XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002



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Transcrição:

POSSÍVEIS EFEITOS DE AEROSSÓIS VULCÂNICOS NO BALANÇO RADIATIVO DA RESERVA BIOLÓGICA NACIONAL DO JARÚ NA AMAZÔNIA L.C.B. Molion - molion@ccen.ufal.br ; C.A. S. Querino - blind_al@bol.com.br ; D.C. de Menezes - cumullosnimbos@bol.com.br, E.A.Lima H.O. da Silva - edy_al@hotmail.com, J.C.C. Borba - meteorocarol@hotmail.com Departamento de Meteorologia - CCEN/UFAL ABSTRACT Incident solar and net radiation fluxes were measured above Jaru River National Biological Preserve s tropical rainforest, Rondonia, Western Amazonia, between 1991 and 1996. October 1991 to March 1992 data, when Mount Pinatubo volcanic aerosols reached maximum concentration within the 20 N-20 S belt, were compared to October 1995 to March 1996 data, when the stratosphere had returned to pre-pinatubo conditions. The first period presented 2.6 MJm -2 per day, or 30 Wm -2, reduction in the solar flux and 7% reduction of the atmospheric bulk transmissivity. CO 2 assimilation was reduced by 0.4 kgc/ha/h, equivalent to 1 million tons of carbon if generalized for the entire preserve area. INTRODUÇÃO Os vulcões explosivos apresentam erupções repentinas e violentas, descarregando grande quantidade de gases e material particulado, como dióxido de enxofre (SO 2 ) em especial, diretamente na estratosfera, entre 20 e 40 km de altitude, afetando o tempo e o clima na escala global. O SO 2 combina-se com a umidade existente na estratosfera e forma pequenas gotículas, denominadas aerossóis, que possuem refletividade de 99% e persistem por 3 a 4 anos em suspensão. Esses aerossóis aumentam o albedo planetário, reduzindo a radiação solar incidente na superfície e a energia disponível (saldo de radiação) para os processos de superfície terrestre. Em um dia de junho de 1982, após a erupção do El Chichón (México), De Luisi et al (1983) registraram um significativo decréscimo de 7,7% na radiação global, cerca de 30wm -2, em Mauna Loa (Hawai). Durante os primeiros meses após a erupção do Monte Pinatubo, que ocorreu em junho de 1991, houve aumento de 2% a 3% no albedo planetário e reduções de mais de 10 wm -2 sobre a Amazônia, de acordo com análises de dados de satélites (Minnis et al, 1993). Lacis et al (1992) estimaram uma redução de 3 Wm -2 para cada aumento de 0,1 na profundidade óptica. No caso do Monte Pinatubo, em que as concentrações mais altas ocorreram sobre a faixa tropical (20 N-20 S), com pico de concentração entre 3 S-5 S no final de 1991 e início de 1992, representariam reduções entre 15wm -2 logo após a erupção. Ë possível que o balanço de energia de florestas tropicais chuvosas, fontes de calor latente para a circulação geral da atmosfera, seja importante para determinar as configurações de tempo e que sua variabilidade interanual esteja relacionada à variabilidade do clima na escala global. Este trabalho teve o objetivo de avaliar uma possível influência de aerossóis vulcânicos, decorrentes da erupção do Monte Pinatubo, sobre o balanço de radiação na Amazônia Ocidental e dar uma contribuição para o melhor entendimento de sua variabilidade interanual. METODOLOGIA Foram utilizados os dados de fluxos de radiação global (Rg) e saldo de radiação (Rn) registrados por estações meteorológicas automáticas instaladas em um dos sítios experimentais do Projeto ABRACOS (Anglo Brazilian Amazonian Climate Observacional Study). Esse sítio está localizado na área de floresta da Reserva Biológica Nacional do Jarú, situado a 10 05 S e 61 55 W, a 120 m de altitude e distante 80 km a nordeste da cidade Ji-Paraná, Rondônia, Amazônia Ocidental. Foram selecionados dois períodos, um compreendido entre outubro de 1991 e março de 1992, quando os aerossóis vulcânicos estavam com concentração máxima, e um entre outubro de 1995 e março de 1996, quando a estratosfera tinha retornado às condições pré-pinatubo. Na região, a estação chuvosa se estende de outubro a abril, em média. Uma razão adicional, por terem sido escolhidos os períodos chuvosos, foi para evitar a interferência dos aerossóis e partículas troposféricos resultantes das queimadas, que são comuns na estação seca. Foram utilizados, ainda, dados de radiação solar no topo da atmosfera, calculados a partir de fórmulas convencionais com a finalidade de se calcular uma transmissividade totalizadora média para a atmosfera local, dada pela razão entre o total integrado do fluxo de radiação global médio diário e o total integrado fluxo de radiação no topo da atmosfera ou radiação extraterrestre. Dados de radiação de onda longa emergente 2842

(ROL), obtidos do CPC/NCEP/NOAA, foram usados para verificar a possível interferência dos aerossóis no efeitoestufa, bem como variabilidade da cobertura de nuvens e precipitação entre os dois períodos. Foram feitas correlações lineares entre Rg e Rn nos dois períodos, onde Rg foi tomada como variável independente, com o objetivo de se estabelecerem relações lineares entre Rn e Rg que possam ser utilizadas para análise de dados e preenchimentos de falhas e verificar se haveria diferença significativa entre os dois períodos e concordância com valores obtidos por outros pesquisadores. A assimilação de CO 2 através da fotossíntese da vegetação, ou a taxa de troca líquida de CO 2 entre o ecossistema e a atmosfera (TLE), é função da radiação solar incidente, se água não for fator limitante e a copa do ecossistema for bem desenvolvida. Uma redução do fluxo de radiação implica numa redução da TLE e, conseqüentemente, da produtividade primária do ecossistema. Fan et al (1990) estimaram que a TLE do ecossistema da Reserva Florestal Ducke, INPA/MCT, Manaus, Amazonas, em função da radiação solar incidente (S ), seria dada por TLE = c 1 + c 2 S /(c 3 +S ) (1) onde c 1 = 4,1 (±1)kgC/ha/h, c 2 = -18.4(±3.8)kgC/ha/h e c 3 = 411(±1)Wm -2 com r 2 =0,90. Essa equação foi obtida através do método de ajuste pelos mínimos quadrados. Um ajuste linear aos dados produziu a equação TLE = 2,2 0,015 S (2) com r 2 =0,86 e unidades em kgc/ha/h. A equação (2) foi utilizada para calcular a variação da TLE neste estudo. RESULTADOS E DISCUSSÃO Na Figura 1 foi apresentada a variabilidade média horária da radiação global (Rg) e do saldo de radiação (Rn) ao longo do dia, ou seja, seu ciclo diário, durante o período de outubro de 1991 a março de 1992. A Figura 2 é semelhante, só que para o período outubro de 1995 a março de 1996, quando a atmosfera já tinha retornado às condições pré-pinatubo. Foi feita a comparação entre os ciclos diários de Rg e Rn para os dois períodos estudados, que foram apresentados nas Figuras 3 e 4. Observa-se nitidamente, na Figura 3, que a curva de Rg, para o período 1991/92, foi inferior a do período 1995/96 em valores absolutos em todos os horários, com uma diferença média diária de 30 Wm -2 aproximadamente. A integração, ao longo do dia, dos valores médios horários resultou num total de 17,13 MJm -2 para 1991/92 enquanto a de 1995/96 apresentou um total diário médio de 19,72 MJm -2., ou seja, o primeiro período, em que havia a presença do aerossóis vulcânicos na estratosfera, registrou um total integrado médio de radiação solar incidente 15% inferior ao período pós-pinatubo. A integração do saldo de radiação (Rn) resultou nos valores médios diários de 12,46 MJm -2 e 14,35 MJm -2 para 1991/92 e 1995/96, respectivamente. Embora a diferença, em valores absolutos, entre os dois períodos seja significativa (1,9 MJm -2 ), a razão Rn/Rg surpreendentemente permaneceu constante e igual 73%. O mesmo percentual de 73% para dois períodos distintos sugere que o saldo de radiação seja controlado primeiramente pelas características da superfície e condições da camada limite superficial e que guarde uma relação linear com a radiação global. A transmissividade totalizadora média foi calculada através do quociente entre o total diário integrado médio da radiação global observada pelo total integrado de radiação extraterrestre, estimado com formulação convencional. Admitindo-se que o fluxo de radiação solar extraterrestre não tenha variado entre os dois períodos, foram encontrados valores para a transmissividade média de 46,7% e 53,8% para 1991/92 e 1995/96, respectivamente. Os valores de 1995/96 concordaram com os valores relatados por Shuttleworth et al (1984) e Molion (1987) para a Reserva Florestal Ducke. Porém, o período de influência dos aerossóis do Pinatubo apresentou uma transmissividade média cerca de 7% inferior a do período em que os aerossóis já não se faziam presentes. As correlações entre os pares de valores observados de Rn e Rg, feitas para cada período independentemente, não apresentou diferença significativa entre as duas relações lineares obtidas. Para o período 1991/92, obteve-se com r 2 = 0,98. E, para 1995/96 Rn = 0,76Rg 13,6 (3) 2843

Rn = 0,77Rg 16,9 (4) com r 2 = 0,96. Uma inspeção da radiação de onda longa emitida para o espaço exterior (ROL), utilizando dados do CPC/NCEP/NOAA, aparentemente não apresentou diferença significativa entre os dois períodos, com valores de 198 Wm -2 para 1991/92 e 203 Wm -2 para 1995/96. A diferença de 5Wm -2 está dentro da acurácia radiométrica dos sensores a bordo de satélites. Isso significa que o adicional de energia disponível durante 1995/96, igual a 1,9 MJm -2, pode ter sido utilizado para outros processos, como evapotranspiração por exemplo, o que corresponderia a um total diário de 1,5 mm dia -1. Não se pode concluir se os aerossóis vulcânicos interferiram diretamente na perda de ondas longas ou no efeito-estufa. A taxa de troca líquida de CO 2 entre o ecossistema e a atmosfera (TLE), calculada com a equação (2), resultou na absorção de 0,77 kgc/ha/h para 1992/93 e de 1,22 kgc/ha/h para 1995/96, ou seja, uma redução de absorção de 0,45 kgc/ha/h em 1992/93, o que corresponderia a 3,9 tonc/ha/ano. Essa taxa, generalizada para toda a Reserva Biológica Nacional do Rio Jarú com uma área de 268.150ha, representaria uma perda de produtividade primária equivalente à assimilação de 1 milhão tonc no ano. CONCLUSÃO O período outubro de 1991 a março de 1992, em que os aerossóis da erupção do vulcão Monte Pinatubo estiveram presentes na estratosfera, registrou uma redução do fluxo médio integrado de radiação global de 2,6 MJm -2 quando comparado com o do período outubro de 1995 a março de 1996, quando a estratosfera estava limpa. Surpreendentemente, a razão Rn/Rg permaneceu constante e igual a 73% nos dois períodos, sugerindo que Rn seja controlado primeiramente pelas características da superfície e pelas condições da camada limite superficial. O primeiro período foi dominado por um evento El Niño fraco, enquanto foi registrado um La Niña fraco durante o segundo período. Anos de El Niño, em princípio, são anos mais secos e de atmosfera mais transparente na Amazônia enquanto anos de La Niña são mais úmidos e com maior cobertura de nuvens. Era de se esperar, portanto, que se registrasse um excesso de radiação global durante o primeiro período comparado com o segundo. No entanto, ocorreu o inverso, com o primeiro período registrando um fluxo total médio integrado 15% inferior, devido à influência dos aerossóis do Pinatubo presentes na estratosfera. Os fluxos de radiação de onda longa emitida para o espaço exterior (ROLE) não apresentaram diferença significativa entre os dois períodos, mostrando a complexidade do efeito-estufa sobre a região de floresta tropical chuvosa. Foi observado que a média troposfera ficou mais fria cerca de 0,8 C durante o período de atuação dos aerossóis. Tal redução de temperatura corresponde a cerca de 5 Wm -2, o que concorda com a diferença de fluxo observada entre os dois períodos. No entanto, como a atmosfera estava mais seca e mais transparente às ondas longas, esperava-se um fluxo de ROLE maior que os 198 Wm -2 registrados. Por outro lado, com um fluxo maior de radiação global na superfície, esperar-se-ia que suas temperaturas fossem maiores e que o fluxo de ROLE fosse correspondentemente maior, o que não ocorreu. É possível que, ou o efeito-estufa tenha sido mais intenso durante o segundo período devido ao aumento de umidade, ou o excesso de radiação global registrado tenha sido utilizado como outra forma de energia, como calor latente de evaporação por exemplo, que tende a resfriar a superfície em questão e reduzir o fluxo de onda longa. Um estudo mais detalhado seria necessário para se determinar a possível influência de aerossóis vulcânicos na perda de onda longa para o espaço exterior e no efeito-estufa. Este estudo, porém, não deixou dúvidas que os aerossóis vulcânicos reduziram, de forma significativa, a radiação global e o saldo de radiação na superfície de uma floresta tropical chuvosa e que tal redução possa causar impactos na produtividade primária e no comportamento dos ecossistemas associados. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DE LUISI, J.J., E.G.DUTTON, K.L. COULSON, T.E. DEFOUR e B.G. MENDONCA. On some radiative features of El Chichón volcanic stratospheric dust cloud and a cloud of unknwon origin observed at Mauna Loa, J. Geophys. Res. 88:6769-6772, 1983. FAN, S.M, WOFSY,S.S., BAKWIN,P.S., JACOB, D.J. FITZJARRALD,D.R. Atmosphere-Biosphere exchange of CO 2 and O 3 in the Central Amazon Forest, J. of Geophys. Res. vol 95 (D10): 16.851-16.864, 1990 2844

LACIS, AA, J.E.HANSEN e M. SATO. Climate forcing by stratospheric aerosols, Geophys. Res. Lett 19: 1607-1610, 1992. MOLION, L.C.B. Micrometeorology of an Amazonian rainforest, in: The Geophysiology of Amazonia, R.E. Dickinson (ed) p.255-272, John Wiley and Sons, New York., 1987. MOLION, L.C.B.. Global impacts of Amazonia deforestation, Revista Geofisica 42:89-101, Instituto Panamericano de Geografia e Historia, México, DF, 1995. MINNIS, P., E.F.Harrison, L.L. Stowe, G.G.Gibson, F.M. Denn, D.R. Doelling e W.L.Smith Jr.. Radiative climate forcing by Mount Pinatubo eruption, Science 259:1411-1415, 1993. SHUTTLEWORTH, W.J., J.H.C. Gash, C.R.Lloyd, C.J. Moore, J. Roberts, A. O. Marques Filho, G.Fisch, V.P.Silva Filho, M.N.G. Ribeiro, L.C.B Molion, L.D A. Sá, C.A Nobre, O.M.R Cabral S.R. Patel e J.C. Moraes. Observations of radiation exchange above and below Amazonian forest, Quart. J.R.Met.Soc. 110:1163-1169, 1984. Reserva Jaru 1991/92 Rg Rn Reserva Jaru 1995/96 Rg Rn 80 80 70 70 60 60 Fluxo de Radiaç ão 50 30 20 10 50 30 20 10 Figura 1: Ciclo diário médio da radiação global (Rg) e saldo de radiação (Rn) no período de outubro de 1991 a março 1992. Fluxos em Wm -2. Figura 2: Ciclo diário da radiação global (Rg) e saldo de radiação (Rn) no período de outubro de 1995 a março de 1996. Fluxos em Wm -2 2845

Gráfico Rg (191/921 95/96) 80 Rg 91/92 Rg 95/96 Gráfico Rn (1991/92 1995/96) 60 Rn 91/92 Rn 95/96 70 50 60 50 30 20 10 30 20 10 Figura 3. Ciclo diário da radiação global (Rg), em Wm -2, do período 1991/92 e a de 1995/96.. Figura 4. Ciclo diário do Saldo de Radiação (Rn), em Wm -2, de 91/92 e Saldo de Radiação 95/96. 120 100 Regressão Linear Rn verso Rg (91/92) Rn = 0,76Rg - 13,7 R = 0,99 1 120 100 Regressão Linear Rn verso Rg (95/96) Rn = 0,77Rg - 16,9 R = 0,98 80 80 60 60 20 20-20 20 60 80 100 120-20 Rg (W/m²) Figura 5. Correlação entre os fluxos do saldo de radiação e da radiação global para o período 1991/92-20 20 60 80 100 120 1-20 Rg (W/m²) Figura 6.. Correlação entre os fluxos do saldo de radiação e da radiação global para o período 1995/96 2846