Alguns aspectos sobre as metáforas de Lakoff e Johnson

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Transcrição:

Alguns aspectos sobre as metáforas de Lakoff e Johnson Ronaldo de Freitas Moreira EPCAR Especialista em Língua Inglesa - Tradução - UFMG Fone: (32)4101-1640 E-mail: ronaldorfm@yahoo.com.br Data de recepção: 28/06/2011 Data de aprovação: 04/07/2011 Resenha de: LAKOFF, George; JOHNSON, Mark. Metaphors we live by. Chicago/London: The University of Chicago Press, 1980. p.3-34. George Lakoff é professor de Linguística na Universidade da Califórnia, em Berkeley, e Mark Johnson é professor de Filosofia na Universidade de Oregon. O interesse comum desses autores pela metáfora deu origem a Metaphors we live by, um importante divisor de águas que abre espaço para uma discussão que envolve linguagem e cognição. O livro é um verdadeiro empreendimento que busca a quebra de um paradigma, uma mudança no modo como entendemos a metáfora. Segundo os autores, a metáfora não deve de ser pensada apenas como uma figura de retórica responsável pelos ornamentos da linguagem. Então como ela deve ser entendida? Metaphors we live by propõe novas respostas para questões antigas, pois questiona conceitos já consagrados em torno das definições que envolvem a metáfora e o seu locus. A obra, na verdade, coloca em xeque todo um modo de pensar ocidental, filosófico e linguístico, sobre o assunto, que assenta suas origens na tradição aristotélica. Os autores mencionam, no primeiro capítulo, que a metáfora é tradicionalmente vista pela maioria das pessoas como um dispositivo da imaginação poética. A seguir, propõem um ponto de vista, que vai de encontro à tradição, segundo o qual a metáfora se faz presente em nosso cotidiano, permeia nossos pensamentos e ações e não se limita apenas ao ambiente linguístico. Nosso sistema conceitual, afirmam os autores, nos termos do qual pensamos e agimos, é metafórico por natureza. De acordo com os autores, 1

nossos conceitos estruturam o modo como percebemos e lidamos com os fatos do mundo e são até mesmo determinantes no modo como nos relacionamos socialmente. Nosso sistema conceitual, portanto, desempenha um papel crucial no modo como definimos nossa realidade cotidiana. O posicionamento dos autores nos mostra que o nosso sistema conceptual é amplamente metafórico. Assim sendo, o modo como pensamos e agimos é muito mais uma questão metafórica. A seguir, afirmam que a comunicação se baseia no mesmo sistema conceitual usado em nossos pensamentos e em nossas ações. A língua (ou linguagem), a partir desse pressuposto, é considerada uma importante fonte de evidência na definição do modo como esse sistema se apresenta. Expressões tais como Your claims are indefensible, He attacked every weak point in my argument e His criticisms were right on target refletem a metáfora ARGUMENT IS WAR (ou ARGUMENTAR É LUTAR ). Lakoff e Johnson destacam que não apenas falamos a respeito de um debate. Na realidade saímos vitoriosos ou derrotados de um evento como esse. Atacamos, defendemos e temos uma visão definida acerca do nosso oponente. Avançamos, recuamos, planejamos e usamos estratégias próprias de quem se envolve em um combate. Segundo os autores, muitas ações, próprias de um debate, são ações estruturadas pelo conceito guerra. Em uma cultura em que não haja um entendimento em tais termos e que as pessoas possuam um outro ponto de vista acerca desse evento, os resultados seriam outros. Nesse sentido, abrimos espaço para um dos mais importantes empreendimentos relacionados aos estudos da linguagem: os atos de fala. Trata-se de uma concepção de linguagem que ensejou uma virada na Linguística tradicional. A partir da contestação em torno do papel meramente descritivo das declarações, com base nas condições de verdade ou falsidade, Austin estabelece uma dicotomia entre constativo-performativo, ou seja, à linguagem não cabe apenas descrever uma realidade. É possível à linguagem mudar essa mesma realidade. A partir das considerações de Lakoff e Johnson, pode-se perceber Cognição e Pragmática como sendo disciplinas complementares na tentativa de explicar o fenômeno linguístico. 2

A seguir, os autores postulam a essência da metáfora: compreender e experienciar uma coisa em termos de outra. Expressões usadas a partir do vocabulário inerente ao conceito guerra formam um modo sistemático de se falar dos aspectos bélicos de um debate. Trata-se da sistematicidade dos conceitos metafóricos. Lakoff e Johnson, em sua obra, destacam inicialmente três tipos de metáforas: estruturais, orientacionais e ontológicas. As estruturais são aquelas responsáveis por estruturar metafórica e parcialmente um conceito em termos de outro, conforme já visto em ARGUMENT IS WAR. Já as metáforas orientacionais são as responsáveis por organizar todo um sistema de conceitos em relação a um outro. Boa parte delas está relacionada com a questão da espacialidade spatial orientation. Orientações espaciais tais como para cima/para baixo, dentro/fora, frente/trás, centro/periferia emergem pelo simples fato de os seres humanos possuírem corpos naturalmente constituídos do jeito como são, atuando em um ambiente físico em determinada cultura. As metáforas orientacionais dão aos conceitos uma orientação espacial. É possível, nesse caso, pensar no processo de ensino e aprendizagem de uma língua estrangeira a partir dos pressupostos teóricos que envolvem o programa da cognição. Contribuições como essas podem motivar o interesse pelas metodologias que contemplam os modelos cognitivos metafóricos como pontes nesse processo. Os autores sugerem que o conceito HAPPY ( FELIZ ), orientado pelo conceito UP ( PARA CIMA ), justifica a existência na língua inglesa de expressões como I m feeling up today. Reforçam, ainda, que tais orientações metafóricas não são arbitrárias, e sim ancoradas em nossa experiência física e cultural. Entretanto, reforçam os autores, apesar de as oposições up/down ( para cima/para baixo ), in/out ( dentro/fora ), front/back ( frente/trás ) serem físicas por natureza, as metáforas orientacionais podem variar de acordo com determinada cultura. Metaphors we live by oferece ao leitor uma série de exemplos que envolvem as metáforas orientacionais, tais como CONSCIOUS IS 3

UP/UNCONSCIOUS IS DOWN ( CONSCIENTE É PARA CIMA/INCONSCIENTE É PARA BAIXO ), MORE IS UP/ LESS IS DOWN ( MAIS É PARA CIMA/MENOS É PARA BAIXO ), GOOD IS UP/BAD IS DOWN ( BOM É PARA CIMA/RUIM É PARA BAIXO ) etc. Orientações espaciais como up/down, front/back, on/off ( ligado/desligado ) proporcionam uma rica base experiencial para que possamos compreender alguns conceitos em termos orientacionais. Uma terceira variedade de metáfora apresentada pelos autores é a chamada metáfora ontológica. Lakoff e Johnson apontam para o fato de o ser humano ser uma entidade limitada por uma superfície, uma entidade discreta. Seguem afirmando que nossa compreensão acerca de nós mesmos como entidades discretas nos permite impor limites artificiais onde não há contornos bem definidos. Assim sendo, ao compreendermos certas experiências como objetos ou substâncias, somos capazes de nos referir a elas, categorizá-las, agrupá-las, quantificá-las e raciocinar acerca delas. Nesse sentido, somos capazes de conceber eventos, atividades, emoções e ideias como entidades e substâncias. As metáforas ontológicas de Lakoff e Johnson servem a vários propósitos, e uma variedade de metáforas são capazes de refletir uma variedade de propósitos. Expressões como Inflation is lowering our standard of living são possíveis devido à existência da metáfora ontológica INFLATION IS AN ENTITY ( A INFLAÇÃO É UMA ENTIDADE ). Segundo os autores, ao concebermos inflação como uma entidade física, somos capazes de nos referir a ela, identificar nela um aspecto em particular, percebê-la como causa e agir a respeito disso. Metáforas ontológicas, na verdade, permitem-nos lidar racionalmente com nossas experiências. Lakoff e Johnson seguem afirmando que somos seres fisicamente constituídos, limitados e separados do resto do mundo pela superfície de nossas peles. Assim sendo, somos capazes, a partir daí, de experienciar esse mundo externo a nós como do lado de fora. Cada ser humano, afirmam, é um recipiente, e essa experiência nos permite perceber que estamos sempre dentro ou fora de algum lugar. Um quarto ou uma casa são obviamente recipientes. Podemos estar 4

dentro ou fora de um quarto ou de uma casa. No entanto, asseguram, alguns tipos de recipientes surgem a partir da projeção da chamada estrutura dentro/fora citada pelos autores. Ao construirmos uma cerca ou muro, por exemplo, estamos marcando um território de modo que haja um lado de dentro, um limite e um lado de fora. Para os autores, há poucos instintos humanos tão básicos como a territorialidade. Da mesma forma, a partir daí, é possível ao homem quantificar uma área demarcada em termos da quantidade de substância contida nesse recipiente demarcado. É dada ao homem a possibilidade de atender aos seus propósitos a partir de algumas estratégias cognitivas, e tudo isso é percebido na linguagem. Se pensarmos em termos de substantivos contáveis e não-contáveis no ensino da língua inglesa, por exemplo, tal compreensão poderia contribuir para a melhoria desse processo. Portanto, um outro aspecto possível se refere ao fato de termos a ideia do nosso corpo como um recipiente. Desde a infância há esse tipo de interação com o mundo. Mais uma vez, se esse modo de perceber a nós mesmos é refletido pela linguagem, as atividades em sala podem vir a explorar os dados dessa interação. Uma possibilidade desse aproveitamento se refere ao ensino das preposições in/out. Lakoff e Johnson mencionam a personificação como um tipo específico de metáfora ontológica em que um objeto físico é especificado como sendo uma pessoa. Esse tipo de fato cognitivo nos permite compreender uma série de experiências envolvendo entidades não-humanas em termos humanos. Alguns exemplos dados pelos autores são Inflation is eating up our profits., Inflation has robbed me of my savings, Inflation has outwitted the best economic minds in the country etc. Conforme mencionam os autores, neste caso não se trata apenas de perceber a inflação como uma pessoa (INFLATION IS A PERSON A INFLAÇÃO É UMA PESSOA ). A questão é muito mais específica, pois trata-se de percebê-la como um adversário (INFLATION IS AN ADVERSARY A INFLAÇÃO É UM ADVERSÁRIO ). 5

A metáfora INFLATION IS AN ADVERSARY justifica algumas ações políticas e econômicas por parte de governos ao estabelecerem metas e medidas. Na verdade, destacam os autores, a personificação é uma categoria geral que cobre uma ampla variedade de metáforas, cada uma delas destacando diferentes aspectos de uma pessoa ou o modo como a percebemos. A personificação é uma extensão das chamadas metáforas ontológicas, que torna possível nossa compreensão a respeito de alguns fenômenos do mundo em termos humanos. Os capítulos iniciais, objetos de nossa resenha, motivam-nos a repensar o modo como entendemos a metáfora e o seu papel na linguagem e na mente. As metáforas, segundo os autores, são fundamentalmente conceituais por natureza. Lakoff e Johnson nos mostram que elas não devem de ser pensadas apenas como uma figura de retórica responsável pelos ornamentos da linguagem. Na verdade, o modo como falamos, pensamos e agimos é uma questão essencialmente metafórica. 6