A AMEAÇA DO GÁS DE XISTO AOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

Documentos relacionados
Centro de Filosofia e Ciências Humanas da UFSC. Água, Energia e o 'Gás de Xisto' como Ameaça Ambiental

Xisto (Petróleo e Gás)

GOVERNANÇA DA ÁGUA E CIDADANIA LATINOAMERICANA. Prof. Dr. Luiz Fernando Scheibe São Paulo, 26 de maio de

Dr. Prof. Eng. Juliano Bueno de Araújo Coordenador Geral Coalizão Não Fracking Brasil

Câmara Técnica de Águas. Subterrâneas CRH/SP A EXPLOTAÇÃO DO GÁS DE XISTO POR FRATURAMENTO E AS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS DO BRASIL

Exploração de Gás Natural Não Convencional Considerações

Projeto de Lei 6.904/13 Deputado Sarney Filho. Silvio Jablonski Chefe de Gabinete

Câmara dos Deputados CMDAS GÁS DE FOLHELHO, ÁGUAS SUBTERRÂNEAS E TERRITÓRIO

FONTES DE ENERGIA PROFESSOR : DANIEL DE PAULA

A GOVERNANÇA DA ÁGUA COMO FATOR DE INTEGRAÇÃO CIDADÃ NO MERCOSUL

Geografia. Claudio Hansen (Rhanna Leoncio) Água

FONTES ALTERNATIVAS DE GÁS NO BRASIL: GÁS DE XISTO

FONTES DE ENERGIA COMBUSTÍVEL FÓSSIL

FIESP - 14º ENCONTRO DE ENERGIA. Symone Christine de Santana Araújo Diretora do Departamento de Gás Natural Ministério de Minas e Energia

Gás Natural em reservatórios não convencionais SOLUÇÕES ARGENTINAS. Silvio Jablonski Assessoria de Gestão de Risco

O que são Áreas Contaminadas???

Gás não convencional e perspectivas no Brasil

Aula 5 Recursos Minerais

MINERAIS HIDROGEOLÓGICOS ENERGÉTICOS. de acordo com a finalidade

(Adaptado de Revista Galileu, n.119, jun. de 2001, p.47).

ASPECTOS TERRITORIAIS DA EXPLORAÇÃO DO GÁS DE FOLHELHO (GÁS DE XISTO) POR FRATURAMENTO HIDRÁULICO

O Shale-gas à espreita no Brasil: desmistificando a exploração dos recursos de baixa permeabilidade Fevereiro 2019

CÓDIGO NITRATO NAS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS NO ESTADO DE SÃO PAULO: COMO DESARMAR ESSA BOMBA RELÓGIO?

VULNERABILIDADE DE AQUÍFEROS

Água subterrânea... ou... Água no subsolo

Governança das Águas Subterrâneas no Brasil, exemplos de casos exitosos

A crise financeira e o. setor de energia

Ciclo hidrológico e água subterrânea. Água como recurso natural Água como agente geológico Clima Reservatórios Aquíferos

Riscos de Cheias e Secas: O papel regulador dos aquíferos

GÁS NÃO CONVENCIONAL NO BRASIL

POTENCIAL DE GÁS NATURAL EM RESERVATÓRIOS DE BAIXA PERMEABILIDADE NO BRASIL

DIAGNÓSTICO DAS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS NO MUNICÍPIO DE VILA NOVA DO SUL / RS AUTORES: Autor: Diego Silveira Co-autor: Carlos Alberto Löbler Orientador:

Agrupamento de Escolas Santa Catarina EBSARC 10º ANO 2015/2016 GEOGRAFIA A AS BARRAGENS E AS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS

ÁREAS CONTAMINADAS NO CONCELHO DO SEIXAL

Funcionamento de um reservatório de petróleo visando introduzir a criação de uma maquete funcional de óleo

Geotécnica Ambiental. Aula 1 : Introdução a Geotecnia

BLOCO V ÁGUA COMO RECURSO NO MOMENTO ATUAL. Temas: Escassez. Perda de qualidade do recurso (água) Impacto ambiental

EPE PETRÓLEO, GÁS E BIOCOMBUSTÍVEIS. Workshop: Desafios e Perspectivas do Setor Sucroenergético no Nordeste. José Mauro Coelho

Coleta de dados de campo. Tratamento de dados de campo e Determinação de parâmetros. Geração de sistemas de fraturas

Mapa das Áreas Aflorantes dos Aquíferos e Sistemas Aquíferos do Brasil

LEI DO PETRÓLEO - Nº 9.478, DE 6 DE AGOSTO DE Presidência da República - Subchefia para Assuntos Jurídicos

Tema 4 Uso da Água Subterrânea na RMSP

GÁS DE XISTO COMO FONTE ENERGÉTICA

WORKSHOP PROWATERMAN, Évora e Faro, 29 e 30 de Novembro de 2012

COMUNICAÇÃO TÉCNICA Nº

Shalegas inicio das discussões. Eng. Jaymede SETAFilho Membro do COSEMA (FIESP) Dez/2013

MODELAGEM NUMÉRICA COMO FERRAMENTA PARA A GESTÃO DAS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS

Licenciamento ambiental projetos de E&P de Gás Natural no Brasil

Os mananciais hídricos

TERCEIRÃO GEOGRAFIA FRENTE 4B AULA 12. Profº André Tomasini

Exploração e Produção de Petróleo no Brasil Aspectos do Desenvolvimento do Pré-Sal

Introdução. Aspectos geológicos. Área de Bom Lugar

Colégio XIX de Março Educação do jeito que deve ser

Tibério Pinheiro A ESTRATÉGIA DE AMPLIAÇÃO DO CONHECIMENTO HIDROGEOLÓGICO PELA AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS

João Alberto Oliveira Diniz Adson Brito Monteiro Fernando Antônio Carneiro Feitosa Marcos Alexandre de Freitas Frederico Cláudio Peixinho

Resultados do Projeto de Proteção Ambiental e Desenvolvimento Sustentável do Sistema Aqüífero Guarani e a Formação e Papel da UNEP

Perspectivas para os Setores Petróleo, Gás Natural e Combustíveis Renováveis

Brasil: características naturais - litosfera. Páginas 12 à 27

PEC 43/2000 PROPOSTA DE MUDANÇA DA DOMINIALIDADE DAS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS : POSICIONAMENTO DA AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS

I - a água é um bem de domínio público;

ÁGUAS SUBTERRÂNEAS EM CUIABÁ E VÁRZEA GRANDE MT: MENSURAÇÃO DO VOLUME PARA ATENDER AOS MÚLTIPLOS USOS

O Novo Marco Regulatório da Indústria do. Gás Natural no Brasil e seus Desafios

Petróleo. Daniela Simioni NºUSP: Rafaela Duarte Pagliarini N USP:

Potencial Exploratório Brasileiro para Gás de Folhelho

Mananciais de Abastecimento. João Karlos Locastro contato:

Gás para Geração Elétrica. Alternativa para Operadores

O GÁS NATURAL E AS OPORTUNIDADES PARA O BRASIL

Diagnóstico dos Recursos Hídricos e Organização dos Agentes da Bacia Hidrográfica do Rio Tubarão e Complexo Lagunar. Volume 5. Análise Quantitativa

Ciências Naturais 8º ano

Exercícios on line Geografia Prof. Dinário Equipe Muriaé

QUÍMICA. Energias Químicas no Cotidiano. Petróleo, Gás Natural e Carvão, Madeira, Hulha, Biomassa, Biocombustíveis e Energia Nuclear

Planejamento nacional e Integração elétrica regional. Amilcar Guerreiro Diretor de Estudos de Energia Elétrica

Gestão de Água Subterrânea. Jaime Cabral

Potencial do Pré-Sal. Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis Magda Chambriard

Profissão em expansão no Brasil e no exterior

LENA AMBIENTE, SA AMBIENTE - EVOLUÇÃO LEGAL E IMPACTO NA ENGENHARIA

Água Subterrânea 16/03/2016. Revisão: Composição do solo: Revisão: Porosidade do solo: Porosidade do solo:

Proteção de recursos hídricos subterrâneos Proteção de captações de água subterrânea

ÁGUA SUBTERRÂNEA: USO E PROTEÇÃO

NEM TUDO QUE RELUZ É OURO Recursos Minerais

Panorama dos Recursos Hídricos no Brasil. Profª Nara Luisa Reis de Andrade

Reflexões sobre a duração das jazidas de petróleo em função do consumo e do que pode ser feito para reduzir o consumo de petróleo.

SETOR PETROLÍFERO BRASILEIRO Acidenteno Campo de Frade

Energia: visão geral e petróleo

POTENCIAL ONSHORE DE PETRÓLEO E GÁS NO BRASIL

Aula 03 Solar, marés, goetérmica e fontes fósseis

ZONEAMENTO DA VULNERABILIDADE À CONTAMINAÇÃO DO SISTEMA AQUÍFERO GUARANI EM SUA ÁREA DE AFLORAMENTO NO ESTADO DE SÃO PAULO, BRASIL

GESTÃO DE PARTILHA: PERSPECTIVAS

GESTÃO DE MANANCIAIS DE ABASTECIMENTO PÚBLICO EM REGIÕES METROPOLITANAS

Exemplos de recursos naturais

Professor Thiago Espindula - Geografia. Subterrânea. Gráfico (disponibilidade de água)

Características hidroquímicas e hidrodinâmicas do aquífero na planície arenosa da Costa da Caparica

O Homem sempre utilizou materiais de origem geológica que a Natureza lhe fornecia. Idade da Pedra Idade do Bronze Idade do Ferro

Disciplina: Cartografia Geoambiental

Mini - curso Monitoramento de Águas Subterrâneas

Manejo Integrado e Sustentável dos Recursos Hídricos Transfronteiriços da Bacia do Amazonas Considerando a Variabilidade e as Mudanças Climáticas

VIII FÓRUM CAPIXABA DE ENERGIA Planejamento Energético Brasileiro: Perspectivas e Oportunidades

Transcrição:

CEDES CENTRO DE ESTUDOS E DEBATES ESTRATÉGICOS DA CÂMARA FEDERAL A AMEAÇA DO GÁS DE XISTO AOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL Prof. Dr. Luiz Fernando Scheibe Brasília, 05 de junho de 2013 DIA MUNDIAL DO MEIO AMBIENTE

A Agência Nacional do Petróleo ANP - anunciou a decisão de incluir o chamado Gás de Xisto, obtido por fraturamento da rocha (shale gas fracking), na próxima licitação, em outubro, de campos de gás natural em bacias sedimentares brasileiras.

A exploração de Gás de Xisto, apesar do sucesso econômico apresentado principalmente nos Estados Unidos, tem sido muito questionada pelos riscos e danos ambientais envolvidos. Enquanto o gás natural e o petróleo ocorrem em rochas porosas ou fraturadas com estruturas geológicas e nichos próprios, o gás de xisto impregna toda uma rocha ou formação geológica impermeável.

Shale Gas Fracking Gás de Xisto por Fraturamento

A tecnologia de extração de gás está embasada em processos invasivos da camada geológica portadora do gás, por meio da técnica de fratura hidráulica, com a injeção de água, areia e substâncias químicas, podendo ocasionar vazamentos e contaminação de aquíferos de água doce que ocorrem acima do xisto. Esta é uma grande preocupação dos técnicos e gestores da área de recursos hídricos e meio ambiente.

Instalações para extração do Gás de Xisto (cf, apres_hugo_affonso_anp_aajdaha6aa. pdf

Instalações para extração do Gás de Xisto (cf, apres_hugo_affonso_anp_aajdaha6aa. pdf

O XISTO (Folhelho = shale) Visto ao microscópio eletrônico (cf. apres_hugo_affonso_anp_aajdaha6aa. pdf)

Maior ainda é a preocupação com os altíssimos volumes de água que resultam poluídos por hidrocarbonetos e por outros compostos e metais presentes na rocha, nos explosivos e nos próprios aditivos químicos requeridos pela complexa atividade de mineração do gás, exigindo dispendiosas técnicas de purificação e de descarte dos resíduos finais.

(cf. apres_hugo_affonso_anp_aajdaha6aa. pdf)

Água e energia sempre tiveram uma relação muito estreita, mas o gás de xisto e a água são particularmente íntimos. A água é essencial para o gás do xisto e existe um mercado crescente, cujo valor estimado é de US$ 100 bilhões, só nos Estados Unidos, para o t r a t a m e n t o d a s á g u a s r e s i d u a i s. http://www.waterworld.com/articles/wwi/print/ volume-27/issue-2/regional-spotlight-europe/ shale-gas-fracking.html

(cf. apres_hugo_affonso_anp_aajdaha6aa. pdf)

A própria captação desta água pode representar uma forte concorrência com outros usos considerados preferenciais, como o abastecimento humano e a dessedentação de animais, em áreas ou períodos com deficiência hídrica no País (Bacia do Parnaíba, por exemplo).

Ou uma ameaça às reservas consideradas mineráveis de aquíferos profundos, como o Aquífero Guarani, considerado uma reserva estratégica no caso de escassez provocada pelo aumento da demanda regional ou até pelas mudanças climáticas.

Localização do SAIG/SG, mapa e perfil hidrogeológico do Estado de Santa Catarina. Fonte: www.geomundo.com.br Folhelho Irati = Xisto Betuminoso Fonte: Agência Nacional de Águas ANA,2007

O SISTEMA AQUÍFERO INTEGRADO GUARANI/SERRA GERAL (SAIG/SG) REDE GUARANI/SERRA GERAL EM SANTA CATARINA COORDENADOR TÉCNICO EM SC: LUIZ FERNANDO SCHEIBE

GÁS DO XISTO AMEAÇA O AQUÍFERO GUARANI Tubo por onde passa a mistura de gás e água poluída Aquífero Serra Geral Fratura Aquífero Guarani Xisto (Ilustração modificada de htp://www1.folha.uol.com.br/mercado/ 2013/04/1263225- polemico- gas- de- xisto- tera- leilao- no- brasil- em- outubro.shtml)

Existem claras evidências da penetração de águas sulfatadas advindas de estratos do permiano que se infiltram no SAG, como as águas termais do limite entre RS e SC, além da presença de óleo antigo em fraturas do sistema Aquífero Serra Geral nos municípios de Videira e Pinheiro Preto, em SC.

(Cf. Arthur S. Nanni, 2011)

Esses processos podem ser reativados pelas explosões e elevadas pressões hidrostáticas empregadas no processo de extração do gás de xisto.

(Cf. Arthur S. Nanni, 2011)

No Brasil, a produção de gás natural é um componente importante e crescente da matriz energética, graças às descobertas de novos campos. O Plano Decenal de Expansão de Energia PDE 2012 2021, lançado em janeiro, procura tirar partido da abundância de petróleo e gás natural.

Ele prevê que haverá ampliação da produção de petróleo de 2,1 para 5,4 milhões de barris/dia e da produção de gás natural, de 65,9 milhões para 190 milhões de m³/dia, e que o consumo total de gás natural será da ordem de 65,9 milhões de m³/dia,ou seja, apenas 1/3 da produção daquele ano.

Neste cenário positivo, parece não haver justificativa econômica ou de demanda para incluir uma fonte tão polêmica de gás o chamado Gás de Xisto. Aliás, ele não é sequer citado no Plano 2012 2021. Por que a pressa, agora, em colocar na pauta de licitação a exploração desse tipo de jazida?

(cf. apres_hugo_affonso_anp_aajdaha6aa. pdf, na FECOMÉRCIO, SP, em 17 de maio de 2013:

O grande perigo de poluição das águas superficiais e das estratégicas reservas de águas subterrâneas vem agora, pois, literalmente de baixo, mimetizando a escalada geométrica do consumismo globalizado e da concentração do capital e colocando, paradoxalmente, cada vez mais em risco a qualidade da vida das espécies que habitam a Terra.

O que estamos solicitando às autoridades responsáveis pela liberação da exploração do Gás de Xisto no Brasil, em especial a ANP e em última instância a Presidenta da República, é que seja estabelecida uma moratória de 5 anos, para aprofundar os estudos sobre os reais prejuízos ambientais dessa perigosa técnica

Estes estudos poderão, com vossa anuência, contar com o respaldo do CEDES e envolver a participação de cientistas da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e das Universidades, antes de se embarcar numa aventura de consequências imprevisíveis, especialmente sobre o Sistema Aquífero Guarani.

AGRADECIMENTOS São devidos ao CEDES, pelo honroso convite; à Rede Guarani/Serra Geral, Convênio 16261/10-2 FAPEU/FAPESC; a Luciano A. Henning, Gerôncio Rocha, Ricardo Hirata e Arthur S. Nanni, pelas contribuições e críticas; ao CNPq, pela bolsa de produtividade de Luiz Fernando Scheibe.