabela 2).

Rev Bras Ortop. 2013;48(1):xx-xx):41-45 43 Tabela 1 - Incidência de queixas por categoria. Júnior Juvenil Infantil Número total Número de atletas 28,70% 33,87% 37,41% 310 Número de queixas 36,30% 28,35% 35,33% 1.548 Traumáticas 26,61% 21,06% 25,26% 1.129 Clínicas 9,69% 7,30% 10,08% 419 Queixas/atleta 6,31 4,18 4,72 4,99 Tabela 2 - Incidência de lesões traumáticas. Tipo de lesão % total queixas % queixas traumáticas Incidência de lesão por posição Contusão 23,46% 32,15% Dor muscular 20,93% 28,70% Entorses 14,02% 19,22% Tendinopatias/ bursites 6,14% 8,41% Lesão muscular 2,78% 3,81% Dor articular 2,45% 3,37% Ferimentos 1,81% 2,48% Contratura 0,84% 1,15% Fraturas 0,52% 0,71% GOL: goleiro; ZAG: zagueiro; LAT: lateral; MEIO: meio-campista; ATAC: atacante. Tabela 3 - Queixas traumáticas por 1.000 h jogo e treino. Fig. 1 - Incidência de lesão por posição. Júnior Juvenil Infantil Número total Número de atletas 89 105 116 310 Total de queixas traumáticas 412 326 391 1.129 Queixas traumáticas/atleta 4,63 3,10 3,27 3,64 Queixas traumáticas/1.000 h jogo e treino 3,05 2,48 3,32 2,88 Momento da Lesão Treino Jogo Observaram-se 2,8 queixas por 1.000 h de jogo/treino por atleta, sendo que a maior incidência foi para a categoria júnior (3,05) (Tabela 3). Quando relacionada à incidência de lesões com a posição em que os atletas atuam em campo, encontramos que os meio-campistas totalizaram 30,65% das queixas (Fig. 1). Além disso, o momento mais frequente foi durante os treinos, com um total de 88,31% (Fig. 2). Os valores encontrados não tiveram diferença significativa dentro das diferentes categorias. Fig. 2 - Momento da lesão.

44 Rev Bras Ortop. 2013;48(1):41-45 Discussão No presente estudo observamos que o número de registros de lesões ortopédicas foi de 3,64 por atleta em dois anos, com uma média de 2,88 lesões/1.000 h de jogo/treino e a categoria júnior (sub 18 e sub 20) com a maior taxa (3,05). Esses dados são similares aos estudos em jovens encontrados na literatura. 11-15 Em concordância com Nilsson & Roaas 16 e Pedrinelli, 17 a lesão mais encontrada foi a contusão (32,15%), com maior frequência para os membros inferiores, principalmente coxa (3,94%). A dor muscular, sem lesão anatômica, foi a segunda queixa mais frequente (28,70%), dando destaque para os membros inferiores e a coluna lombar. A maioria dos estudos não aborda essa queixa de maneira criteriosa, uma vez que coloca os relatos de dor muscular (dor muscular tardia, mialgia pósesforço e contraturas) juntamente com as queixas de lesão musculares (lesão de fibras). No entanto, acreditamos que esse dado seja importante e que o resultado seja influenciado pela condição fisiológica muscular em formação encontrada em atletas mais jovens, associada ao aumento do volume e da intensidade de treinos para melhoria do rendimento. Além disso, podemos citar a falta de diagnóstico por meio de exames de imagem, uma vez que a estrutura para categorias de formação tem algumas restrições para realização desses exames. Entorses são lesões frequentes na prática do futebol, principalmente no tornozelo e nos joelhos. 10,11,13,14 Entorse de tornozelo (13,72%) e entorse de joelho (3,45%) foram as queixas mais frequentes, sendo que o total de entorses no período foi de 19,22%. As entorses de tornozelo na grande maioria foram de grau I, de pouca gravidade (13,37%), e para o joelho, entorses sem lesão (1,77%) tiveram uma maior frequência. Lesões ligamentares nos joelhos, principalmente aquelas que evoluem com instabilidade, são eventos preocupantes e modificam o desempenho do atleta. 18 Em nosso meio, Carazzato et al. 19 encontraram uma taxa de 13% de lesões ligamentares e meniscais no futebol masculino em 20 anos de atividade em um clube poliesportivo. No presente estudo, quatro lesões de ligamento cruzado (0,35%) e uma lesão de menisco (0,09%) foram diagnosticadas em dois anos. Observamos diferença entre os dados da literatura, como em um estudo epidemiológico de lesões no futebol em estudantes americanos, que mostrou uma incidência de 12,9% de lesões ligamentares que necessitaram reconstrução. 20 Acreditamos que a diferença significativa de lesões ligamentares do joelho em relação à literatura ocorreu pela dificuldade de compararmos populações de atletas diferentes em relação à preparação. Em nosso estudo, todos os atletas eram jovens e com preparação semelhante à dos atletas profissionais, diferentemente dos atletas estudantes, que têm uma preparação menos específica no que diz respeito à prevenção de lesões. Além disso, a maioria dos estudos faz a análise de lesões em atletas profissionais, levando a uma falta de dados específicos para as categorias de formação, que, mesmo com uma preparação semelhante aos profissionais, têm intensidade e volume nitidamente menores. Diferentemente de alguns estudos, 21-23 nos quais as lesões musculares aparecem em primeiro lugar, em nosso estudo encontramos que somente 3,81% foram diagnosticadas como lesão. Isso se justifica, pois vários trabalhos têm demonstrado grande diferença nas taxas de incidência das lesões registradas no futebol, 7,9,11,13 uma vez que existem muitas controvérsias conceituais e erros nos métodos de coleta de dados, tempo de observação, desenho e tipo de estudo. Além disso, como citado anteriormente, encontramos algumas restrições em relação à confirmação por meio de exames de imagem, fato esse comum no departamento médico de categorias de formação. As lesões ósseas devem ser observadas com cautela, uma vez que não encontramos atletas que apresentassem fraturas graves. Cohen 21 relata 5,4% de fraturas e luxações em atletas profissionais. Em contrapartida, em dois anos, encontramos somente oito fraturas (0,71%); dessas, uma fratura de maxilar e uma fratura de maléolo medial que necessitaram de fixação cirúrgica. A maior incidência de lesões ocorreu nos meio-campistas (30,65%), atacantes (19,84%) e zagueiros (19,84%), em concordância com o estudo em atletas profissionais feito por Pedrinelli. 17 Esses dados podem confirmar que a mudança para um estilo de jogo mais competitivo entre as categorias de formação, visando à melhor projeção profissional, tem influenciado diretamente no surgimento de mais lesões. Esses atletas são mais exigidos fisicamente do que os demais (goleiros e laterais), pois fazem movimentos rotacionais em excesso e percorrem maiores distâncias em velocidade máxima, o que aumenta os índices de lesões. 17,21-24 O nível de competitividade dos treinos técnico-táticos assemelha-se ao de um jogo, onde a disputa pela posse da bola e por um lugar no time titular pode favorecer a incidência de algumas lesões. 25,26 Além disso, a busca pelo alto rendimento muscular por meio dos treinos físicos tem elevado o número de lesões. No atual estudo, 88,31% das queixas ortopédicas ocorreram durante ou após treinos e somente 11,69% durante ou após jogos. Em um estudo prospectivo com atletas profissionais Chomiak et al. 9 observaram que o trauma foi responsável por 81,5% das lesões ocorridas. Poucos estudos apresentam resultados comparativos entre as lesões ocorridas em treinos e em jogos. Para tanto, observamos que há uma menor incidência de lesões em jogos para as categorias de formação. Isso se explica, já que a carga de jogos para esses atletas é menor do que para os profissionais, bem como a carga de treinos é ligeiramente maior. Além disso, existe uma marcante fragilidade técnica e tática, assim como uma menor força muscular, resistência, coordenação e experiência dos atletas jovens. Conclusão A lesão mais encontrada foi a contusão, com maior frequência para os membros inferiores, principalmente coxa. A maior incidência de lesões ocorreu nos meio-campistas, principalmente durante os treinos e em atletas da categoria júnior.

Rev Bras Ortop. 2013;48(1):xx-xx):41-45 45 O levantamento epidemiológico dos atendimentos de um departamento médico é instrumento importante para análise das principais queixas, bem como o meio principal para medidas de prevenção e manutenção da saúde dos atletas. Além disso, é cada vez mais necessária a estruturação e a padronização da estrutura médica das categorias de formação dos clubes brasileiros, para evitarmos lesões precoces e incapacitantes para a prática profissional do futebol. Conflitos de interesse Os autores declaram inexistência de conflito de interesses na feitura deste trabalho. referências 1. Inklaar H, Bol E, Schmikli SL, Mosterd WL. Injuries in male soccer players: team risk analysis. Int J Sports Med. 1996;17(3):229-34. 2. Cohen M, Abdala RJ. Lesões no esporte: diagnóstico, prevenção e tratamento. Rio de Janeiro: Revinter; 2003. 3. Cohen M, Abdalla RJ, Ejnisman B, Amaro JT. Lesões ortopédicas no futebol. Rev Bras Ortop. 1997;32(12):940-4. 4. Bangsbo J, Norregaard L, Thorsoe F. Activity profile of competition soccer. Can J Sport Sci. 1991;16(2):110-6. 5. Torres SF. Perfil epidemiológico das lesões no esporte. [dissertação] Florianópolis. Universidade Federal de Santa Catarina; 2004. 6. Carazzato JG. Manual de medicina do esporte. São Paulo: Sociedade Brasileira de Medicina Esportiva/Laboratório Pfizer, 1993. 7. Keller CS, Noyes FR, Buncher CR. The medical aspects of soccer injury epidemiology. Am J Sports Med. 1987;15(3):230-7. 8. Silva AA, Dória DD, Morais GA, Prota RVM, Mendes VB, Lacerda AC, et al. Fisioterapia esportiva: prevenção e reabilitação de lesões em atletas do América Futebol Clube. Belo Horizonte: Anais do 8º Encontro de Extensão da UFMG; 2005. 9. Chomiak J, Junge A, Peterson L, Dvorak J. Severe injuries in football players. Am J Sports Med. 2000;28(5):58-68. 10. Inklaar H. Soccer injuries I: incidence and severity. Sports Med. 1994;18(1):55-73. 11. Kakavelakis KN, Vlazakis S, Vlazakis I, Charissis G. Soccer injuries in childhood. Scand J Med Sci Sports. 2003;13(3)175-8. 12. Schimidt OS, Jorgensen U, Kaalund S, Sorensen J. Injuries among young soccer players. Am J Sports Med. 1991;19(3):273-5. 13. Junge A, Chomiak J, Dvorak J. Incidence of football injuries in youth players. Am J Sports Med. 2000;28(5):47-50. 14. Kibler WB. Injuries in adolescent and preadolescent soccer players. Med Sci Sports Exerc. 1993;25(12):1330-32. 15. Peterson L, Junge A, Chomiak J, Graff BT, Dvorak J. Incidence of football injuries and complaints in different age groups and skill-level groups. Sports Med. 2000;28(5):51-7. 16. Nilsson S, Roaas A. Soccer injuries in adolescents. Am J Sports Med. 1978;6:358-61. 17. Pedrinelli A. Incidência de lesões traumáticas em atletas de futebol [tese]. São Paulo: Universidade de São Paulo; 1994. 18. Rezende UM, Camanho GL, Hernandez AJ. Alteração da atividade esportiva nas instabilidades crônicas do joelho. Rev Bras Ortop. 1993;28(10):725-30. 19. Carazzato JG, Campos LAN, Carazzato SG. Incidência de lesões traumáticas em atletas competitivos de dez tipos de modalidade esportiva. Trabalho individual de duas décadas de especialista em Medicina Esportiva. Rev Bras Ortop. 1992;27(10):745-58. 20. Yard E, Schroeder MJ, Fields SK, Collins CL, Comstock D. The Epidemiology of United States High School Soccer Injuries, 2005-2007. Am J Sports Med. 2008;36(10):1930-7. 21. Cohen M, Abdalla RJ, Ejnisman B, Amaro JT. Lesões ortopédicas no futebol. Rev Bras Ortop. 1997;32(12):940-4. 22. Stewien ETM, Camargo OPA. Ocorrência de entorse e lesões do joelho em jogadores de futebol da cidade de Manaus, Amazonas. Acta Ortop Bras. 2005;13(3):141-6. 23. Raymundo JLP, Reckers LJ, Locks R, Silva L, Hallal PC. Perfil das lesões e evolução da capacidade física em atletas profissionais de futebol durante uma temporada. Rev Bras Ortop. 2005;40(6):341-8. 24. Gould III JA. Fisioterapia na ortopedia e na medicina do esporte. São Paulo: Manole; 1993. 25. Mannrich G. Epidemiologia das lesões ocorridas na prática diária (jogo e treino) de uma equipe de futebol profissional no período de janeiro a setembro de 2001. Florianópolis, 2001. 26. Arnason A, Gudmundsson A, Dahl HA, Johannsson E. Soccer injuries in Iceland. Scand J Med Sci Sports. 1996;6(1):40-5.